Projeto Memória Oral Museu da Pessoa
Entrevista de Silvia Maria Pereira de Carvalho
Entrevistado por: Ane Alves (P/1) e Fabiana Neves (P/2)
São Paulo, 17 de agosto de 2023
Código da entrevista: MUPE_HV005
Revisado por: Nataniel Torres
P/1 - Você se apresente, falando seu nome completo, data de nascimento e cidade de nascimento, é o local de nascimento.
R - Bom, eu sou Silvia Maria Pereira de Carvalho, nasci em 28/09/1949, na cidade de Itajubá em Minas Gerais.
P /1 - Silvia, te contaram como foi o dia do seu nascimento?
R - Contaram. Bom, eu nasci de madrugada. Fui a segunda filha, o primeiro era um homem, meu irmão mais velho e a minha mãe quis que eu nascesse em Itajubá, porque lá morava o bisavô, a mãe dela, a minha avó e duas irmãs. E mais tias e uma família grande, e ela preferiu que eu nascesse lá. E meu pai, engenheiro, se formou lá em Itajubá e ele já tinha um trabalho, ele precisaria viajar. E a minha mãe disse, “não vai porque ela vai nascer hoje, a criança vai nascer hoje”, ninguém sabia o sexo, naquela época era uma surpresa, e aí ele ficou e eu nasci de madrugada, às 4 horas da manhã com um tio, que era médico. Então eu nasci na Santa Casa de Itajubá, que era o único hospital que tinha nas mãos de um médico e com a família toda em volta. Então foi assim, um parto normal, tranquilo.
P/1 - E você sabe por que você se chama Silvia?
R - Sei. Tem uma história. O meu bisavô, o Wenceslau Braz, que foi presidente do Brasil, disseram assim, a família dizendo, “ah, se nascer homem tem que ser alguma coisa Wenceslau”. Wenceslau Bisneto ia ficar ruim, mas então o Luiz Wenceslau, Mário Wenceslau, uns nomes lá que surgiram, “e se for menina?”, “Ah se for menina podia ser Wenceslania” e a minha mãe disse “de jeito nenhum”, então eu tinha uma tia que minha mãe gostava muito e que acabou sendo minha madrinha de crisma e que se chamava Silvia. E então, em homenagem a ela, eu me chamo Silvia.
P/1 - E qual é o nome da sua mãe? Me fala um pouquinho dela, a origem dela.
R - A minha mãe se chama Lucy com “Y” e ela também é de Itajubá, mas morou no Rio de Janeiro muitos anos, foi interna no Colégio Sion em Petrópolis e ela perdeu o pai muito cedo com 16 anos, então ela estudou até o que seria o colegial, hoje em dia. Eu não sei nem se ela chegou a completar o colegial. Então ela foi morar em Itajubá e chegando em Itajubá, ela já conhecia o meu pai porque eles eram amigos, o pai do meu pai e o meu bisavô eram amigos e sócios, inclusive, ela logo que chegou lá disse assim: “eu vou me casar com o meu pai”, Moacir com “Y” também, e foi isso que aconteceu, ela mirou nele e fez acontecer toda uma história de amor, viveram juntos 70 anos, ele sempre cuidando muito dela. Ela era uma dona de casa, teve quatro filhos e nunca trabalhou, trabalho assim feminino na minha família não era um valor, valor era você casar bem e ter um marido que desse tudo pra você. Quis fugir desse modelito, mas era isso.
P/1 - Mas ela olhou pra ele e falou, “vou casar com você”?
R - Sim, como toda mulher faz. É assim, quando você tá interessado, homem também faz, mas acho que a mulher mais. Quando cê tá interessado, cê promove coisas. A minha mãe então de uma família pequena só com três pessoas, 3 irmãs, e ele uma família muito grande com várias irmãs e tudo, o meu avô paterno teve 10 filhos no primeiro casamento e depois mais 10 no segundo. Eu sou do segundo, descendo do pessoal do segundo casamento. E as irmãs do meu pai, do segundo casamento, eram mais ou menos da mesma idade da minha mãe e das irmãs. Então a minha mãe sempre promovia passeios longos no sítio pro meu avô paterno dizer pro meu pai acompanhado, porque o meu pai era sério, ele confiava muito no meu pai. E ela inventava esses passeios, ia pra Pedra do Baú, que levava e a cavalo, levava não sei quanto tempo, espertinha ela, e ela já tinha avisado pras irmãs, pras amigas lá em Itajubá. “Esse ninguém pega porque ele é meu”. E foi assim.
P/1 - E o que seu pai fazia, qual era a profissão?
R - Então, ele era engenheiro. Ele se formou em Itajubá, engenheiro eletricista e trabalhou durante muitos anos com isso, em linhas de transmissão, e fez várias linhas de transmissão pelo Brasil afora, mas também teve uma época uma construtora, e ele trabalhou muito em Brasília, no começo de Brasília. Então às vezes meu pai ia pra lá e ficava 3 meses, 2 meses, pra se comunicar era por rádio, porque não tinha telefone. Era complicado e minha mãe ficava aqui, sempre acompanhada das irmãs e da minha avó, que vinha de Itajubá ficar com ela e tudo. Então era assim. Então ele trabalhou no Brasil todo.
P- E a origem dos seus avós todos eles moravam em Itajubá, os seus avós maternos?
R -. Ah sim. Então os dois, né? Dos dois lados. O meu avô paterno morou na região ali de São Bento, que tinha outro nome na época. Era muito interessante a história dele porque ele era São Bento do Sapucaí, vocês já ouviram falar ali perto de Campos do Jordão? Então ele estudou só até a 4º série, então ele logo fez uma tropa de burros e ia buscar mercadoria em Paraty. Cês podem imaginar, sair ali, descia, ia pra Paraty, pegava mercadoria e ia vender no Sul de Minas. E foi assim que ele foi ficando bem de vida e depois ele foi morar em Guaranésia, Guaxupé, tudo ali região do Sul de Minas. O meu avô Wenceslau, diferente, ele já vinha de uma família de fazendeiros da região, gente com dinheiro e políticos. O meu bisavô Wenceslau começou a entrar na política com 12 anos de idade, ele acompanhava o pai, ele era muito inteligente, coisa e tal, e ele começou a acompanhar o pai, e ele estudou aqui na São Francisco. Ele se formou, ele estudou em colégio particular, enfim fez todo o ensino que tinha pra fazer na época e entrou na faculdade, e ele conversava muito que eu conhecia ele, já era idoso e tudo, mas ele morreu, eu tinha 16 anos, então eu convivi 16 anos com ele, e ele dizia assim, “eu não sei o que que eu tô fazendo aqui ainda, porque já morreu quase todo mundo que eu conheci, meus amigos todos já foram. Eu conheci Dom Pedro II, eu andei no primeiro avião que veio pro Brasil”, ele era o presidente na época, então ele andou. Eles dizia: “eu vi chegar o trem e agora eu tô vendo o Gagarin”, que deu a volta na terra, ele assistiu aquilo, ele dizia, “gente, não é possível. O que que eu ainda tô fazendo aqui?”. Então são duas pessoas totalmente diferentes. O meu avô materno, do lado da minha mãe, também era um advogado que morava no Rio de Janeiro e eu acho assim que ele se casou com a minha vó por conta que ela era filha do presidente, minha vó era uma pessoa muito legal, gostava muito dela, muito simples, apesar de ser filha do presidente, ter morado no catete, ela e as irmãs, uma irmã mais jovem do que ela, ela era uma mocinha na época e, apesar disso, ela era muito simples, uma pessoa muito quietinha e ele era um homem lindo de morrer, um advogado super bonitão, carioca e ele morreu com 42 anos, já tava meio separada da minha avó, mas ninguém podia saber, aquelas coisas escondidas, morreram num desastre de automóvel que se arrebentou inteiro e é isso, mas a minha mãe gostava muito dele, ele paparicava muito minha mãe. Mas enfim, é isso. Então eu não tive nenhuma convivência, claro, porque ele morreu 42 anos e nem o meu avô paterno, porque eu também não tive porque quando ele morreu, eu não tinha nem nascido. Só o meu irmão mais velho. Era um bebê. Então o avô mesmo que eu chamo de avô até hoje é o vovô Wenceslau, que na verdade é bizarro.
P - Você nasceu lá em Itajubá e a sua infância?
R - Não, eu fiquei três meses e vim pra São Paulo.
P - E como isso? Como é a primeira casa assim que você tem recordação aqui de São Paulo na sua infância?
R - Então, a primeira eu não tenho nenhuma recordação, eu já tenho da segunda que a gente morou muitos anos, que é essa lá que eu contei da Benedito Chaves, ali onde tem a Igreja do Perpétuo Socorro. Essa sim, eu tenho muita lembrança. Eu tenho lembrança também porque teve um período que a gente ficou 6 meses em Itajubá e aí eu lembro das duas casas que a gente morou lá e onde nasceu o meu irmão caçula. Então minha mãe tem 2 filhos que nasceram em Itajubá e dois que nasceram aqui e que me lembro também vagamente de uma casa em Bragança, que o meu pai trabalhou lá numa empresa chamada Byington e ele ficou uma época lá em Bragança, então a gente foi pra lá, mas disso que eu me lembro, dessas de Bragança eu tenho umas lembranças que eu tinha, na época em Bragança, eu devia ter uns 4 anos na época em Itajubá, eu já era maiorzinha, inclusive entrei no colégio de freiras lá, estudei meio semestre, tipo um uma pré-escola.
P - E nessa casa em Bragança, você lembra das festas da família, como eram os costumes da família?
R - Não, festa em Bragança eu lembro, festa mesmo era na casa desse meu bisavô, festas homéricas com muita gente, família inteira, ele tinha basta dizer que ele tinha duas cozinheiras, com dois fogões, cada uma tinha o seu. Uma que cozinhava doces, quitutes, porque tinha lanche à tarde, aquela mordomia total. E o outra é que cozinhava os salgados. Então lá é ela. É tipo casa grande e senzala, gente. Não é por nada, mas embaixo tinham vários empregados, gente que morava lá no porão, era muito habitável, era um porão grande em uma biblioteca, uma coisa de snooker, um não sei o que, tinha um quarto, banheiro, e também tinha uma ala que ficava pros empregados, que é uma ala boa também, então aí uma não casava, tinha filho, também morava lá, aí o outro irmão de não sei quem também morava, era um bando de gente assim, era uma coisa, mas era um lugar muito animado, com muita coisa pra fazer, muita gente, muito primo, muito tio, muito tia. Então era um lugar muito legal. E também na fazenda, muita festa. Enfim, aí aqui em São Paulo tinha festinha de aniversário em casa, mas aí eu já era maior.
P/1 - Natal?
R - Ah, Natal, festança total. Ou era com a família da minha mãe, família estendida, né? Mas era muito mais com a família do meu pai, que também era enorme, principalmente lá no sítio, que antes primeiro era na casa dos meus avós e aí aquele bando de primo, aquela festaria, era uma delícia, muito bom, tive uma infância muito boa.
P - E vocês são em quatro filhos?
R - Quatro. Isso.
P - É pertinho a idade de vocês, como era a relação com seus irmãos?
R - É perto. Na verdade eu era única filha.
P/1 - Os outros todos são homens.
R - São. A gente se dá muito bem e tudo, até hoje, mas quando era pequeno, não, porque o meu irmão mais velho era 3 anos mais velho que eu e ele logo já tinha a turma dele, coisa e tal. Eu fui sempre semi-interna, então a partir dos 6 anos eu ia pra escola de manhã e voltava tarde, às 4 horas. Eu ia de ônibus escolar e voltava de ônibus. Então eu chegava em casa às 5 horas da tarde. Só quarta-feira que eu tinha meio período, era o meu dia de festa, quarta-feira, a tarde que eu podia ficar em casa brincando e tudo, brincando também não eu era bem controlada a vida inteira porque menina tal, mas os meus irmãos, liberdade total.
P - E qual eram as suas brincadeiras preferidas?
R - Eu brinquei muito de boneca, brincava de amarelinha, brincava de pique, de lata, que era uma brincadeira engraçada, tinha que bater lata, coisa e tal, com o pessoal da rua. E aí brincava de miss também, Miss Universo, era muito engraçada com essas brincadeiras com uma vizinha, minha amiga, vizinha assim, era uma casa geminada, então a gente inclusive passava do quarto de uma pra outra pelo alpendre assim, minha mãe ficava brava com o pai também, dizia que era perigoso, mas a gente fazia isso e era era mais tranquilo. Você pode imaginar, andava de bicicleta ali pela Faria Lima, existia Rua Iguatemi, que era uma ruazinha. Ali onde é o shopping? O shopping Iguatemi, ali era uma chácara enorme, então aí eu ia com a empregada comprar verdura, era uma chácara imensa ali de um alemão e a gente frequentava o Clube Pinheiros que era um clube gostoso, e a gente ia a pé. Enfim, eram outros tempos, era muito tranquilo morar em São Paulo, embora já tivesse um trânsito como esse, você vê que eu saía dali de ônibus e ia até Higienópolis, no Colégio Sion e era super tranquilo. Hoje em dia você fica pensando 3 vezes pra botar o filho numa escola tão longe. Mas você não tinha muita opção. Meu pai queria, minha mãe estudou, minhas tias estudaram, entendiam uma tradição. E era difícil conseguir vaga um cartãozinho, vaga pra pagando, hein? Caro. E meu avô mandou um cartão solicitando a vaga pra bisneta dele e tudo.
P - E na família vocês tinham costume de escutar rádio, ver tevê, como que ia dizer que estudava muito, mas cê tinha um tempinho?
R - Rádio pouco. TV entrou na minha casa tinha 9 anos. Aí desde que entrou eu me apaixonei. Eu sou uma pessoa que curte uma TV, não TV aberta, hoje em dia, mas naquela época era o que a gente tinha. Você tinha um Teatro da juventude no domingo que era de altíssima qualidade com a Tatiana Belinky, com o marido dela, como é que ele chamava? Júlio. Aí depois a gente precisa ver, o marido da Tatiana Belinky procura aí gente no Google o que vocês acharem esqueci o nome dele. Mas era de altíssima qualidade. Então era esse meu pai, achava bom o que a gente ia, mas assistia, ele deixava a gente ver, mas isso já tinha 9 anos, mas brincar, muito ler, meu pai gostava de música clássica, então eu gosto até hoje, a gente escutava muita música clássica e era assim, uma vida bem classe média assim. Bem, meu pai nunca deixou a gente estudar em escola pública, porque ele achava o seguinte, que se a gente estudasse numa escola pública, a gente tava tirando a vaga de quem precisava. Ele sempre teve visto até recentemente ele morreu com 93 anos, minha mãe tem 99, cê acredita e ele não deixava comprar na farmácia popular e dizia “papai, vamos comprar pra mamãe, mamãe mundo de remédio”, ele também “vamos pra farmácia popular”, “de jeito nenhum, porque você tá tirando de gente que precisa, aí não vai ter pra quem não pode pagar e a gente pode pagar, pague”. E é assim, ele tinha essa cabeça. Eu me lembro que o meu irmão repetir o dia ele falou que eu quero estudar ali naquele colégio que tem, como é que ele chama? Ali na Pedroso um colégio super antigo. É aqui não, quando teve aquele movimento, lembra? Em 2013 foi super importante, tanto que meu pai não deixou, falou “de jeito nenhum”. Você vai pro colégio interno, lá em Poços de Caldas ele foi, pro Colégio de Padre.
P - Quando você era pequenininha já pensava assim, “quando eu crescer eu quero ser…”. Tinha algum sonho de profissão?
R - Queria ser professora, mas eu queria muito ser independente. A verdade é essa. Desde pequena. Porque a minha mãe naquela quarta-feira lembra que eu dizia “aquela ótima que eu adorava”. A minha mãe era muito indecisa, ela foi indecisa a vida inteira, até agora, ela tá já com problema, já senil e tudo, então ela não sabe mais nem quem ela é, coitada, mas ela até falou, “essa roupa que eu tô usando tá na moda, isso aqui tá se usando?”, ela até hoje. E a gente dizia, “mãe, cê tá com 93 anos, mas cê pode vestir qualquer coisa, moletom, tênis, ficar assim”, ela “não, mas eu quero na moda”. E ela então me comprava com um livro. Ela falava “se você for comigo até o centro da cidade”, que era assim. Você ia lá no centro, na Casa Sloper, tudo era um evento, ela contratava na época, eu contratava um táxi, ela não dirigia, nunca dirigiu, e então eu queria ficar brincando, mas ela falou que “eu te compro um livro se você for”, aí eu ia com ela pra ela ficar experimentando roupa e eu dizendo se eu gostava, se eu não gostava, entendeu? Aí eu não consigo fazer compra com ninguém, não pergunto pra ninguém, eu compro, quis ficar independente, eu tinha pavor daquela dependência que a minha mãe tinha, de tudo, do meu pai, da irmã, da mãe, das empregadas, disso, daquilo. Eu achava muito estranho.
P - Vamos entrar no mundo da escola, agora você falou da escola lá em Itajubá, que cê estudou.
R - Na escola eu estudei esses meses, né? Foi tipo um semestre assim, enquanto o meu pai tava lá fazendo também um trabalho lá que era um campo de pouso pra avião pequeno, e então a gente morou lá um tempo e a mãe adorou, eu também, porque é cheio de primo e lá eu podia andar na rua, tinha sei lá 6 anos, 5 anos e tal, se podia andar na rua, todo mundo te conhecia, tinha charrete. De manhã, na casa do meu avô escutava aquele barulhinho de charrete andando na rua, que tem um barulho que até hoje eu me lembro, mas eu gostei. Em São Paulo eu já entrei logo no Sion com 6 anos, aí já o pré, fiz o pré e detestava aquela comida horrível, meu pai dizia, “tem que comer, coma o que tiver”. Aí eu comia. Quando a gente era bem pequena, a gente tinha umas mais velhas que já estavam no colegial, no normal, acho que nem tinha colegial na época lá e não tinha normal também, era clássico e científico, e em geral aí elas iam ficar, chamava de anjo, elas ficavam na mesa com um bando de meninas pequenas, obrigando a gente a comer. E uma delas, eu me lembro que era chatésima, filha do Jânio Quadros, ela ficava na minha mesa e eu brigava, eu não aguentava, e as freiras é que botavam o prato, eu comia super pouco, até hoje como pouco, eu tenho pavor de prato pronto. Num restaurante vem um prato pronto “com licença, um outro pratinho”, aí eu vou pondo na minha medida, eu fiquei com aquele pavor de alguém servir um prato pra mim, eu não aguentar e ter que comer toda aquela comida. Mas meu pai não queria saber “cê tem que ir, esse colégio é muito bom, melhor colégio que tem, você vai e você aguenta”.
P - E tem algum professor da escola que tenha te marcado por coisas boas ou ruins?
R - Vários, mulheres em geral todas, nós só tivemos professor homem, quando eu estava no magistério. Aí sim, tivemos homens também. Alguns marcantes. Mas até dos 6 até os 14 anos eram só mulheres, algumas freiras, umas legais e outras chatésimas que pegava no pé, e mulheres que dormiam, algumas dormiam lá, elas ficavam feito umas freiras, mas algumas eram muito legais, a gente se dava bem, eram interessantes e tudo. Eu gostava da escola. Claro, tinha uma ou outra que eu não curtia e tudo, mas enfim, lá cê podia patinar, podia fazer muita coisa, eu gostava muito de teatro, fazia peças de teatro, era um colégio lindo de morrer, tombado. Eu lembro que eu quando eu tinha uns 13 anos, 14 anos fiz uma peça que era “O Fantasma de Canterville”, eu fiz tudo, fiz um roteiro, roteiro a direção, cenografia e aí pela escola lá nos depósitos buscando móveis antigos e biombos e não sei o que era, tinha uma festa de classe e tudo mais. E ia mal em matemática? Nunca aprendi matemática. A gente nunca teve física nem química, porque mudava de ano aí “não, agora não vai ter”. Lá tinha depois, enfim foi assim. Eu gostava de ler. Isso ajudou.
P- Tem alguma amiga que se recorda que te marcou que era aquela da escola?
R - Sim, tive várias amigas, uma inclusive que ficou durante muitos anos minha amiga, que começou no pré, depois ela foi embora, mas a gente seguiu sendo amiga. E aí depois tive outras, eu tive uma amiga que era muito legal que a gente combinava a fita de cabelo que a gente ia pôr, uma ligava pra dizer, “cê vai com a fita rosa? Então eu também vou”, “cê vai com a fita branca?” Essas coisas de menina. Enfim, era bom e aí eu namorei um cara de frente do Rio Branco porque lá era só mulher, então você não tinha contato, e no Rio Branco eram só homens. Hoje está tudo mudado. Graças a Deus. Então a gente tinha umas festinhas e aí nessa festa eu conheci esse menino do Rio Branco. Então eu namorava e uma vez eu recebi a maior bronca. Quase me tiraram a cruz. Porque a gente usava uma cruz pendurada porque eu estava lá em cima. Veja bem. Eu estava lá em cima na sala. Você pode imaginar o segundo andar do negócio. Aí ele passa na hora do recreio, eles tinham autorização pra sair e passear na calçada, então ele passeava na calçada e eu dava um tchau, e a freira entrou nessa hora. Ela chamava Vera Inocência, enorme assim. “Eu não acredito, uma menina de família se dar o desfrute”, de dar um tchau, hein gente, de longe e a distância! Ela falou assim “eu vou levar você pra diretoria, você vai perder essa cruz” eu falei: “ai, Vera Inocência, por favor, imagine, meu pai vai ficar muito bravo”, meu pai acho que não ia ficar tão bravo assim, mas enfim, ele sabia, tinha esse namoradinho, então, não namorico assim desses que pegava na mão.
P - Você ia pra escola, você falou que de ônibus, né?
R - É. No começo eu ia de ônibus escolar, aí no ônibus escolar tinha aquele negócio, a gente entrava primeiro porque nós éramos menores, a gente ocupava os melhores lugares na janela na frente, aí o pessoal mais velho entrava, pegava gente no colo, botava a gente no fundo e sentava. Então bullying minha filha, sempre teve. Pra você ver. Mas enfim, se aprende a conviver. Naquela época, era o que tínhamos, não adiantava reclamar pro pai, pra mãe.
P - E esse seu primeiro namorado do Rio Branco, você falou que seu pai sabia, né? Mas essas festinhas eram na escola?
R- Não, na casa das amigas, né? Eu mesma fiz uma vez, mas já muito mais tarde. Esse meu pai não era muito adeptos a essa coisa, mas eu tinha essa minha amiga, melhor amiga, que era ótima, eu ia pra casa dela, os pais eram bem abertos e a mãe inclusive tinha uma Kombi, e ela levava um grupo e ficava esperando ali fora em casa, horas, até a gente dizer que chegava que queria ir embora. Aí eu dormia na casa dela, era ótimo. Aproveitava e ela morava também num lugar que eu acho que foi um dos primeiros condomínios aqui do Brasil que chamava Paiol, que era no Taboão da Serra, eram irmãos que se cotizaram comprar um baile do terreno, tinha piscina, tinha isso, tinha aquilo e cada um fez a sua casa, casa térrea, uma delícia. Então, cê pode imaginar, lá era um paraíso, porque eu ia pra lá fim de semana, meu pai deixava e tudo porque ele conhecia, me diverti muito lá. Aí então você ia em muito festinha, ia em baile no clube, que acontecia nessas festas
P - Seu pai levava.
R - É, meu pai levava e ia buscar.
P - E quando cê quando cê começou a sair sozinha, foi na adolescência?
R - Ixi! Quase praticamente não saí sozinha. Depois um pouco mais velha, eu pegava ônibus, ia pra casa, às vezes descia na Augusta com uma amiga, a gente ia tomar chá, mas por exemplo, quando eu comecei a namorar mesmo pra casar e tudo, eu ia com meus irmãos, meu pai mandava os dois menores junto, tinha que dar umas burladas, eram outros tempos, pai mineiro. Aí cinco anos depois que eu me casei, já o negócio estava totalmente, todo mundo tomando pílula coisa e tal, mas eu já não era assim não, tinha que casar virgem.
P - Vamos falar um pouquinho da escola, depois a gente volta pros namoros até o casamento. Você entrou na faculdade?
R - Então, eu me casei com 19 anos. Então eu me casei assim que eu terminei o magistério. Aí eu prestei pra fazer história na PUC, que eu adorava história. Então meu pai falou assim: “eu quero que você entre ou na PUC ou no Ceres, na USP nem precisa fazer o vestibular”, porque ele achava que lá podia ter muito comunista, “o negócio era muito perigoso”. Já o meu noivo na época “Claro que você tem que fazer na USP. Evidente que você vai fazer na USP, não sei o que”, porque ele estava estudando arquitetura, estava no último ano, ele se formou no ano que eu terminei o magistério, e a gente casou logo em seguida. Então, aí no dia da prova da USP, um dia anterior, eu tinha uma febre de 40º, coisas raríssimas que eu nunca tive, acho que já foi um negócio psicológico pra não brigar entre o noivo e pai. Eu não fui, não tinha nem condição física, estava a mesmo mal. E aí eu entrei no Ceres que também era católico, na PUC que era católica, aí eu comecei a fazer PUC, mas eu engravidei na lua de mel, então aí eu fiz um ano de história e aí voltei no ano seguinte, engravidei de novo do segundo filho, que é a mãe da Teresa. E aí abandonei, voltei anos depois, quando eu voltei eu não queria fazer vestibular e eu tinha duas opções, ou eu entrava em Direito ou eu fazia o serviço social, era os dois que tinham vaga, por incrível que pareça, sem eu precisar fazer vestibular e eu louca pra fazer Direito, mas isso eu fiquei pensando que ia ser difícil com dois filhos pequenos, e então eu falei, acho que eu vou fazer serviço social porque eu tinha uma moça que depois virou minha cunhada, minha cunhada pelo lado do meu ex-marido, e aí ela falou ai vai fazer porque o trabalho é meio período você pode cuidado dos filhos e tudo. Então sempre essa ideia de que eu tinha que cuidar dos filhos. Mas quando eu voltei pra PUC, eu engravidei de novo, mas aí eu e o último filho, eu já tinha estrutura, e aí eu continuei trabalhando, estudando e tive com o filho, fui tocando a vida. Eu tinha empregada, que dormia e tudo isso. Então e aí eu me formei e já tava trabalhando, continuei trabalhando e nunca mais parei.
P/1 - Se formou em Ciências Sociais?
R - Não, em Serviço Social. Eu comecei a trabalhar em favela, na prefeitura, com creches da prefeitura e aí fiquei nessa história, minha vida toda até hoje e enfim, é tudo meio correlato, trabalhar com baixa renda. A missão, como diz meu irmão mais velho, por que você não inventou um negócio que você ganhasse dinheiro mesmo de verdade? Mas eu estou satisfeita com a vida profissional que eu que eu criei.
P/1 - Três filhos e consegui estudar ainda!
R - Quatro netos.
P/1 - Vamos voltar um pouquinho então pra história do marido, pra depois a gente voltar pra profissional, casou com 19 anos…
R - Apaixonada, aquela paixão louca. Ele é arquiteto, ele nem era bonito assim.
P/1 - Cês se conheceram como?
R - Na casa do irmão de uma amiga, na casa dessa amiga que eu a gente combinava a fita. A gente inclusive parecia um pouco. Ela tinha um irmão mais velho, que ele deu uma festa e ele falou “ó pode tem três amigas sua que você pode convidar”, eu era uma das três, aí eu fui lá e estava o meu ex-marido lá, e aí eu achei ele super engraçado, divertido, dei muita risada, eu sempre dei muita risada com ele porque ele perde o amigo mas não perde a piada. Aí começou um rolo, a gente começou e tal e começamos a namorar, levou um ano assim pra namorar, mas aí quando começou já foi aquela coisa de em um ano e pouco a gente tava noivando, noivado de aliança, conhece as famílias, faz aquele jantar, é tudo assim
P/1 - E os seus pais aprovaram?
R - Aprovaram. A minha mãe na época falou: “ah, você é tão novinha”, mas eles ficaram um pouco aliviados, porque o medo de eu engravidar antes de casar. Esse era um grande medo na época.
P/1 - Conta pra gente um pouquinho como foi o dia do seu casamento, apaixonada.
R - Olha, como você sabe, sempre fui independente, então, fiz tudo, decidi tudo, vestido, roupa, como ia ser igreja, tudo decisão, minha mãe concordou, eu não quis festa, eu sempre troquei festa por viagem, quando eu fiz 15 anos também aquele negócio de fazer umas festança, gastar aquele dinheirão, eu falei pro meu pai, “eu quero ir pra Europa”. Aí o meu pai disse, “não”, mas eu falei, “não, mas eu quero ir com uma senhora muito legal, ela leva um grupo de amigas”. Aí essa senhora foi lá em casa, meu pai ouviu bem a senhora falando e quando a senhora foi embora ele disse, “de jeito nenhum, você não vai. Com uma pessoa que não gostei dela, você não vai”. Eu falei, “ai, pai, mas eu queria tanto, né? Eu não quero fazer festa” e o meu pai também não queria festa ele falou: “então você vai com a sua mãe”. Aí ele comprou uma excursão. 35 dias com a minha mãe. Era um bando de gente, tinha gente de Portugal, gente da Espanha, gente do Brasil, tinham outras pessoas do Brasil, e aí eu fui. Foi a primeira vez que eu fui pra Europa.
P/1 - E como que era o nome do do seu marido?
R - José Ricardo de Carvalho.
P/1 - E onde foi a viagem de lua de mel?
R - Foi na Bahia. Porque eu tinha ido pra Bahia com 16 anos e tinha amado. O meu pai tinha um trabalho em Feira de Santana, então o papai falou assim: “ah, eu vou ter uma ideia, ao invés de eu alugar uma praia, porque a gente ia direto pra fazenda?”. Eu dizia: “ai papai, tô cheio de toda hora, vamos pruma praia, eu quero ir pruma praia. Aí ele falou: “Ao invés de alugar lá, sabe o que eu vou fazer? Eu vou alugar alguma coisa lá na Bahia”. Aí nós fomos de carro, meu pai foi de avião e porque era do trabalho dele, tava lá, e nós fomos de carro com a minha mãe, o motorista, porque aí eu já não tinha mais ônibus, eu tinha motorista e tudo, meu pai tava bem de vida, e aí a gente tinha motorista e o motorista pra escola, e aí então foi minha mãe, esse motorista com uma boina de lã, um calor do cão pela estrada afora, uma rural Willys, ninguém usava cinto de segurança e não tinha. A minha mãe levou uma empregada porque ela não ia ficar sozinha lá com três crianças porque o meu irmão mais velho estava fazendo vestibular. Ficou em São Paulo. E aí eu fui pra Bahia e na Bahia eu amei. Aí lá a gente ficou num hotel horrível, mas depois alugamos um apartamento na Avenida Sete ali, mas um lugar lindo, a Bahia era outra coisa, era uma delícia, ela e aí eu falei “eu quero passar a lua de mel na Bahia” e aí eu fui. Mas lá na Bahia o que que aconteceu? Tinha a amiga de uma tia que era casada com um artista plástico e era super amiga do Caribeiro, do Jorge Amado, de não sei o que. Então, eu saía com essa amiga à noite, ia pra boate, minha mãe deixava, porque ela era uma pessoa super conhecida. E eu tinha 16 anos e aí eu falei ai “eu quero voltar pra lá”. E aí a gente passou a lua de mel lá na Bahia.
P/1 - Quanto tempo vocês demoraram pra chegar na Bahia?
R - Não, nossa! Levamos três dias. A minha mãe, os dois pequenos, que na época, sei lá, tinham o quê, uns 12 anos, um tinha 10, num tinha 12, a empregada e esse motorista, tudo apertado ali. Levamos três dias e a gente ia parando, paramos em Teófilo Otoni, não sei aonde. E era super precária a estrada. Precaríssima!
P/1 - E aí passou a lua de mel na Bahia, cê teve três filhos, né?
R - Três filhos. Aí quando eu voltei, o que que aconteceu? É até tudo uma história. Gente, mas eu vou contar a história inteira da vida, eu não vou, cê vai ter que resumir tudo porque eu nem cheguei na metade, que horas são? Benza Deus!
P/1 - Vai ser rapidinho, aí a gente vai entrar na parte profissional. Eu só queria saber como foi teu primeiro filho essa parte, essa emoção de ser mãe pela primeira vez?
R - Pra falar a verdade, bem complicado porque eu queria estudar, queria trabalhar. Meio que veja, com 20 anos, você tem um sono do cão, você quer dormir, e foi tudo bem difícil assim, complicado pra mim, eu acho. E eles sobreviveram e eu também, nós sobrevivemos, todos muito jovens ali e tudo. Mas eu tive muita ajuda. Eu não posso me queixar. Eu tive bastante ajuda e mãe, sogra, minha sogra era aposentada também e tudo primeiro e tem primeiro neto dum lado, primeiro neto do outro. Então era aquele festival, eu tive muita muita ajuda nessa nesses dois primeiros, e eles foram fáceis de criar. Claro, coisas de criança e tudo. Eu fui uma mãe bem presente assim, embora eu trabalhasse tudo. Primeiro trabalho que eu tive, eles iam comigo porque aí eles estudavam na mesma escola que eu dava aula. Depois eu sempre tive esse negócio de meio período quando eu trabalhei também, eu trabalhei muito tempo meio período, depois quando eles estavam grandinhos, foi aí que eu criei e aí que eu criei o instituto, aí foi que a coisa pegou, porque era um negócio pra ser mais light, mais tranquilo também, mas aí foi crescendo, e eu tive quase como um filho, porque faz 37 anos.
P/1 - Você casada com os três filhos, qual foi seu primeiro trabalho?
R - Então meu primeiro trabalho foi numa escola, numa escola particular. Eu dava aula de inglês pra criança pequena. Eu levava o filho mais velho e a minha filha.
P/1 - Fala o nome dos seus filhos, por favor.
R - O mais velho é o Marcelo, depois a Ana Carolina, que é a mãe da Tereza, a gente chama de Lili, e o Guilherme que é o caçula. Então tinha isso, eu não trabalhava todos os dias, eu trabalhava alguns dias na semana, na verdade eu era uma mãe que ia ao clube com as crianças, as crianças ficavam comigo, eu tinha um apoio, uma ajuda, mas era uma ajuda de alguém que ajudasse, mas quem cuidava mesmo deles, quem cuidava da comida, do sono, disso, daquilo, era eu. Então eu tive essa parada assim, digamos, profissional, teria sido uma outra vida. A verdade é essa, talvez, não sei nem se teria filho tão cedo, mas enfim são outros tempos, mas hoje eu acho bom porque imagine, ontem fui almoçar com a Tereza. Eu tô desfrutando da companhia das minhas três netas, todas lindas que eu acho. Claro.
P/1 - E a emoção de ser vó, porque dizem que a emoção de ser avó é diferente de ser mãe.
R - Muito melhor que mãe, porque mãe imediatamente você se sente super responsável e você fica com receio. E mãe eu acho que dificilmente acerta. Eu acho. Acho que inclusive eu criei, eu comecei a trabalhar com creche muito em função que eu acho que todos os pais tem que ter um ótimo apoio pras famílias que têm crianças pequenas. Então essa é a minha missão. Agora dia 23 eu tô indo lá pra Brasília num bate e volta que eu não deveria porque eu tô com esses exames médicos, mas pra fazer parte do lançamento de um grupo sobre primeira infância, eventos, lá no Palácio do Planalto. Estou indo porque eu acho que isso é uma coisa boa pra ONG, pra OSCIP, e segundo porque é a minha missão de vida. Eu acho que o fim da picada é ficar só sob a responsabilidade da mulher. Eu acho que isso não é uma coisa boa pra ninguém. E acho que é muito ruim porque por mais que a mãe queira muito, que ela, “ai, eu quero ser mãe, o meu destino é esse”, acho que não deve ser. Porque mãe é uma das coisas que você pode exercer na vida, mas você tem que ter uma profissão, você tem que ter um trabalho, mesmo que você não precise ganhar financeiramente, vai então assumir uma direção de alguma coisa que você não precise ganhar, mas que você tem que trabalhar, que você tem uma ocupação, que você faça alguma coisa produtiva. Vai plantar alguma coisa, vai fazer alguma coisa, porque ficar só em casa, gente. Pelo amor de Deus, isso não é saudável do ponto de vista das trocas que você pode ter com os filhos, com os netos. Eu acho que eu tenho um perfil muito gerentão também, a pessoa que gerencia muito, então eu tive que me afastar um pouco pros filhos terem vida própria.
R - Aí vamos lá pra vida profissional, aí de professora que cê trabalhava alguns dias…
P/1 - Aí me deu uns cinco minutos e eu trabalhava já há sete anos lá e já tinha então o terceiro filho, nessa altura dos acontecimentos, ainda não tinha o terceiro, mas enfim, resolvi que eu ia voltar pra faculdade e a ia terminar e foi o que eu fiz, e já logo trabalhar. E aí já meu primeiro trabalho foi na favela de Paraisópolis numa creche mequetrefe que tinha, super precário, eu tinha pesadelos à noite porque eu via aquelas crianças desnutridas, criança com três anos que parecia que tinha um. Ave Maria! Hoje em dia tá bem mudado, hoje em dia tem muito mais controle, a gente controlava, eu tava na prefeitura e tudo, a gente controlava e tudo mais, era bem complicado ali a estrutura que tinha assim, você não tinha creche direta na prefeitura só tinha conveniada, agora você ainda tem mais conveniada do que a direta, mas você tem conveniadas excelentes, nós mesmo pela ONG já trabalhamos com várias, a nossa metodologia de formação foi feita dentro de uma organização com apoio da C & A. A C&A tinha um instituto na época que investia em educação, eles investiram na gente 15 anos, foi uma maravilha, é o sonho de toda a ONG que tá começando, e que tem essa missão por uma creche de boa qualidade, que era investir na formação profissional porque naquela época você podia ter a quarta série que você podia cuidar, porque tinha a ideia do cuidar, e as crianças tinham até seis anos, ficava de zero a seis. Então, a coisa era bem precária. E a gente trabalhou em mais de 60 instituições da zona oeste, zona sul de Osasco e foi bem legal, foi bem produtivo assim. Foi onde a gente criou a metodologia e depois, a partir de 2004, é que eu comecei a entrar, nós começamos a entrar na rede pública, aí já com pré escolas da rede pública e junto com isso a gente fez muito advocacy.
P/1 - Mas aí já o Avisa Lá?
R - Chamava-se Crecheplan quando a gente fundou.
P/1 - E como surgiu a ideia, como que o plano começou?
R - O plano começou assim, eu vi aquela precariedade, eu fui fazer um curso sobre educação, porque embora eu tenha feito magistério, era um magistério muito precário na época. Assim precário em termos de concepção de ensino e aprendizagem. E eu fui fazer esse curso na Escola da Vila que tinha um centro de estudos, nesse centro de estudos eu abri a minha cabeça do ponto de vista pedagógico. Aí eu falei: “quer saber? Eu vou fundar”, assim do nada “eu vou fundar um centro de estudos pra creche”. Então se chamava CrechePlan, que funcionou durante 7 anos numa salica do escritório de arquitetura do José Ricardo. Eu falei pra ele: “foi o melhor investimento que você fez na vida. Por que? Você investiu 7 anos em mim nesse escritório, pagou parte da minha faculdade, e nós nos separamos e você não precisou da pensão porque sua mulher tem uma profissão, trabalha. Fala a verdade!”. Então, é isso. Mas aí eu fui juntando gente interessada, aí veio a Ashoka, eu tinha acabado de fundar o Crecheplan, que na época era uma empresa, pra você ver como as coisas mudam na vida, era uma microempresa com eu e mais duas, uma nutricionista que eu conhecia da prefeitura e uma outra pessoa, que eu conheci também ali, depois não deu certo com essa pessoa. Mas ela ficou muito pouco tempo, também da prefeitura. E a nossa ideia era dar curso, fazer curso, isso e aquilo.
P/1 - Curso pra preparar as pessoas que trabalhavam nas creches?
R - As pessoas que já estavam trabalhando, e aí era tanto na área de saúde quanto na área pedagógica. Nós organizamos, começou a vir gente, a gente começou a fazer, a gente cobrava coisa e tal, mas aí no mesmo ano a Ashoka veio pro Brasil e ela selecionou o que ela chamava naquela época, ninguém falava, empreendedor social e eu fui uma das entrevistadas e junto com uma das sócias, aí a gente escreveu esse projeto numa creche de boa qualidade que era trabalhar com todos os profissionais, cozinheira, faxineira, diretora, coordenadora nem tinha, e as educadoras da época. E aí a gente ganhou a bolsa que era tipo assim, daquela época valia a pena porque eu poderia parar de trabalhar na prefeitura que eu receberia a mesma coisa. Mas como era meio período na prefeitura, eu trabalhava meio período lá e meio período aqui, e eu fui levando aquilo. A gente conseguiu então ir montando. Depois eu acabei deixando o trabalho da prefeitura. Eu abandonei na verdade o trabalho da prefeitura porque eu primeiro pedi licença sem remuneração por 2 anos, recebi, aí depois eu já tinha feito mestrado nessa época, aí o mestrado tinha sido sobre os programas de educação da prefeitura em creche, mas aí eu já tinha uma estrutura que permitia que eu largasse, que eu deixasse a prefeitura. E eu me lembro que eu fiquei 2 anos então sem ir e faltando, aí eu recebi uma carta dizendo que eu tinha que ou assumir ou fazer alguma coisa. Aí eu fui lá na procuradoria lá da prefeitura, fui subindo lá, que eles andares, o elevador não estava funcionando, aí eu fui subindo e vendo aquele pessoal sem fazer nada e eu já naquele pique de ONG fazendo projeto e trabalhando aqui, trabalhando ali, “gente eu não vou voltar nunca pra prefeitura”, quando eu cheguei lá em cima eu expliquei toda a história, eu falei “olha, eu terminei o mestrado, aí eu fundei isso e aquilo, e eu tô trabalhando com muitas instituições, até instituições que têm convênio com a prefeitura, coisa e tal”. Ela falou: “ai, mas por que cê vai embora? Fica, a gente precisa de gente boa, gente que sabe trabalhar, fica”. Eu falei: “mas eu não tenho condição porque aí eu entro lá, sou assistente social, vou mandar eu fazer, entregar óculos, eu não vou poder trabalhar onde eu quero. Eu até tentei, mas não dá, entendeu? Aí uma hora cê tá numa regional, agora mudou, agora você vai trabalhar por microrregião, agora cê vai trabalhar, eu não consigo fazer nada ali que tem uma continuidade. E eu não quero isso pra minha vida”. “Ai, mas e depois a sua aposentadoria?” Eu falei, “ah, ixi, vai demorar muito tempo pra eu me aposentar e aí eu teria que assumir muito cargo de direção. Com quem? Jânio. Pita”. Falei, “gente, não tem condição”. Eu não tenho esse temperamento acordado, sabe? Eu já chuto logo o pau da barraca. Então não dá, não posso. E aí eu não me arrependo porque eu me aposentei, deu tudo certo e quer dizer, me aposentei em termos. Me aposentei com o salário que dura uma semana pra eu ter esse nível de vida que eu tenho, mas eu todo esse tempo trabalhei e aí eu recebia, de vez em quando. Agora eu reduzi pela metade o que eu ganho porque eu estou botando outras pessoas no meu lugar.
P/1 - Conta como foi dessa parte até o Avisa Lá.
R - Então, o Avisa Lá é uma continuidade na verdade, porque o que aconteceu? A gente começou em 1999 fazer revista. E começamos a trabalhar e a revista até foi meu filho que deu esse nome, Avisa Lá, a gente gostou e aí tinha aquela música, né? Do daquele refrão, “avisa lá, avisa lá, avisa lá, ô, ô”. Aí eu gostei, falei, “ah, quer saber? Vou botar na revista”. E a gente começou no ano seguinte, no ano seguinte não, um pouco mais pra frente, 2000, 2001, depois vocês checam isso quando foi o primeiro Memória Local na escola, o Avisa Lá e o museu fizeram juntos. Acho que foi em 2001. Aí a gente já começou no ensino fundamental.
P/1 - Espera aí. Como foi a parceria do Avisa Lá com o museu? Tem que contar essa parte.
R - A parceria foi assim, depois que eu entrei pra Ashoka, sou do primeiro grupo da Ashoka do Brasil, é no mesmo ano, então faz 37 anos que a Ashoka entrou no Brasil, e aí mudou a minha vida porque eu fiz milhares de coisas interessantes, fui pra África do Sul, fui pra não sei aonde, fui pra aqui, pra ali, tudo por conta da Ashoka, participei dum evento daquele global do Clinton, cumprimentei o Clinton, aí do meu lado tava o Matt Damon, do outro lado o Michael Douglas, assim do lado, tudo pela Ashoka. Mas enfim, foi bem interessante todo esse pedaço, mas o que aconteceu? Eu aí eu comecei a entrevistar as pessoas que iam ser fellows da Ashoka, que queriam ser. Quem eu entrevistei? Várias pessoas, o Chico Mendes, um mês antes dele falecer. Vocês acreditam nisso? Pessoa maravilhosa. Pessoa assim que ele falava, ele contava as coisas. Você acreditava no que ele falava. Ele falou, “eu estou jurado de morte”. E um mês depois ele estava morto. Ele ganhou a bolsa e um mês depois, ele nunca usufruiu dessa bolsa. A Marilene Lazarine do Idec que criou o IDEC e quem mais gente? A Sueli Carneiro, a Cida Bento, o Wellington, do Doutores da Alegria, é uma lista imensa e a Karen Worcman. A Karen chega com aquele barrigão e pra entrevistar lá no Rio de Janeiro e ela começa a contar a história. Eu fiquei fascinada pela história. Eu falei, “Karen, vamos fazer um projeto juntas, mesmo que não dê certo aqui, vou fazer um projeto juntas”. Aí a cara, “topo porque eu quero entrar na rede pública”, a gente já tava na rede pública, porque aí nós começamos assim, eu não falei o negócio do nome porque o nome não podia chamar Crecheplan, eu já trabalhando na rede com ensino fundamental. Aí ficou aquela discussão na equipe, “põe aquilo, põe não sei o que”, aí alguém falou “ah, por que não põe Instituto Avisa Lá?”. Eu falei “então vamos botar Instituto Avisa Lá Formação” continuar dentro de educadores, só que virou Avisar Lá e ficou esse esse nome até hoje. Nós estamos trabalhando como sempre com creche pré-escola, ensino fundamental I. Aí eu disse, “nunca mais eu vou trabalhar. Acabou. Não vou trabalhar com Fund. II e muito menos o ensino médio. Bom, Fund.II já tive que voltar atrás porque a gente também, “ah não, mas tão legal isso que vocês fazem”, porque a gente trabalha assim claro, sempre muita teoria por trás e tudo segurando essa teoria, segurando o trabalho prático, mas é aprender a fazer fazendo. Já mudando a prática. Se você não muda a prática na hora, não adianta que não vai mudar nunca. Então formação de formadores das prefeituras, em geral e um pouco com o estado, mas muito menos, mas com as prefeituras, que é muito mais tranquilo de trabalhar. Aí fazendo também todo o Advocacy, todo o trabalho escrevendo muita coisa e material. A gente começou, fomos pioneiras no trabalho de formação à distância, já em 2004 um projeto com a IBM. Com o museu foi assim, a gente começou o museu tinha essa coisa da Lei Rouanet. Então ele vinha com a Lei Rouanet que pra nós era ótimo. E aí a gente fez essa parceria. Juntamos as duas instituições, seus profissionais, e fomos criando. E no começo era muito interessante porque era todo mês presencial. Os dois do museu iam juntos. Eram tempos que o recurso era mais fácil de conseguir. Agora está cada vez mais difícil, e estão reduzindo muito e isso é um prejuízo pro trabalho e a gente ainda produz, eu acho que os produtos do museu são sempre muito interessantes, bonitos e tudo, mas a formação em si eu acho que perdeu muito, porque uma coisa, os nossos profissionais iam e trabalhavam direto com as crianças. Isso tem um potencial muito grande de entusiasmar os professores, as equipes técnicas, porque eles assistem, era filmado, eles filmavam lá, isso tinha muito impacto, mas ainda é um projeto interessante, quem sabe muda agora os financiadores e a gente volta a fazer uma coisa mais parruda.
P/1 - Mas o que a Karen falou nessa conversa que fez você pensar nessa parceria?
R - Ah eu acho que primeiro, história de vida das pessoas comuns é algo que diz muito respeito ao que a gente pensa também porque nós estamos lidando com o que tem ali de mais precioso naquela comunidade, que são os profissionais que são dali, que em geral moram ali do lado, às vezes até tem filho nas próprias instituições, com aquelas famílias que também são dali, e com aquelas crianças. É o ouro puro ali que vem a força de um país. E você, botar aquilo em destaque e valorizar? Como a gente valoriza os desenhos? Valoriza o jeito como a criança pensa, o jeito como aquela família constituiu sua vida, as relações culturais que existem, valorizar isso, então achei que tinha tudo a ver. E foi super acertado porque são quantos municípios até agora, também precisa buscar aí que eu já nem sei mais quantos, porque o que eu tenho trouxe de material, é um material que já está um pouco defasado, mas então eu achei assim que que isso ia dar uma vertente também bastante interessante pro nosso projeto, a gente aprender muita coisa. Embora sempre é difícil, eu digo, o que é difícil? Duas fellows, eu já trabalhei com outras, já produzimos coisas, mas assim, tanto tempo e nesse volume de trabalho só aqui com o museu e com a Karen. E também a gente ficou amigo pessoal, nós somos vizinhas praticamente, já viajamos juntas, já fizemos várias coisas juntas. Viajamos tanto pela Ashoka juntas, como também profissionalmente, a gente ia muito nesses eventos de inauguração quando tinha lá na em Paraty, mesmo em Uberaba, Uberlândia, eu me lembro da gente ter ido ao cabeleireiro se arrumar, porque a gente falou, “gente, nós tamo muito esculhambada aqui pra ir num evento que vai ter Prefeito e tudo”, aí de nós duas pro cabeleireiro fazer unha, arrumar o cabelo e tudo pra ir mais arrumadinhas, não com essas cara de professora, e o pessoal porque era um evento nas cidades e tudo, o Prefeito tá lá e o secretário e outros secretários, e o pessoal de comunicação e fotos, isso, vai sair no jornal, isso e aquilo e na praça pública, às vezes alguns dos painéis ficavam nas praças, em rodoviárias, em lugares de muito movimento. Então era um evento, né?
P/2 - E como foi pra mesclar as duas metodologias? A metodologia que você já aplicava nos seus cursos pra juntar com a metodologia de histórias de vida que você ouviu?
R - Então, isso não foi assim também uma coisa tão simples. Porque as duas equipes às vezes se estranhavam um pouco, mas deu certo porque o Avisa Lá foca muito na questão da leitura da escrita e do desenho, e o museu na questão da história, da história de vida. Por exemplo, escrever legendas, não é assim qualquer legenda e se sai escrevendo legenda. Você primeiro tem que entender isso das legendas, a professora tem que entender isso, ela tem que ver, por exemplo, os livros que contam histórias de memórias de crianças. Então a gente levava um acervo e aí como você lê pras crianças? O que tem naquele livro, naquela ilustração que é interessante? Como você ajuda a melhorar o desenho das crianças? Porque tinha criança que desenhava com um lápis fraquinho, não sei o quê, que não ia nunca dar uma produção. Aí valorizo esse trabalho, acho que foi bem complementar. E a metodologia do museu era a metodologia de tirar essas histórias, tipo de pergunta, que é uma pergunta mais interessante, que é uma pergunta que suscita mais que o entrevistado desenvolve a história. Eu acho que isso, casou por aí, porque a gente também primeiro, até hoje você começa a fazer um trabalho com leitura, por exemplo, você às vezes escuta do professor, “nossa, mas que interessante sempre pensei que ler era mais assim pra aprender higiene bucal, aprender sobre meio ambiente, aprender sobre como cuidar do lixo”, cê acredita? Então a pessoa não tem ideia de que você pode tirar muita coisa da literatura que não é aquele imediato ali da vida. Não são procedimentos. A leitura literária não serve pra você extrair procedimentos. Por exemplo, lavar as mãos é uma coisa que você não precisa escrever um livro literário sobre lavar as mãos. Até você pode, evidente. Hoje em dia você pode escrever sobre pra qualquer coisa. Mas não é um tema que suscita muita coisa. Eu lembro que sempre ensinou a lavar as mãos desse jeito que na pandemia começaram a ensinar e a gente “ai, vocês já faziam isso há muito tempo”, claro, é o jeito correto. Mas isso é uma coisa simples banal. Agora uma história de vida, depende, se pode dizer, “então, casei, fiz isso, fiz aquilo e acabou. A história e minha vida foi muito boa e deu tudo certo e coisa e tal”. Isso é uma coisa, outra coisa é você pescar na história ali algo, logo a gente foi se dando conta de que dava mais certo era coisa das brincadeiras, das coisas erradas que você fez, que não devia ter feito e não sei o que, e que ia pescar com o pai no rio e que já não está mais e aí como era pescar num rio? Então tudo bem você vai falar da coisa da poluição coisa e tal mas não é esse o foco, o foco é o outro, então eu acho que isso casou muito bem. Apesar que sempre é difícil, duas fellows da Ashoka, que são sempre pessoas que empreendem, fazem coisas muito gerentonas, que estão acostumados a mandar e tudo.
P/1 - Uma coisa que você falou que eu acho bem interessante são os desenhos que tem no livro. Como foi pensado essa memória na escola, a Memorial local na escola e tem que desenhar enquanto tá acontecendo a entrevista, como que foi pensado?
R - O que a gente aposta? A gente aposta sempre numa educação integral, não é uma educação pra aprender “ba-be-bi-bo-bu”, aprender a contar e fatos históricos, não é isso, é uma educação integral, você tem que mexer com tudo aquilo que o ser humano pode, tem competência pra fazer, pra ampliar, pra mudar, e a produção de desenho, de pintura, é uma coisa fundamental pras pessoas, e normalmente no ensino fundamental isso é abafado na educação infantil até deixam, tudo bem que a criança faça um desenho que não é lá aquelas coisas, mas tudo bem, e já no ensino fundamental já tem muita crítica dos próprios alunos e mais das professoras e tal. Então a gente viu que ali tinha um potencial também dos desenhos. Aí era preciso então discutir com as professoras o tipo de desenho que a gente esperava e também, é claro, que tem todo o trabalho do cenógrafo aí que junta e tudo, mas então foi isso, então os primeiros desenhos geral apareciam assim muito fraquinhos, muito estereotipados, aquela coisa por exemplo, a gente diz, “olha, a gente num num vai aceitar um desenho que tenha uma bolinha, um carinha, um pauzinho e uns negócio assim, num dá, tem que fazer desenho de observação”, porque é através do desenho de observação que a criança, o aluno, o pequeno, porque a gente começou bem nos terceiros anos depois que a gente aumentou um pouco, é pela observação que você desenvolve os grandes artistas, grandes pintores, mesmo depois eles até virassem a abstracionistas e tudo eles começam pela observação, é um início de desenvolvimento do desenho, até hoje eu imagino que isso continua. Claro que você pode começar sem nunca ter feito um desenho de observação. Eu imagino, hoje em dia pode tudo, mas nós somos adeptos do trabalho, que tem que trabalhar, pra aprender a ler, você tem que ler bastante pra aprender a escrever, cê tem que escrever bastante, você tem que conhecer gêneros, você tem uma notícia de jornal não é igual uma narrativa literária, isso tudo você tem que saber. Agora se você nunca leu uma notícia de jornal, se na escola nunca apareceu um jornal, você não tem jornal em casa, não vê jornal no digital, como você vai escrever uma notícia? Então é essa a questão, cê tem que aprender a fazer isso, não é do nada que surge, cê tem que ter esse contato. Até do nada pode surgir, do nada que eu digo, sem cê tá numa escola formal, tá cheio de gente que o pai lia, a mãe lia, o avô lia, todo mundo lia, quando ele foi pra escola ele já sabia ler e escrever. Você vai dizer, “ah ele aprendeu do nada?” Como assim aprendeu do nada? Ele aprendeu porque ele tinha leitores e escritores em casa, ele viu ele se interessou e responderam a ele quando ele perguntou que letra é essa? Como escreve o meu nome? O que está escrito aqui? É um trabalho. E os professores muitas vezes não tiveram isso pra eles. Então eles jamais leram um livro de memória, jamais leram uma biografia. Eles leram, se ele é um professor hoje em dia, ele fez faculdade e aonde ele deve ter lido pra vestibular aquela meia dúzia de livros que ele leu às vezes só o resumo, porque ele achou chato, ele não gosta de ler, então ele leu o resumo, ele não vê prazer nisso, então é um convencimento também de que ele, naquela história, você pega um livro aí do Drauzio que ele conta as memórias dele, o Dráuzio Varella foi muito pobre, ele morava num cortiço, o pai dele tinha dois trabalhos, ele perdeu a mãe super cedo, pai tinha dois trabalhos pra poder dar conta, ele queria que os filhos estudassem em escola privada. E então cê veja, aí ele conta como era a vida dele de menino. Então isso mobiliza os professores também. Primeiro você tem que mobilizar os professores. E aí você leva essas histórias de vida, pra mobilizar, pra dizer “olha, mas as crianças precisam ouvir muito dessas histórias”.
P/1 - E qual foi o primeiro projeto que você participou do Museu da Pessoa?
R - Eu acho que foi em Uberlândia, o primeiro projeto que a gente desenvolveu era com a CTBC lá de Minas, porque o museu já tinha feito, depois vocês checam também isso, mas o museu e nós fizemos Uberlândia, Uberaba e tem uma outra cidade como chama, uma cidade menor ainda, do lado de Uberaba, Ituiutaba? Ituiutaba, exatamente. Então foram os primeiros, depois fizemos Santos, e Santos nós ficamos três anos, depois eu não sei se Rio de Janeiro foi antes, fizemos no Rio de Janeiro, no Rio inteiro claro, fizemos ali, onde morava o, como é que ele chama? Gente, está uns brancos aqui, Vila Isabel. Fizemos na Vila Isabel. Onde era a fábrica de tecidos. Lembra aquela música do Noel? Que cês não sei se vocês lembram, a música que apitava essa fábrica. E o Noel fez como se ela fosse funcionária aqui. E ele ouvia a fábrica de tecidos, coisa e tal. E o Pão de Açúcar tinha aqui eles fizeram o Pão de Açúcar mesmo ali, mas a casa tinha uma casa antiga que era ali um centro cultural. Então foi lá, foi muito legal lá na fábrica de tecidos e era o grupo Pão de Açúcar.
P/1 - Aí você falou que no início ia cinegrafista, acompanhava.
R - No dia do evento ia fotógrafos, cinegrafista, ia tudo, mas depois a gente começou a filmar localmente. Porque aí você imagina, todo mês ia, não dá pra mandar um cinegrafista pra fazer todo mês. Então tinha gente filmando lá. Contratava-se que filmava a ação das nossas formadoras com as crianças, e aí depois as prefeituras mesmo, as secretarias mesmo.
P/1 - Você chegou algumas das formações você mesma?
R - Não, aí eu nunca fiz, eu já nessa época, eu fiz formação direto muito pouco, porque aí logo depois eu fiquei, nem a Karen, nunca fez também. Então, era gente da equipe que fazia. A gente só ia pro evento final, nós íamos primeiro quando tava contratando o trabalho, a gente ia apresentar, mostrar como era coisa e tal, aí fizemos pra Votorantim, vários municípios, pro Pão de Açúcar, pra Klabin, pra vários lugares. Enfim, foi muito trabalho
P/2 - Você falou da questão dos câmeras, que vocês vão contratar com todas as vezes, eles iam mais ter os eventos finais, era uma coisa que a gente tinha uma dúvida, como a tecnologia, porque o museu é um museu virtual, e as histórias são acessadas pelos computadores e esses primeiros foram no começo dos anos 2000. Então, a gente queria saber um pouco como era essa coisa?
R - Era gravado com aquelas fitas K7
P/1 - Aquelas grandes que era a câmera?
R - Isso, mas o museu sempre primou por escolher o que tinha de melhor. Então bons fotógrafos, o Teobaldo que é um cenógrafo muito bom, ele que foi contratado, o produto sempre ficou com muito boa qualidade desde o início. Claro que quando tinha mais recurso, ficava melhor ainda e tal, mas desde o início. Agora a tecnologia naquela época, nós não tínhamos nem celular. O computador, sinceramente, a gente tava começando o uso do computador, o museu não tinha nada digital. Eu acho que não tinha museu digital, tinha já entrevista? Quando começou a ir pro computador as entrevistas?
P/1 - Agora você pegou a gente.
R - Vocês vão ter que descobrir. Claro que tinha computador, todo mundo tinha, o Avisa Lá também tinha, aqui também tinha.
P/1 - O primeiro site, com as histórias?
R - É.
P/1 - Ai gente, espera aí, acho que foi em 93, eu acho. Não.
R - Acho que talvez em 92 tinha uma coisa mais institucional.
P/1 - Depois eu vou perguntar tudo direitinho
R - Dá uma checada, porque, por exemplo, a nossa revista saiu impressa em 1999, a gente imprimiu e o trabalho com museu começou pouco depois. Então naquela época a gente tinha um site que era mais um fôlder, eu dizia.
P/1 - Quando cê começou a trabalhar com o museu, o museu ficava onde?
R - O primeiro é na Cardeal e depois aí ele foi pra rua Delfina e depois veio pra cá.
P/1 - Como você acha que é o impacto desses projetos nas cidades? Porque passa por várias cidades, cidades pequenas, cê tem alguns, xô ver relato, alguma história assim de professor que falou como esse projeto impactou.
R - Vários, né? Inclusive, às vezes a gente é chamada. “Nossa, eu quero o Avisar Lá aqui porque eu fiz com vocês um projeto maravilhoso que ficou na rede”, aliás seria uma coisa interessante o museu ir atrás pra saber onde esse projeto enraizou. Porque eu me lembro que lá em São Bernardo a pessoa depois foi pra Guarulhos e ela quis que a gente fosse trabalhar lá por conta desse projeto que tinha sido anos antes em São Bernardo, entendeu? E aí eu falando “não, mas a gente não faz esse tipo de projeto pra esse financiador, esse gosta de uma coisa mais ligada a alfabetização, mas é de outro jeito, coisa e tal”. Mas olha ela tanto insistiu, que a gente acabou tendo que fazer alguma coisa lá. Guarulhos não, ela saiu de São Bernardo e foi pra Diadema, mas ela disse que aquilo foi um dos melhores projetos que ela tinha participado. Então tem muitos, muitos depoimentos assim, nós temos, o museu tem também, eu acho que em todo, no relato dos projetos, tem muito depoimento. Agora seria interessante fazer esse levantamento, uma pesquisa. Teria que ver se então teve um projeto assim assado, se tiver ainda alguém lá daquela época, porque são muitos anos, vinte e tantos anos, 23, né? 22 anos, sei lá que a gente tem.
P/2 - E esse processo de acessar as escolas, como elas eram escolhidas e como o projeto era recebido pelas escolas?
R - Então esse era um lado que o Avisa Lá também ajudou bastante porque como a gente tinha muito trânsito em escolas e tudo ficava mais fácil chegar, mas também tinha uma ação muito boa das empresas. Diferente do que acontece hoje. Porque hoje tem aquele compliance e às vezes você não pode ter contato direto. Ninguém da empresa pode ter contato direto com a secretaria porque é uma coisa política, tem uns lances como esse. Mas às vezes a empresa tem muito contato com a secretaria, a secretaria recebe e quando a gente expõe o projeto sempre a gente tem que dizer olha sei lá você entra num município que tem duzentas escolas, não dá pra gente fazer o projeto com duzentas escolas, porque a gente vai ter um grupo de professores que a gente vai acompanhar, um grupo de coordenadores, de diretores, então você tem que restringir ali. Então, a gente sempre faz uma negociação com a secretaria pra dizer, olha, dá pra ter trinta professores no curso, dá pra ter não sei quando é. Então, eles mesmo restringem ali, alguns que tem uma equipe técnica muito atuante falam “ah, tudo bem vocês vão fazer com esses trinta e nós vamos ampliar pros demais”, às vezes o município é tão pequeno que tudo bem, já atinge a rede toda. Mas, em geral, a gente faz esse recorte. Porque a ideia é o seguinte: você desenvolve uma metodologia que depois eles podem continuar.
P/2 - É a secretaria que separa as escolas, seleciona as escolas ou vocês que propõe?
R - A gente procura dar uma orientação porque, por exemplo, há lugares que eles dizem “ah essa escola está muito precária e é isso aquilo lá ela precisa muito de projeto”, não é um bom projeto pra entrar numa escola muito precária. Eu sempre digo uma escola muito precária tem que ter o melhor diretor, o melhor coordenador e os melhores professores, senão ela nunca vai deixar de ser precária, porque em geral tá na periferia, não tá não sei aonde. Porque em geral eles querem que a gente faça na escola central, eu lembro de um esses anos, acho que é da Uberaba, que ele dizia, “ai porque aqui esse diretor é um ministro da educação”. Aí eu já falei “gente pra que eu vou entrar num lugar que eu me desencontro, que tem computador, que todo mundo quer ficar nessa escola. A elite daqui fica nessa escola”. Existe esse raciocínio. Então pra quem já tem tudo, cê oferece a melhor escola pública e aí lá na periferia, onde mais precisa, onde a única chance daquele aluno ter um avanço na vida é tá numa escola boa, com livro, com isso, com todas as oportunidades, sabendo desenhar, sabendo ir, sabendo aquilo, cê oferece o pior? Então, a gente sempre diz, “ó, tem que ser uma escola média, uma escola que não seja, mas uma escola que tem alguma estrutura, porque vai ter que desenvolver esse projeto, vai ter que ter um produto no final do ano. Essa é a questão.
P/1 - Quais são as coisas mais importantes pra você hoje?
R - Bom, já que nós tamos falando de legado do museu, eu acho que o mais importante é esse legado de uma escola pública de qualidade. Pra mim, isso tem um valor muito grande. Eu acho que a hora que a gente tiver uma escola pública de qualidade, eu acho que aí tudo vai dar certo. Tudo vai se resolver nesse país. Enquanto a gente não resolver isso, eu acho difícil. A outra coisa que eu acho é essa coisa do conhecimento, eu então agora tô muito interessada nessa, eu comprei um telescópio pra mim sem saber usar, eu não nem sabia que telescópio ficava invertido, não sabia que o sol era uma estrela pra você ver o nível de coisa, e agora eu acho que esse de buscar sempre um conhecimento, eu acho assim não parar, que isso move a vida. A outra coisa são as relações familiares, você conviver cada vez mais com a família, os amigos e desfrutar a vida porque a vida é só trabalho, embora eu tenha um trabalho que me mobilize, eu acho que isso também é muito importante, um valor eu acho se tem um trabalho que é uma coisa que se acha que tá fazendo alguma coisa nesse mundo, senão a vida ia ficar muito, a vida não basta. Viver por viver, eu acho que cê precisa ter um um algo que você acredita, e eu acho que conviver assim com pessoas interessantes, pessoas curiosas, pessoas que acrescentam coisas na sua vida e que tenham humor, levam a vida de um jeito mais mais light também, não sejam agressivos, isso também a gente já vai aprendendo com a idade, se cercar de pessoas mais agradáveis, mais de bem com a vida. Embora a gente sabe, a vida não é fácil, principalmente aqui nesse país. Então eu acho que isso são valores que eu prezo muito.
P - Como você vê o projeto Memória Local daqui pra frente, você mesmo tava falando das mudanças, que teve?
R - Então, eu acho que é um projeto que merece ser melhor remunerado pra gente se dedicar mais, pra ter mais espaço. Essa é uma questão muito difícil atualmente. Porque atualmente todo mundo quer coisas rápidas, fáceis, tá todo mundo lotado de coisa pra fazer, mesmo municípios cheio de projeto pra todo lado. Então eu acho que isso também é um pouco aflitivo assim, de cê ter que fazer uma coisa que cê sabe que poderia ser muito melhor, que as pessoas poderiam aproveitar mais, os professores, enfim, os alunos, as famílias poderiam aproveitar mais. Então, isso é uma coisa que eu acho que a gente teria que lutar ainda pra pra manter mais, tanto o museu quanto o Avisa Lá tem feito coisas semelhantes por conta própria, que sai mais barato, que não são duas instituições sendo remuneradas, fica mais em conta, mas eu acho que perde, perde muito porque essa troca. O museu investe bastante também em formação, dos seus profissionais, o Avisa Lá também, então a gente tá sempre aprendendo, sempre crescendo e eu acho que o projeto poderia ganhar. Agora isso é claro, depende de você conseguir o financiamento, das empresas se interessarem. E hoje tá muito focado nessa coisa de meio ambiente, da temática racial, da diversidade, eu acho que o projeto em si ele favorece muito isso, mas ele não é focado nisso exclusivamente, então talvez a gente pudesse repensar na hora de vender, repensar assim pra ficar mais de acordo com o que está acontecendo. Coisas para pensar.
P/1 - Uma pergunta você já falou um pouco mas qual os seus sonhos sei lá de repente agora você fala seus sonhos pessoais?
R - Meus sonhos pessoais, agora eu tô trabalhando nisso e passando um pouco a direção pra outras pessoas mais jovens da equipe que tão assumindo e ficar mais na retaguarda, mais na representatividade, tipo esse evento lá no Planalto, tudo bem, eu vou lá, faço, participo dessas coisas, mas menos esse dia a dia que eu tenho que resolver e que toma muito tempo, e que então isso é um sonho. O outro sonho eu acho é ter saúde, energia, pra continuar aprendendo, pra continuar ativa. Eu tô com uma mãe com 99 anos totalmente dependente, que precisa de cuidadora 24 horas. Então isso é muito triste, a pessoa já não sabe mais quem ela é, quem são os filhos. Embora a gente procure ficar sempre perto e dar toda a assistência, ela tá sendo muito bem cuidada, a gente é bem preocupado com isso, mas eu não gostaria disso pra mim. Eu acho que seria muito ruim você não aproveitar todos os dias até o fim da vida. Tem muita coisa pra fazer, tem coisas pra ler, eu gosto muito de ler, eu tenho um grupo de literatura, quinze mulheres que leem um livro por por mês com uma professora e a gente se encontra uma vez por mês, e aí também a gente vai a teatro, vai a shows musicais, viaja e faz coisas aí pra encher a vida com coisas boas e damos muita risada, falamos também dos perrengues, das questões familiares e de tocar a vida nessa altura, nessa idade já não querendo fazer algumas coisas pra me dirigir, eu já dirigi pra sítio, eu já não faço, eu vou com motorista até Campos do Jordão, aí ele volta de ônibus, aí eu pego o carro e vou pro sítio porque é na zona rural, não posso ficar sem carro lá. Mas então é isso, cada uma vai se adaptando, às suas suas condições e é bom, estamos envelhecendo juntas porque nós somos parecidas. Temos um tipo de vida parecido, mas eu sou das poucas que ainda trabalham.
P/1 - Tem alguma coisa que a gente não perguntou e você gostaria de falar da parte profissional, da parte pessoal?
R - Eu acho que eu já falei bastante, né? Eu vou ver se eu arrumo, eu devo ir pro sítio daqui duas semanas, preciso ver o negócio da operação, mas aí eu vou ver se eu trago as fotos, porque essa foto eu acho muito curiosa, essa foto da cidade. A minha família não era muito de tirar foto, meu pai não era muito, talvez tenha algumas, mas essa particularmente eu acho interessante. Aí tem a foto do meu casamento. Menina, o pessoal diz que fazia a primeira comunhão, tanto eu quanto ele, porque a cara de menininha e foi lá no Sion, cê acredita? Eu casei no Sion, o senhor não era aberto, não era aberto pra casar, entendeu? Mas no ano que eu me casei ele abriu e eu pá, fiz lá o casamento. Eu gostava daquela escola, apesar do “ai como é que cê freira” tudo falei “ah, mas tinha as freiras boas, não como todos escola tem os professores que são legais, aqueles que são chatos, aqueles que são não são bons professores e tem aquelas que são legais, aquelas que que você curte, que você tem uma relação mais duradoura.
P - E, por fim, como foi contar um pouco um trecho da sua história de vida hoje aqui?
R - Ah, foi bom. Eu gosto de contar, a gente gosta de contar história, não contei da missa a metade, mas precisariam muitos dias pra contar tudo, mas eu acho que é isso, eu acho que eu sou de uma geração que mudou muito rapidamente. Eu nasci nos anos 50, praticamente. Então, anos 50, gente, vamos falar do ponto de vista da situação da mulher, era totalmente diferente. Na escola, por exemplo, ninguém lia Simone de Beauvoir. Na minha casa não tinha porque era uma feminista. A primeira feminista que teve foi a Carmen Silva que escrevia na Cláudia. Lá que eu entrei em contato que a mulher tinha que trabalhar, que a mulher tinha que fazer isso, não é um valor. O dia que a minha tia, que era solteira, foi trabalhar com 33 anos, minha mãe chorou de pena dela, que ela ia trabalhar, e a minha mãe está vivendo bem agora porque essa irmã trabalhou e era funcionária pública e ela tinha, de quando ela se aposentou, salário integral, não teve filhos, ela se casou mas o marido morreu logo, e ela agora que sustenta a minha mãe, o dinheiro dela. Você imagina e minha mãe queria aquela, “ai coitada, porque ela não casou quando tinha que casar, porque isso e aquilo”, que o valor era esse, um homem que dá de um tudo, lembra de uma empregada que falava isso, “ah ela tá ótima, casou com um homem que dá de tudo, ela não vai mais trabalhar”. Eu disse, “devia chorar, porque uma mulher que não trabalha, minha filha, vai viver às custas de um homem, isso aí não dá certo, ele vai mandar nela”, “ah não tem importância, desde que deu de tudo, tudo bem”.
P/1 - Ainda tem muita coisa pra avançar, mas já avançou bastante. Silvia, muito obrigada, agradeço.
R - E eu que agradeço.
P/1 - Em nome do Museu da Pessoa, foi uma honra escutar a sua história, pena que não dá pra ser toda, né?
R - Eu gostei muito de vocês também. Cês são muito acolhedoras e ajudaram com as perguntas porque perguntar é uma arte que a gente tem que aprender a fazer.
P/1 - Muito obrigada.
R - Ah, eu que agradeço.
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