Projeto Trinta Anos Alunorte
Entrevista de Carlos Henrique Matos de Abrantes
Entrevistado por Lígia Scalise
Barcarena, 15 de julho de 2025
Transcrita por Selma Paiva
(00:19) P1 – ‘Seu’ Carlos, vou pedir para o senhor começar dizendo para mim teu nome inteiro, a cidade e a data de nascimento do senhor. Cidade onde o senhor nasceu, tá?
R1 – Carlos Henrique Matos de Abrantes, nasci em Belo Horizonte, em 10 de março de 1958.
(00:36) P1 - O senhor nasceu em Belo Horizonte. A família do senhor é de lá?
R1 - Sim, de Minas, mas papai e mamãe são do interior.
(00:48) P1 - E onde eles se conheceram?
R1 - Em Belo Horizonte. Papai foi cedo, com 14 anos, se não me engano, trabalhar com os irmãos, em Belo Horizonte e mamãe lá em Santa Bárbara do Tugúrio. Ela nasceu, mas já mudou para Belo Horizonte também.
(01:10) P1 - Aí se conheceram já jovens?
R1 - Se conheceram já jovens.
(01:14) P1 - Como é que eles chamam?
R1 - Expedito da Penha Abrantes e Terezinha Matos de Abrantes.
(01:20) P1 – ‘Seu’ Expedito e Dona Terezinha. Como que eles eram? Como eles são?
R1 - Mamãe eu perdi em 2013 e papai está comigo desde que ela faleceu. Ele veio de Belo Horizonte morar aqui comigo, em Barcarena. E eles, pra mim, são lindos. (risos)
(01:45) P1 - Me descreve um pouquinho fisicamente seu pai e sua mãe.
R1 - Mamãe é alta, todos dois a cor da pele muito parecida com a minha. Os cabelos, com a idade, ficaram bem grisalhos, muito bonitos. Papai também branco, todos dois, porte físico mais ou menos igual o meu. Hoje o papai está com a barriga muito grande, (risos) já com pouco cabelo, careca, sempre gostou de usar bigode.
(02:22) P1 - E o senhor tem irmãos?
R1 - Tenho. Eu tenho três irmãos. Dois homens acima de mim, eu sou o caçula dos homens e uma menina, que é a caçulinha da casa.
(02:35) P1 - Como é que eles chamam?
R1 - É Júlio, Eduardo e Valéria.
(02:40) P1 - Quando o senhor nasceu, te contaram como foi...
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Entrevista de Carlos Henrique Matos de Abrantes
Entrevistado por Lígia Scalise
Barcarena, 15 de julho de 2025
Transcrita por Selma Paiva
(00:19) P1 – ‘Seu’ Carlos, vou pedir para o senhor começar dizendo para mim teu nome inteiro, a cidade e a data de nascimento do senhor. Cidade onde o senhor nasceu, tá?
R1 – Carlos Henrique Matos de Abrantes, nasci em Belo Horizonte, em 10 de março de 1958.
(00:36) P1 - O senhor nasceu em Belo Horizonte. A família do senhor é de lá?
R1 - Sim, de Minas, mas papai e mamãe são do interior.
(00:48) P1 - E onde eles se conheceram?
R1 - Em Belo Horizonte. Papai foi cedo, com 14 anos, se não me engano, trabalhar com os irmãos, em Belo Horizonte e mamãe lá em Santa Bárbara do Tugúrio. Ela nasceu, mas já mudou para Belo Horizonte também.
(01:10) P1 - Aí se conheceram já jovens?
R1 - Se conheceram já jovens.
(01:14) P1 - Como é que eles chamam?
R1 - Expedito da Penha Abrantes e Terezinha Matos de Abrantes.
(01:20) P1 – ‘Seu’ Expedito e Dona Terezinha. Como que eles eram? Como eles são?
R1 - Mamãe eu perdi em 2013 e papai está comigo desde que ela faleceu. Ele veio de Belo Horizonte morar aqui comigo, em Barcarena. E eles, pra mim, são lindos. (risos)
(01:45) P1 - Me descreve um pouquinho fisicamente seu pai e sua mãe.
R1 - Mamãe é alta, todos dois a cor da pele muito parecida com a minha. Os cabelos, com a idade, ficaram bem grisalhos, muito bonitos. Papai também branco, todos dois, porte físico mais ou menos igual o meu. Hoje o papai está com a barriga muito grande, (risos) já com pouco cabelo, careca, sempre gostou de usar bigode.
(02:22) P1 - E o senhor tem irmãos?
R1 - Tenho. Eu tenho três irmãos. Dois homens acima de mim, eu sou o caçula dos homens e uma menina, que é a caçulinha da casa.
(02:35) P1 - Como é que eles chamam?
R1 - É Júlio, Eduardo e Valéria.
(02:40) P1 - Quando o senhor nasceu, te contaram como foi o dia do seu nascimento? Foi no hospital? Foi em casa?
R1 - Se contaram eu não lembro, (risos) mas eu acredito que foi em hospital. Eu não acredito. Não sei, realmente eu não lembro.
(03:02) P1 - E o senhor sabe do porquê escolheram Carlos como nome para o senhor?
R1 - Também não. A gente, os nomes dos homens todos são compostos, né? É Júlio César, Eduardo Augusto e eu, Carlos Henrique. E quem me chamava de Carlos Henrique, acho que era só mamãe. (risos)
(03:24) P1 - Quando ela estava brava, ou todo dia?
R1 - Não, ela sempre chamou pelo nome composto. Eu não sei se... também não lembro se foi ela, gosto dela ter nome composto.
(03:35) P1 - Quando o senhor nasceu, como era a vida dos seus pais, com seus irmãos já, ali, também? Era uma vida simples? O que eles faziam?
R1 - Simples. Sempre foi uma vida muito simples. Papai e mamãe sempre trabalharam, para tentar sustentar e dar o melhor para a gente. Sempre procuraram fazer de tudo para dar estudo.
(03:59) P1 – O que seu pai fazia?
R1 - Papai era fotógrafo, trabalhava no Fotos Artes. Ele, quando foi para Belo Horizonte, com 14 anos, foi para mexer com lapidação de pedra preciosa. Os dois irmãos já mexiam com isso e ele foi para Belo Horizonte e começou a mexer com lapidação.
(04:19) P1 - E aí, como é que ele chegou na fotografia? Não sabe?
R1 – (risos) Não lembro, mas ele parou com essa lapidação e entrou para trabalhar nesse Fotos Artes e ficou lá muitos anos, acho que mais de sessenta anos.
(04:34) P1 - E ele fazia foto de quê?
R1 - Fotografias, de modo geral, mas o forte era aquela fotografia para documento, fotografia três por quatro, pequenininha, era tudo retocado à mão. Eu lembro, na sala escura. Ele levava serviço para casa, para poder retocar. Eu até arrisquei tentar aprender, com lápis. Era muito difícil, porque ele tem a mão muito, muito leve. E esse Fotos ficou famoso, por ter uma das fotos de melhor qualidade em Minas Gerais.
(05:09) P1 - Ele gostava?
R1 – Gostava muito.
(05:12) P1 – Então, ele fotografou a cidade inteira?
R1 - Olha, deve ter fotografado (risos) uma boa parte. Na família, com certeza. Os irmãos, os primos, fotografou todo mundo.
(05:24) P1 - E a sua mãe, trabalhava?
R1 - Mamãe também trabalhava. Mamãe trabalhava como contadora numa loja que vendia tecido, roupas, que era no centro da cidade também.
(05:39) P1 – ‘Seu’ Carlos, os seus pais estudaram?
R1 - Não, só até o primário e o ginásio. Nenhum dos dois fez curso superior, não.
(05:51) P1 - E como que era a infância? O que o senhor tenta lembrar aí, da infância, pra mim?
R1 - Ah, eu lembro, era maravilhosa. Sim, eu lembro da gente brincando muito, a infância era muito na rua, a gente tinha que inventar os brinquedos, jogar pião, bolinha de gude, saía para jogar bola. E bola, antigamente, eu lembro que tinha um campinho que chamava Terra Branca e a gente, de vez em quando, tomava umas chineladas porque, quando a gente voltava, a roupa ficava muito suja e encardida. A gente acabava perdendo short. A gente vivia com dificuldade e não podia perder roupa que estava em bom estado. Mas era muito divertido. A gente brincava de Mãe da Rua. A gente inventava as brincadeiras, mas divertia muito.
(06:45) P1 - E ficava sujo de quê?
R1 - Da terra. Esse campo que chamava Terra Branca tinha uma lama, alguma coisa, que encardia a roupa. (risos) Aí mamãe ficava brava, falava: “Vocês vão arrumar outro canto pra jogar, nesse não”. (risos)
(07:02) P1 - Mas lá que era bom, né?
R1 - Mas lá era bom. (risos)
(07:06) P1 - E quem fazia parte das brincadeiras? Eram seus irmãos, era o pessoal da rua?
R1 - Eram os irmãos e o grupo de amigos da rua. A diferença dos meus irmãos é mais ou menos um ano, para dois anos. A gente vem em fila assim. E, naquela época, a partir de uma idade, os irmãos mais velhos já não gostavam muito de sair com os irmãos mais novos. Aí acabou que eu e minha irmã ficamos com um grupo de amigos, meus dois irmãos mais velhos com outro grupo de amigos. Apesar da gente conviver junto, estar sempre junto.
(07:53) P1 - E você se dava bem com a sua irmã?
R1 - Muito. Muito. Ainda me dou muito bem até hoje, com todos eles, são muito unidos. Família é o que tem de mais importante pra gente.
(08:07)
P1 - E tinham tradições, regras na casa de vocês? Tinha que dormir tal hora, comer de tal jeito?
R1 - Tinha. Tinha. Todo dia, antes de... mamãe sempre perguntava: “Já tomou leite, escovou dente, meninos?” E tinha horário pra deitar, mas essas... “Já tomou banho?” Então, tinha regras que já eram rígidas. E mamãe, tadinha, quando a gente já era um pouco mais adolescente, ela só ia dormir depois que os filhos todos já estavam dentro de casa. Às vezes chegava de madrugada, ela levantava, ia no quarto e olhava se a gente estava deitadinho, estava bem.
(08:49) P1 - Ela era uma mãe brava, ou uma mãe calma?
R1 – Muito calma, ela sempre foi o equilíbrio da casa, sempre, porque a gente era meio terrível. (risos) A gente gostava muito de farra, brincadeira. Papai também. E ela era que sempre, sempre foi o equilíbrio da casa.
(09:14) P1 - Vocês faziam bagunça e ela era calma, mesmo assim?
R1 - Era calma, mesmo assim e era engraçado (risos) que até os amigos, a gente ia para a cozinha da casa brincar, jogar baralho, jogar truco, que é um jogo que faz muito barulho e ela ficava preocupada com os vizinhos. Dava uma certa hora da noite, teve caso assim que ela ia: “Não, vocês podem ir todo mundo paras casas suas” - expulsava todo mundo – “e vocês tratem de dormir”. A gente subia e os amigos saíam, só que eles não iam embora não, ficavam parados lá no muro, em frente à casa. Aí não passava meia hora, a gente descia de novo, abria a porta e entrava para a cozinha, fechava a porta, fechava a janela. (risos) Mas daí a pouco é igual a sala aí do lado, a gente perdia o controle, na empolgação do jogo. (risos) Aí, a hora que ela descia, ela descia mais brava ainda. Aí acabava de vez com a brincadeira.
(10:13) P1 - E o pai do senhor, como que ele era?
R1 - O papai era bravo. O papai ‘botava’ a gente de castigo por telefone. E a gente ficava.
(10:24) P1 - Como que era isso?
R1 – A gente fazia alguma coisa e mamãe, o respeito acima de tudo, qualquer coisa que tinha de problema falava, a mamãe o avisava, na época que já tinha telefone, porque no início não tinha não, o ‘chinelo comia’ era a hora que chegava em casa. Mas ele falava: “Você pode virar para a parede e fica, que a hora que eu chegar em casa nós vamos conversar”.
(10:52) P1 - E ficava?
R1 - Ficava.
(10:54) P1 – Parado, olhando para a parede?
R1 – Parado, olhando para a parede.
(10:57) P1 - Por quanto tempo?
R1 – De castigo, por telefone. O tempo dependia da hora que ele colocou, até que ele chegasse. (risos)
(11:05) P1 - O senhor era como, como criança? Era uma criança bagunceira, uma criança obediente?
R1 - Não, eu acho que eu sempre fui obediente, sempre fui muito tranquilo. Eles falam que eu dei pouco trabalho, menos do que os meus dois irmãos mais velhos. Mas eu sempre fui, o que eu lembro, muito tranquilo.
(11:30) P1 - Eles passavam roupa, brinquedo, como que era essa divisão, assim, na casa?
R1 - Passava, passava roupa. A roupa ia passando dos mais velhos para os mais novos. A roupa estava boa, mas ele crescia, mas servia no outro, aí passavam. Os brinquedos, normalmente, eu não lembro de passar, porque a gente tinha brinquedos, ganhava bola, pião, bolinha de gude, não tinha nada, assim, de que eu lembre de brinquedos que passavam de um homem para o outro, praticamente nada.
(12:10) P1 - E como que era a casa? O que você lembra, da casa?
R1 - Não, eu lembro que a gente morou primeiro na Rua Alagoas, aí minha avó ainda era viva, eu tenho uma imagem dela na cadeira de roda e depois nós mudamos pro bairro Anchieta, que é onde tem a casa até hoje. Então, tinha uma casa na frente e um barracão atrás. Aí eu lembro que papai aumentou um cômodo no barracão, fez um quarto para ele. E aí tinha uma sala, mais um quarto, onde dormíamos nós três, banheiro, cozinha e um quarto de... era para a empregada. E aí foi muito bacana, porque nós ajudamos a construir a casa. Acredita? A casa antiga. Nós ajudamos a tirar tijolo por tijolo, para tentar aproveitar o tijolo para outra casa que ia construir, né? E aí foi muito bacana. Participamos de toda a construção, da primeira laje, a casa de dois andares, uma casa muito boa. Quando jogou a laje no primeiro andar, nossa, foi uma festa danada, todo mundo brincando. Então, tem uma imagem muito bacana. E a casa está lá até hoje. Hoje meu irmão mais velho é que está morando lá, nela.
(13:43) P1 - O que o senhor mais gostava dessa casa?
R1 - Eu gostava de tudo, porque era muito bacana, a gente divertia muito nela, brincávamos muito. Na época, quando tinha algum aniversário, essas coisas, a gente gostava de imitar lá o programa do Roberto Carlos, aí fazia um palco, cada um imitava um cantor e cantava. (risos) Sempre tivemos cachorro, bicho, brincava muito, correndo em volta. Brincava de trem fantasma, porque tinha um corredor que dava a volta na casa inteira. Aí, de noite, uma pessoa tinha que passar correndo e os outros dando susto. (risos) De vez em quando um adulto pregava peças, aparecia, a gente não estava esperando e criança, mamãe com lençol todo branco, aí a gente saía correndo e gritando. (risos) Então, era muito bacana. Sempre foi muito carinho. Sempre muito rígido na educação, sempre valores muito rígidos com a verdade, com o respeito, a honestidade. Então, tem lembranças boas.
(14:56) P1 - O senhor falou que tinha até cachorro. Tinha algum cachorro que era seu bichinho de estimação preferido?
R1 - Ah, eu gostava, eu acabava gostando deles todos. Tivemos muito pastor alemão, fox terrier. Eu não gostava muito de um papagaio. Acho que ele não gostava de mim, não, porque eu saía no terreiro e ele queria me avançar. (risos) Mas meu irmão e minha mãe, ele, o papagaio, adorava.
(15:21) P1 - Qual que era o nome do papagaio? Tinha nome?
R1 - Tinha, mas eu não vou lembrar, não. (risos)
(15:26) P1 – E ele falava?
R1 - Falava. (risos) Mas ele, eu não sei o que ele tinha comigo, eu não lembro de ter feito nada com ele. A não ser que, jogando bola, alguma bola bateu nele e ele guardou, mas eu saía no terreiro e ele queria voar pra cima de mim. (risos)
(15:43) P1 - E o senhor falou que tinha um cachorro que foi muito especial.
R1 - Eu lembro deles, do Tiger, que teve mais de um que chamou o Tiger, a Faísca. Era a que mais brincou com a gente, era uma fox terrier. Essa a gente era pequeno ainda e divertia muito com a gente.
(16:06) P1 - Tem alguma memória dessa infância que é muito marcante para o senhor, que o senhor não esquece jamais? Às vezes é um aniversário, às vezes é alguma coisa que senhor ganhou, um domingo, umas férias, alguma travessura.
R1 - Quando a gente vai conversando, a gente acaba lembrando, né? Os Natais sempre eram muito bacanas.
(16:29) P1 - O que acontecia, no Natal?
R1 - Sempre tinha os presentezinhos, a gente tinha que dormir, acreditando que ia ter Papai Noel. De manhã cedo acordava, para pegar os presentinhos no pé da meia.
(16:44) P1 - Tinha que escrever cartinha para o Papai Noel?
R1 - Escrevia cartinha para o Papai Noel. (risos) Na Páscoa escondia os ovinhos de Páscoa, pra gente procurar. Minha esposa acabou fazendo muito disso: os pezinhos dos coelhinhos, pra as crianças, pros meninos também saírem procurando. E, assim, uma coisa específica mesmo...
(17:06) P1 - Tinha alguma comida que o senhor gostava muito enquanto era pequeno, que sua mãe fazia?
R1 - Eu lembro que eu gostava muito quando a gente ia no Mercado Central com o papai, que a gente comia o abacaxi no espeto, o abacaxi geladinho. Eu lembro que era gostoso. Agora, o papai sempre cozinhou muito bem e aí a gente gostava, a comida era toda regrada. Eu lembro, por exemplo: fazia o bife, era um bife pra cada um. Não podia pegar o bife do outro, não, né? (risos) Mas sempre comida especial, especial não, mas eu lembro que a gente gostava muito de um mexidão. Eu fazia muito isso. Quando comecei, teve uma época que eu fazia Administração de Empresa de manhã, fazia um estágio em outra cidade, que era em Contagem e fazia Engenharia Mecânica à noite. E eu chegava à noite, eu abria a geladeira, pegava as comidas e misturava tudo. Aquele mexidão. Tudo que tinha na geladeira, você mistura na panela e faz. Até hoje a gente gosta muito. Pica muito o bacon, quebra os ovos, faz o ovo separado, porque senão ele some no meio do mexidão, né? E depois mistura no arroz, no feijão, pica as carnes todas que tem. Olha, se você não comeu ainda, eu recomendo, é bom, viu? (risos)
(18:36) P1 – ‘Seu’ Carlos, você tinha algum sonho, quando o senhor era menino?
R1 – Engraçado que eu não lembro, mas a gente ia muito, quando era menino, praticamente todas as férias para a fazenda do meu avô, que era em Calixto, Resplendor. A gente pegava o trem e ia de trem para lá e fazenda era muito gostosa, porque tinha muito bicho, a gente via os boiadeiros. Aí, quando eu era menino eu falava que ia ser boiadeiro. (risos) Mas não, depois a ideia pensei em ser engenheiro, um irmão do papai era, foi engenheiro civil, está vivo até hoje. Teve uma época que eu pensei em jogar bola, mas na época bola não dava tanto dinheiro igual dá agora. Cheguei até ao ponto de ser convidado pra jogar em profissional, mas não valia a pena. Eu achava que não dava futuro.
(19:35) P1 - Você jogava em qual posição?
R1 - Meia-armador.
(19:40) P1 - Mas era atacante, zagueiro?
R1 - É, meia-armador é mais pro ataque, que era o camisa 10. Então, joguei. Gostava muito de jogar bola, participei muito de jogos, campeonatos. Já fui da seleção mineira. Aqui também joguei muita bola.
(20:01) P1 - Começou desde pequeno a jogar bola?
R1 - Desde pequeno. Tinha um amigo que era um craque, morava... a gente o chamava de Fiote, ele era preto, mas a gente era muito amigo e ele era impressionante, como é que ele jogava bola. E ele me ensinava, porque ele era muito bom e a gente ia fazer ‘embaixada’. Aí eu lembro que ele fazia ‘embaixada’ sentado e eu em pé. E aí ia ‘botando’ dificuldade: “Agora tem que trocar de pé, agora tem que jogar bola na cabeça”. E ele, impressionante, porque procuraram... ele gostava de farra também e acabou se perdendo na cachaça, no álcool, mas cansei de ver os times aqui do Atlético, Cruzeiro, os representantes tentarem buscá-lo em casa, para levá-lo para ser profissional, mas não quis nada.
(20:56) P1 - E quem cuidava de vocês? Porque seu pai trabalhava como fotógrafo e sua mãe como contadora.
R1 - Tinha uma tia, tia Terezinha, que morou com a gente muito tempo e ela cuidava da gente. Quando minha irmã veio pra cá, antes de mim, pro Pará, o marido dela trabalhou na Vale muitos anos, um grande amigo meu e quando ela veio pra cá essa tia veio também, com ela. Mas a gente já era maiorzinho, mas ela morou muito tempo com a gente.
(21:27) P1 - E como que era a tia Terezinha?
R1- Muito, muito bacana. Engraçado que a mamãe o nome é Terezinha e o dela é Tereza e a gente trocou: todo mundo chamava mamãe de Dona Tereza e a tia de tia Terezinha. Não sei te explicar por que, não, mas era assim. (risos)
(21:46) P1 - Era Terezinha no documento?
R1 - Da mamãe, o nome é Terezinha mesmo e da minha tia é Tereza. Só que, no tratamento do dia a dia, todo mundo chamava minha mãe de Dona Tereza e a tia de tia Terezinha. (risos)
(22:02) P1 - E a tia Terezinha morava, dormia e acordava com vocês?
R1 - Morava, ela também trabalhou durante um tempo, não ficava o dia inteiro. A gente acabava, ia pra escola à tarde. Quando eu era menor, mamãe cuidou da gente. Depois que gente já estava maiorzinho, ela também foi trabalhar, para ajudar no dia a dia da casa. E aí a gente se virava, não tinha problema, não.
(22:28) P1 - E não era diferente, para aquela época, você ter um pai fotógrafo? Porque não era muito comum, né? As pessoas não trabalhavam tanto com isso.
R1 - É, mas antigamente era muito. Isso que eu estou dizendo. Para tirar qualquer documento, você precisava de uma fotografia. E era lá que se fazia, né? Hoje não tem mais, né? O celular acabou com muita coisa. Eu lembro que quando, por exemplo, eu fui trabalhar, em 1982, em Porto Trombetas, para eu conseguir falar com a minha família eu tinha que ir pra uma fila de orelhão, que era da Telepara e às vezes eu ficava uma hora na fila, para poder conseguir falar. A gente recebia notícia e vinha gravada numa fita cassete, de Santarém e às vezes vinha com uma semana de atraso. (risos) Então, era difícil. E naquela época foto tinha um bom movimento. Aí fazia fotos também, mas para casamento, essas coisas todas.
(23:35) P1 - Ele era o artista, né?
R1 - Ele era o artista. Fazia gestão, mas retocava, porque não era fácil achar quem dava esse retoque nas fotografias, era tudo preto e branco, na época, não tinha foto colorida, não.
(23:53) P1 - E a escola, como que era?
R1 - Eu estudei o primário no Grupo Escolar Antônio Carlos, era perto, uns sete, oito quarteirões lá de casa. E depois fui para o Colégio Marista, que era uns dois quarteirões de distância desse.
(24:14) P1 - E ia a pé?
R1 - Ia a pé. Eu gostava muito de esporte, tinha uma época que eu fazia muito esporte. Ainda amarrava um quilo de chumbo em cada pé e ia correndo. Chegava, ia assistir a aula, aí no intervalo eu jogava espirobol, é um esporte pouco conhecido, depois eu nunca mais vi.
(24:37) P1 - O que é isso?
R1 - É um esporte que tem uma corda amarrada na ponta e uma bola, tipo a bola de beisebol, na outra. E você tem que conseguir enrolar a bola para um lado e o adversário para o outro. Você podia jogar de dupla ou individual.
(24:52) P1 - Mas é com a mão?
R1 - É com a mão, batendo na bola e tem que enrolá-la no poste. Eu, depois, nunca mais vi. (risos)
(25:01) P1 - Como é que chama?
R1 – Espirobol. E aí jogava basquete, jogava bola, pratiquei muitos anos o caratê. Ia cinco horas para a academia, saía dez. Eu comecei a dar aula, durante um período, de caratê, sempre gostei muito, muito de esporte. Quando vim para cá, eu também aproveitei e pratiquei o que o local mais me permitia. A bola eu continuei, mas eu comecei a velejar, esquiar, moto, passeei muito por esse Pará.
(25:45) P1 – Esquiar?
R1 - Esquiar, puxado. Aqui, quando eu mudei para cá, a praia do Caripi não tinha nada. Tinha um barraco que era de madeira, que era do ‘seu’ Bené. Então, eu peguei essa prancha minha, conversei com ele e eu deixava debaixo da casa dele. Saía da fábrica, da Albras, ia pra lá, velejava e depois sentava na escada, pra ficar conversando, ouvindo caso. Era muito gostoso ver o pôr do sol. E um grupo de amigos acabava, vinha pra cá esquiar também... velejar. E eles vinham de buggy, mas a praia não tinha ninguém. A gente amarrava uma corda no para-choque do buggy e esquiava na beira do rio, assim, atravessava a praia do Caripi inteira, esquiando na beiradinha, só na lâmina d'água, né? Era muito gostoso. Só não podia cair, porque aí ralava na areia toda. (risos)
(26:45) P1 - Mas esqui é assim, não é?
R1 - Não, esqui de...
(26:50) P1 – Jet-ski.
R1 - Não, que você põe dois... vou chamar de tábua, dois esquis no pé e puxado por lancha, normalmente.
(27:02) P1 - Entendi.
R1 - Só que não tinha lanche e ia no buggy mesmo. Na praia não tinha ninguém, era só nós, então era muito divertido.
(227:12) P1 - Então, deixa eu voltar um pouquinho antes, ainda lá na adolescência, quando você estava na escola você queria já estudar...
R1 - Queria estudar e formar, né, em Engenharia. Aí eu acabei, quando eu formei, em 1982...
(27:277) P1 - Lá mesmo, em BH?
R1 - Em BH. Eu fazia as duas faculdades lá. E eu estava, tinha passado pro terceiro ano de Administração, porque eu comecei a fazer Administração, eu já estava fazendo Engenharia. Mas o país ainda era pouco desenvolvido em tecnologia, essas coisas. Aí eu percebia que muitos engenheiros acabavam atuando mais como administrador. Aí eu falei assim: “Eu vou fazer uma faculdade de Administração também, porque eu abro o meu ‘leque’ de oportunidades.
(28:03) P1 - Qual que era o objetivo do senhor?
R1 - Eu quis abrir, igual eu te falei, assim, a minha...
(28:08) P1 - Mas era trabalhar em grandes empresas?
R1 - Era trabalhar, sempre fui trabalhar em empresas. Eu nunca tive o espírito de empreendedor, não, de montar um negócio. Se eu tiver assistido... eu acho que financeiramente eu poderia estar muito melhor do que eu estou, porque aqui foi uma grande oportunidade. Quando eu cheguei aqui, não tinha praticamente nada.
(28:32) P1 - Os seus irmãos também fizeram ensino superior?
R1 - Meu irmão mais velho acabou largando, tirou o científico, que chamava na época, mas não fez o curso superior. O segundo começou a fazer Engenharia Elétrica, no quarto ano ele resolveu largar. Foi uma confusão danada, porque o papai não aceitava de jeito nenhum. Falou: “Você faz o sacrifício, conclui o curso e depois você faz o que você quer”, que ele queria fazer Administração de Empresas. Aí, mas ele sempre foi muito determinado, não quis e falou pro papai: “Não. Não adianta, pai, porque eu não vou conseguir assistir às aulas, não vou na aula e eu tenho que ser honesto contigo. Eu não quero fazer”. E aí largou, fez Administração, acabou virando, depois abriu um bar que chamava (29:34), fez muito sucesso em Belo Horizonte, depois foi mexer com distribuição de cerveja também. E mexeu com isso muitos anos, se deu bem, foi um empresário muito bem-sucedido. Ele começou em Belo Horizonte, depois foi para Recife e mora em Recife até hoje, mas já não mexe mais com distribuição, não. Hoje só ‘curte’. (risos)
(30:02) P1 - O mais velho, que não fez ensino superior, foi trabalhar com o quê?
R1 - Foi trabalhar, trabalhou um tempo lá no mesmo Foto, com o papai, depois meu irmão o levou para trabalhar na distribuidora, ele trabalhou muitos anos lá, em Recife, no bar também, meu irmão o levou para trabalhar junto. (30:21) P1 - E aí o senhor fez duas faculdades?
R1 - Eu fiz duas, acabei não concluindo a Administração, né? E aí, quando eu formei, esse meu cunhado era muito amigo meu, já tinha ido em 1980 para Porto Trombetas.
(30:38) P1 - A sua irmã estudou?
R1 - Minha irmã estudou, fez Administração.
(30:43) P1 - Tudo administrador!
R1 – É. Mas casou e foi, junto com o marido, para Porto Trombetas. E, quando eu formei, em julho de 1982, ele: “Você não quer vir pra cá? Vai ter uma vaga de analista”. Não era nem de engenheiro. Eu tinha feito alguns testes, algumas provas em Belo Horizonte, e falei: “Não, vamos embora”. Aí fiz uma entrevista e em outubro eu fui pra lá.
(31:13) P1 - Esse foi o primeiro emprego ou o senhor tinha trabalhado antes?
R1 - Eu tinha trabalhado antes, como estagiário, trabalhei no (31:22), eu trabalhei numa empresa de usinais, de caldeiraria, que era esse período que eu trabalhava à tarde. Era muito corrido. Mas eu até falo com os meus meninos: “Dá tempo para tudo”. Eu ainda tentava tocar violão de madrugada, meu irmão sofria, tadinho, (risos) dormia tudo no mesmo quarto e eu não sabia tocar nada, ficava ‘trem, trem, trem’ e eu me lembro dele ‘botando’ o travesseiro no ouvido, (risos) xingando: “Vai dormir” “Mas só tem essa hora pra eu tentar aprender a tocar”, né? Eu sempre gostei muito, mas não tenho o dom, não. Ninguém na minha família, mas da minha esposa é o contrário, eles nasceram com esse dom. Meu menino, então, tudo que ele pega, ele toca.
(32:07) P1 – Uau!
R1 - Uma facilidade danada e gosta.
(32:09) P1 - Eu tô aqui imaginando, então, que vocês tiveram a chance de não precisar trabalhar para ajudar em casa, naquela época da adolescência, né?
R1 - Não, papai e mamãe sempre queriam que a gente estudasse. Eu até fazia: vendia picolé, engraxava sapato, para ganhar um trocado, mas nunca nenhum de nós necessitou trabalhar para ajudar, graças a Deus.
(32:37) P1 - O que você comprava com esse dinheirinho do picolé?
R1 - Não, acabava comprando picolé mesmo. (risos) A gente divertia. Papai, quando a gente saía de férias, naquela época viajava muito de carona, não tinha dinheiro para... aí dava o dinheiro para a gente almoçar, mas a gente queria também... para alimentação só, não tinha dinheiro sobrando. Sempre vivemos com muito ‘aperto’. Mas, para a gente, por exemplo, tomar uma cervejinha, fazer alguma farra à noite, a gente tinha que ‘se virar’, né? Dava ‘nó’ numa refeição (risos) ou, na época, fazia serenata para as meninas, aí elas pediam, deixavam o café da manhã na varanda. Se o café da manhã fosse caprichado, já valia para o almoço. Aí sobrava o dinheirinho para cerveja, à noite. (risos)
(33:29) P1 - Me conta da serenata, o que era isso?
R1 - Era muito bacana. Eu conhecia uma menina e ia para beira da janela de madrugada e cantar música.
(33:41) P1 - Cantar e tocar?
R1 - Cantar e tocar.
(33:43) P1 - Sem saber tocar?
R1 - Na realidade a gente levava uma que sabia. Eu sabia poucas músicas, eu fui aprendendo. Eu aprendi muito, decorando. Eu te via tocando e aí olhava para as posições. Aí eu falava... aí decorava. Quando eu ia para casa, e aí foi uma dificuldade para mim, porque eu sou canhoto, para escrever e a maioria das pessoas são destras. Aí eu te via tocando, ou eu virava as cordas do violão, aí eu não ia saber afinar, (risos) porque eu pedia a quem tocava pra afinar, ou eu aprendia a tocar com a mão direita. Aí eu aprendi a tocar com a mão direita.
(34:24) P1 - E cantava também?
R1 - E cantava também. Aí era muito divertido. Teve uma época que, eu não sei por que, nas férias eu fazia caligrafia, para aprender a escrever com a mão direita. Não sei o que tinha de errado ser canhoto. Teve uma época em que eu cheguei a escrever com as duas mãos.
(34:46) P1 - E aí desistiu?
R1 - Não, depois desisti e continuei só com a esquerda. (risos)
(34:51) P1 - O que você gostava de cantar, na serenata?
R1 - Na época a gente gostava muito, falei que a gente era Jovem Guarda, ‘curti’ muito música popular brasileira. Aí eu gostava de tocar o que eu estava aprendendo. Ontem, até mexendo nas fotos, eu comentei com a minha esposa que eu achei legal, porque eu comprava, tinha uns caderninhos que tinha as músicas cifradas, ou amigos que tocavam. Aí eu escrevia a letra e ele ‘botava’ cifra pra mim. Então, ontem eu, tentando buscar algumas fotos pra cá, achei esses caderninhos. Gostei muito. Eu falo pra minha esposa que, assim que eu parar de trabalhar efetivamente, porque eu já estou aposentado, eu quero, duas coisas que eu quero fazer com ela, uma comigo é aprender a tocar realmente, entrar numa escola de música, para tentar tocar decentemente o violão (risos) e entrar numa escola de dança. Papai e mamãe foram grandes dançarinos. Eu lembro de acompanhá-los em serestas, menino. Quando eles levantavam para dançar um tango, impressionante. No salão as pessoas paravam, para ver os dois dançarem.
(36:10) P1 - Que lindo!
R1 - Mamãe adorava dançar.
(36:14) P1 - E ele aprendeu a dançar com ela?
R1 - Ele dançava muito bem também.
(36:18) P1 - Você dançava?
R1 - Eu até que gostava, não danço igual ele dançava, não, mas me saía bem, pelo menos as moças não reclamavam, não. (risos) Eu me emocionei, porque o papai, até hoje, se senta num cantinho lá de casa, que a gente chama - é uma área que tem churrasqueira, fogão a lenha, essas coisas - de favela. Ele senta no cantinho e põe as músicas, né? Às vezes ele me fala que ele fecha o olho e lembra vê-lo dançando, com a mamãe. Também é muito gostoso.
(36:55) P1 - E essas serenatas vocês eram pagos pra fazer, ou vocês iam lá só pra conquistar?
R1 - Não, pra conquistar menina e pra ganhar o café da manhã. (risos) E a gente divertia, era bacana.
(37:10) P1 - E dava certo? Conquistava?
R1 - Dava, dava, dava certo, sim. Às vezes o som não era muito bom, os pais reclamavam, né? (risos) Mas era exceção. (risos)
(37:23) P1 - Tinha namoradinha, nessa época?
R1 - Tinha. Novo... eu não lembro a idade certa, não, mas tinha namoradinha de bairro, né?
(37:38) P1 - E aí, quando então o cunhado do senhor foi para Trombetas, qual que era a empresa?
R1 - Era a Vale do Rio Doce, era a Mineração Rio do Norte. Era o início do projeto Vale e Japão, para ter a cadeia de alumínio aqui no Pará. Então, lá é a mineração de bauxita, até hoje a gente recebe bauxita de lá. Duas ou três linhas da Alunorte, rodam, produzem com bauxita de lá. E aí ele me convidou e eu fui para Porto Trombetas.
(38:16) P1 - Já tinha andado de avião?
R1 - Eu acho que foi a primeira vez. É impressionante, que eu tenho imagem assim de... eu vim até Belém, depois os aviões eram aqueles pequenininhos, na época. Nossa, e voa, mata, mata, mata e não via nada. E de repente um clarão no meio da selva, aí pousou lá. Mas foi muito gostoso, eu já gostava muito de bola, comecei a trabalhar efetivamente, foi muito gostoso também começar a ter meu dinheirinho. Naquela época, por ser um local, igual eu te falei, muito distante, se pagava melhor, rapidinho eu consegui comprar uma moto, muito rápido. Aí, na época fazia muita trilha, ia para Terra Santa. A mineração tinha um barco com tripulação, que você podia reservar no final de semana. Você pagava o diesel e a comida. Então, tinha um grupo de amigos que a gente pegava um barco e falava assim: “Pra onde nós vamos?” “Vamos tentar chegar no marco zero do Equador?” “Vamos”. Aí, comprava as comidas, colocava diesel, reservava, ‘botava’ as motos dentro do barco, subia o rio: “Para aqui, pega a gente aqui” e entrava no meio do mato e saía.
(39:38) P1 - E foi a primeira vez que você saiu da casa dos pais, né?
R1 - Foi a primeira vez que eu saí da casa dos meus pais.
(39:43) P1 - Eles apoiaram?
R1 - Apoiaram, sempre. Nunca...
(39:48) P1 - Você não ficou com medo de ir para um lugar tão distante, tão diferente?
R1 - Não, porque tinha meu irmão... meu cunhado e minha irmã. Pior que eu cheguei, se não foi na mesma semana, foi na seguinte, ele foi transferido para Belém. (risos) Na época eu pensei: “Vou voltar, mas já estou aqui, deixa levar”. Foi muito gostoso, foi uma época muito bacana. Eu conheci o grupo de amigos deles, é uma cidade fechada, só entravam pessoas com permissão da empresa. Então, era uma turma divertida, tinha uma bola no C1 e saía todo dia do serviço e ia bater essa bola, fazia uma farra sempre, depois. Um dos amigos dele, quando ele foi embora, me convidou para morar com ele, depois eu fui para o alojamento, mas foi uma forma de carinho, de me receber. Aí eu aprendi a esquiar, porque eles tinham lancha. Aprendi não, porque eu já esquiava, desculpa. Esquiei muito tempo também na Lagoa da Pampulha, em Belo Horizonte. (risos) Mas lá tinha uma facilidade danada, porque no grupo de amigos deles vários tinham lancha, a gente passeava, saía para pescar. Olha, tinha tudo para fazer, só precisava ter vontade. Construímos uma pista de cross, no final de semana era a atração, as famílias levavam os meninos para ver a gente tomar tombo de moto. Muito, muito gostoso. Passeei muito. Pegava a moto. Se você pegar, eu fui de Óbidos até Prainha, de moto.
(41:35) P1 - Qual a distância?
R1 - Não lembro, mas se você pegar no mapa, você vai ver que corta o oeste do Pará quase todo. E cheguei em Monte Alegre, foi uma cidadezinha linda, que eu não tinha visto montanha no Pará, né? E lá tem a Cidade Alta e a Cidade Baixa. Quando nós chegamos parecia que eram uns extraterrestres. Fiquei impressionado. Nós encostamos numa praça, num barco, mas correu de menino pra cima da gente, porque a gente estava com capacete, luva, colete, joelheira, bota até em cima. Eu acho que foi a primeira vez que eles viram moto e gente assim, lá. (risos)
(42:12) P1 - Você tinha algum apelido?
R1 – Tive, muitos. Na época não tinha esse ‘trem’ de bullying, que hoje, qualquer coisinha, as pessoas ficam... na época, era muito... eu tive apelido de Rato, ficou. Tem gente que me chama de Rato até hoje, eu não sei por causa de que, mas pegou. Mas eu tive Magrelo, Esqueleto Humano. Eu era muito, muito magro, os ossos apareciam e a gente levava tudo numa boa. Todo mundo tinha um apelidozinho, brincava.
(42:45) P1 - Será que Rato vem por causa do queijo de Minas?
R1 - Não, você sabe que eu não sei por que (risos) de Rato, mas tem amigos que brincam até hoje e chamam: “Rato”. Esse compadre meu... eu fiz uma grande amizade com esse Mauricio, que ele chama, ele é até padrinho da minha primeira filha.
(43:09) P1 - O seu cunhado?
R1 - Não.
(43:11) P1 - O compadre que foi morar junto?
R1 - É. Aí ele... o compadre que eu conheci lá em Barcarena chama...
(43:22) P1 - Lá em Barcarena?
R1 - Não, em Porto Trombetas. Depois ele veio pra cá, entendeu? E aí a gente... eu acho que fui uma das pessoas que introduziu peteca aqui no Pará. Na época ninguém jogava peteca, nós trouxemos. Você conhece o jogo de peteca?
(43:41) P1 - Pode me contar.
R1 – (risos) É, tem uma borracha e umas penas, né? E você joga por cima da... como se fosse uma quadra de vôlei, só que uma rede específica para o jogo, né? E meu cunhado também é mineiro, gostava também. Lá em Trombetas a gente brincou pouco, mas quando veio para Belém, na quadra do prédio dele, a gente começou a jogar e os moradores amigos se interessaram e aprenderam. Depois acabaram levando para o clube... como é que chama? Ah, depois vou lembrar o nome. E pegou durante um tempo e jogou. Hoje a gente não vê mais. (risos)
(44:27) P1 - Carlos, quantos anos você tinha, então, quando você foi para Trombetas?
R1 - Eu tinha 24 anos. Eu fiquei lá até... muito bacana, que o superintendente de lá criou o Igarapé das Pedras. Era um lugar bacana que tinha, um igarapé lindo, a turma fazia churrasco, tinha um... quando ele saiu de lá, ele veio pra cá, para Albras, que ela partiu antes da Alunorte. E ele acabou levando quem era meu gerente, um grande amigo meu, trabalhou aqui, Ulisses, foi a primeira promoção, eu com seis meses, essa pessoa saiu - era engenheiro mecânico - da mina, trabalhava na manutenção e assumiu a gerência que eu trabalhava, no almoxarifado, lá. E aí tinha uma vaga de supervisor, eu não conhecia, mas ele passou um mês entrevistando e vendo as pessoas e acabou me promovendo. E aí ficamos grandes amigos, aí ele veio pra cá também. E, quando ele veio, ele me deu outra oportunidade. Ele me chamou pra vir pra cá também.
(45:49) P1 – Tá. Então, lá você ficou quanto tempo?
R1 - Lá eu fiquei até dezembro de 1984.
(45:53) P1 - Foi um ano, então?
R1 - Dois anos. Dois anos e dois, três meses.
(45: 57) P1 - E estava feliz?
R1 - Estava muito feliz. Quando eu recebi o convite pra vir pra cá, eles queriam me dar a gerência, que era a que ele largou. Mas solteiro, já tinha um tempo, eu falei: “Vou conhecer outros espaços, né? Vou passear”. Aí resolvi sair e vim pra cá.
(46:21) P1 - Veio pra Barcarena?
R1 - Vim pra Barcarena.
(46:23) P1 - Como é que vem de Trombetas pra Barcarena?
R1 - Vem até Belém de avião, né? E depois era só barco, não tinha estrada. E aí, quando chegamos na Vila, ainda estava acabando de construir a Vila, eu morei um tempo em Abaetetuba e morei um tempo em Belém também. Abaetetuba tinha época de chuva, assim e a estrada ainda era muito ruim, tinha ponto da estrada, já teve época do ônibus ir até um ponto, a turma descia, tirava a bota, subia, arregaçava as calças, atravessava um lamaçal e pegava outro ônibus, do outro lado. Você acredita? Não era fácil, não. (risos) Mas também foi muito bacana. Eu nunca saí de Belo Horizonte e falei assim: “Eu vou ficar dois anos e vou voltar”. Eu pus na minha cabeça, falei assim: “O melhor lugar que existe é onde eu estou” porque, se eu estou num lugar pensando em outro, melhor eu ir embora para o outro. Então, vou tentar aproveitar o máximo tudo que tem onde eu estou. E eu sempre fui muito feliz, graças a Deus.
(47:38) P1 - Você sentia falta do que, lá de BH?
R1 - Sempre fui muito família e amizade, dou muito valor a amizade. Então, eu sentia falta dos amigos. Do local, essas coisas, igual eu te falei, eu nunca fui muito apegado. Sempre me dediquei a apegar onde eu estava. Então, não ficava com essa... mas às pessoas, sim, né? Tanto que tem uma coisa que você falou assim, que marcou muito na minha vida, quando eu tirei as primeiras férias, em início de 1984, se não me engano, foi a primeira vez que eu estava voltando para Belo Horizonte. Quando eu cheguei, o avião pousou ali, a porta, pisei pra começar a descer a escada, aí começou uma batucada cantando assim: “O moleque acabou de chegar, ê, mãe”. Você acredita que aí fui descendo, andando, uma barulheira de um monte de gente cantando, andando no saguão, que dava para acompanhar, o pessoal andando embaixo, todo mundo perguntando o que é. Estava tendo a Olimpíada, é alguém que está chegando das Olimpíadas? E era eu, era um grupo de amigos da família, eles foram para lá para me receber e foram cantando essa música do moleque que acabou de chegar, até eu entrar lá dentro. Foi muito bacana, muito emocionante.
(49:12) P1 - Nossa, eu me emocionei.
R1 - Eu não esperava de jeito nenhum. E estavam todos os amigos de faculdade. Até hoje, quando eu vou à Belo Horizonte, marca um dia, a gente encontra num bar, vão todos, com as esposas, é muito gostoso.
(49:29) P1 - Que bonito!
R1 - Isso marcou muito.
(49:33) P1 - E você avisou pelo telefone do orelhão: “Estou voltando”.
R1 - É, marcava: “Estou indo”. Aí avisava, falava com os amigos, acabava conversando muito pouco, era muito difícil. A fila era grande. Você falava: “Não adianta ficar nessa...”. Escrevia carta, naquela época tinha carta. (risos)
(49:52) P1 - Recebia carta também?
R1 - Recebia carta. (risos)
(49:55) P1 - E o correio chegava aqui, em Barcarena?
R1 - Chegava lá, chegava em Trombetas e chegava aqui também. Aí aqui eu achei bacana que esse superintendente, que foi o diretor aqui, na Albras, a casa que era dele, ele quis... ele cedeu e fez o Clube 1. Ele queria fazer igual era o Igarapé das Pedras, um lugar que reunisse a turma. Também ficou muito bacana, fez dois salões de dois quartos, era um salão de jogos, com mesa de sinuca, tinha o bar, uma cozinha boa, então era um lugar bacana, que era ponto de encontro, então trazia shows pra lá, então também era muito gostoso.
(50:41) P1 – Então, quando é que você começou a trabalhar na Albras?
R1 - Na Albrás eu comecei em dezembro de 1984.
(50:49) P1 - No almoxarifado?
R1 - Fui para o almoxarifado. A planta ainda não tinha partida, ela partiu em julho de 1985, 6 de julho, se não me engano, partiu a primeira cuba. Então, eu acompanhei as duas empresas, todas, do nascimento... participei delas também, do início até hoje.
(51:13) P1 - Quando você chegou em Barcarena, Carlos, o que você viu na cidade? Como é que era? Estava tudo começando, né?
R1 - Estava tudo começando. Não tinha nada. Você não tinha opção. Tinha o Caripi, igual eu te falei, que era praia, mas você tinha que levar seu isopor com a cerveja, com comida, que não tinha nada e divertia na casa dos amigos. Encontrava, tomava cerveja, tocava música, fazia um baralho, fazia uma brincadeira. As casas não tinham muro, era um murinho de vegetação, baixinho, mas a gente saía para passear, largava tudo aberto. As casas tinham tela para ventilar, só deixava na tela e ia embora. Chegava de noite com tranquilidade, não tinha nada. As crianças patinavam, andavam de bicicleta, tudo na rua, não tinha risco nenhum. Era muito divertido também. E eu continuei aqui, continuei mexendo com moto. Aí, velejava, fui arrumando muitas oportunidades. Amigos de Belém pegavam balsa e vinham pra cá. Eu morei um tempo em Belém e um tempo aqui. Depois que eu casei, também acabei fazendo por escola melhor em Belém. Eu mudei pra Belém, minha esposa fez duas faculdades. Aí, tem uma época que nós também mudamos pra Belém. Acho que eu fui e voltei umas três vezes. (risos)
(52:43) P1 - E aqui em Barcarena vocês moravam numa vila que era só para os funcionários?
R1 - É, é a Vila dos Cabanos. Só tinha os alojamentos. Então, eu vim solteiro para cá, eu morei em vários deles. Nos rams. Tinha os rams, que era individual e um que era de dois quartos, que eram duplos, que eram duas pessoas. Eu cheguei a morar nos dois tipos de alojamento. E quem era casado tinha as casas, mas a Vila acabava onde se chama Rua da Lama. Já não era nem asfaltada mais, era última rua que tinha casa. E farmácia, por exemplo, não tinha, era na casa da farmacêutica que a gente ia comprar remédio. O mercado é onde é hoje o hospital, ou em frente. Era um galpão só, a padaria, o Naldo, hoje, que é famosa a padaria e ele veio, se não me engano, de São Paulo, com divisórias, separou uma área dentro do mercado, tinha o pão, tinha amigo que montou um boteco na garagem da casa dele, mas não tinha opção. Eu lembro que um boteco que ficou famoso, que a gostava muito, chamava Cirrose. Era de um amigão meu, ele resolveu abrir, tocava muito cavaquinho. Tocava não, toca muito cavaquinho, até hoje, trouxe o irmão dele para trabalhar, então eu lembro que era um lugar bacana, mas a gente acabava indo muito, fim de semana, pra Belém. Eu morava em Abaetetuba, em um período tinha mais oportunidades, mas divertia muito, era muito bacana. A turma era muito unida...
(54:35) P1 - E tinha gente de todos os lugares.
R1 - Tinha gente de todos os lugares. Muito e muito unido. Sempre tinha coisa pra fazer.
(54:43) P1 - E o pessoal local, vocês também eram amigos? Quem morava, que nem era de Barcarena mesmo?
R1 - Sim, você acaba fazendo amizade. Eu fiquei muito amigo lá do seu Bené, por exemplo, do menino dele, eu atravessei do Caripi, o filho dele me levou de barco para ir na Ilha de Marajó, tudo aqui, pelo Caripi, saindo de Caripi. Foi muito bacana. Depois eu fui à Marajó, via Belém, mesmo, (55:14), passear. Fui de moto, rodei a praia, beirando a praia, o litoral todo de moto.
(55:21) P1 - E o calor? Você não sentia muito calor? Não era muito diferente?
R1 - É muito diferente, mas eu gosto muito do calor. Papai adora também. (risos) Então, agora em setembro ele está indo, vou sair de férias e ele está indo comigo, mas já não vai estar frio, né? Aí ele fica um período lá. Mas eu me adaptei muito bem ao calor. Gostei muito daqui. Os paraenses muito receptivos, me dei bem com todos eles. Olha, foi muito bacana.
(55:54) P1 - Me conta, então, como é que você conheceu a esposa.
R1 - Eu conheci a minha esposa por intermédio de uma menina que foi minha namorada também. Fazia Educação Física também. Aí ela veio passear um dia aqui e eu acabei conhecendo minha esposa. Numa festa dessa, a levou no Ram, a gente estava fazendo uma farra lá na garagem, na parte de baixo e aí eu acabei conhecendo-a. Ela também gostava muito de esportes, fez Educação Física, depois mais tarde ela fez Fonoaudiologia e acabamos ficando juntos e estamos até hoje, graças a Deus.
(56:39) P1 - Como é que ela chama?
R1 – Rosália Cristina.
(56:40) P1 - De onde ela é?
R1 - Ela é de Santarém.
(56:45) P1 - Paraense!
R1 - Ela esteve em Porto Trombetas, apesar de não lembrar, quando eu morei lá, para disputar alguns jogos. Tinha a turma aí de Santarém, de Oriximiná. Aí ela teve lá, mas ela também não lembra de mim dessa época, não.
(57:04) P1 - Vocês conhecem em Barcarena?
R1 - Nós conhecemos aqui, em Barcarena, na Vila dos Cabanos. Então, aí se acabava... eu até achei uma foto, por exemplo, quando estava começando a construir a APAE, né? Aí nós ajudamos. Eu e esse compadre meu montamos um barzinho com madeira, na praia, pra vender caipiroscas, que a fazia uma caipirosca muito gostosa. E aí tinha uma placa, que o bar chamado Mastur e embaixo bar. Nós vendemos mais de 36 litros de vodca, arrecadamos um dinheiro bom e passamos tudo para a APAE, para ajudar a construir. A turma se unia, para ajudar a desenvolver, fazer algum tipo de coisa.
(57:57) P1 - E aí você a conheceu em que ano?
R1 - Eu conheci, nós acabamos casando, porque eu casei com ela três vezes, (risos) em dezembro de 1989. Aí ela engravidou da minha filha primeira e nós resolvemos casar. Falamos: “Bom, vamos ficar juntos”. A trouxe de Santarém, em dezembro de 1989.
(58:22) P1 - Quando vocês se conheceram, ficaram namorando à distância?
R1 - Nós namoramos... não, ela já estudava em Belém. Conhecemos, ela já morava em Belém, fazia Educação Física e a gente ficava, eu ia pra Belém, ou ela vinha pra cá. Namoramos dois anos, se não me engano dois anos e pouco. Posso errar nessas coisas, porque eu falei que a minha memória... (risos) mas aí casamos.
(58:49) P1 - Casou porque ela engravidou?
R1 - Isso, a gente já namorava, mas falou: “Não, vamos, vem embora”. Liguei pro pai dela, pedi a permissão, pedi a bênção.
(58:59) P1 - Direitinho.
R1 - Direitinho. (risos) E aí ela veio, quando foi em julho, na época, falei assim: “Não, vamos casar no civil”. Na época, a Albras, pra ela ter direito aos planos, às coisas, não podia ter só o relacionamento. O importante é que a gente quer estar junto, vamos casar no civil. Aí mamãe veio, o papai não veio, porque estava trabalhando, mas mamãe veio, casamos no civil, então casei a vez.
(59:34) P1 - A primeira foi só festa? Foi só o telefone?
R1 - Não, a primeira foi que ela veio morar comigo, aí casei.
(59:38) P1 – Ah, ali já era casamento? Está bom.
R1 - Foi o primeiro casamento. Falei assim: “Agora nós somos uma família, estamos juntos. (risos) Nós e a Bruninha, que está na barriga”. Aí depois casei no civil. E teve uma farra, se eu não me engano, num jogo do Brasil com os amigos, eu não lembro, nós estávamos numa farra danada, aí surgiu e falei assim: “Mas nós vamos casar no religioso, quando a Bruna fizer 15 anos”. E aí, em 3 de agosto de 2005, que foi em 1990 que a Bruninha nasceu, nós casamos no religioso (risos) e fizemos outra farra, foi muito bom.
(01:00:19) P1 - Quando a Bruna nasceu, como é que estava a sua vida naquela época?
R1 - Estava bem estável, estava bem tranquila, trabalhando na Albras, ainda, só saí da Albras efetivamente... saí fisicamente de dentro em 2008, mas eu trabalho para o Alunorte desde que ela partiu. Depois eu vou te contar o detalhe, né? (risos) Mas era bem estável. Igual eu te falei, era muito família, os amigos. Eu tirei uma foto, tentando pegar. Era festa na casa de todo mundo, os meninos brincavam tudo junto. Às vezes ficava... tem os meninos... encontrei, por exemplo, o dono do hotel aqui, nosso, que era filho dos amigos, porque a gente conhecia, estava sempre junto. Ele comentou, falou que as melhores festas, farras que tinha, era lá em casa, (risos) que era muito animado. E era assim: às vezes a gente começava, nos encontramos: “Vamos fazer um churrasco”. Aí ia passando um amigo na rua, andando com a esposa: “Opa, tem festa na do Carlão”, entrava, se conhecia e virava uma festa, uma bagunça grande. Era muito, muito gostoso.
(01:01:41) P1 - Isso quando era solteiro, ou depois também?
R1 - Não, depois de casado. Quando era solteiro, aí eu ia pra casa dos casados.
(01:01:49) P1 – Aí, depois que casou, recebia o pessoal?
R1 - Aí recebia também o pessoal, mas as festas eram muito assim: ou ia pra praia do Caripi, ou em alguma outra praia, Beja, levava os isopores, as coisas e divertia junto.
(01:02:45) P1 – Então, ela gosta de festa também, sua esposa?
R1 - Gosta. Hoje nós estamos mais sossegados, mas as farras eram grandes, (risos) muito grandes. Quando eu fiz quarenta anos foi bacana, que eu resolvi construir um muro de latinha de cerveja. Aí eu pedi a todo mundo que for no meu aniversário que tem que me dar uma caixinha de latinha de cerveja. Quando ele entrava, eu dava a ele um Superbonder. Nós construímos um muro, ele chegou a ficar quase do tamanho da... até ali, naquele banco da parede, lá. Ele criou, mas nós fomos ficando tontos, ia colar latinha, o dedo colava, puxava, o muro começava a envergar, (risos) mas foi uma diversão muito bacana. A gente inventava as coisas, entendeu? E brincava e divertia. Então, quando ela nasceu, estava estável, as empresas sempre foram muito boas para se trabalhar.
(01:03:04) P1 - E aí, decidiu criá-la aqui em Barcarena?
R1 - Aí, resolvi criar aqui. Então, ela... os meninos todos, todos nasceram em Belém, no Hospital de Belém, né? Mas foram criados aqui, ou em Belém.
(01:03:21) P1 - São quantos filhos?
R1 - São três: a Bruna, a Daniele... a Bruna é de 1990, a Dani de 1992 e o Gugu, o Gustavo Henrique, é o ‘raspa de taxa’, dez anos depois. (risos) A gente já tinha, minha esposa sempre quis ter um menino também, a gente tentou, tentou e não vinha, depois veio por acaso, uma grata surpresa. Aí depois dele resolvemos encerrar.
(01:03:52) P1 - Então, criou as duas meninas bem pertinho uma da outra.
R1 - Muito, muito amigas. Aí a mais velha... aí depois elas acabaram estudando o ginásio e o segundo grau, uma parte do ginásio aqui, mas o segundo grau todo em Belém. Estudaram no Colégio Nazaré, depois no Ideal. E aí a mais velha quis fazer Direito. Aí eu perguntei: “Você quer fazer aqui, ou você tem a oportunidade de fazer em faculdade...” - na época eu achava que era melhor em Belo Horizonte – “Você tem as duas opções, você quer ir para o papai, para a vovó e para o vovô, você pode ir morar lá”. Ela resolveu e foi para Belo Horizonte. A segunda, ela me contou, eu não lembrava, que eu te contei, (risos) que ela não queria ir, não. Que não queria nem sair do Nazaré, mas eu que ‘forcei a barra’, que eu achava que o ideal para o que ela queria fazer, era melhor o ensino. E que depois ela foi para Belo Horizonte também, que ela disse que não queria ir, que eu que falei. (risos) Mas ela foi para Belo Horizonte, aí as duas moraram juntas e criaram um vínculo, uma amizade, uma coisa mais linda, lindo, lindo, lindo. Até hoje são muito amigas. E o menino passou, depois de bastante tempo já, em Belo Horizonte, em Ouro Preto, para Engenharia Mecânica e passou aqui, na Federal, para computação. E aí ele conversou: “O que você acha que eu devo fazer?” “Eu não acho nada, você que tem que achar, fazer o que você quer. O futuro com computação, está tudo caminhando para isso. Agora, você vai ter que gostar de ficar sentado dentro de uma sala, mexendo no computador, porque é isso que você vai fazer. Agora, engenharia você tem a oportunidade de ser um engenheiro de campo”. Ele sempre gostou de montar, desmontava as coisas todas. Aí ele falou assim: “Não, quero fazer Engenharia”. Falei: “Então, está bom”. Aí ele foi para o Ouro Preto. Está em Ouro Preto e se forma agora, esse ano, em outubro, se Deus quiser.
(01:06:17) P1 - A segunda filha, Daniele, fez o quê?
R1 - Ela fez Administração de Empresas, começou e aí também abandonou. Não quis e foi fazer Jornalismo e Comunicação. Se formou em Jornalismo e Comunicação.
(01:06:35) P1 - E você foi um pai igual ao seu pai? Como é que foi?
R1 - Igual, igual, acho que ninguém, nunca é, né? Mas os valores são os mesmos, entendeu? Não ‘abro mão’ de jeito nenhum do respeito, da honestidade. Então, isso hoje eles têm muito. Detesto. Nossa, nem fala que mentiu, porque a gente tem que, certo ou errado, assumir as responsabilidades, os louvores, né? Então, eu acho que a gente foi muito tranquilo, ainda somos, né? Somos muito unidos, apesar da distância. A mais velha abriu um café, largou o Direito, veio pra cá, resolveu estudar pra fazer alguns concursos, aí teve a pandemia, teve umas confusões, ela acabou depois resolvendo ser empresária, abriu um café aqui, na Vila, Dom Village, com a tia e a irmã. E aí está tocando o cafezinho. A mais... a segunda, que é a Dani, acabou vindo para cá, trabalhou numa contratada, depois foi para área do porto e se identificou muito com o porto. E aí trabalhou aqui, teve uma oportunidade na Alcoa, ela foi para a Alcoa. Aí trabalha de home office e montou a base dela em Belo Horizonte, tem a casinha dela lá. É impressionante como o curso de Comunicação e Jornalismo a ajudou, porque ela tem um network muito grande, que a área do porto é maravilhosa, eu gerenciei porto, manutenção e operação, muitos anos. Então, você tem contato com diversos tipos de entidades, pessoas, de reuniões envolvendo muita gente e ela escreve muito. Então, acabo atendendo todas as áreas da refinaria, acabei atendendo também porto e tive oportunidade de participar de reuniões em que ela estava envolvida e me surpreendeu a facilidade de comunicar, de se expressar, de escrever. E aí me recordou que eu tive, um dos treinamentos que eu tive, na minha trajetória, o consultor, o palestrante falou que deu uma guinada na vida dele quando ele fez um curso de teatro. Ele fez teatro, para poder fazer as palestras, aí deu uma guinada grande na vida dele. Isso também me marcou. Por exemplo: a pessoa está certa, ele vai estar só falando em público, ele precisa ter essas habilidades, ele fez esse curso de teatro.
(01:09:28) P1 - É uma desenvoltura, né?
R1 - É, uma desenvoltura.
(01:09:30) P1 – ‘Seu’ Carlão, agora virou ‘seu’ Carlão, eu estou aqui imaginando quando é que o senhor conheceu a Rose...
R1 - Rosália.
(01:09:40) P1 - Como que ela era? O que você gostou nela?
R1 - Eu gostei de tudo, ela era muito bonita, tinha um corpo muito bonito, sempre fez muito esporte, fazia Educação Física. E aí ela canta muito bem, ela toca, tem facilidade, deu aula de piano, aqui na Vila. E aí, foi, eu era meio... eles falam que eu era meio terrível, também. (risos)
(01:10:11) P1 - Terrível?
R1 - Terrível assim: eu procurava muito as mulheres.
(01:10:20) P1 - E ali acertou?
R1 - Fui lá e acertei. No Caripi a gente jogava muito frescobol. Gostava muito, joguei muito tempo com um compadre meu, depois eu vou contar a história, mas fala um palavrãozinho, tem problema em falar? Não tem, não. Mas ele é impressionante, que ele é uma pessoa que fala palavrão e ninguém... não incomoda. Todo mundo que fala, às vezes, normalmente incomoda. Ele não incomoda, não. E ele gostava também, muito. A gente jogava, éramos bons parceiros. E ele era... ele é muito moleque, muito divertido, fazia muita bagunça. E ele acabou... a gente só o chama de CP, porque... pode falar? Caralho preto. Você acredita que ele, pra pregar peça na... a gente tinha umas brincadeiras que a gente morava no ram. O meu apartamento era do lado dele. E a gente falou assim: “Se eu compro o som, você compra a televisão porque, se a gente for ouvir música, nós pulamos pra um lado, televisão pro outro”. Aí tudo a gente era dividido. Fomos em Belo Horizonte e compramos uma pampa de meia. Subimos pra passear no litoral todo de meia. A gente tinha um monte de brincadeira, né? Às vezes estava a turma, os amigos, namorados, todo mundo sentado. Compramos um tapetão pra cobrir a sala nos dois apartamentos e aí sentava e fazia brincadeira. Às vezes atendia o telefone: “Alô”, não era ninguém. Aí conversava um tempão, aí passava pro outro, ele conversava também. Ele te entregava o telefone e você: “Alô, alô”. E aí não era ninguém. “Mas não é possível, me daí o telefone”. E pegava, falava e passava pra um terceiro, que estava combinado, (risos) só pra amolar. E ele pegou esse apelido, porque ele pegou mesmo um exemplo do preto e ele ficava em pé e botava dentro da geladeira. E aí a Lígia ia lá em casa, a primeira vez, aí ele falou: “Não sei, Lígia, pega não sei o que na geladeira”. Aí a Lígia ia abrir e dava aquele berro, assustando. (risos)
(01:12:38) P1 - Ele fez isso com a Rosália?
R1 - Deve ter feito, viu? (risos) Fazia com todo mundo que ia na casa. E pegou esse apelido. Mas era muito divertido.
(01:12:51) P1 - Mas ela era como, fisicamente? Ela era morena?
R1 - Morena, cabelo liso.
(01:12:58) P1 – Bonitona?
R1 – É. Eu, pelo menos, acho. (risos) E gostava muito de música, sentava na beirada do parapeito ali do ram, pegava o violão. Na época eu gostava muito de música, gostava muito de ler, assinava os livros que saía da Abril e recebia. Aí tinha, tenho até hoje, uma coleção grande dos ‘bolachões’, né? Aí chegava da fábrica, apagava a luz do ram, ‘botava’ as músicas para ouvir. Era gostoso. Agora que eu estou começando a conversar, vou lembrando das coisas, né? Que às vezes, normalmente, a gente não lembra.
(01:13:39) P1 - Quando ela teve as meninas ela estava trabalhando, ela parou de trabalhar?
R1 - Ela parou de trabalhar. Aí teve a Bruna. Depois, logo seguida, não deu dois anos, uma é de março de 1992, a Bruna é de agosto de 1990. Deu menos de dois anos, um ano e pouco, aí teve a segunda. Aí ela trabalhou com Educação Física durante bastante tempo, depois quis fazer Fonoaudiologia e hoje ela trabalha com fonoaudiologia, tem uma clínica aqui também, no núcleo.
(01:14:19) P1 - E você trabalhava muito, nessa época, na Albras?
R1 - Trabalhava, igual trabalho até hoje, sempre é. A fábrica exige bem da gente, mas eu me sinto bem, sempre me senti bem. Os relacionamentos foram muito saudáveis. Eu passei por todo tipo de chefe que você pensar. Impressionante. Tive um chefe que foi diretor aqui da Alunorte, que pouca gente acredita, mas ele trabalhou em Porto Trombetas também. Você acredita que o aviãozinho estava arrancando e ele estava chegando atrasado, ele entrou com o carro dele na pista e fechou o avião para parar, para ele poder entrar? (risos) O piloto falou que não levantava voo com ele de jeito nenhum. Que confusão que foi para sair de lá! (risos) Mas era... eu acho que, nas conversas que gente teve aqui, comentaram dele, que ele era muito doidão, muito... mas foi fundamental, acho, para a partida, que era muito problema. Ele vivia junto, estava junto, subia os tanques todos, estava junto desde o início.
(01:15:37) P1 - Quem era ele?
R1 - Galib. Então, quando nós chegamos aqui a Albras era para ter partido por Trombeta, depois Alunorte, que pega a bauxita e faz alumina e depois Albrás, que ia pegar a alumina e ia fazer o metal, com eletrólise, na Albras. Só que o mercado não estava bom para alumina. E aí, no projeto já tinha alguns tanques grandes, os tanques dos precipitadores, que a gente passa na rua e vê aqueles tanques maiores, já tinha, não estava pintado, nem nada, então eu cansei de ir trabalhar e vendo esses tanques tudo enferrujado, parado e a gente foi para a Albras e a Albras importava alumina. E ficou assim durante bastante tempo, né? Dez anos depois que a Alunorte partiu.
(01:16:36) P1 - Como é que foi esse movimento da Alunorte?
R1 - A Alunorte, o Galib era gerente de processos, lá na Albras, ele veio pra assumir a diretoria e acabou trazendo muita gente que era da Albras. Na época eu gerenciava, além de toda a área de suprimentos, almoxarifado, manutenção e operação portuária. Quando a Alunorte partiu eu transferi - eu tinha uma equipe com 33 pessoas - para Alunorte, a Alunorte assumiu as operações portuárias da Albras e eu assumi toda a parte de suprimentos da Alunorte. Então, quando a Alunorte partiu, apesar de eu ser empregado da Albras, toda parte de compras da Albras, eu que gerenciava e fazia.
(01:17:37) P1 - Sendo funcionário Albras?
R1 - Albras. Então, tinha essa operação compartilhada, que se fazia.
(01:17:45) P1 - E aí, quando a Alunorte partiu, trouxe um monte de gente, né?
R1 - Quando ela partiu trouxe um monte de gente da Albras. Muitas das pessoas que até hoje ainda estão aí vieram da Albras. No início o Pará... trouxe muita gente de fora, porque o Pará ainda não tinha indústrias. Então, partir para o alumínio e não tinha nada do alumínio aqui. E aí trouxeram muita gente da Alcan e da Alcoa, de Ouro Preto. Então, trouxeram profissionais que conheciam um pouco. Na Albras trouxe muita gente da mineração. Eu fui um, o superintendente veio, meu gerente veio, mas umas boas turmas vieram de Porto Trombetas pra cá, também. Então, acho que esse remanejamento acabou sendo natural.
(01:18:39) P1 - O que o senhor lembra dessa época, de 1995? O que marcou pra você?
R1 - Ah, eu lembro da... mesmo quando a Alunorte partiu, eu ouvia dizer que a Alunorte estava partindo, mas era uma empresa que ia dar prejuízo. É impressionante como é que ela... mas o grupo resolveu assumir e partiu, realmente, a empresa. Muita dificuldade, no início. Eu não vivia os problemas da operação direto, porque na realidade eu acabava tendo dois gerentes. Não era muito fácil. Um era o Galib, que era o diretor aqui (risos) e um outro gerente lá na Albras, mas eu vivi as dificuldades da operação direto, eu vivia: “Está faltando essa... precisa colocar aqui, de qualquer jeito”. Mas fisicamente eu não estava aqui no dia a dia, muito pouco. Mas acompanhava os problemas. Então, eu lembro das dificuldades, é impressionante como mudou o mercado e que rapidez essa empresa cresceu, com qualidade, porque eram duas linhas, partiu em 1995, aí depois quando começou a crescer partiu a linha 3, daí alguns anos partiu linha 4 e 5, mais uns dois anos partiu linha 6 e 7. Eu vim para cá, transferido mesmo, assumindo, a estrutura era muito mais enxuta, tinha um diretor e nós éramos oito gerentes gerais, que chamavam. Então, vim assumir essa gerência de manutenção, que tinha a oficina central, toda a automação, a preditiva, a gestão da manutenção era direcionada por essa gerência. Aí tinha toda a parte de limpeza de tanques, serviços industriais, comunicação, rádio. Parte de administrativa de limpeza, manutenção civil. Nossa, era muita coisa. (risos) Mas foi muito bom também. As empresas foram uma escola muito boa, profissional, acho que ainda são, dão muitas oportunidades, investem bem nos profissionais. Então, não arrependo, não. Tive oportunidades de sair e acabei ficando e eu estou até hoje. Mas tive boas oportunidades financeiras, então, até com um cargo menor do que eu tinha, que era gerente, ir como analista e ganhando quase uma vez e meia o que eu ganhava aqui. Pra ir Vitória, por exemplo.
(01:21:33) P1 - E não foi?
R1 – Não. Eles acabaram me oferecendo mais coisas (risos) e me convenceram a ficar. Mas eu também me sentia bem.
(01:21:43) P1 - Como foi o convite para virar Alunorte de vez? Como que você saiu da Albras, para virar...
R1 - Foi o diretor, que era o Dario. Ele trabalhou na Albras também. E quando a Alunorte partiu, o Galib o trouxe para cá. E a gente também conhecia todo mundo, era amigo de todo mundo, na Vila, todo mundo junto. E aí, como tinha, nessa gerência sênior, muita contratação de serviço e eu já tinha também experiência com manutenção, ele achou que eu tinha o perfil. Então, é uma pessoa que profissionalmente me deu uma oportunidade grande de crescimento. Aí ele me fez o convite e eu aceitei. (risos)
(01:22:34) P1 - Que ano que foi?
R1 - Foi em 2008, março de 2008. Aí ontem eu vi as placas da despedida mesmo, das gerências da Albras, a turma reunida. E aí eu vim definitivo para a Alunorte, sem mais operação compartilhada, nem nada.
(01:22:53) P1 - Mas aí você pediu demissão?
R1- Fui transferido, não. Só transferido. Foi por isso que eu vou fazer 41 anos de empresa. Minha data de admissão ainda é dezembro de 1984.
(01:23:06) P1 - Ou seja, a Alunorte está fazendo tinta anos e você tem 41 anos.
R1 - Eu tenho 41 anos de empresa. (risos) Isso mesmo. Porque eu não sei se... trinta anos de operação, mas de que foi fundada a empresa, a pessoa jurídica, já tem mais, bem mais tempo.
(01:23:29) P1 - Carlos, quando a Alunorte começou a crescer, começou a... não fechou, não deu errado, começou a dar certo, qual era a promessa para vocês, assim? O que você via de futuro?
R1 - Bom, quando partiu a linha 3, daí para frente a promessa era grande, de crescimento mesmo, porque a qualidade sempre foi muito boa, muito boa, então desejada pelos clientes da alumina. E o mercado mudou radicalmente. Então, ela expandiu numa rapidez e aí cria oportunidades para todo mundo, porque naturalmente a empresa cresce e a gente cresce, sempre cresce junto. Então, hoje é com satisfação que eu vejo muitos gerentes executivos, que a estrutura hoje está bem maior, mas gerentes executivos, gerentes sêniores, que eram trainees, estagiários, passaram comigo, vivemos juntos, então é muito... a satisfação é grande, que vê que a empresa deu oportunidade e as pessoas cresceram junto.
(01:24:42) P1 - Você cresceu aqui dentro?
R1 - Eu cresci e tive altos e baixos. Eu fui, vim como supervisor, saí de supervisor lá da mineração, aqui também como supervisor, depois assumi a gerência do almoxarifado, fui transferido para Belém, morei um tempo em Belém, assumi a gerência toda de suprimentos. E teve uma época, se não me engano, foi 1990. Com o desentendimento com o meu gerente, ele não me queria na gerência. E o gerente sênior da redução me queria: “Não, você não vai embora, não. Você vai... você quer tocar os projetos de investimento da redução?” E eu quis. “Não, eu quero”. O primeiro robô de automatização que teve no Pará também, foi lá na Albras, foi eu que implantei. O primeiro posto de autoatendimento foi eu que implantei também. Acho que no Pará não tinha de chegar e abastecer. Hoje tem que você abastece sozinho, pega bomba. Eu não lembro, mas eu implantei na Albras, mas depois teve problemas jurídicos, por causa de periculosidade, que as pessoas chegavam, encostavam o carro, passavam o cartão, pegavam a bomba, abasteciam... é igual tem afora aí, um monte de lugar, tem. Então, foi muito bacana, implantei bons projetos e aí esse gerente virou diretor na Albras e eu tinha muita experiência já na área que eu estava e já tinha implantado a grande maioria dos projetos. Ele me fez (01:26:30): “Você vai voltar para assumir as gerências lá”. Eu falei: “Mas com o meu chefe não vai dar certo, ele já me tirou de lá, eu vou voltar para trabalhar lá” “Não, vai ter que, senão eu vou trocá-lo. Você vai virar e vai falar quais são as regras, como é você quer trabalhar”. E eu voltei pra lá, desse jeito, você acredita? Não tive mais problema nenhum. Até ser transferido, ele teve que concordar com as minhas regras. Nada de imposição, só de não ter... “Se você está me gerenciando, eu entendo que você tem que me dar as diretrizes e deixa eu agir, pra te dar o resultado. Se eu não estiver dando o resultado, você me orienta, treina, se eu continuar não dando o resultado, você me troca. Agora não vem falar como é eu tenho que tratar, fazer, cuidar das coisas, porque senão não dá certo, não vou estar sendo eu”. Mas foi bom. Então, assim, mesmo nos altos e baixos, muito feliz aqui também, eu saí de gerente sênior, nas mudanças, quando a Hydro assumiu teve uma reestruturação geral e voltei a ser gerente. Aí voltei para área de suprimentos, me convidaram para ir para suprimentos, aí eu virei empregado Paragominas, mas fisicamente eu fiquei na Alunorte. Tinha uma gerência que era empregados Paragominas e que cuidava, gerenciava, fazia a gestão dos almoxarifados, tanto de Paragominas, quanto aqui, de suprimentos e eu fui para essa gerência, virei empregado de Paragominas, só fui transferido, também.
(01:28:16) P1 – Continuou na Alunorte.
R1 - Empregado não, de Paragominas, virei funcionário de Paragominas, só não fui fisicamente.
(01:28:24) P1 - Mas os benefícios, o salário...
R1 - Tudo Paragominas. Eu virei empregado de Paragominas.
(01:28:30) P1 - Sem se desligar da Alunorte?
R1 - É, desliguei assim, transferido. Igual eu vim da Albras para cá, só fui transferido de uma empresa pra outra.
(01:28:40) P1 - E aí, depois?
R1 - Fui transferido para Paragominas e depois fui transferido de volta para a Alunorte. (risos)
(01:28:48) P1 – Então, aqui você teve uma escada, né? Você foi crescendo, a sua carreira? 41 anos?
R1 - Cresci. Hoje, se você pensar hierarquicamente, eu tô abaixo do que eu... que eu já fui ligado direto no diretor, né? Hoje não. Eu estaria um cargo abaixo. A Alunorte criou na estrutura, mais uma gerência. Então, eu, tem o gerente sênior, tem o gerente executivo e o diretor, né? Tem um cargo a mais.
(01:29:19) P1 - Você teve um crescimento na carreira que você esperava?
R1 - Sim, eu nunca quis... se você pensar... eu penso: “Você queria ser diretor, presidente?” Eu nunca tive sonho assim, não. Eu não gosto muito de política. Eu acho que o cargo exige muito de você ter um perfil nesse sentido, entendeu? Então, acho que eu nunca tive... acho não, tenho certeza que eu nunca me planejei e falei assim: “Quero ser...”.
(01:30:01) P1 - Mas teve a construção da carreira.
R1 - É, construí minha carreira gerencial, né? Aí você aprende a parte técnica, que te ajuda muito, que te ajuda na comunicação, na orientação, mas você precisa ter a habilidade de lidar com pessoas, que é o mais fundamental, né? Porque as pessoas é que dão os resultados. Eu sempre tive muita facilidade de fazer amizade, me dar bem com as pessoas, então eu nunca tive muita dificuldade nisso e achei que eu deveria seguir a carreira de gestão, em vez da carreira técnica. E continuei o tempo todo, tirando esses dois anos que eu fiquei mexendo com projetos, mesmo assim, gerenciava equipes de serviço. Toda minha carreira, depois da primeira promoção lá, com seis meses, foi a nível gerencial.
(01:30:59) P1 - E a valorização? O senhor se sentiu como? Valorizado, reconhecido?
R1 - Sim. Senti, sim. Mesmo nos altos e baixos, não me abalou, não. Acho que é o destino, foi aprendizado, gerenciei, passei por muitas áreas. Eu cheguei, saiu o gerente de controladoria e eu assumi a controladoria (01:31:29). Gerência da patrimonial eu também assumi, então eu peguei muita experiência, em diversas áreas, diversos perfis, diversas culturas, de gestão, passei por todas elas, passei por todos os diretores das duas empresas, tirando Paragominas, mas da Albras e da Alunorte eu vivi de perto tudo, todas as glórias e todas as dificuldades. A primeira greve... passar... teve momentos que foram complicados, de ver pessoas que você conhecia, mas passar no corredor, que eles chamavam Corredor da Morte, o ônibus parava, na primeira greve, a gente descia do ônibus, passava a pé e as pessoas xingando, que a gente deveria aderir. Cheguei a dormir uma semana dentro da Albras, problema. Quando a Albras teve o apagão de energia, foi um momento muito difícil, porque foi um momento que ela teve dificuldade financeira e eu tinha que negociar com os fornecedores, que eu precisava adiar os pagamentos. E tinha fornecedor que dependia exclusivamente da empresa. Então, foi um momento muito difícil de negociação, de aceitação.
(01:32:50) P1 - E daqui?
R1 - Daqui também vivi momentos, todos muito bacanas e de experiência, então, na Covid foi um momento delicado, da gente passar por ele. Aqui teve um apagão de internet, nós ficamos sem sistema. Eu achava que a minha gerência não funcionaria nunca sem sistema. Com quase 15 mil itens no estoque, eu tinha que administrar e não deixar faltar nada aqui e não tinha comunicação nenhuma, comprando tudo de fora, então foram momentos, assim, de superação, igual eu te falei: a fábrica aqui é 24 horas, não tem jeito, sete dias na semana, 365 dias no mês e não pode parar. É bacana que a turma se ajuda, na maioria das vezes. Atravessamos momentos difíceis, mas teve momentos que eu vivi profissionalmente que eram, assim, uma tranquilidade, porque todo mundo se ajudava. Todo mundo se ajudava. Não tinha uma pessoa pensando numa área, pensava no todo. Então, fica tudo mais fácil, quando a gente enxerga assim, não tem feudos. O problema é: “Preciso produzir alumínio com qualidade” e é todo mundo junto. Então, nós que estamos na gestão, conseguimos manter uma empresa num clima, numa organização desse nível, fica muito mais tranquilo. Não é fácil quando a gente está em crise. A planta da Alunorte é uma planta muito mais viva. Viva que eu falo é o seguinte: se eu paro uma bomba que alimenta uma linha e eu não tenho a reserva funcionando, eu paro a linha. Na Albras, por exemplo, não. Se eu parar, tem 860, 960 cubas. Não lembro de cabeça. (risos) Mas é em torno disso. Acho que 860. Se eu parar uma cuba, as outras 859 estão produzindo. Não é igual aqui, que é uma produção numa cadeia fechada que, se tiver um problema aqui, eu paro tudo. A fábrica de ânodo, se ela para eu tenho ânodo no estoque, dá tempo de recuperar, mas não para tudo de uma vez. Aqui, dependendo de onde para, para tudo de uma vez.
(01:35:21) P1 - Você sente uma diferença, assim? Parece que é tudo uma história só, porque de fato é uma continuação, né? Mas ser Alunorte e ser Albras são coisas diferentes?
R1 - Sabe que eu não sinto... não teve assim... porque desde o início foi o que eu falei: quando eu comecei a trabalhar, eu nunca fui demitido primeiro, né? Então, não sei o que é isso. Simplesmente num dia e falar: “Amanhã você já virou empregado da Alunorte”.
(01:35:51) P1 - Não mudou nada na sua vida?
R1- Não, muda assim... (risos). Não, até muda quando você fala assim: quando eu vim fisicamente pra cá, mudou. Nessa época eu fui morar em Belém e voltava de carro, a estrada era ruim, acordava cedo. Eu acho que consigo levar a vida numa paz tranquila. Eu procuro fazer o que eu tenho como opção ficar bom, entendeu? Então, isso acho que me ajuda muito. Então, a viagem é ruim, é cansativa? É, mas eu tenho que olhar o lado bom: eu vinha com um amigo, grande amigo, que perdi na pandemia, infelizmente, mas a gente vinha ‘curtindo’: “Vamos lembrar do Roberto Carlos”, aí vinha cantando, contando caso e aproveitava o momento para ‘curtir’ a amizade um do outro. Vinha passeando.
(01:36:52) P1 - É um jeito de encarar a vida, né?
R1 - É um jeito de encarar a vida de maneira mais fácil, igual eu te falei, eu não saí pensando, não posso morar aqui pensando: “Bom é Belo Horizonte, o bom é...”. Aqui é o melhor lugar do mundo e passa a ser. Nunca tive vontade de morar no exterior, adoro o Brasil. Não tenho ainda. Não falo que não vou nunca, igual eu te falei: se eu tiver que ir, eu vou e lá vai ser, (risos) vai ter que ser bom.
(01:37:21) P1 - E o que você viu de muita diferença do antes e depois, quando era Vale e passou para ser Hydro? Teve uma marcação aí, né?
R1 - Teve. Teve bastante mudança. Mudou muito o meu ritmo também, né? Eu fale: eu estava numa gerência que estava ligada direta à manutenção e operação e está num ritmo muito mais batido e voltei para a área de suplementos. Teve uma mudança grande também na gestão, a Hydro implantou uma cultura nova. Eu acho que os valores, a Vale também tinha valores que eu acredito. Se eu não acreditasse nos valores das empresas, com certeza - e não fossem coerentes com o meu - eu não estaria aqui, pode ter certeza disso. Eu vivi áreas críticas, entendeu? Mas, graças a Deus, as pessoas acho que perceberam o meu caráter. Uma vez, porque eu cheguei a comprar para as duas empresas, igual eu te falei, tudo que se comprava para as duas empresas funcionarem, eu era o gerente e respondia só para o diretor. Então, tinha um poder grande de negociação. E é uma área delicada, que as pessoas... mas eu, graças a Deus, uma vez uma pessoa tentou conversar e querer levar vantagem. Foi essa vez e não teve mais nada e saiu do cadastro. Mas eu não tive, graças a Deus, que viver nenhuma desse tipo de oportunidade. Acho que as pessoas perceberam que não teriam essa... não era o caminho. Então, eu acredito muito nesses valores, que são hoje da Hydro: coragem, cooperação, igual eu te falei, enxergo que a empresa tem que trabalhar, é a única maneira de sobreviver, a gente achar que a gente não é um, a gente é um todo. Todo mundo precisa de todo mundo, o tempo inteiro. Todo mundo é importante igual todo mundo, na cadeia. Então, isso me ajudou muito, me facilitou muito na vida e eu tive diversos gestores, com perfis – diretores - totalmente diferentes, mas eu acho que os valores, pelo menos até chegar em mim, sempre foram mantidos, tanto numa empresa, quanto na outra.
(01:39:58) P1 – E o senhor vê qual legado que essa empresa deixa pra essa cidade, nesses trinta anos? O que ela construiu aqui?
R1 – Construiu acho que tudo. Quando eu cheguei aqui, igual eu te falei, só tinha as casas, os moradores... ela construiu essa vila. Tinha os moradores de Barcarena. Depois tinha os moradores de Abaetetuba e poucas pessoas ao redor da Vila, porque ela pegou uma área e construiu as casas, tudo. Então, não tinha nada. Hoje eu olho e até assusto. E as empresas, a Hydro, investe muito forte na comunidade, diversos programas, né? Olha, o tanto que desenvolveu, igual eu te falei: se eu tivesse o espírito empreendedor, eu poderia ser um grande empresário, porque teve a oportunidade para todo mundo. Hoje tem várias empresas instaladas, hotéis, muito grande. Desenvolveu muito, muito, muito. Investiu muito na educação, em cursos. Eu acho que deve muito, acho foi fundamental para o desenvolvimento da região. Muito. Eu acho que as empresas todas, porque eu vejo um crescimento em Belém, assim, que me chamou muita atenção na gestão do Almir Gabriel, em termos de crescimento e tecnologia. Quando minha irmã chegou a morar em São Luís e eu via São Luís, por um período, muito mais desenvolvido do que Belém. Depois do Almir eu vi uma mudança radical. Ele criou várias coisas, começou a desenvolver, criar a alça para ligar o Pará ao sul do Pará, a estação das docas, duplicou a saída de Belém, que era tudo muito complicado, eu vi uma mudança grande. E Belém também, quando eu cheguei em Belém para a saída da estrada, não tinha nada, a BR, ali, era tudo mato. Eu voava, igual te falei, voando de teco-teco, pra chegar em Belém tinha muito pouco. Cresceu muito a região toda. Eu sou mais paraense do que mineiro, né? Porque eu tô (risos) com 67. Tô há 43 anos aqui. As filhas e a esposa são paraenses. Então, acho que as empresas têm que ser um crescimento com responsabilidade, porque se acaba tirando uma parte da área verde, mas se você conduzir com respeito, com tecnologia, você consegue produzir e crescer junto. Eu acho muito importante elas foram e continuem sendo.
(01:43:12) P1 – O senhor falou bastante dos seus valores, que tem que ser respeitados, para o senhor estar trabalhando. Qual é o valor que o senhor vê que o senhor tem, a empresa tem, que concordam muito, que é muito importante?
R1 - Ética, muito importante. Cooperação, igual eu te falei, também, honestidade, caráter. Então, essas coisas, para mim, é o meu norte. Passo isso para minha família também. Isso ajuda muito. Dificuldade, problema, todo mundo vai ter. Agora, se você tem quem te apoia, colabora, ajuda muito. E coragem, eu acho que é bacana. É uma coisa que a gente tem que estar desafiando, apesar de eu ter arriscado pouco, igual eu te falei. Hoje, às vezes conversando, falo assim: “Se eu pudesse voltar atrás, eu teria mudado?” Não sei se teria mudado, acho que não, porque... eu penso que valeria a pena eu ter arriscado alguma coisa. Valeria como experiência de vida. Não ser tão acomodado, talvez não seja muito bom. Para mim foi. Eu não arrependo de nada. E não tem jeito, eu falo muito pros meus filhos: “Não fica sofrendo por decisão passada, não. A única coisa que você não vai ter é a certeza se era melhor ou pior, porque você não viveu a outra vida, você não sabe se você vai estar muito pior ou poderia estar muito melhor. Então, aprenda, se não está bom agora, com o que você não teve sucesso, pra estar na situação e procura corrigir. Mas da decisão nunca eu me arrependi, não.
(01:45:06) P1 - Valeu a pena?
R1 - Valeu a pena. Me sinto realizado, sou muito feliz. Acho que a base da vida eu aprendi, primeiro é equilíbrio. Você precisa ter equilíbrio. Nada na vida, pra mim, em exagero, é bom, nem amar. Você não pode amar em exagero, porque você vai acabar fazendo coisa errada. Então, eu penso, sempre...
(01:45:32) P1 – Bateram até palmas pro senhor!
R1 – (risos) ... pautei minha vida em ter equilíbrio. Não fazer nada além do limite. Então, isso eu acho que foi um bom rumo. E eu passo para os meus filhos.
(01:45:49) P1 – E conseguiu.
R1 - Consegui. Então, eu sinto essa tranquilidade, essa paz e o importante eu acho que é ser feliz, buscar a felicidade. Minha filha, quando quis largar o Direito, ela me puxou para conversar, achando que estava me decepcionando. E eu falei assim: “Eu acho que eu errei num ponto, de achar que a sua felicidade está em eu desejar. A única coisa que eu quero é que você seja feliz, porque você, mantendo os nossos valores, pode fazer o que você quiser”. Acho que pautei minha vida muito nesses princípios e não arrependo, não. Sou muito feliz. Deus foi muito bom. Agradeço todo dia que eu levanto, que eu saio e que eu entro em casa, eu agradeço. É só gratidão.
(01:46:48) P1 – O senhor, hoje, agradece pelo quê?
R1 - Por tudo que eu tenho. Eu acho que eu sou privilegiado. Por exemplo: só de ter uma família saudável, quer mais riqueza do que essa? Acho que não tem.
(01:47:05) P1 - E de fazer parte dessa história?
R1 - Ah, muito feliz, porque é bom, igual que eu falei: é uma alegria ver os meninos hoje coordenando, gerenciando, fazendo uma gestão. Pessoas que eu vi com dificuldade, aprendendo tudo e hoje superaram, atingiram seus objetivos. Então, é muito bacana ver a empresa, o sucesso que é, ver o desenvolvimento local, tanto de empresa, tanto de gente nova trabalhando, eu fiquei... eu, depois que eu trouxe o papai para cá, nos últimos seis anos, mais um pouco, tenho muita dificuldade para andar e não tenho muita vontade, mais, de sair. Então, acabei saindo muito pouco. Então, quando às vezes eu saio agora, que eu vou passear, andar de carro na Vila, eu assusto. Olha, às vezes eu entro numa rua que não é nem asfaltada e a gente se perde. Andando e cheio de casa, não sei se foi invasão, mas olha, aumentou muito. Pra tudo quanto é lado. E é muito bacana, né? Porque é gente que está aí desenvolvendo, trabalhando, fazendo. Adoro ir na feirinha. Eu vou todo sábado. Aí conheço todo mundo, brinco com todo mundo.
(01:48:32) P1 - Feirinha de quê?
R1 - A feirinha que vende hortigranjeiro, vende as coisas que tem. Hoje tem mais de uma. Mas eu vou sempre na mesma, que é a mais próxima ali, de casa, na Vila. Mas é muito bacana. Faz amizade com a turma, né? A gente pega um carinho, amizade. Todo sábado eu vou lá, comprar as bananinhas. A Dona Quitanda guarda as bananinhas pra mim. Vou pegar água de coco, que eu encho uma jarra com água de coco, pra ir tomando na semana. Ele guarda os meus cocos, as pessoas passam e querem comprar: “Não, não, já está vendido”. Aí a hora que eu chego está lá. Eu assumi o compromisso também: se eu, por acaso, não vou, eu ligo pra ele: “Vende os cocos aí, porque eu não vou hoje não, eu vim pra Belém”. (risos) Então, é vidinha simples e eu gosto muito de simplicidade, muito gostoso, era muito feliz quando papai conseguia ir comigo também. Hoje todos... eu passo e perguntam por ele: “E papai, está bem? Manda um abraço para ele”. Aí é gratificante, esse carinho.
(01:49:49) P1 - Como é que foi trazer o seu papai para cá?
R1 - Para mim foi muito bom. Na época minha irmã morava em Omã. O marido estava trabalhando lá pelos lados dos Emirados, meus dois irmãos em Recife. O mais velho casou, mas estava morando sozinho, separou, divorciou e estava morando sozinho, em Recife. E o segundo acima de mim, era o dono da distribuidora, não tem filhos, só ele e a mulher, que também é empresária. E eu não, já tinha as meninas, né? E falamos assim: “Acho que melhor lugar pro papai é vir comigo, porque lá pelo menos vai ter os netos, vão estar em casa o dia inteiro, distraindo, brincando. E ele veio. E foi muito gratificante, pude ‘curtir’, porque eu saí de casa também cedo, né? Que eu falei: acabei de formar com 24 anos e vim embora. Então, foi uma oportunidade de aproximar papai e eu acho que eu tento fazer isso também com meus filhos. Eu falo assim: “Eu quero ser muito mais amigo deles do que pai, propriamente. Pai eu vou ser de qualquer jeito. Agora, amizade a gente pode perder, se não respeitar o outro no convívio. Então, prezo muito isso. Então, eu pude ‘curtir’ muito. Papai é uma pessoa muito tranquila, não me dá trabalho nenhum. E a família da minha esposa também, pessoas maravilhosas, adoro estar junto deles. Perdi meu sogro também muito cedo. Teve um infarto, passeando de... atravessando de barco, porque eles estavam morando em Oriximiná, mas tem a Ilha do Sapucuá, que chama, ô lugar lindo. Eu vou lá passear, minha sogra adora. Então, é muito bacana sempre que tenho essa oportunidade. Tem um evento que eu não te contei: eu já afundei no Amazonas, no barco Oriente, na época de 1990. Quer dizer, o barco não chegou a ficar no fundo, não, que ficou pendurado, só com a boquinha pra fora, assim, que bateu num tronco. O barco Oriente. Agora, a última vez que eu estive em Santarém, em Oriximiná, eu vi que ele ainda está encostado lá.
(01:52:20) P1 - Você pulou do barco?
R1 - Graças a Deus, ele ficou preso no tronco, porque senão eu tinha morrido. Eu estava indo pescar. Minha sogra adora pescar, meu pai, adoro também. Mas dessa vez estava indo a Bruninha, estava pequenininha, fui eu e minha esposa. Aí meu sogro tem a casa em Santarém e tinha a casa em Oriximiná. Então, a gente foi para Santarém, foi eu, meu sogro e minha sogra. Minha esposa ficou com a Bruna, que era muito pequenininha. Aí nós fomos no barco, entramos no barco para ir de Santarém até Oriximiná, depois a gente ia pegar outro barquinho. Hoje a gente faz essa viagem, quando eu vou para Santarém, aí pega o barcão, lancha, para Oriximiná e minha sogra pega a voadeira dele e a gente vai para Sapucuá, que é um lugar maravilhoso, vou achar umas fotos, vou te mandar, quando (01:53:18). E aí, você acredita que nesse dia eu estava muito ruim de gripe, eu falei assim: “Eu não vou...”, a turma foi pra lá, para proa do barco lá, tinha o bar lá, foi lá tomar cerveja. Eu fiquei na rede, porque os barcos armam só rede. E já era de noite, quando foi dando perto de meia-noite e eu não sou muito bom de dormir em rede, não aprendi, (risos) eu falei: “Quer saber, eu vou lá tomar uma cerveja, essa gripe vai curar de qualquer jeito, a garganta”. Só que a hora que eu cheguei lá, o bar estava fechando. Tinha acabado a cerveja, já estava na hora, estava fazendo barulho demais para quem estava dormindo, eu sei que quando a gente estava voltando, já era meia-noite e meia, perto de uma hora, deu um barulhão, a luz acendeu e apagou e eu me lembro do meu sogro falando: “Calma, é banco de areia, calma”. E eu não vi ninguém calmo. Eu sentado lá na rede, a turma tirando a roupa, saindo da rede, pulando tudo dentro da água. Aí eu olhava pro lado assim, não enxergava nada de noite, da margem. Falei: “Ué”. Aí daqui a pouco meu sogro: “Não, está indo pro fundo”. A água já estava chegando no segundo andar do barco. Já não tinha quase ninguém. Aí eu lembro que ele... eu olhei pra minha sogra, ela estava com o colete, sentada no parapeito, no segundo andar e o meu sogro e um colete, só tinha um colete em cima da minha cabeça. Aí eu o peguei, falei: “Você agarra numa ponta, eu na outra”. Fomos correndo pro lado da minha sogra, pra pular, só que não tinha jeito de pular. Estava cheio de gente embaixo, gente desesperada, querendo o filho. Nossa, que sufoco! Mas o barco foi, foi e parou, só com a pontinha. E aí, de um lado estava longe, que eu não enxergava a outra margem do Amazonas, mas do outro estava uns sessenta, cinquenta metros de distância da margem. Já estava cheio de gente lá. E sobrou eu, meu sogro e minha sogra, mais uns três ‘gatos pingados’, mais o comandante, na pontinha do barco. E eles falaram que foi a salvação porque, se o barco vai pro fundo, eu não ia conseguir sair, porque ele rola e você não sai de dentro dele. Mas ‘marinheiro de primeira viagem’, não sabia nada disso. A turma da região... olha... mulheres descalças, de calcinha sutiã, sem roupa. Eles nem olham pra onde está, pulam dentro da água. E eu acho que é o correto, né, que eles falaram: “Você pula dentro da água, deixa o rio te levar. Uma hora o rio vai fazer uma curva e vai estar perto de uma beirada. Você nada e sai”.
(01:56:12) P1 - Faz tempo isso?
R1 - Foi na década de noventa. Aí passou uma balsa da Petrobras, nós subimos na balsa e voltamos para Santarém.
(01:56:23) P1 - Meu Deus!
R1 - Aí chegou em Santarém, estava lá a cidade toda esperando a gente. Acho que morreram algumas pessoas, que ficaram presas com a bagagem, que corriam no fundo, poucas foram. E aí, falei: “Pronto. Agora, o que nós vamos fazer?” Minha sogra pegou: “Nós vamos pescar”. (risos) Falei: “Então, vamos nessa. Vamos, (01:56:49)?” Ele falou: “Vamos embora”. Saímos pros mercados, comprar tudo de novo. De noite nós pegamos outro barco e fomos embora. (risos)
(01:56:57) P1 - Que história! Muita coisa nessa história.
R1 – Que história! Muita coisa. Muito bacana. Assim, de ruim é que faleceu gente, mas eu falo de... não, pelo menos me... é uma experiência apavorante. Tem horas que você quer pular no pulo, você acha que vai morrer, mas é experiência. Eu acho que a vida é feita assim, de vivência, de experiência, de altos e baixos.
(01:57:27) P1 - O que é a história da sua vida há 68 anos...
R1 – Sessenta e sete.
(01:57:31) P1 - ... te ensinou? O que você leva de aprendizado, nesses 67 anos?
R1 - Eu acho que eu já te falei um pouco disso, né? Eu acho que a vida é muito fácil de se levar. A gente precisa aprender só a viver, ser leve, ter equilíbrio, princípios e valores que sejam fortes e que você acredite e buscar ser feliz com o que você tem. Não adianta ficar sendo feliz com o sonho dos outros. Não falo que não deva sonhar e buscar meu sonho, mas tenho que aprender a saber que toda a trajetória tem altos e baixos. Então, pense que você tem que ser feliz com elas todas. Igual eu estou falando: vivi uma situação que eu enxergo como felicidade. Fez parte da minha vida. Fez parte do que eu sou. De tudo eu tirei uma lição. Foi um momento ruim? Foi, mas não lembro... lembro da mamãe só dos momentos bons, entendeu? Perdi, fui um baque, mas não fico chorando pela perda. Choro de lembrar tantos momentos bons, de felicidade. Acho que a gente precisa chorar mais de felicidade do que de tristeza, entendeu?
(01:58:54) P1 - Ela se despediu em 2013?
R1 - 2013.
(01:58:58) P1 - O que ela teve?
R1 - Você acredita que ela agachou, para pegar o netinho e desequilibrou e caiu para trás. Aí fraturou a bacia. Foi para o hospital, para fazer a cirurgia. De lá pegou uma infecção hospitalar e daí só complicou, só complicou e não saiu mais. Pessoa maravilhosa.
(01:59:28) P1 - E aí ficam as boas memórias, né?
R1 – Ficam as boas memórias, igual eu te falei, eu lembro de, às vezes, chegar e deitar no colo, na cama, deitar entre eles, dos puxões de orelha, de vê-la chegar de madrugada e ver que ela vai na beirada da cama e te faz um carinho. Então, muita coisa gostosa, que é só coisa boa, né? E a única coisa certa que a gente tem na vida é que a gente vai morrer, o resto a gente não tem certeza nenhuma.
(02:00:00) P1 - Você tem medo?
R1 – Nenhum. Nenhum, nenhum, nenhum. E nem preocupo com isso, nem penso hora nenhuma nisso. Acho que a hora que for minha hora eu vou e vou feliz. De coração, (risos) eu vou feliz.
(02:00:19) P1 - E teu pai, está como?
R1 - Está bem. Ele está meio... impressionante que ele fica preocupado em me incomodar. Ele está querendo ir agora, ele fala que ficar velho cansa, que a vida cansa, que ele tem vontade de fazer as coisas, ele está muito lúcido e não consegue. Anda de andador, mas curtas distâncias, mas hoje ele ainda entra... ele tem uma rotina fixa dele lá. Ele senta na varanda e olha os passarinhos, põe as bananinhas para os passarinhos, alpiste, todo dia, fica tudo solto, não nenhum preso. Aí ele lê uns livrinhos de faroeste, não sei se você deve ter conhecido, de antes. Um livrinho antigo, meu irmão compra no sebo, em Belo Horizonte e manda pra ele. Ele senta, lê, lê a Bíblia, aí fica na varanda, dá umas cochiladas, mas tem relógio pra casa inteira. Toda hora olha pro relógio. Ele olha e aí, dez horas, ele vai pra piscina. Aí, vai, quando a dor entra e fica ali, uma hora, andando dentro da piscina, conversando com as florzinhas. Aí sai da piscina, toma um banho na beirada e vai lá pra favela, que eu te falei. Aí lá ele senta, liga os... ele é o DJ da casa, aquele que pega os CDs e fica trocando, tem uma ordem, cheia de critério, de disciplina lá. Fica bravo se a gente mexe no CD e troca as horas. (risos) Aí fica escutando, todo tipo de música, bem... as meninas até acham engraçado dele ouvir o Tchan, né? Mas ele tem coleção do Orlando Silva, Altemar Dutra, escuta os boleros, escuto os tangos. Toma a cervejinha dele, adora o rum Bacardi e aí toma o rum, vai dar a hora do almoço, ele come a comidinha dele, depois deita ali na sala, vê uma televisão, dá uma cochilada. De noite eu chego e ele está ali, conversando, uma vidinha bem tranquila. Antes ele saía, ele está me prometendo que vai na feirinha rever os amigos, falei: “Eu te levo na cadeira de rodas, rapaz, deixa de ‘onda’”. Um dia eu consegui levá-lo também num barzinho, pra ele sair e tomar uma cerveja, ele sempre gostou, mas ele anda bem preguiçoso. E eu falei, ele fica muito preocupado em me incomodar, porque eu não saio, aí ele está falando que quer ir embora, que ele está cansado. E agora, em setembro, quando eu descer de férias, ele vai junto. O Natal eu vou passar com a família da minha esposa, nós vamos lá para Santarém, Oriximiná, nós vamos passar lá, junto. E para ele essa viagem, se for para Oriximiná, é muito difícil, porque vai de avião para Santarém, aí depois tem que pegar barco, na cadeira de roda e desce em Oriximiná, o portozinho não é muito confortável pra cadeira. Então, tudo é muito problemático pra ele: “Não, você passa o Natal lá e ano que vem a gente resolve”. A conversa dele. (risos)
(02:03:30) P1 - Ele está com quantos anos?
R - Nove e meia. Adora pescar, meu irmão acima de mim também adora, o levava todo ano, mas agora ele não está querendo ir. Sempre fizeram algumas... eu participei de algumas, é uma farra. Nossa, é caro, mas é uma mordomia boa. (risos)
(02:03:46) P1 - Hoje, para você, o que é importante, Carlão?
R1 - Manter minha família, meus amigos, meus empregos aqui, é ver meus filhos se realizando, sendo felizes, entendeu? Pra mim, importante é estar convivendo bem, estar fazendo o bem. Isso, pra mim, é importante. Eu sou muito simples, mesmo, muito.
(02:04:18) P1 - Tem algum momento do dia que é o mais gostoso, assim?
R1 – Eu, pra te falar, ‘curto’ todos, de coração. Quando levanta eu sou... eu, às vezes, me atrapalho, se eu sair da rotina, acabo fazendo as coisas com muita disciplina. Mamãe me ensinou um pouco disso. Eu tiro as coisas e ponho sempre no mesmo lugar, porque a hora que eu preciso eu sempre acho. Então, mamãe pegava as coisas lá em casa de olho fechado: “Onde está isso, mãe?” “Está na gaveta tal, do lado direito, no canto”. Você ia lá e estava lá, estava tudo certinho. Então, eu acabo fazendo isso, mas igual eu te falei: nada na vida em exagero é bom e essa disciplina muito rígida também é ruim. Mas eu procuro me divertir com ela. Eu levanto, faço café, papai acorda, brinco com ele. Quando eu posso tomar café com ele, às vezes não dá tempo. Aí venho, trabalho, levo numa boa, aqui, no meio dos amigos, conhecidos. Vivo momentos. Hoje, igual eu te falei, quatro e pouco estavam me ligando, com problema de (risos) abastecimento. Faz parte da vida, tem que levar isso da melhor maneira possível, eu acho que tem que ser feliz, eu tenho que ser feliz com o que eu tenho e com que eu vou procurar buscar.
(02:05:46) P1 - Você já se aposentou?
R1 - Eu me aposentei.
(02:05:49) P1 - Mas continua na ativa e assim quer ficar?
R1 – Mas continuo na ativa. Eu quero ficar mais um pouco. O meu menino está formando agora. Quero vê-lo se encaminhar, começar a trabalhar. Mas vai ter uma hora que vou ter que parar, vou ter que ir pra aula de violão, de cavaco e aprender a dançar. (risos). Então, acho que tudo tem seu tempo, mas eu acho que eu ainda tô com saúde, tô bem, tô bem lúcido, acho que eu sou útil pra empresa ainda, entendeu? Se a empresa continuar enxergando que eu também sou útil pra ela, que eu posso contribuir com alguma coisa, eu pretendo ficar pelo menos nesse ano e o ano que vem. Não fiz planos para mais. Nós conversamos, eu e minha esposa, falamos assim: “Para a gente ficar sem trabalhar, à toa, eu acho que a beira da praia era um bom lugar, porque você vai ter mais opções para fazer alguma coisa durante o dia. Você passear, fazer uma caminhada na beira da praia ou caminhar aqui na rua, para mim tem uma diferença grande. Então, eu gosto, sempre gostei de esporte, não sei se eu vou dar conta, mas posso tentar voltar a velejar, frescobol é mais fácil. Eu operei da coluna há uns 12, 13 anos e me limitou um pouco. Eu não sinto nada mais, graças a Deus, consigo... estava fazendo pilates, parei com a pandemia e depois por falta de vergonha na cara, não vou te esconder, (risos) mas eu sempre gostei muito de esporte, eu nunca gostei muito de fazer exercício. E aí, se eu puder e tiver condição, eu quero voltar a praticar esporte.
(02:07:43) P1 - Além dessas vontades de tocar violão, dançar, tem algum sonho para realizar?
R1 - Só de ver meus filhos bem encaminhados e felizes. Não tenho sonho nenhum, meu, pessoal, assim, não.
(02:08:00) P1 - Tem neto?
R1 - Ainda não. Mas também não fico sonhando o sonho dos outros. Igual eu te falei: quem tem que sonhar em ter neto são meus filhos, me dar neto são meus filhos. (risos) Se eu tiver, vou ficar muito feliz. Se eu não tiver, eu vou morrer feliz do mesmo jeito.
(02:08:21) P1 - Tem muito pela frente, ainda!
R1 - Tem muito. Sou igual o Zeca Pagodinho: “Deixa a vida me levar, vida leva eu”. Igual eu te falei, eu acho que a vida é bem leve, se a gente souber viver.
(02:08:337) P1 - Até passando pelos momentos difíceis, né?
R1 – Por todos os momentos difíceis, é muito fácil. É, é fácil porque, igual eu te falei, precisa ter - por isso que eu dou muito valor à família, à amizade - pessoas que te apoiem, porque a gente não está sozinho, sempre. Então, você precisa... tem três coisas que eu falo pro meu filho, que eu pautei na minha vida profissional. Três vetores. Eu preciso estar num lugar que eu me sinta bem, primeira coisa, eu passo no mínimo oito horas do meu dia nesse lugar. Então, tenho que estar rodeado de pessoas que têm a ver comigo, que eu me sinta bem, no local que eu me sinta bem. Preciso enxergar que, nesse lugar, eu tenho, eu sou útil. Eu faço parte dele, né? Eu contribuo de alguma forma, como ser humano, ou como profissional. E eu preciso enxergar se eu tenho oportunidades de ir atrás de sonhos, se eu tiver. Eu estou gostando daqui, eu tenho oportunidades, só depende de mim. Então, quando eu... minto, porque essa segunda é a mesma. E eu preciso ter, no terceiro lugar, que é o terceiro vetor, um emprego que me dê uma condição financeira de me satisfazer. É o terceiro vetor. Então, um lugar que eu me sinta bem, um lugar que eu me enxergue crescendo profissionalmente, sendo útil, acrescentando alguma coisa, como pessoa ou como profissional e ele me remunere, para me dar o básico que eu preciso, para ser feliz. Quando eu perdi um desses vetores, eu ainda suportei bem. Agora, eu acho que eu não resistiria se eu perdesse o segundo, com um só eu não ia ficar, tenho certeza disso. Graças a Deus, nunca perdi os dois, entendeu?
(02:11:07) P1 - Aqui você conseguiu, né?
R1 - Sempre consegui, no mínimo, manter dois. Já teve momentos, igual eu te falei, que eram momentos que faz parte, de crise, a relação às vezes não é muito boa com um, ou com outros gestores, mas os outros dois vetores você ainda enxergava no contexto geral, né? Porque às vezes o desentendimento pessoal é parte. Cada uma pessoa é de um jeito, você tem que aprender a respeitar e conviver dessa forma.
(02:11:39) P1 - Carlão, minha última pergunta, que eu podia ficar o dia inteiro te ouvindo, é bom demais: você, aquele menininho lá de BH, chegou aqui e é o que é hoje, construiu o que construiu hoje, viveu tudo isso. E aí?
R1 - Muito feliz. Espero continuar ainda vivendo e podendo ‘curtir’ a vida bela. Igual eu te falei, não me arrependo de nada, fui muito feliz na minha infância, fui muito feliz na minha adolescência. Às vezes lembro muito pouco, infelizmente, mas...
(02:12:17) P1 - Lembrou muito.
R1 - É. Assim, gostei muito, estudei muito, gostei do que eu estudei, além das duas faculdades, não ter concluído outra. Eu fiz duas especializações, fiz especialização em Gestão Empresarial, fiz especialização em Logística. A empresa me proporcionou especialização em Logística, eu fiz na USP, em São Paulo. Então, aprendi muito. A vida é igual te falei: Deus é muito bom comigo. Então, acho que tudo foi muito gratificante.
(02:12:55) P1 - E como é que você se sentiu contando a sua história, hoje?
R1 - Bem, foi muito gostoso o bate-papo. Eu até falo que eu tenho muita dificuldade, eu não gosto muito de falar em público, eu não gosto de falar de mim. Tem treinamento que pede, fala assim: “Agora fala três principais virtudes, seus três principais defeitos”. Eu não gosto muito de falar de mim, mas foi muito tranquilo. Obrigado, foi, assim, bem descontraído. Acho que eu falei muito.
(02:13:32) P1 – Tsc, tsc, tsc. E deu pra buscar as histórias.
R1 – É, busquei alguma coisa.
(02:13:35) P1 – Lembrou.
R1 – Você foi me estimulando, eu fui lembrando de coisas. Até que eu naufraguei no Oriente eu lembrei! (risos)
(02:13:44) P1 - Qual que é a música da sua vida?
R1 - Eu gosto. Tem uma coisa que eu falo pros meninos, que quando eu fizer setenta anos, cada um vai ter que tocar um instrumento diferente, pra tocar uma música pra mim, né? (risos) Aí eles falam que eu gosto, tem mais de uma música que eu gosto muito. Tem música que marca, igual essa, de mim chegando: “O moleque acabou de chegar, ê mãe”. Então, tem um hino que é da turma da faculdade e a gente o canta. E eu tenho uma música que é essa que eles vão cantar, que é: “When the night has come, and the moon is light”. E eles falaram que vão tocar essa pra mim.
(02:14:34) P1 - Você que escolheu?
R1 - Eu que escolhi. Eu acho que, da época de criança, a gente brincava, tocava muito. Sempre pegava as noitadas, eu estava tocando violão. Tem filho de amigo meu, que é músico hoje. Toca, toca muito bem. Então, era muito divertido, né? E a gente brincava e cantava as músicas. (risos) E essa música marcou. Eu gosto muito dela, aí eles lembram de mim. Os meninos falavam: “Ah, quando escuto essa música eu lembro de Tio Carlão”, porque todo mundo chamava todo mundo de tio. Os meninos, todo mundo: “Tio, tio”. Minhas meninas os chamam, os amigos, de tio. E essa música eles falaram que vão cantar pra mim.
(02:15:17) P1 – Então, vai ter festa nos setenta?
R1- Vai ter festa. Não sei se é festa grande, não, mas pelo menos pra eles tocarem essa música vai ter. (risos)
(02:15:26) P1 - Obrigada.
R1 - Eu que agradeço. Obrigado.
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