Projeto 30 anos Alunorte
Entrevista de Francisco Xavier
Entrevistado por Ligia Scalise
Barcarena, 11 de julho de 2025
Transcrito por Selma Paiva
(00:16) P1 – ‘Seu’ Xavier, eu vou pedir para o senhor começar falando seu nome completo, data de nascimento e o local onde o senhor nasceu.
R1 - Ok. Meu nome é Francisco Xavier Coelho Moura. Eu sou natural de uma pequena cidade do Maranhão chamada Cururupu, que fica no litoral maranhense. Eu nasci em 1967.
(00:39) P1 - Que dia?
R1 - Eu nasci no dia 4 de dezembro de 1967.
(00:43) P1 - Quando o senhor nasceu, o senhor sabe como foi seu parto?
R1 - Na minha época ainda era com parteira, então tinha uma parteira muito famosa na minha cidade, chamava Isabel Mineira. E todos os moradores daquela época a chamavam de mãe, Mamãe Isabel Mineira. Então, tanto é que no Dia das Crianças nós íamos para casa dela. Ela tinha uma casa, eu lembro muito bem, que era como se fosse um barco, né? E esse barco era um salão. E dentro desse salão ela recebia as crianças, que eram os filhos dela, né? Que ela era parteira de todo mundo, ela recebia a gente. Em vez de ir para casa da madrinha, ia para casa da Mamãe Isabel Mineira.
(01:23) P1 - Que legal! Ela tinha filhos?
R1 - Tinha filhos, tanto próprio, como adotivo.
(01:27) P1 – Ela ajudava no parto? Ela fazia o parto?
R1 - Ela fazia o parto, ela era uma parteira, mesmo. Naquela época não se tinha, principalmente nos interiores, médico pra sempre fazer parto, acompanhamento, como tem hoje. Então, a minha mãe, nós somos cinco irmãos, desses cinco irmãos somente um nasceu em São Luís, que é a capital do Maranhão.
(01:47) P1 - No hospital?
R1 - No hospital, que mamãe já teve problemas de parto, em função da idade dela também, mas o resto todo foi com a Mamãe Isabel Mineira, que era nossa parteira.
(01:57) P1 - Você lembra dela até hoje?
R1 – Eu lembro dela até hoje, que ela parecia uma bonequinha. Ela sentava, ficava assim e...
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Entrevista de Francisco Xavier
Entrevistado por Ligia Scalise
Barcarena, 11 de julho de 2025
Transcrito por Selma Paiva
(00:16) P1 – ‘Seu’ Xavier, eu vou pedir para o senhor começar falando seu nome completo, data de nascimento e o local onde o senhor nasceu.
R1 - Ok. Meu nome é Francisco Xavier Coelho Moura. Eu sou natural de uma pequena cidade do Maranhão chamada Cururupu, que fica no litoral maranhense. Eu nasci em 1967.
(00:39) P1 - Que dia?
R1 - Eu nasci no dia 4 de dezembro de 1967.
(00:43) P1 - Quando o senhor nasceu, o senhor sabe como foi seu parto?
R1 - Na minha época ainda era com parteira, então tinha uma parteira muito famosa na minha cidade, chamava Isabel Mineira. E todos os moradores daquela época a chamavam de mãe, Mamãe Isabel Mineira. Então, tanto é que no Dia das Crianças nós íamos para casa dela. Ela tinha uma casa, eu lembro muito bem, que era como se fosse um barco, né? E esse barco era um salão. E dentro desse salão ela recebia as crianças, que eram os filhos dela, né? Que ela era parteira de todo mundo, ela recebia a gente. Em vez de ir para casa da madrinha, ia para casa da Mamãe Isabel Mineira.
(01:23) P1 - Que legal! Ela tinha filhos?
R1 - Tinha filhos, tanto próprio, como adotivo.
(01:27) P1 – Ela ajudava no parto? Ela fazia o parto?
R1 - Ela fazia o parto, ela era uma parteira, mesmo. Naquela época não se tinha, principalmente nos interiores, médico pra sempre fazer parto, acompanhamento, como tem hoje. Então, a minha mãe, nós somos cinco irmãos, desses cinco irmãos somente um nasceu em São Luís, que é a capital do Maranhão.
(01:47) P1 - No hospital?
R1 - No hospital, que mamãe já teve problemas de parto, em função da idade dela também, mas o resto todo foi com a Mamãe Isabel Mineira, que era nossa parteira.
(01:57) P1 - Você lembra dela até hoje?
R1 – Eu lembro dela até hoje, que ela parecia uma bonequinha. Ela sentava, ficava assim e nós todos do lado dela. Ia lá, tomava bênção e ia sentando no chão, mesmo. As crianças sentavam no chão.
(02:09) P1 – Como que ela era?
R1 – Deixa eu tentar lembrar, aqui, a fisionomia dela. Era branquinha, magrinha, usava umas saias bem compridas e a saia dela, naquela época, era rodada, tinha aquelas rendas, então era muito... a blusa dela ela usava também com aquelas mangazinhas folgadinhas, que ficavam assim, meio cheinhas, né? Então, eu tenho essa visão dela até hoje, da Mamãe Isabel Mineira, nesse formato.
(02:40) P1 - Que legal! E por que Francisco? Alguém falou explicação do nome?
R1 - A mamãe... eu sou de uma família católica, né? Minha avó trabalhava em casa de padre. Mamãe foi professora muitos anos em escola de padre, né? E a mamãe tinha muita devoção para os santos. Depois veio o Chico Xavier e ela também gostava do Chico Xavier. Eu sei que meu nome foi uma junção de santo com o Chico Xavier, que é um médium, que já não tem muita coisa a ver.
(03:12) P1 - E te chamavam de Chico?
R1 - Chico é o apelido. No Maranhão, eu sou conhecido como Chico, Francisquinho. Ou Chico ou Francisquinho. Carinhosamente, alguns parentes chamam Francisquinho. Aqui, quando eu vim para Belém, eu passei a ser chamado, já, de Francisco e em Barcarena, Xavier. Tanto é que hoje, se me chamar de Francisco, eu não sei quem é. (risos) Eu sou Xavier.
(03:39) P1 - Você é o primeiro filho, o último filho, qual que é a ordem?
R1 - Dos cinco eu sou o terceiro. Tem duas moças na minha frente, eu sou o terceiro.
(03:48) P1 - Quem são os seus pais?
R1 - Minha mãe é Neusa Coelho Moura e meu pai Mariano de Abreu Moura. Meu pai já é falecido. Infelizmente ele veio a óbito cedo, falta de cuidados médicos, ele teve apendicite e veio a óbito. Minha mãe hoje tem 81 anos, hoje ela já não é mais católica, ela é de outra religião, da Batista. Ela vai para a igreja com 81 anos e ela é uma das pessoas que lê a Bíblia lá, para todas as outras pessoas que estão na igreja. Lê, faz o louvor dela, é muito bonito. Eu fui, inclusive, no Dia das Mães, eu passei o Dia das Mães com ela e ela me levou para a igreja e lá ela fez o louvor. Achei muito bacana, lendo ainda com 81 anos.
(04:36) P1 - Ela ainda mora lá?
R1 - Mora lá, até hoje. Meus irmãos todos mudaram para o Rio de Janeiro, ficou só um que mora lá, com ela.
(04:42) P1 - E o que eles faziam, quando você nasceu? Como era a vida deles?
R1 - Meus pais? A minha mãe era professora, o pai do meu pai... são descendentes de cearenses. Então, a história que eu conheço é que tinha... teve uma seca muito grande no Ceará, lá nos anos quarenta, 45 para cinquenta, então eles migraram para o Maranhão e lá o meu bisavô comprou uma terra, uma fazenda, né? E meu pai, a família do meu pai continuou mantendo isso aí, até quando meu pai veio à óbito a gente abandonou essa questão de terra, fazenda. Mas meu pai gostava de gado, de plantações, ele vendia assim muito negócio de farinha, de milho, mas não em varejo, ele vendia em atacado, para ser revendido para empresa, para outros comércios.
(05:34) P1 – Então, ele era agricultor?
R1 - Era agricultor e pecuarista, ao mesmo tempo.
(05:39) P1 - E sua mãe sempre professora?
R1 - Minha mãe sempre professora. Minha mãe se aposentou trabalhando como professora. Aí ela fez concurso para prefeitura do Maranhão, passou, aí deixou de dar aula para a escola de padre, passou a dar aula para o município.
(05:54) P1 - Como é que eles se conheceram?
R1 - O meu pai, por ser, na época, um jovem, assim, um pouco influente numa cidade pequena e a minha mãe, por trabalhar, ter muito contato com o padre, nessa época o Brasil ainda tinha muito isso de militarismo, nós ainda estávamos na época do militarismo e a Igreja Católica era muito influente, então todos os jovens também iam para a igreja, tinha a catequese, as missas de domingo. Eu também ia, quando eu era jovem. Então, nessa época eles se conheceram, começaram a namorar e casaram e tiveram os filhos.
(06:34) P1 - E eles eram como, fisicamente?
R1 - O meu pai, eu sou a xerox do meu pai, né? Só que meu pai era bem alto. Pra você ter uma ideia, nome dele é Mariano, mas o chamavam de Antão. E eu não sabia o nome do meu pai até, eu acredito, com uns sete a oito anos, porque ele era conhecido como Antão.
(06:53) P1 - De grandão?
R1 - De grande. E por quê? Eles o assemelhavam a anta, mas não em sentido que hoje as pessoas pejorativas dizem que anta é outra coisa, né? Mas era por tamanho, que ele era grandão. Antão. Na escola, a professora um dia perguntou o nome dos pais, falei o nome da minha mãe e perguntou do meu pai, eu falei Antão. “Não, não é esse o nome do seu pai. Você vai, é um dever de casa, perguntar o nome do seu pai, vai voltar com o nome”. Aí que eu fui saber que o nome do meu pai era Mariano. (risos)
(07:23) P1 – (risos) Deve ter sido engraçado.
R1 - É engraçado. Ele era muito conhecido na cidade, com esse nome. Todo mundo o conhecia, ele era muito bem-quisto também.
(07:30) P1 - E ele parecia mesma cor de pele e tudo, com o senhor?
R1 - Mesmo, igual, igual. Já minha mãe é pequenininha, magrinha. Meus irmãos todos puxaram pra minha mãe. Somente eu puxei pro meu pai, em termos de ser maior, um pouco mais avantajado. Porque a família do meu pai é uma família de gente mais... tem uma estatura maior e também são um pouco mais fortes, né? Digamos, não quero dizer gordo, né? (risos)
(07:54) P1 - E aí eles foram lá para o interior do Maranhão e se deram bem?
R1 - Se deram muito... não, eles se conheceram já no Maranhão, porque com a seca meu avô... meu bisavô foi pro Maranhão, aí meu avô teve o filho, que um foi meu pai. A minha mãe nasceu em Fortaleza, né? O pai da minha mãe era caminhoneiro. É uma outra história também, ele era caminhoneiro, então ele viajava muito, né? Fazia essas viagens Brasil afora. E a minha avó o acompanhava. E uma temporada ele ficou em Fortaleza e lá minha mãe nasceu. Tanto é que esse ano eu fui de férias lá para Fortaleza, a cidade da minha mãe, que ela nasceu e que ela não vai mais lá há muitos anos, nem conhece os parentes que tem lá. Então, depois ele foi para o Maranhão, a trabalho, levou a minha avó e lá resolveu ficar e lá minha família começou a ser montada, construída.
(08:54) P1 - E você falou que seu pai era influente, em que sentido, lá na cidade?
R1 - Como era uma cidade pequena, ela devia ter em torno de vinte a trinta mil habitantes e em território, assim, é muito... e, como ele trabalhava com vendas, atacado, atacadista, então se tornava muito conhecido. A gente não tinha comércio, mas ele tinha, eu lembro que no fundo da nossa casa tinha uma espécie de um depósito feito... na época, fazia de madeira, de pau a pique, né? E, para que a farinha não ficasse mofada, eles faziam tipo um girau, enchiam de farinha. Então, ele colocava ali mais de cem sacas de farinha, mais de duzentas sacas de milho, arroz ainda por pilar, né? E ali ele começava a vender. E ele também, esperto da época, o que ele fazia? Quando estava na entressafra, ele vendia, que ganhava um dinheirinho a mais.
(09:53) P1 - E era do consumo de vocês, também?
R1 - A gente consumia também, mas como era grande quantidade, mais ele vendia do que a gente consumia.
(10:02) P1 - E como que era essa vida de vocês, na infância? Tinha fartura de comida? Faltava alguma coisa? Era difícil? Era fácil?
R1 - Naquela época a comida era bem difícil. Por quê? Não tinha... por exemplo: a carne bovina eu lembro que era uma vez por semana que se comprava, que se matava o boi, até porque a população era pequena, não tinha dinheiro pra comprar. Meu pai era um dos que fornecia carne pra cidade, né? Então, ele não matava boi todo dia, porque não ia ter quem comprar aquela carne, porque as pessoas não tinham condições financeiras. Então, era dia de sábado ou domingo que se matava o boi e vendia para quem tinha condição de comprar, mas ele se alimentava muito de peixe, porque lá fica na beira do Oceano Atlântico. Então, é uma cidade que tem, inclusive, praias em torno dela. Tem uma praia famosa, não sei se vocês já ouviram falar, na Praia dos Lençóis, mas não é Barreirinha, porque tem duas praias de Lençóis: tem Lençóis Maranhenses, lá em Barreirinha, que ficou famosa, das dunas e tem a Praia dos Lençóis, que é dos albinos, que é uma praia, inclusive, que você não pode construir. As pessoas que moram lá recebem uma Bolsa do governo federal. Ela é muito bonita. E lá moram os albinos.
(11:21) P1 - É uma cidade de albinos?
R1 - É uma praia de albinos. Ela fica no Oceano Atlântico. Ela pertence a Cururupu, mas para você chegar nela, você passa de barco em torno de oito, nove horas de viagem.
(11:35) P1 – Então, vocês não iam para a praia? Não era perto?
R1 - Nessa praia, não. Nós íamos nas outras praias, mais próximas. Essa aí eu fui depois de adulto, na verdade eu fui lá devia ter uns 15 anos. E voltei depois.
(11:46) P1 - E quando senhor era pequeno, o que o senhor gostava de fazer?
R1 - Naquela época você não tinha tecnologia, que computador, pra chegar lá, eu vim conhecer aqui na Albras, né? Depois de um tempo, quando surgiu o computador, eu comecei a usar. Mas a gente brincava muito de bola, né? Correndo na rua, de Pira e Esconde. Aquele moleque que corria, se escondia, outro tinha que achar. Jogava algum joguinho de pião, que a gente chamava, que lá no nordeste, no Maranhão, especificamente, tem um coco que a gente chama de coco babaçu. Ele tem umas amendoazinhas dentro, ele é muito duro e você quebra aquele coco para extrair o óleo, ele é muito bom para fazer o óleo, tanto para consumo, como para usar em máquina. Eu lembro que, logo quando vim trabalhar na Albras, a Albras utilizava esse óleo, comprava esse óleo, para utilizar nos maquinários. Aí esse coco a gente fazia uma espécie de pião, que hoje o pião é feito de madeira e tal, era feito daquele coco e você ficava brincando com aquilo. Ou mesmo a peteca de grude, jogando aquela peteca. Ou bola, muita bola. O moleque vivia correndo, via solto, não tinha assim a questão de limitação de horário, até porque a gente não tinha, naquela época, assim, risco de ser atropelado, de roubo, isso aí nem existia. O máximo que poderia acontecer ali é você cair de um pé de fruta e machucar o braço, a perna. A gente saía, vinha da escola, aí tinha as regras: você ia para a escola de manhã cedo, quando você vinha da escola tinha que limpar quintal, tinha tarefa de homem e de mulher. Naquela época existia muito essa separação, que os nossos pais diziam assim: “Homem não lava louça, homem não varre casa. Mas o homem varre o quintal, homem tira o mato do quintal, o homem faz isso, a mulher faz isso aqui”. Então, a gente tinha as tarefas. Depois dessas tarefas, aí você estava liberado, para ir brincar. Só não podia chegar em casa à noite. Tinha que chegar ali até seis horas da tarde, você tinha que estar em casa.
(13:52) P1 - E os pais eram bravos?
R1 - A minha mãe sim, meu pai não. A minha mãe, até hoje, eu a respeito muito. Eu tenho 58 anos. Aí eu vou lá, para eu tomar uma cervejinha escondido dela.
(14:04) P1 - Não acredito.
R1 – É. E ela não fala, ela só fala assim: “Eu não te falei que você não pode beber, menino?” Já batendo, né? Então, ela... e todos os meus irmãos, meus filhos, filhos dos meus irmãos, apanharam dela. E hoje ela tem uma neta que tem, minha sobrinha, 13 anos. Essa é única que nunca apanhou dela. Que o pessoal diz: “Engraçado, a vovó batia em todo mundo” - minha sobrinha que fala – “e agora a Miriam não apanha”. Ela diz: “Não, é que a Miriam não faz nada”. Não, vive no celular. Mas é muito engraçado, ela gostava muito de bater. Qualquer coisinha ela já falava batendo.
(14:42) P1 - E era com a mão?
R1 - Com a mão, com chinela, com cipó, tem tamarindo, um tipo de... até no Chaves tem tamarindo, faz suco de tamarindo. É um tipo de... que você faz suco, né? E o galho dele é muito resistente, igual o da goiabeira. Ou é tamarindo ou goiabeira. Ela pegava aquilo e deixava lá. Ela dizia: “Ó, você está no meu caderno”. ‘Estar no meu caderno’ ela ia anotando quantas vezes você fez alguma coisa que não era pra ser feita, né? Aí, se fizesse assim, bem grave, ela pegava aquele cipó de tamarindo ou de goiabeira e: “Olha, moleque”, deixava a marca, né?
(15:18) P1 - Doía.
R1 - É. Sandália Havaianas era o de menos. (risos) Preferia apanhar de Havaianas do que do cipó de tamarindo. Ela dizia: “Cipó de tamarindo está ali”, ou da goiabeira. Aí o moleque já ficava com medo.
(15:31) P1 - E você aprontava muito?
R1 - Não, eu não aprontava muito. Eu era muito, assim, eu acho que era muito medroso, porque o meu irmão... eu tinha um irmão, o segundo, depois de mim tem outro, que é quase a mesma idade minha, a diferença é de um ano. Eu tenho 58, ele 57. Então, quando nós tínhamos ali em torno de 13, 14 anos, os filmes ainda eram daquele rebobinados em carretel. E a gente gostava muito de filmes de bang-bang, aqueles faroestes, né? Aí ele dizia: “’Mano’, ‘bora’ no cinema, que tem um filme legal, que está passando” “Não, rapaz, chegar a mamãe e vai bater” “Ela bate, mas nem vai doer. Amanhã já passou”. E aí ele ia pro cinema. Quando ele chegava a mamãe batia nele. Aí eu: “Está vendo, ‘mano’, tu foi” “O filme era bom pra caramba”. E até hoje ele assiste no YouTube aqueles filmes, eu chego lá, quando eu vou passar as férias, visitá-la, aí ele está lá assistindo esses filmes de bang-bang, no YouTube. Até a imagem é totalmente... porque naquela época não tinha tecnologia que nós temos hoje, né? Então, a imagem não era legal e ele assiste lá, até hoje. Gosta muito desse negócio de filme de bang-bang. É isso e futebol. Flamengo é o time dele.
(16:44) P1 - Você tinha time?
R1 - Eu tenho. Era uma briga que eu tinha com ele, porque ele era flamenguista e eu era vascaíno. Naquela época o Vasco era bom. Tinha o Roberto Dinamite, o Flamengo tinha o Zico. Então, a gente tinha uma briga danada quando ia ter jogo entre esses dois times. Em um desses jogos, o meu time ganhou do dele. O Vasco ganhou do Flamengo. A televisão era daquelas de tubo de imagem, da grandona e os jogos não passavam na televisão, assim. Na televisão passava jornal, novela. Dificilmente, só quando era um jogo muito importante. E nós estamos lá no radinho do papai, o rádio era do papai, daquele móvel de madeira, ainda meio arredondado. Lá o Vasco ganhou, ele deu um murro no rádio, desmontou o rádio do papai. Aí acabou o jogo e agora, como é que nós vamos recuperar esse rádio, para o papai não descobrir que nós quebramos? Na verdade, ele quebrou, mas um protegia o outro. Aí foi consertar o rádio, passar cola, depois passar um produtozinho ali, para papai não ver que quebrou o rádio. (risos)
(17:43) P1 - Deu certo?
R1 - Deu certo. O papai não descobriu. Porque era madeira, né? E você passa aquela cola branca, que é de papel, ela acaba resolvendo o problema.
(17:52) P1 - E ele era seu irmão mais próximo, que vocês brincavam?
R1 - Mais próximo, porque nós tínhamos praticamente a mesma idade, né? O outro já era o caçula, bem... até perdi esse meu irmão, esse ano, em abril, 19 de abril ele faleceu. Esse mais novo, né? Então, ele tinha, ele faleceu com 53 anos. Bem novo.
(18:13) P1 - Do quê?
R1 - Olha, essa é uma história bem... ele morava no Rio, com a família dele. Eu tenho duas irmãs que moram no Rio também, com a família delas. E ele foi pro Rio de Janeiro e estava 16 anos que ele não ia no Maranhão. E a minha irmã mais velha tinha... eu não sei se era 25 ou 35 anos que ela não ia também visitar mamãe. Mas a mamãe ia no Rio de Janeiro, eu levei mamãe no Rio Janeiro algumas vezes, mas eles não iam no Maranhão. Eu disse: “Mamãe vai fazer oitenta anos, eu quero que todos vocês vão visitar minha mãe, a gente vai fazer uma festa surpresa pra ela. Combinei com minha sobrinha, minha filha que mora... tenho uma filha que mora lá, que é funcionária pública, ela fez Fisioterapia e foi transferida pra lá. Aí ela organizou, junto com minha outra sobrinha, então está bom, a gente vai fazer essa festa. Aí eu disse: “Não se preocupe não, deixa, eu só quero que vocês compareçam no aniversário da mamãe”. E todos foram. E mamãe já crente, minhas duas irmãs que moram no Rio são crentes, só ele que não, gosta de beber bebida alcoólica. E a mamãe disse: “Olha, no meu aniversário ninguém vai beber aqui em casa, até porque no meu aniversário vai ser um louvor”. Eu queria fazer churrasco. Aí tinha arranjado um sítio lá, para fazer churrasco. Ia ser uma festa bem bacana, né? Ela: “Negativo, minha festa vai ser um louvor na minha casa”. E o meu irmão que mora lá tem uma espécie de sindicato, que ele é o presidente do sindicato e funciona lá do lado da minha casa. Sindicato da Agricultura Familiar, uma coisa pra atender agricultores. Ela disse: “Vai ser no sindicato” “Mas aqui não dá, mãe, é pequeno e tal”. Ela: “Fecha a rua”. Aí a minha sobrinha conhece lá o pessoal da prefeitura e foi lá, negociou com a prefeitura e fecharam realmente um quarteirão, literalmente, da rua. ‘Botaram’, a prefeitura mesmo foi lá, colocou os ofendículos lá, fechou e botou placa desviando etc. E nós fizemos esse aniversário dela, um festão pra ela, com louvor, muitos crentes, quem não era crente também, né? E aí, e agora, os colegas que querem tomar uma cerveja, como é que faz? Aí a casa da minha tia, que tem 94 anos, mas está inteirona também, porque no interior as pessoas vivem mais. Aí minha tia: “Não, vocês ‘botam’ no meu congelador, pode deixar aqui, depois que a Neusa acabar o aniversário, vocês pegam a bebida aqui”. E ele, como gostava de beber, passava o dia - ele já bebia muito - tomando Coca-Cola. Na verdade, dentro da Coca-Cola ele ‘botava’ vodca e a mamãe não sabia, ele ficou bebendo o dia todo, à noite. Terminou o aniversário dela, foi um negócio muito bacana, teve vários depoimentos deles que não iam lá e tal, mamãe ficou muito feliz, se emocionou, terminou o som, aí ele voltou para o Rio de Janeiro. Normal. Isso foi em abril, o aniversário da mamãe foi em agosto. Quando foi em setembro, ele sentiu uma dor. Aí foi para hospital, chegou lá e descobriram que ele estava com câncer no estômago. E aí ele fez a cirurgia, (choro) não resistiu e eu viajei para o Maranhão, festa do Lira, que lá no norte, estava... (21:45) tinha me convidado para ajudar na organização, porque eu sou da segurança, eu tive que ir embora lá para o Maranhão, para ficar com a minha mãe. Aí queriam levar o corpo para o Maranhão, aí eu não concordei, porque a família dele é de lá. Filho, esposa, né? Minha mãe superou bem, graças a Deus. Hoje ela está... eu, sempre que tenho uma folga, vou lá visitar. Tudo bem.
(22:10) P1 - Quando ele descobriu, então, já foi tudo muito rápido, né?
R1 - Muito rápido. Ele foi bem assistido. Ele foi para um hospital bom, Incor, onde fez a cirurgia. Tudo bem. O médico disse que estava muito avançado, mas conseguiu eliminar todo, só que um mês depois ele começou a sentir dor e levaram pro hospital de novo e ficou acho que ainda dez dias no hospital e já saiu de lá o corpo. Muito triste.
(22:40) P1 – Pô, Xavier, sinto muito. Mas vamos voltar para as memórias ainda da infância, que são boas. (risos)
R1 - Vamos lá, para as coisas boas.
(22:50) P1 - Ô homem! Então, tinha um irmão mais...
R1 - É, que era mais junto de mim, em função da idade, que a gente tinha quase a mesma idade.
(23:00) P1 - Vocês estudavam na escola com sua mãe, era professora de vocês?
R1 - Não. A gente estudava em uma outra escola. Eu estudava em uma escola e ele estudava em outra, questão de vaga. Então, sempre estava...
(23:12) P1 - Quando vocês começaram a trabalhar, ajudava o pai?
R1 - Então, eu sempre fui assim, meio... eu gostava de ganhar dinheiro. Mas é porque eu queria ser independente, então eu achava que eu não me contentava com pouca coisa. Ah e tem uma coisa engraçada, essa questão de trabalhar para ajudar os pais. Menor Aprendiz, hoje é Jovem Aprendiz, mas na minha época tinha Menor Aprendiz. Era normal toda criança fazer algum tipo de atividade que os pais mandavam. Ou ele ia fazer datilografia, que não tinha computador, era datilografia, ou ele ia trabalhar como ajudante de marceneiro, de carpinteiro, de pedreiro, enfim, qualquer coisa ele ia fazer, porque a mãe achava que ele tinha que aprender uma profissão. Essa era a ideologia dos pais, né? E um ‘cara’ foi lá em casa fazer um serviço, um pedreiro, e a mamãe disse: “Tu não quer ensinar meu filho?” Que era eu, né? Eu devia ter lá, eu acho que uns 13, 14, 15 anos, mais ou menos. Não, não tinha nem 15, não. Uns 13, 14 anos. Aí ele: “Ensino, Neusa”. Aí mandou eu ir trabalhar com ele. E toda vez que ele ia, eu ia com ele. Eu acho que eu fui uma semana só, né? Que tinha que jogar, passar um negócio na parede, pra alisar a parede e eu digo: “Isso não dá certo pra mim, não”.
(24:27) P1 - Não?
R1 - Eu só comigo, né? Mas eu não podia falar pra mamãe, né? Porque você sabe que a criação daquela época não é como hoje. E como é que eu faço? Eu tinha que ir, porque a mamãe tinha que saber que eu saí pra trabalhar, né? E, indo pra lá, tinha uma oficina, um ‘cara’ que tinha uma oficina de marcenaria. Então, lá eles faziam móveis, construíam casa também, parte de telhado de casa, portas, essas coisas todas. E eu ia pra lá, ficava ajudando os ‘caras’ a trabalhar, porque eu achava bacana, eles já eram modernos, já tinha máquinas, serravam tudo na máquina e tal. E eu pegava aqueles restinhos de madeira... eu não podia cortar na máquina, porque eles não iam deixar, mas aí eu dizia para eles: “Serra aqui para mim”. Aí eles serravam. Eu fazia aqueles carrinhos. Na época o óleo não vendia como vende hoje, em garrafinha de plástico. Era de lata, de latão. Então, eles serravam. Como eu pedia, eu fazia aquilo em carrinho. As rodas de madeira, ou de sandália, cortava a borracha e fazia a roda e vendia para as crianças. Aí comecei a ganhar dinheiro e ficava lá e os operários precisavam de mim, para segurar as coisas para ele. Iam pregar alguma coisa, eles: “Segura aqui para mim, menino”. Aí eu ficava segurando lá, para eles. Para mim era bom e para eles também, né? Então, era uma coisa meio cumplicidade. Sem o dono da oficina nem saber que eu estava ali, indo todo dia. Aí, um belo dia, o pedreiro passa na frente da minha casa. Aí a mamãe perguntou para ele: “’Seu’ Naldo, e aí o menino, como é que está?” Ele disse: “Ele não foi mais, ele só foi na primeira semana”. Mamãe pegou logo no meu braço, e disse: “E tu estava indo pra onde?” Aí eu disse: “Não, mãe, eu tô trabalhando ali, na casa do seu Pedrinho”, que era o dono da oficina, né? “Eu tô lá no ‘seu’ Pedrinho, não lhe falei porque a senhora podia brigar comigo e tal. Ela: “’Bora’” lá. Porque naquela época era assim, né? Aí ela foi segurando no braço, chegou lá e ela chamou o seu Pedrinho, o dono da oficina: “Esse menino está...” “Olha, eu vejo ele por aí, quase todo dia, com o pessoal aí”. Era mais ou menos uns dez a 15 trabalhadores que tinha lá. Aí um veio me defender, que era o que mais me pedia pra ajudar: “Ah, ele me ajuda aqui, ele é meu ajudante aqui, faz os carrinhos, faz tudo aqui” e tal. Aí mamãe: “Certo, te livrou, tu ia pegar uma surra, apanhar”. Aí eu disse: “É, mãe, eu estava aqui”. Aí ela falou pro Pedrinho: “Você quer que ele continue aqui, então?” Ele disse: “Não tem problema, se ele quiser ficar, ele gosta se estar aí, os meninos gostam dele, deixa ele aí”. Aí eu fiquei. Eu ganhava aquele dinheirinho vendendo essas bugigangas que eu fazia, de madeira, né? E nisso chegou um ‘cara’ lá, um profissional que veio de uma outra cidade, para trabalhar nessa oficina e eles ganharam um contrato para construir uma loja de disco. Na época, estava saindo o disco de vinil e entrando o CD. Aí tinha que fazer as prateleiras para colocar o CD e a gente tinha que trabalhar durante um final de semana inteiro, ou melhor, uma semana inteira, porque no final de semana ia inaugurar a loja. Uma loja chamada Toque Disco. Não esqueço o nome, né? E aí eu fui pra lá, ajudá-lo a fazer isso aí. Aí, no final do serviço, ele pagou o pessoal que estava trabalhando com ele, os profissionais e me pagou também. Eu nunca tinha pegado dinheiro assim, na empresa, da oficina: “Isso aqui é teu”. Aí eu fiquei muito feliz da vida. Cheguei em casa: “Olha, mamãe”. Aí ele disse: “Olha, você dá pra sua mãe comprar sabão pra lavar sua roupa, está bom?” Aí eu: “Está bom”. “Olha, mamãe, o que eu ganhei pra senhora comprar sabão”. Aí ela pegou o dinheiro e ficou mesmo, né? E aí na segunda-feira eu voltei, já não mais para a oficina, mas para trabalhar com esse ‘cara’, porque ele era uma espécie de empreiteiro da oficina. E comecei a ganhar dinheiro trabalhando com ele. Entre 15, 16 anos, eu já estava trabalhando com ele.
(28:19) P1 - Você lembra quanto foi que ele pagou?
R1 - Na época, digamos assim, como se fosse hoje uns trezentos reais, por uma semana. Era muito dinheiro. Depois eu fiquei esperto, ele me dava esse valor, aí eu já dava para a mamãe duzentos e eu guardava, porque eu não tinha com que gastar, não bebia, não fumava, nada. Eu guardava aquilo. Eu tinha um amigo... eu tenho um amigo de infância, que ele era meu banco, naquela época guardava dinheiro debaixo de colchão, né? Então, ele guardava o meu dinheiro. Tanto é que nós estudávamos juntos e os pais dele trabalhavam numa empresa, aqui no Pará, chamada Andrade Gutierrez. É minha vinda para o Pará, estou emendando tudo. E ele disse: “Tu não quer passar férias lá no Pará, comigo?” Aí eu disse: “Eu vou”. Aí falamos com a mãe dele, que a mãe dele era minha professora de religião e era como se fosse uma mãe pra mim, porque naquela época os professores também batiam. Aí ele... falamos com ela e eu vim pra Belém, a primeira vez, passar as férias. Eu estava fazendo, na época a gente chamava ensino técnico, ensino científico e tinha o magistério. Eu fazia o ensino técnico. Eu estava no segundo ano do técnico. Aí vim para Belém, passar as férias.
(29:41) P1 – Com esse dinheirinho?
R1 - Eu já tinha dinheirinho, sim. Eu tinha dinheiro.
(29:45) Pra comprar passagem?
R1 - Paguei passagem e tudo.
(29:47) P1 - Foi passagem de quê?
R1 - Era de ônibus. Para você chegar em Belém, de lá para cá, era muito difícil, porque até hoje a BR não é muito boa, a 316. Então, lá de Cururupu para São Luís também não tinha estrada, a estrada era ruim, você ia de Cururupu para São Luís em van, que não era bem van, era uma picape tipo D20, veraneio. E de São Luís pegava um ônibus, da Transbrasileiro, que vinha para Belém. Aí vim embora para Belém, passar as férias. E aqui em Belém eu conheci, ele tinha um tio que era da Aeronáutica, taifeiro da Aeronáutica e ele disse: “Tu já te alistou?” Eu disse: “Não, vou me alistar lá em São Luís, ainda” “Pois te alistar aqui, eu trabalho na Aeronáutica, é melhor que te alistar aqui. Eu disse: “É mesmo”. Eu me alistei na Aeronáutica, isso em 1987. Aí, quando me alistei: “Você volta aqui em janeiro” - deram a data lá – “janeiro de 1988, pra fazer o processo”. Eu achava que eu não ia ficar, né? Eu não tinha muito interesse, né? Até porque eu sabia que ganhava pouco, mas tudo bem. Aí eu voltei, continuei estudando, quando foi em janeiro, eu vim e aí eu tive que servir. À época ainda estava na transição militar, eu tive que servir mesmo. Obrigatório, né? O ano obrigatório. Então, essa foi a minha vinda para Belém.
(31:15) P1 – Olha! Antes disso, ‘seu’ Xavier, você tinha algum sonho de infância que você queria ser, quando crescesse?
R1 - Eu queria meu sonho de infância, porque eu me espelhava muito num tio que era militar. Então, meu sonho de infância era ser da Marinha. Olha só! Porque eu achava muito bonito o ‘cara’ ser da... mas não da Marinha do Brasil, fuzileiro naval. Eu queria ser fuzileiro naval, que eu achava bonito, assim, que era a terra, a água, mar. O fuzileiro naval é mais completo, naquela época era bem... então, eu queria ser fuzileiro naval. E eu acabei não entrando na Marinha, o meu sonho de ser marinheiro não foi, porque quando eu cheguei aqui encontrei essa pessoa que me convenceu a ir para a Aeronáutica, que na verdade ainda não tinha bem um sonho. Eu achava que... para você ter uma ideia, eu nunca fui, assim, ambicioso por bem material. O único sonho que eu tinha era ter uma bicicleta. Pra você ver, né? Aí eu comprei a bicicleta.
(32:14) P1 - Lá no Maranhão?
R1 - Lá no Maranhão, ainda. Aí comprei essa bicicleta, andava pra cima e pra baixo com dois colegas, um andava sentado no varão, na frente, outro na garupa. A gente andava, um carregava o outro, os três, né? E consertava bicicleta, era uma festa.
(32:28) P1 - Isso foi na adolescência?
R1 - Na adolescência. Então, esse era o meu sonho. Eu nunca tive, assim, um sonho: “Ah, eu quero ter um...”, não. Aí, depois que eu passei a ter a paixão já por moto, mas antes era só bicicleta.
(32:41) P1 – Olha! E foi com dinheirinho, trabalhando na loja?
R1 – Trabalhando, que eu comprei a bicicleta. Com aquele dinheirinho que ajudava, que o ‘cara’ lá da oficina me dava, que eu ia guardando e comprei a minha bicicleta, porque a mamãe também não gostava que a gente andasse de bicicleta, porque podia cair, se machucar. Aquela questão de mãe, né?
(33:01) P1 - Gente, eu tô aqui imaginando você pequenininho, lá, andando de bicicleta pra cima e pra baixo.
R1 - É, bem jovem, aquela vida de criança do interior.
(33:11) P1 - E tinha namorada nessa época, da adolescência?
R1 - Eu também era bem... eu gostava muito de namorar. Eu... o meu primeiro filho, quando meu filho nasceu, eu estava aqui, já na Aeronáutica. Eu tinha 18 anos quando nasceu meu primeiro filho. Hoje ele está até aqui em Belém, veio me visitar. Ele está com 37 anos.
(33:35) P1 - E era só um namorinho?
R1 - Na verdade, é assim: eu conheci a mãe do meu primeiro filho, a gente se apaixonou mesmo, coisa de adolescente e tal, mas na época nem ela tinha experiência, que você tinha que se preservar, usar preservativo, esse tipo de coisa, nem eu também. Os pais não ensinavam e a gente não se preocupava, não tinha... as crianças hoje estão na internet, sabem de tudo, mais do que nós. Naquela época a gente não tinha esse entendimento, e acabou que ela ficou grávida. Aí eu fiz uma carta, eu estava aqui em Belém, para a mãe dela. Combinando com ela, que eu ia casar com ela, ia voltar e ia casar, mas aí não deu certo.
(34:20) P1 - Não?
R1 - Não, não deu.
(34:22) P1 - Você fez a carta prometendo?
R1 - Não, eu fiz a carta, mandei, ela aceitou, comprei enxoval da criança e fiquei ajudando. Só que aí, também, quando você vem para a cidade grande, aí muda o universo, né? O ‘cara’ começa a pensar também já em outras loucuras e...
(34:38) P1 - E sua mãe, quando ela virou avó do seu primeiro filho, como é ela reagiu?
R1 - Ela já tinha. Da minha segunda irmã, ela já tinha uma filha e a mamãe já cuidava dela, mamãe gostava dela, então não teve, assim, muito...
(34:54) P1 - Não ficou brava?
R1 - Não.
(34:56) P1 – Tá. Daí você veio, então, pra Belém e aí, nessas primeiras férias, como é que foi vir pra Belém, ver a cidade?
R1 - Ah, eu fiquei encantado, né? Cidade grande. Em São Luís eu já ia, mas ficava limitado na casa de tio, você não saía, assim. Quando eu vim pra Belém, já com meu amigo, as irmãs dele já eram maiores, a gente saía, né? Passeava. Aí ia pra OCAN, eu lembro que a ia muito ali para Nazaré, que era um ponto que gente ia visitar muito. Outeiro ali, a Praia de Outeiro, Icoaraci. Então, a gente tinha toda aquela liberdade, né? Tinha esse rapaz que era da Aeronáutica, que era taifeiro, tinha um carro, a gente saía no carro dele, ele gostava também de... então, fui descobrindo um outro mundo.
(35:45) P1 - E aí, quando você veio para a Aeronáutica, o que te marcou? Uma memória que te marcou nessa época, da Aeronáutica?
R1 - Na Aeronáutica, eu tenho até uma foto que a gente, até ano passado eu me encontrei, ano retrasado, a gente formou um grupo de jovens, naquela época. Nós éramos 208 alunos. E depois a gente se reencontrou, muitos deles ainda estão na Aeronáutica, outros foram para a Polícia Militar, outros para a vida civil, então a gente se encontra, ainda tem esse grupo e se encontra, de vez em quando e faz aquela festa, final de ano, aí vem... que era nosso sargento, na época, que é o nosso oficial também, que ainda é vivo, eles vão também nesses encontros, a gente faz ordem unida, como se fosse ainda militar, então me marcou muito. É uma vida que, naquela época, o militarismo também era muito rígido, né? Você aprendia disciplina. Eu não era muito disciplinado, eu aprendi na Aeronáutica, né? Porque naquela época, já pensou? Pega 208 jovens, cada um com uma ideologia diferente, vindo de um lugar diferente e junta ali, todo mundo tem que cumprir aquela mesma regra, aquela mesma rotina, em um espaço que o recrutamento são três meses. Durante três meses você tem que se adaptar naquela vida ali. Então, naquele tempo era assim.
(37:08) P1 - Era difícil?
R1 - Era muito difícil. O aluno tinha que cumprir regra ali. Eu lembro que você acordava quatro horas da manhã, fazer ordem unida e ia dormir dez horas da noite sugado, achava que estava tudo resolvido, quando era meia-noite tocava uma corneta dentro do alojamento, você tinha que sair de novo e era assim, tinha dia que você não dormia, né? Era um negócio bem... mas estava preparando - hoje eu entendo - você para uma vida real porque, se você fosse participar de uma guerra, você tinha que estar preparado. Então, a gente tinha toda essa loucura de não dormir, de ficar estressado e tal e também hierarquia, você passa a ter hierarquia, respeitar mesmo, o ‘cara’ que é um soldado mais velho, você tem que respeitá-lo, o cabo, o sargento e assim sucessivamente.
(37:56) P1 - O que você gostava?
R1 - Eu gostava mesmo da amizade. Eu não era muito disciplinado, como eu falei, porque eu fui criado na rua, correndo, brincando e tal. Eu gostava da amizade dos outros colegas, que a gente se juntava e tinha colega do Marajó, de Vigia, de Belém mesmo. E a gente fez essa amizade e eu gostava dessa convivência com eles. Mas o militarismo... por que eu não fiquei na Aeronáutica? Quando a gente entra na Aeronáutica, naquela época, não sei se hoje ainda é assim, você já faz todas as provas que tem que fazer, todos os estudos, para você já sair de segunda classe para primeira classe, automaticamente. Então, você já tem uma nota ali, minha nota era 36 de 208, mas essa nota pode diminuir ou aumentar, você pode perder posições já por comportamento ou outros fatores. A mesma do estudo, a minha nota era 36, então eu sabia que eu engajaria tranquilamente. E eu gostava muito, no começo, mas o que me deixou frustrado, porque o salário acho que era meio salário-mínimo, eu não lembro, era uma ajuda de custo e para mim não dava. Acostumado a ganhar dinheiro, pra eu ganhar aquilo ali não dava. Aí eu resolvi não ficar.
(39:18) P1 - E ainda tinha que pagar pensão, né?
R1 - Não.
(39:20) P1 - Não pagava pro filho, que ficou lá?
R1 - Não, não, não. Eu tinha ajuda, eu ajudava meu filho. Na verdade, eu também não precisava muito de dinheiro aqui, porque nessa época que eu servia, a maior parte... as pessoas ficavam militares e ficavam no quartel. Então, você tinha almoço, janta, café da manhã, tudo por conta.
(39:37) P1 - E você sentia saudades de casa?
R1 - No começo eu sentia, mas depois, como eu fui me adaptando com os colegas, passei a não ter tanta saudade assim, né? Mas quando tinha feriado, folga grande, assim, eu visitava minha mãe, eu ia pra lá.
(39:54) P1 - E aí, então, você ficou quanto tempo?
R1 - Eu fiquei de janeiro de 1988 a dezembro. Quando foi em janeiro de 1989 eu saí, foi que eu entrei já na vigilância, na época.
(40:07) P1 - Aonde?
R1 - Ainda em Belém. Aí eu já estava em Belém, eu já não queria mais saber também do Maranhão, porque aqui era, como eu falei, fiquei encantado, cidade grande e tal. Conheci um ‘cara’, ele era supervisor de uma empresa de vigilância chamada Norsergel, essa empresa foi vendida pro Grupo Nordeste e depois Prosegur. E foi meu primeiro emprego. Como, naquela época, quando você saía das Forças Armadas, ou você entrava na Polícia Militar, era facilzinho, ou uma vigilância, que também era fácil. Não precisava fazer muita coisa, porque você já vinha da vida militar. E aí, optei... meu tio queria me colocar na Polícia Militar. Na época eu não quis, lá no Maranhão, porque eu queria ficar aqui no Pará, aí esse colega meu que era supervisor da Norsergel, disse: “Tu quer entrar na vigilância? Faz o curso lá, que eu te coloco”. E o curso era pago pela empresa na época, também, porque o vigilante, como tem uma lei específica, que na época era a 7.102 - mudou agora o nome - de 1983, então era bem nova, era obrigatório ele fazer esse curso, para ter aquela certificação. Aí eu fiz o curso, entrei na vigilância, aí eu já ganhava, saí ganhando ali um pouco mais de meio salário-mínimo, pra vir pra vigilância ganhar três, quatro salários meninos. Já era uma diferença bem razoável, né?
(41:33) P1 - E como é que era a rotina, então, quando você começou a ser vigilante?
R1 – Aí, na vigilância eu comecei, como a vigilância tem uma questão que a gente chama de posto físico. Aquele ‘cara’ trabalha só naquele lugar. Eu passei a tirar férias em vários lugares. Só que era jovem, tinha muita... e comecei a conhecer pessoas e trabalhar em um lugar e outro. E aí surgiu, isso em 1989 e a empresa ganhou um contrato na Albras. A empresa que estava trabalhando na Albras ia sair e ela estava com uma questão de litígio, não ia liberar nenhum dos empregados pra passar para outra, ela tinha mais de cem empregados aqui dentro. Aí a empresa me chamou e disse: “Olha, nós vamos levar uma equipe para Barcarena. Não tem como vir pra Belém todo dia, vai ficar alojado lá, a gente vai dar casa, dar comida, dar roupa lavada, mas vocês vão ficar três meses lá, que é pra pegar o serviço e depois a gente vai contratar a pessoa da região e traz vocês de volta.
(42:36) P1 - Três ou treze meses?
R1 - Três meses. Aí: “Quem aceita?” Eu logo aceitei, digo: “Vou pra essa aventura”. Eu gostava de aventura. Aí vim pra Barcarena. Pra chegar aqui em Barcarena não tinha alça viária, não tinha a PA, que as rodovias estaduais eram tudo de piçarra. Era um sufoco. Aí viemos num barco, descemos no Arapari, pegamos ônibus. Aí eu vi todo mundo andando de máscara, dentro do ônibus, que estranho! Depois eu descobri por que, que quando o ônibus pegou a estrada e a janela não fechava, do ônibus e a poeira entrava no ônibus. Aí eu peguei a camisa e comecei a dizer: “Agora eu porque eles usam máscara”. Descobri dessa forma. Aí vim pra Barcarena, pra Albras. A Albras estava no processo de... já tinha implantado a primeira fase, que foi em 1985, estava na segunda fase de construção da Albras. E tinha a primeira portaria, quem vem pra cá hoje, ela está desativada, que era a portaria A3, que a gente chamava. E lá entrava o pessoal da construção, pra construir lá redução 4. E eu fui trabalhar nessa portaria, eu tinha que saber tudo de todas as portarias, porque a gente tinha que passar para as pessoas que vinham, né? Então, eu ficava uma semana na portaria 1, outra semana na outra portaria e aí via como que era o negócio, ia passando para os ‘caras’ que tinham sido contratados, da região. Aí, quando um mês depois, a outra empresa saiu e levou todo mundo mesmo. Nós entramos com todo o pessoal sem conhecer nada. Nós éramos trinta pessoas só que conhecia um pouco, né? Porque a gente estava há um mês, não dava para conhecer muita coisa. Nós éramos trinta e nesses trinta tinha inspetor, supervisor e vigilante. Eu era vigilante. Aí fiquei eu acho que uns seis meses.
(44:22) P1 - E gostava?
R1 - Eu gostava. O trabalho era... eu gostava do dinheiro. Vamos chegar lá, que esse ‘cara’ pensando muito em dinheiro. (risos) A jornada de trabalho era de oito horas. Pegava das seis às 14 horas, outra turma de 14 horas às 22 horas e outra de 22 horas às seis. E eu pegava de seis, só largava 22 logo, porque eu achava bom, que eu ganhava muito dinheiro. A hora extra dobrava, questão sindical e tal.
(44:50) P1 - Passava dia inteiro?
R1 - O dia inteiro. Eu saía daqui, ia pra casa, ia tomar banho, dormir, jantar, porque almoçava aqui mesmo, na Albras. E aí o pessoal vendo assim o meu jeito de trabalhar, disse: “Tu não queres trabalhar, ser inspetor?” Digo: “Quero, quem não quer”, né? Mas aí eu tinha, nesse período que eu estava aqui, aproveitei e já comecei a fazer o meu processo pra tirar a minha carteira de habilitação. Aí fui lá em Belém, tirei a carteira de habilitação.
(45:18) P1 - De carro?
R1 - De carro. Aí: “Ó, mas tem que dirigir micro ônibus. Tua categoria é B, tu vai ter que trocar”. Aí eu: “Está bom, eu troco. Mas não dá pra trocar agora, que é dois anos pra trocar, de B pra D. Aí não dá pra trocar” “Mas aqui todo mundo dirige com a B”. Naquela época não tinha muita regra, né? Então, a gente acabava dirigindo. E aí eu fui trabalhar como inspetor. Aí fui pra portaria da Albras, já pra parte de fiscalização. A outra empresa, que levou o pessoal, teve que demitir depois, porque ela não tinha como ficar com todo aquele pessoal pagando, sem ter posto, pra ‘botar’. Aí foram voltando, foi equilibrando as coisas. E aí terminou a construção da Albras e começou a se falar da construção da Alunorte. A Alunorte estava parada. A segurança da Albras era responsável pela Alunorte. Como era da fiscalização, eu fazia lá e aqui. E aí disseram: “Olha, a gente vai precisar ‘botar’ agora alguém dedicado na Alunorte, porque a Alunorte vai começar a obra e a gente precisa ter alguém lá”. Mas ninguém queria vir pra Alunorte, porque a Alunorte era mato, só tinha aqui esse prédio 73, 71 e a primeira linha de tancagem aqui da precipitação, o resto era tudo mato, ninguém queria vir pra cá. E lá no Albras não, era um negócio mais moderno. Aí eu disse: “Eu vou, não tem problema, não”. Aí: “Tu queres ir pra lá?” Digo: “Vou, tranquilo” “Está bom”.
(46:49) P1 - Por que você quis?
R1 - Porque eu gostava sempre de estar inovando. Como ia começar a obra, eu achava o pico da obra... porque a Albras, quando terminou a obra, ficou muito monótono, só ‘cara’ entrando. Não tinha a mesma agitação de uma obra. E a obra não, é aquela gente entrando, saindo toda hora, aquela confusão disso e daquilo, era bom demais. Aí eu vim para a Alunorte. Chegou na Alunorte a segurança sempre era a mesma da Albras, mas eu trabalhando na Alunorte. Aí começou a construção. Gente pra caramba, oito mil homens trabalhando aqui, aquela confusão toda aí. Aí, quando foi pra partida da Alunorte tinha que confeccionar crachá, tinha um departamento aqui que chamava de Departamento de Serviços Gerais. Aí o pessoal começou: “Ah, vamos separar da Albras” - que transporte era dividido, tudo era dividido – “a Alunorte que é Alunorte, Albras é Albras”. Aí e eu, que era da segurança, onde é que eu fico, nessa história? “Não, tu vai ficar subordinado à Alunorte agora” “Está bom”. Só que eu era da empresa de vigilância. Nós tínhamos quinhentos e setenta empregados na época, próprios, que vieram, parte deles era da Albras, outros foram contratados para a partida da Alunorte. E aí partiu essa Alunorte, veio o primeiro diretor, que era o Galib Chaim.
(48:14) P1 - Que ano que foi?
R1 - Isso foi em 1995. Já a partida, né? E aí nós começamos a tocar a nossa vida assim, meio que separando já da Albras, né? Só que quem ia fazer o nosso crachá? Tudo era feito na Albras. Quem ia... exame médico, tudo era lá. Alimentação. Aí crachá: “Não, pessoal da vigilância faz”. Aí: “Eu faço, não tem problema, não”. Aí me treinaram, compraram uma maquinazinha de fazer o crachá, que não era PVC, igual o que gente usa hoje, colava dois assim, um em outro, um tipo de plástico que fixava ali, um no outro. Aí eu passei a fazer crachá do empregado, dos contratados e aí... e o táxi? Precisava chamar táxi para os empregados, porque aí começou a surgir demandas que tudo era feito pela Albras, né? Aí: “Não, leva para a segurança também”. Aí eu fui absorvendo aquele... toda essas... crachá, aí já era para chamar táxi. E reserva de hotel? Quem vai reservar hotel, se o ‘cara’ precisar vir em tal hora e precisa de um hotel? “‘Bota’ para a segurança”. Aí vem para a segurança também. Aí foi acumulando, né? Eu gostava, começou já ficar o negócio mais dinâmico, não era mais só vigilância, a gente tomava conta de muitas coisas.
(49:34) P1 - Trabalhava de que horas a que horas?
R1 - Meu horário era administrativo, passou a ser administrativo e eu tinha a empresa Alunorte, que foi... foi, não, é uma empresa muito boa para mim, desde quando eu iniciei. Por quê? Eu não era empregado próprio, mas eu tinha apartamento que a Alunorte me dava, eu tinha carro que a Alunorte me dava. Celular, já nessa época tinha celular que a Alunorte me dava, tudo eu usava, não tinha limitação. Eu podia pegar, sair daqui no final do expediente, pegava meu carro e ir lá, para o apartamento.
(50:14) P1 – Onde ficava o apartamento?
R1 – Eu morei, hoje é um hotel, lá, que a gente chama de Hotel... pertence ao Grupo Samaúma, mas era um pensionato da Albras que ele transformou em hotel.
(50:25) P1 - O Jardim Tropical?
R1 – Jardim Tropical. Depois vem pra pensão azul e, por último, o último ram que eu morei foi o ram marrom, que já era maior, tinha dois quartos, sala, cozinha.
(50:42) P1 - Morava bem?
R1 - Morava bem, tudo por conta da empresa, nunca me preocupei com isso.
(50:47) P1 - E eram só funcionários?
R1 - Eu não era funcionário e tinha toda essa regra. Por isso que eu digo que a Alunorte foi... foi não, é uma empresa que me deu, proporcionou coisa fora de série. Pra você ter uma ideia, nós éramos ainda ligados ao Grupo Vale e o Doutor Paulo Sette Câmara foi um secretário de segurança do estado do Pará, não sei se já ouviram falar, ele já faleceu, ele foi oito anos secretário de segurança pública do estado do Pará, na época do Almir Gabriel, isso mesmo e ele foi consultou da Vale e ele veio aqui, fazer uma avaliação. Comecei mostrar pra ele a questão de segurança e tal, o que eu fazia, o que eu não fazia e tal, aí ele me ajudou muito. Tinha muita coisa que era ‘de boca’, né? Aí ele disse: “Mas você há de convir que tudo que tu está fazendo está errado?” Aí eu: “Mas por que, doutor?” “Tu não é empregado. Como é que tu pode determinar quem vai ficar no hotel, por exemplo. O teu contrato, como é que tu vai dirigir carro da empresa, se tu não tem nenhum contrato que te autoriza isso?” “Não sei, a empresa mandou eu fazer, né? Eu faço”. E aí eu não ganhava salário de sindicato, era um salário diferenciado, né? Acordo entre, na época, a liderança da Alunorte comigo: “A gente vai te pagar um salário maior”. Chama a empresa, a empresa concordou e fizemos um acordo, eu recebia fora da tabela de sindicato. Mas ele não se conformou com isso, ele veio na sala do Doutor Galib e eu não sabia, veio com o Galib, o Galib me chama: “Xavier, vem aqui comigo”. Aí eu: “Sim, senhor, doutor”. Aí cheguei lá e ele tinha um olho bem azul, eu sentei assim na frente dele e ele ficou me olhando assim: “Você está satisfeito com o seu salário?” Aí eu disse: “Estou, doutor. Eu ganho mais do que ganha um...” - era supervisor – “supervisor da empresa de vigilância, meu salário é diferenciado, a empresa me dá carro, tem um celular que fica comigo, que eu posso ligar para qualquer lugar”. Aí ele: “Tu tem algum problema em continuar assim?” Eu disse: “Não”. E o Sette Câmara na sala do lado. Ele disse: “Eu confio nele, Sette Câmara, pode ficar, pode voltar lá para o seu trabalho. Obrigado”. Eu fui embora. Aí o Sette Câmara depois chegou lá comigo, ele me tratava assim meio... mas ele gostava muito de mim, tanto é que quando ele se aposentou mesmo, total, até a história de Barcarena ele me deu, que ele fez o primeiro estudo para construir a Albras, do sistema de prostituição que poderia ter no Conde, ele conta toda uma história lá, o que deveria ser feito, os alojamentos etc e ele me deu todo esse material. Aí ele chegou lá comigo: “Seu porco” - com licença da palavra – “eu queria te ajudar, mas pelo jeito o ‘cara’ gosta de ti, tu gosta dele, se resolvam aí”. Aí ele passou só a me ajudar a fazer documento: “Eu vou pelo menos documentar tudo isso aí, pra que tu não tenha problema aí, depois”.
(53:55) P1 - Ele queria te dar um aumento.
R1 - Não, na verdade ele queria que a empresa me absorvesse, mas ele estava vendo pelo lado legal, assim, que eu viesse pra ser empregado próprio, porque eu não tinha autonomia. Por exemplo: eu trabalhava na parte de apuração de ocorrência. Hoje a Hydro tem um formato diferente, tem um departamento de compliance. E na Vale, na época ainda era Alunorte Vale, a gente que fazia apuração, né? Então, eu chamava empregado próprio para ouvir, para apurar a ocorrência, depois gerava um relatório, esse relatório ia para mão do diretor, que tomava uma decisão, baseada no que eu estava dizendo. Então, tinha toda essa questão legal por trás. Então, é isso que o Sette Câmeras... a visão dele era essa. Estava certa a visão dele, mas a do Galib também estava certa, porque o Galib confiava em mim, né? E eu gostava da empresa, eu digo: “Vou continuar do jeito que está, está tudo bom pra mim, está tudo bem”. Então, esse foi o início. E aí o Alunorte foi crescendo.
(54:50) P1 - Mas nesse início, como é que você via a cidade? O que estava acontecendo em Barcarena?
R1 - Outra questão: quando nós iniciamos, que eu falei que fazia a ronda no início, nós tínhamos a Vila dos Cabanos, Vila do Conde, Laranjal, Itupanema e São Francisco, só. Era separada uma bem longe da outra, o resto era tudo mato. E Vila dos Cabanos era onde moravam os empregados da Albras. E a responsabilidade da segurança da Vila dos Cabanos era nossa, da vigilância. A gente tinha convênio com a Polícia Militar, mas quem fazia a ronda era nós, num carrinho lá, com Giroflex, se pegava alguém em atitude suspeita, que na época também não tinha esse tipo de criminalidade que tem hoje, até porque para chegar em Barcarena era difícil, a questão logística. E aí a gente fazia a ronda dentro da Vila e eu fiscalizava o ‘cara’ que fazia a ronda. Eu ia na Vila, para fazer essa fiscalização. Pra você ver que era tão pacato Barcarena, Vila dos Cabanos e Barcarena como um todo, que eu ainda estava trabalhando pela Albras e eu tinha um amigo que era motorista de uma graneleira e sempre eu ia lá na casa dele, conversar, tomar um cafezinho. E um dia eu chego lá, era um domingo, umas dez horas da manhã, bati e ele não estava. As casas não tinham muro, era tudo só um aramezinho dessa altura. Aí eu bati e ele não estava, aí o padeiro passava e ia deixando o pão nas maçanetas das portas. E o padeiro passou, deixou o pão lá. Eu cheguei dez horas e ele não estava, eu peguei o pão e levei. Aí, no outro dia eu disse: “Pô, Sérgio, fui ontem na tua casa, rapaz, tu não estava em casa”. Ele disse: “Ah, foi tu que pegou meu pão” “Foi. Eu levei teu pão pra comer, pensei que tu estava viajando”. Então, era muito pacato. Era assim: todo mundo se conhecia e tinha aquela coisa mesmo de cidade interior, aquela questão, as bicicletas ficavam na porta, não tinha risco de você andar na rua e ter problema.
(56:46) P1 - E a relação desses funcionários com a comunidade que aqui vivia?
R1 - Era muito boa porque, na verdade, a comunidade trabalhava aqui. A própria comunidade, o pessoal, os moradores da comunidade passaram a vir trabalhar nas empresas, tanto na Albras, quanto na Alunorte.
(57:03) P1 - Aí misturou?
R1 - Misturou. O que fez a cidade crescer desordenadamente, ela tinha inclusive um planejamento de crescimento, rua definida, para ser construídas casas futuramente, que era da Codebar, uma companhia do governo federal responsável pela parte do urbanismo, que deixaram de mão e acabou o pessoal ocupando irregularmente. Como surgiu a ocupação? Quando construiu a Albras e a segunda fase da Albras, foram feitos os alojamentos, as pessoas ficavam no alojamento e depois iam embora. Terminou a obra e iam embora. Mas parte dessas pessoas acabou arranjando família aqui ou trazendo a família de outro lugar, para cá. E eles não tinham de morar, porque os alojamentos eram da Albras. O que eles fizeram? Construíram uma casinha ali, num terreninho que ele comprou, do vizinho. Quando veio a construção da Alunorte veio mais gente de fora, também não tinha lugar para eles morarem. Ou eles iam morar em alojamento, ou eles iam construir ali uma casa para morar, porque tinha família, né? As pessoas começaram a construir e aí foram invadindo, ocupando irregularmente e foi se transformando, hoje uniu tudo. Porque antes era bem separado e foi unindo e hoje está esse tamanho que está.
(58:25) P1 - E aí você foi vendo o comércio nascer tudo, né?
R1 - Tudo do zero, mesmo. Antigamente você tinha duas, três lojinhas que vendia, atendia a gente e tinha os lugares onde tinha que ter as lojas. Hoje não, já não tem mais isso, é loja em qualquer lugar. E aí você começou a ver assim: o ‘cara’ era empregado da Albras: “Vou montar um...”. Tinha um que a gente chamava de Beirinha, esposo da Denise, ele trabalhava aqui, ele e a esposa dele, a esposa dele trabalhava, inclusive, na minha área. Aí o Beirinha viu, na época ele era muito... tinha visão de futuro, ele montou uma loja para vender material de construção, que era o que, na época, estava começando o mercado, começou a crescer, mas ele não vendia o material, digamos assim, o básico, ele vendia de acabamento, então ele comprava já material de acabamento e vendia na loja dele. A loja do Beirinha cresceu de uma tal forma e começou assim e outros empresários que surgiram aqui, que trabalhavam aqui dentro, eu digo para todo mundo, assim. O próprio Vilaça, que já faleceu, era funcionário aqui da Albras, era chefe de transporte de uma empresa chamada Triminas. E o Vilaça também teve uma visão assim: “Aqui dá dinheiro”. Comprou um ônibus para carregar pessoas e foi crescendo, crescendo e se tornou aí um megaempresário. E assim foram vários empresários crescendo dentro de Barcarena, que começou de baixo.
(59:58) P1 - E tinha muito ‘perrengue’, nesse começo?
R1 - Não, no começo era bem tranquilo, até. Nós viemos ter... você fala ‘perrengue’, assim, relacionado...
(01:00:08) P1 - No seu dia a dia, na sua vida.
R1 - Ah, tinha, porque a gente precisava de profissionais especializados. Por exemplo: soldador, montador de andaime. Então, são umas profissões que elas são muito específicas e nós não tínhamos público aqui para fazer esse tipo de atividade, então vinha de fora, as empresas traziam esses ‘caras’ de fora e eles não estavam habituados a certas regras que nós tínhamos aqui, diferente da nossa população local, que já tinha toda uma regra, eles não, aí ou eles faziam greve... eu lembro que teve uma greve aqui, em 2005, que os ‘caras’ fecharam tudo, vieram andando lá do terminal rodoviário até aqui, não deixava ninguém passar, a gente precisava ‘botar’ os empregados para dentro e não conseguia. Era um negócio bem divertido, no sentido da palavra, mas na época a gente ficava com o ‘nervo à flor da pele’, porque a planta não pode parar, né? Você tem que ‘botar’ as pessoas para dentro e aí os ‘caras’ bloqueando a via.
(01:01:10) P1 - E o vigia ficava como?
R1 - Exatamente.
(01:01:14) P1 - E como é que você se divertia, naquela época?
R1 - No início, eu ia muito pro Caripi, frequentava muito o Caripi, o Cabana Clube. Como eu trabalhava na área de segurança empresarial e nós tínhamos... foi vindo pessoas de fora e aí a gente já não tinha mais uma vida social muito... eu mudei de Barcarena, né? Hoje eu moro em Ananindeua, justamente porque a minha vida social acabou aqui, assim. Eu não poderia mais ir para o Caripi e ficar lá, exposto, porque o ‘cara’ pode dizer assim: “Esse ‘cara’ ali que não deixou entrar na Hydro”. Na verdade, ele não entrou, porque deve ter feito alguma tolice, né? Ou ele saiu, porque ele fez alguma coisa que não era para ser feita, alguma coisa errada e ele poderia levar para lado pessoal, aí eu resolvi ir embora para Belém. Os filhos também cresceram, precisavam ter uma escola diferenciada, uma faculdade que aqui não tinha, não tem ainda, agora tem a UEPA, mas não tinha, então eu tive que ir pra ...
(01:02:15) P1 - Mas isso mais para frente, né?
R1 - Mais para frente.
(01:02:17) P1 – Então, você ficou em Barcarena até quando?
R1 - Eu fiquei em Barcarena, morando mesmo em Barcarena, até 2008.
(01:02:29) P1 - E quando é que você arranjou uma esposa, teve filho?
R1 - Nesse período eu já tive outros filhos, né? Eu sou casado hoje.
(01:02:38) P1 - Quando é que você casou?
R1 - Eu casei em 2019. Eu casei a primeira vez... na verdade, eu casei duas vezes.
(01:02:45) P1 – Tá. Então, você teve um primeiro filho com 18 anos?
R1 - É.
(01:02:48) P1 - E aí, depois?
R1 - Depois eu casei acho que foi em 2000... eu não lembro mais, bem, em 2020. Casei em 2020.
(01:02:57) P1 – Agora há pouco? 2020?
R1 - Não, em 2000. Casei em 2000. Tive um filho com essa pessoa que eu casei.
(01:03:08) P1 - E ela é daqui de Barcarena? Não conheceu aqui?
R1 - Não, não conheci aqui, não. Depois eu casei, em 2019. Nós separamos, não deu certo, em 2015 eu me separei e casei de novo, agora em 2019,
vivo com outra pessoa.
(01:03:22) P1 – Tá. Em 2000 teve filho, nesse casamento?
R1 - Eu tenho filho... eu tenho três filhos... dois que eu criei e três... não. Quatro meus e dois que eu criei. Esses meus quatro filhos são: tem uma menina que mora - essa que eu falei - lá no nordeste, ela é fisioterapeuta, trabalha na prefeitura de lá. Tem esse outro meu filho, que é empresário, que veio me visitar agora, que é o mais velho. Tem um outro que mora aqui em Barcarena e trabalha aí numa empresa que às vezes ela presta serviço aqui, pra gente, mas ele trabalha na área externa, na parte do Departamento Pessoal dessa empresa.
(01:04:06) P1 – E o outro?
R1 - O caçula, que é com essa que eu casei em 2000, é engenheiro desenvolvedor da Ericsson. Ele entrou na UFPA, que eu tinha um plano, eu disse: “Só saia da Hydro depois que todos vocês estiverem formados” e ele foi o último a ser formado. Em 2024 ele se formou engenheiro, ele já estava estagiando na Ericsson, aí a Ericsson...
(01:04:31) P1 – O ano passado?
R1 - ... o contratou para trabalhar, só que ele é engenheiro eletricista, mas ele foi para a parte já de software, trabalha com isso. Trabalha em home office, só foi em São Paulo duas vezes, porque teve reunião lá e ele foi lá, mas ele trabalha de casa.
(01:04:51) P1 – E, Xavier, em que momento você virou funcionário, então?
R1 - Em 2008. Aí, nessa minha trajetória eu iniciei lá em 1989, como vigilância e fiquei trabalhando na vigilância até 2011. Não, até 2004. Em 2004 eu já vim para fiscalização, que é uma empresa de locação de mão de obra, para fiscalizar o serviço da vigilância, porque estava tendo conflito entre a empresa que eu trabalhava e fiscalizava. Como que eu poderia fiscalizar uma empresa que eu era da empresa? Não dava muito certo. Aí eu tive que ser absorvido aqui por uma locação de mão de obra e quando foi 2008 eu passei para o quadro próprio da Hydro.
(01:05:44) P1 - Da Alunorte.
R1 - Da Alunorte, isso.
(01:05:46) P1 - E aí entrou com que cargo?
R1 - Eu entrei como analista... não, assistente... é, analista. Em 2011 eu fui para gerente operacional, aí depois dessa função de gerente operacional mudou para supervisor.
(01:06:04) P1 - Hoje é o seu cargo?
R1 - É o meu cargo.
(01:06:06) P1 - E aí, trabalhando aqui para Alunorte, você foi estudar também?
R1 - Ah, sim, a parte da educação. Quando eu vim lá do nordeste para servir, né, eu entrei na Aeronáutica e eu não tinha concluído o ensino médio. Faltava um ano, porque eu não tinha como concluir, que eu estava servindo e eu estudava lá... aí eu estudei em Belém. Na época, eu concluí o ensino médio em Belém. E depois que eu vim para Barcarena, eu sentia necessidade, que eu percebi que o ensino médio não ia resolver, de fazer um curso técnico. Aí eu fui fazer Gestão de Segurança, porque eu trabalho na área de segurança, nada mais do que fazer um curso de gestão. Aí eu comecei em 2006 a fazer o curso de Gestão de Segurança. Então, eu ia para Belém, trabalhava aqui durante o dia, à noite eu ia para Belém e fazia o curso, voltava, tinha um barco que voltava, chegava aqui por volta de onze, saía onze horas de Belém, chegava meia-noite em Barcarena.
(01:07:15) P1 - E isso com benefício, com incentivo da empresa?
R1 - Com incentivo, mas eu ainda não era próprio ainda, foi em 2008 que eu fui absorvido direto, mas eu tinha os benefícios. Por exemplo: eu ia no ônibus da empresa, voltava. Aí depois eu fiz uma pós-graduação em Gestão Empresarial, estou fazendo uma outra agora, que já é de Compliance, fiz uma de Análise de Risco, estou fazendo agora uma de compliance.
(01:07:48) P1 - Está na terceira pós-graduação?
R1 – É. Porque isso é mais para a parte minha, da minha atividade, eu preciso conhecer um pouco da parte de gestão, da parte de apuração, de análise, né? Então, a gente tem que estar sempre voltado.
(01:08:03) P1 - E aí tem apoio da empresa?
R1 - Hoje, como é tão fácil, poderia, se eu fosse fazer um curso voltado para a área de engenharia, então a empresa dá incentivo. Só que o meu, como é uma pós voltada mais para a área de gestão, não tem. E também hoje, como é online, é mais fácil você fazer sem precisar de deslocamento, esse tipo de coisa.
(01:08:33) P1 - Mas cresceu bastante na carreira, né?
R1 – Sim. Aí o pessoal diz assim: “E por que tu não continuou?” Na verdade, eu poderia ter feito inglês, mas eu me acomodei, porque eu cheguei, como eu te falei lá no início, eu não era e não sou ambicioso, né? Eu já tive vários carros etc. Mas a minha única ambição que eu tenho é moto. Mas não é assim, por ter uma moto. Eu gosto de moto assim, de fazer viagens. Não é pra andar na moto aqui, pra eu ir daqui pra ali, não. Então, eu pego assim, por exemplo: amanhã, sábado, pego minha moto, vou lá em Castanhal tomar café, vou lá e tomo café com uma equipe, outros colegas, aí volto pra Belém, só pra passear. Aí eu ‘boto’ a esposa na garupa, ela gosta também: “Ah, vamos lá em Salinas, tomar café”. Olha só, a gente vai tomar café em Salinas, só pra chegar em Salina está na hora do almoço, né? Mas a gente faz isso, vai lá, aí almoça, aí volta de novo, no mesmo dia. Isso é um grupo de motociclistas, eu gosto disso aí. Então, essa é única ambição que eu tenho.
(01:09:34) P1 - Que legal! E você falou que fez uma promessa para si mesmo, que só ia, se saísse, depois que os filhos se formassem.
R1 – Isso.
(01:09:42) P1 – Por quê?
R1 – Pelo incentivo que a empresa dá, porque os meus filhos estudaram, todos, em colégios bons, com incentivo da empresa, eu não paguei nada. Se eu tivesse que pagar eu ia estar gastando. Esse meu filho mais novo, que mora em Belém, estudou no Ideal, porque ele optou por estudar no Ideal. A mãe dele também achava que era melhor, mas o que o Ideal cobrava era o equivalente que a empresa me reembolsava, então eu não tinha custo. Plano de saúde da empresa até hoje ele ainda tem direito. Ele já tem o dele, mas ele ainda tem direito, porque ele é meu dependente, termina esse ano, eu acho que esse ano. Mas ele tem plano de saúde por conta da empresa, minha esposa tem plano de saúde. Então, são muitos benefícios. Transporte, por exemplo. Hoje eu digo, eu moro em Belém. Lá no início eu falei pra você que eu vim de Belém naquela poeirada, era um sufoco pra chegar aqui. Hoje você vai num ônibus confortável, que a empresa fornece pra você, com ar-condicionado, se você quiser ler, você vai lendo, quem gosta de dormir vai dormindo, enfim. Então, tem todas essas coisas que a empresa oferece, que você... só não fica quem não gosta mesmo de ter um conforto, ter um plano de saúde. A previdência privada eu pago um valor, a empresa paga o mesmo valor também, a contrapartida, que é para mim, mas a empresa está pagando, ali. Então, quando eu for me aposentar, se um dia eu me aposentar, que acho que eu não vou me aposentar, porque eu não vou aguentar. Então, você vai se aposentar, vai ter um salário a mais, sem ser o do INSS, porque você tem uma previdência privada, no qual a empresa ajudou você a construir. Então, são esses tipos de benefícios que você tem. Por exemplo: esses óculos meu aqui, é novo, está com o mês, eu acho. Eu fiz óculos, a empresa paga metade do valor dos óculos, eu posso escolher óculos bom e a empresa me dá metade do valor. Remédio, se você tomar algum tipo de remédio contínuo a empresa vai lá e paga o remédio pra você. Então, são tantas vantagens. Ticket alimentação dá, acho que - que fica com minha esposa, eu não sei bem o valor - eu acho que é mais de mil reais, deve ser mil reais, eu acho. Ela não deixa eu ver nem a senha, porque senão... (risos) Só tem uma coisa que eu não gostei nessa questão do ticket, que tem o do Círio, que cai no ticket e a mulher fica. Eu não vejo. O do Círio pelo menos é meu, que é um extra, que a empresa dá extra. Ainda tem isso, empresa dá um ticket extra, dá cesta de Natal. De vez em quando ainda surpreende a gente com um abono, um abono do presidente: “O vice-presidente mandou dar um dinheiro para vocês” “Opa, então está bom”. PLR, nós temos uma muito boa. Pra você tem uma ideia, na pandemia foi bem desafiador para nós. Eu tive eu tive na empresa dois momentos desafiadores: em 2010, quando a Vale... como eu era já empregado próprio e respondia para a segurança da Vale, na época eu fui chamado junto com os outros da Albras também: “Nós vamos juntar as seguranças, porque vamos fazer só uma segurança, porque a Vale vai vender a não ferrosa e vocês vão... a gente vai montar, para reduzir pessoas, mas não vamos demitir vocês não, vamos transferir para outras unidades da Vale etc”. E aí começou aquela tensão, porque muitos empregados da Alunorte acabaram sendo demitidos na época, que a Vale precisava dar uma ‘enxugada’, para poder vender. E aí foi um tempo de tensão pra mim, porque eu não sabia: “Será que eu vou sair?” Onde foi momento de tensão. O segundo foi na pandemia, mas na pandemia a gente não sabia para frente, o que ia acontecer. Então, como eu trabalho na área de segurança, eu sabia o que estava acontecendo com os empregados, tinha que manter distanciamento, tinha que trabalhar naqueles planos para manter, conseguir operar a planta. Então, foi um momento de muita incerteza. Basicamente, foram esses dois momentos de grande incerteza que a gente teve, um pela pandemia e o outro quando a Hydro absorveu. E quando a Hydro absorveu, depois, em 2000... eu lembro, acho que foi em 2011, teve um evento no Cabana Clube e eu disse: “Essa é uma empresa diferenciada”. Eu sou muito... eu gosto de saber onde é que eu estou. Eu fui ler sobre a Hydro, a história da Hydro, disse: “Caramba, essa é uma empresa diferenciada, mesmo”. Aí o pessoal: “O que vocês acham?” Eu digo: “Rapaz, vocês estão numa empresa maravilhosa. Olha a história da Hydro”. Aí, o pessoal: “Realmente”.
(01:14:58) P1 - Me conta o que você viu de diferenciado.
R1 - A Hydro, quando ela começou lá, há cem anos, é uma empresa sólida, não parou de crescer. Só crescendo e sempre buscando um diferencial. Por exemplo: nós, hoje, aqui, a Alunorte, estamos com a biomassa. É um experimento aí e isso está tirando o caroço de açaí, que os batedores pagavam pra ser descartados e hoje está sendo consumido por nós. Então, a Hydro foi buscar o parque eólico, que é uma questão que, poxa, vocês gastam tanta energia, vocês poluem isso e aquilo, né? A gente ouve isso aí. E aí a Hydro já tem uma energia limpa, a energia solar. Tem um projeto da New Wave agora, que é pra fazer... tirar gusa da bauxita. Então, são coisas, assim, você vê que são umas ‘pegadas’ que ela traz lá, de cem anos atrás. Cem anos ela começou, para matar a fome das pessoas, a desenvolver a parte elétrica e vem crescendo, crescendo e fazendo sempre, buscando uma forma de diminuir o risco para as pessoas. E hoje é uma ‘pegada’ ambiental que está muito forte e nós estamos com as caldeiras elétricas também, três caldeiras elétricas. Então, são coisas que eu fico orgulhoso, assim, até lagrimo (choro) de felicidade, porque realmente é uma empresa diferenciada. Tenho orgulho de dizer: “Eu trabalho na Hydro, a melhor empresa do mundo”. (choro)
(01:16:44) P1 - Não é só sobre ganhar o dinheiro no fim do mês, né?
R1 - Não.
(01:16:47) P1 – É sobre trabalhar num lugar que o senhor...
R1 - Pessoas.
(01:16:51) P1 - ... acredita, né?
R1 - Você acredita na empresa e nas pessoas. Hoje, muitas pessoas trabalham comigo. Eu sou sincero para eles, digo: “Olha, buscam, a Hydro tem muita oportunidade, buscam o melhor pra vocês aqui dentro da Hydro. Vocês vão conseguir, basta vocês quererem”. Tem muitas pessoas que me encontram aqui e dizem: “Olha meu chefinho!” As meninas me encontram e me abraçam, né, que são de outras áreas já, que já passaram lá pelo meu departamento e eu fico feliz de ver as pessoas crescendo, assim como eu cresci, até onde eu estou aqui. Aí eu falei, eu parei porque eu não quis, eu achei que eu estava... eu tenho tudo que eu preciso nessa empresa. Então, meus filhos estão todos formados, trabalhando, tenho minha casa própria, tenho a minha motocicleta para passear, minha esposa tem um carrinho dela para passear, então está tudo bem. Tem meu plano de saúde, vou me preocupar com o quê? Então, eu tenho uma vida muito feliz, por trabalhar nessa empresa. É uma empresa maravilhosa.
(01:18:00) P1 - O que mais te orgulha?
R1 - De ser empregado deles. Isso é o maior orgulho que eu tenho.
(01:18:09) P1 - Valeu a pena ter vindo, então?
R1 – Valeu muito a pena.
(01:18:15) P1 - Eu vi que o senhor é tão inteirado em tudo que acontece aqui dentro, o senhor que busca essas informações, como é que faz?
R1 - É porque, como eu venho acompanhando desde o início, eu acabo conhecendo todo o processo da empresa e eu busco também. Como eu falei, eu sou curioso, eu quero saber onde eu estou, como eu estou e se aquele ambiente é bom pra mim. Então, eu estou sempre buscando informações que realmente, assim: “Poxa, essa tua empresa aqui é...” e tenho orgulho de falar para os colegas, para alguém que perguntar: “Onde é que tu trabalha?” “Trabalho na Hydro, na empresa maior de alumínio do mundo”. Aí, o ‘cara’: “Porra, é mesmo?” “É, você pode pesquisar aí, que você vai ver que é a maior empresa de alumínio do mundo” “Mas é bom trabalhar lá?” “É a melhor empresa para você trabalhar no mundo, também”. Então, esse é o meu orgulho, de trabalhar nessa empresa.
(01:19:09) P1 – ‘Seu’ Xavier, e quando alguém questiona, o senhor vai lá e defende, se alguém questiona alguma coisa?
R1 - Uma vez, em 2018, eu sofri muito em 2018, porque em 2018 eu estava aqui. Eu vi que não era o que estavam falando. E a orientação era para a gente não se debater, não tentar defender, porque dá vontade. Eu lembro, eu saí daqui, fui lá no Guajará, um bairro que tem lá em Ananindeua, ia ter o aniversário de um amigo e eu cheguei lá, o ‘cara’ estava com o jornal aberto, com uma foto e o meu amigo defendendo a Hydro. Aí ele disse: “Está aqui, chegou o ‘cara’ que trabalha lá”. Aí ele disse: “Está aqui, o jornal está dizendo que é isso”. Aí eu disse: “Amigo, não dá pra... a gente não vai conseguir entrar num consenso, porque você está com um jornal que está te mostrando, né? Só se você trabalhasse lá, que você ia ver que isso aí, que está no jornal, não reflete a realidade. Mas não vem ao caso eu chegar e dizer pra você que isso aqui é real, porque não é, mas não vai adiantar. Vamos comemorar o aniversário do nosso amigo, a gente veio foi pra isso aqui e tal”. E eu tirei, porque não ia valer a pena. Mas por que eu sofri? Porque eu estava vendo o que estava fazendo por questões de interesse pessoal, pessoas manipulando pessoas. Eu lembro que foi o delegado da DEMA. Ele me conhecia, a gente fez alguns trabalhos juntos. O levei no entorno da empresa, ele olhou tudo. Aí eu fui chamado, um dia, para ser testemunha do processo que estava ‘rolando’: “Xavier, nós dois, que já trabalhamos na área de segurança, e aí, o que você me diz daquilo lá?” Falei assim: “Doutor, o senhor andou lá comigo, o senhor andou no entorno, eu lhe levei em todo o local. Aonde a soda cáustica passa, doutor, o senhor sabe que ela queima”. Aí ele achou graça: “Mas alguma coisa aconteceu lá”. Digo: “Doutor, a grama estava verde, o senhor viu. Lhe levei lá onde o pessoal estava dizendo que teve problema”. Aí ele achou graça e bateu, pegou minha mão: “Tudo bem, Xavier”. Quer dizer, sabe, é uma coisa que eles tentam imputar, então eu sofri muito por isso, porque você não consegue. E a Hydro diz assim: “Não, você deixa, que a gente vai responder nos canais adequados e tal”. E eu também passo pro pessoal: “Não adianta a gente brigar, pessoal”. Aí você fica se remoendo, assim.
(01:22:09) P1 – Dói.
R1 - Dói, dói.
(01:22:12) P1 – O senhor ‘veste a camisa’, né?
R1 - Com certeza. Defendo, porque é minha empresa, não é, assim, um emprego. Não, aqui eu não tenho... eu não digo assim: “Ah, eu tenho emprego”. Não. Eu tenho uma empresa onde eu tiro o sustento da minha família, sim, mas é uma empresa que vê muita a parte de pessoas, vê muito o social, né? A gente tem um cuidado muito grande de estar sempre nas comunidades, tratando com as comunidades, ajudando, voluntariado, porque isso é importante, você estar interligado com a comunidade. Mas, às vezes, vem uma pessoa que não tem nada a ver e consegue manipular algumas pessoas, que você sabe, pessoas são manipuladas.
(01:23:03) P1 - E as pessoas que você fez amizade aqui, são o que, pro senhor?
R1 - Aqui dentro da Hydro ou fora?
(01:23:09) P1 - Aqui dentro. Viraram família, amigo de vida, não é?
R1 - Eu tenho... eu acho que eu sou muito conhecido, primeiro porque eu trabalho numa área onde a gente trata com todo mundo, né? Todo mundo aqui se trata assim, como amigo, né? A gente tem, assim, um grupo de colega, pessoas. Não tem aquele grupinho não, todos são parceiros mesmo de trabalho, amigos, vão jogar bola junto, vai para um evento junto, todo mundo ali está se abraçando, está confraternizando, é um clima bom. Aqui a gente não tem aquele negócio assim, de dizer: “Porque eu sou teu líder, você tem que fazer isso”. Ou chefe, porque líder é líder mesmo. “Eu sou teu chefe, tu tem que fazer isso”. Não, aqui a gente cumpre, desde o - no meu caso, eu sou da área de vigilância - o vigilante que está lá, na ponta, ele cumpre um procedimento da empresa que tem, ou é respaldo da gerência sendo da minha área, ou é da diretoria do vice-presidente. Então, ele faz cumprir aquilo ali, é lei. Está cumprindo a norma da empresa e ninguém vai questionar, porque é norma. Então, a gente tem que se preocupar, por isso. Todo mundo em harmonia. Às vezes o ‘cara’ tem dúvida, aí me liga: “Xavier, eu tenho dúvida sobre isso”. Vamos esclarecer, está tudo certo. “Ah, mas eu queria fazer diferente” “Se não estiver contra a lei, a gente pode verificar, vamos falar com o fulano, ciclano, vamos mudar, se o procedimento não está legal, vamos alterar”. Existe toda essa...
(01:24:50) P1 - Você me falou dos momentos de mais desafio que o senhor passou aqui dentro, né? E quais são os momentos que mais te marcaram, que aí você guarda na memória, nessa história toda? São muitos anos.
R1 - O primeiro aniversário da Alunorte, eu não vou conseguir lhe dizer o ano. Mas o primeiro aniversário que nós festejamos foi lá no Clube 1, antigo Clube 1. A Alunorte fez uma churrascada lá, pros empregados. E eu era da parte de vigilância e também tinha um pouco da logística comigo, na época, que ainda não tinha o Departamento de Logística. Então, a gente tinha que organizar esse evento. E eu participei mesmo, ativamente. Foi uma festa maravilhosa, assim, para mais de cinco mil pessoas. Então, esse evento foi fantástico. E depois disso, eu acredito que foi em 2013, foi o show do A-ha. Foi muito desafiador, porque também eu estava na parte da segurança, organização, contato com Bombeiros, Polícia Militar etc, vendo liberação do Cabana, isso foi feito no Cabana e lá nós colocamos 12 mil pessoas, né?
(01:26:04) P1 - E era festa de quê?
R1 – A-ha é uma banda norueguesa.
(01:26:08) P1 - Mas era festa de fim de ano?
R1 - A festa do A-ha foi aniversário da Hydro, também. Festa muito bonita.
(01:26:17) P1 - E o show, foi bom?
R1 - Só foi, ótimo. Muito bom, mesmo. Nesse evento do A-ha, eu lembro que eu ganhei um DVD - na época já era DVD - da banda. E aí eu levei esse DVD lá pra casa, eu tinha comprado um aparelho do DVD. Minha filha devia ter uns 14 anos. A gente estava brincando lá em casa, o ‘cara’ passou lá em casa, alguém que me conhecia e disse: “Eu vim buscar o DVD do seu pai,” - falou meu nome – “do Xavier pra eu limpar. Pega lá, pra mim”. Ela pegou: “Agora pega o aparelho, o DVD mesmo. Agora pega aquele DVD” - eu tinha mostrado o DVD lá, na rua. Eu sabia que era alguém de lá que pegou – “Pega lá o DVD do A-há”. Aí ela deu o meu DVD (risos) e o ‘cara’ sumiu. Quem foi, minha filha? Não sei. A mãe dela ficou ‘tiririca da vida’ e eu perdi o DVD do A-ha. Mas foi um momento muito marcante a vinda deles aqui e também essa primeira festa que nós fizemos grande, mesmo, no aniversário da Alunorte, que no Clube 1, teve o churrasco. E ultimamente nós estamos tendo aí o Fórum de Líder, que veio o Cafu. Eu briguei com a Silvia, porque não me disseram que era o famoso que vinha e, na hora... sorte que não vazou, né? Que, se vaza, aí vinha muita gente ali, pra querer autógrafo do Cafu, que Cafu é muito conhecido no mundo do esporte, né? O Tande também. Então, são momentos assim, que... pra você que, no meu caso, acompanhei o Cafu e o Tande jogando, poxa, pra mim aquilo ali é muito marcante, muito emocionante. O do Zé Roberto não pôde participar, porque foi justamente quando meu irmão faleceu. Mas são momentos, assim, ímpares, que você não esquece.
(01:28:21) P1 - Eu acho interessante que o senhor tem um cargo que muitas vezes as pessoas pensam que é alguém bravo, fechado, né? Segurança. E não é isso.
R1 – Não. Porque antigamente a segurança, usava muito aquele negócio: “Ah, o ‘cara’ tem que ser bravo, tem que ser isso”. Não, hoje a gente tem que ter diálogo, né? Conversar, entender, saber tratar as pessoas, né? E isso que faz a diferença, né? A pessoa ser humilde, respeitosa, respeitar as pessoas e com certeza todo mundo vai se tratar bem. Não tem aquela de dizer assim: porque eu sou negro, sou branco, eu sou do sexo feminino, sou LGBT, não. Pessoas são pessoas, nós temos que tratar as pessoas como elas são, independente do que seja.
(01:29:14) P1 - Isso o senhor aprendeu aonde?
R1 - Por eu ser negro, é uma história até engraçada, eu tive alguns preconceitos mesmo. Primeiro quando eu fui, quando eu servi. Não que as pessoas falavam para me ofender. Tinha um oficial, era carioca, Tenente Ronel, ele era bem negro. Então, como as pessoas queria chamá-lo de negro, fazer alguma coisa para ele, mas não podiam, por ele ser um oficial, falavam para mim, quando eu estava próximo dele. Ele ficava: “Negão, negão, não sei o quê”. Para mim ele olhava assim, eles me chamavam de negão. Tanto é que muita gente me chama de negão até hoje. Mas quando eu trabalhei na Albras, tinha um ‘cara’ que era da fiscalização, ele era bem branco e ele contava umas piadas, chamava muita gente. Aí ele dizia: “Olha, quando Deus fez as pessoas, fez uma piscina. Aí o ‘cara’ caía na piscina, saia limpinho lá. Todo mundo era preto, saia branco. Quando chegou a vez do Xavier, não tinha mais água. Aí só aquele filetinho, só o pó. Aí mostra a mão dele aí. Mostra a mão aí, Xavier”. Quer dizer, então isso eu sentia na pele, né? O ‘cara’ diz assim: “A mão dele é branca. Só a mão dele”. Então, eu disse: “A gente tem que respeitar as pessoas como elas são, não importa o que elas sejam. Tem que respeitar como elas são”. Mas eu também não ia brigar, não ia... eu achava que não valia a pena. Eu ia reclamar, eu ia fazer o quê? As pessoas ainda iam aumentar aquela... porque quando você vai se digladiar, piora a situação. Eu simplesmente ignorava. Hoje eu não tenho mais negócio de preconceito, assim, alguém chegar e... eu não percebo mais isso, mas ainda existe. E eu tento mostrar pras pessoas que a gente tem que, independente do credo, da raça, de cor, de sexualidade, tratar todo mundo igual, porque nós somos pessoas. Você não tem que chegar e olhar um colega, porque ele usa o cabelo, pintou o cabelo de vermelho. Ele gosta, é um desejo dele. Ele raspou a cabeça. E daí? O que tem a ver com isso? Porque ele não gosta de namorar com sexo oposto. Sim, problema dele. Então, tem toda essa... e a Hydro também, é uma coisa que eu acho legal, a diversidade, né? Você tratar todo mundo com igualdade, independente de raça, cor, da opção sexual, tratar todo mundo igual. É muito bacana, da Hydro.
(01:32:18) P1 - Isso o senhor vê na prática?
R1 - Na prática. Sofri na pele, né?
(01:32:25) P1 - Quais são os seus principais valores e aprendizados, nesses anos todos?
R1 - Olha, a Hydro tem três palavrinhas que dizem tudo: cuidado, coragem e colaboração. Então, aqui já diz tudo, você tem que ter coragem, pra enfrentar o problema da vida. Você tem que ter cuidado com as pessoas, cuidado com o meio ambiente, cuidado com os valores, né? Então, isso é... e você também tem que colaborar, de uma forma geral, ajudar as pessoas, orientando. Não digo colaborar em financeiro, não, é orientando. Às vezes a pessoa precisa só de um apoio seu, moral. Você chega lá: “Poxa, como é que faz?” “Olha, você pesquisa ali, faz isso, você vai conseguir”. Incentiva as pessoas a buscarem sempre o melhor. Então, essas três palavrinhas são chaves.
(01:33:24) P1 - E senhor passou isso para os seus filhos?
R1 - Com certeza. Eu tenho uma história bacana. Eu falo muito. Esse meu filho mais novo completou 24 anos em maio. Aí ele vinha no carro, ele era bebê, devia ter uns cinco anos. E vinha no carro eu, ele, a minha sogra e minha esposa. Minha sogra saiu de casa tomando não sei se foi café ou água, num copo e ela baixou o vidro do carro e jogou, na Mário Covas, o copo. Aí ele: “Pai, pare o carro aí”. Aí eu: “O que foi, meu filho?” “A vovó jogou o copo na rua, papai. Vai pra dentro do esgoto, vai entupir o esgoto, a água vai voltar, vai entupir nossa casa, pai”. Aí eu: “a senhora jogou?” “Eu joguei, meu filho, é só um copinho”. Eu digo: “Meu filho, não dá para parar, infelizmente, na Mário Covas, o trânsito”. Aí eu fui conversando com ela, disse: “Minha sogra, não pode jogar, o que ele está falando é verdade”. Aí ele: “É, vó, não pode, vó”. Sabe, então, a gente... eu pegava, na época tinha o... eu não vou conseguir lembrar agora o nome do jornal impresso. A gente tinha um jornal impresso aqui, que ele tinha as ‘pegadas’ ambientais, inclusive a parte também de classificados. Então, eu levava para casa e sempre mostrava para eles: “A gente tem que cuidar do meio ambiente, tem que cuidar dos animais, a gente tem que cuidar disso. Olha o que está escrito aqui”. Sempre quando eu via ou depois que melhorou a tecnologia, que começou a ter já informação mais digitais, eu passava para eles. Eu passo até hoje. Quando tem uma matéria bacana da Hydro eu vou lá no grupo da família e mando, para eles verem o que gente faz, realmente.
(01:36:17) P1 - Eles já vieram aqui?
R1 – Já, já conheceram pessoalmente.
(01:35:22) P1 - E aí, como é que foi?
R1 - Ah, muito emocionante. Eu queria trazer os dois. Um já trabalhou aqui, que eu falei. Ele hoje presta serviço, porque ele está na parte mais administrativa, fica lá fora. O outro, esse mais novo, eu disse para ele: “Meu filho, meu sonho...”. Ele queria ser... fazer História. Eu disse: “Meu filho, pode fazer História, papai não vai se incomodar com isso, mas por experiência, se eu fosse você, faz um curso primeiro que tu vai ganhar dinheiro, depois tu faz História, porque aí tu já vai estar estabilizado, História é pra... tu não vai ser professor, está bom?” Aí ele ficava assim. Aí eu comecei a incentivá-lo, o levei pra um amigo meu que trabalha aqui na Hydro, trabalha até hoje, o Zé Luiz, falar sobre a parte elétrica. O Zé Luiz trabalhou na Eletronorte, hoje trabalha aqui conosco, é gerente de elétrica. O Zé Luiz conversou com ele: “Ah, elétrica é muito boa”. Aí eu conversei com um outro amigo, que hoje é professor, mas ele é da mecânica, né? É professor do Senai. Aí conversou também com ele, sobre a parte mecânica, ele ficou encantado, né? Aí ele: “Pai, decidi fazer elétrica e depois eu faço História” “Pronto, meu filho, agora tu está escolhendo uma coisa boa. Mas tem outra: tu vai estagiar lá na Hydro, com o papai. E eu espero que um dia tu seja meu chefe. Chegar assim e dizer: “Pai, eu sou seu chefe hoje”. Que não é chefe, é líder, né? Aí ele: “Ah, pai, legal”, né? Eu digo: “Vai, meu filho, você vai conseguir”. E aí ele começou a estudar e depois ele viu que ele não queria trabalhar, assim, da parte elétrica. Aí ele disse: “Não, pai, eu não gosto de energia não, eu gosto... eu não quero esse lado não, eu quero... eu vou pra outra parte, vou ser desenvolvedor” “Está bom”. Aí ele está trabalhando na Ericsson, ele gosta muito, eles gostam dele lá. Mas o meu sonho era vê-lo trabalhando aqui comigo, né?
(01:37:24) P1 - Aí ele foi pro outro caminho.
R1 - Pro outro caminho. A parte agora é de software etc.
(01:37:29) P1 - E me conta quando é que você conheceu essa sua atual esposa, qual é nome dela, o que ela faz?
R1 - Alessandra. Foi engraçado, eu fui numa... eu estava com minhas duas filhas, saindo de um evento, desse que eu falei que a gente se junta anualmente, o ex-pracinha, né? E nós fizemos, nós nos encontramos lá no evento, fizemos lá um evento e terminou, era de dia, uma churrascada e o maranhense gosta de reggae, né? E lá em Belém tem um lugar que tem reggae, que chama-se 48. Aí minhas filhas: “Pai, embora lá no reggae?” Eu: “Embora”. Aí peguei duas filhas e uma amiguinha delas e fomos embora, lá para o reggae. E chegou lá eu conheci a Alessandra, né? Começamos a conversar. Na verdade, ela me deu o número dela e no outro dia eu liguei para ela, ficamos conversando, meio que amigo e assim começou o namorinho, isso em 2016.
(01:38:31) P1 - Estava sozinho...
R1 - Sozinho, é. Aí ela conheceu minhas filhas, viu que eu não era um ‘cara’ daqueles... aí ficou tudo certo.
(01:38:39) P1 - E ela é de Belém?
R1 - Ela é de Belém.
(01:38:42) P1 - E aí começou a namorar e foi morar junto?
R1 - Aí fomos morar junto e casamos.
(01:38:46) P1 - Casou no papel e tudo?
R1 - Casamos.
(01:38:47) P1 - Teve festa?
R1 - Teve festa, festa de arromba.
(01:38:50) P1 - É?
R1 - É, dança, dançamos o reggae na festa do casamento, muito bacana.
(01:38:56) P1 - Que legal!
R1 - E é uma parceira e tanto, que viaja comigo, quando a gente tira as férias, a gente sai viajando aí, por esse nordeste, eu gosto muito do nordeste, né? Viajando aí, pelo nordeste.
(01:39:08) P1 - E ela na garupa?
R1 - Dessa vez, essa última agora a gente vai de moto também, mas dessa vez agora eu fui de carro. Mas a gente viaja de moto também, ela gosta.
(01:39:18) P1 - E ela trabalha com o quê?
R1 - Ela é podóloga. Tem um espaço que ela tem, anexo à nossa casa. Ela atende só com agendamento. Ela atende muitas pessoas. Não é por ser minha esposa, mas ela tem uma especialidade para a parte de pé de criança, de bebê, que é um negócio assim... podólogo corta a unha ali, a unha encravada, calosidade, esse negócio todo, né? E o pessoal a indica para cuidar de bebê. De vez em quando alguém liga, marca para levar um bebê lá, que está com a unha encravada e o hospital manda procurar uma podóloga e a indicam.
(01:39:58) P1 - E o que ela acha da sua vida aqui, dessa carreira?
R1 - Ela gosta demais. Uma vez, ela até disse pra mim: “Embora morar pra Barcarena? Eu acho que lá tem podóloga”. Eu disse: “Pode ser, podemos pensar em voltar pra Barcarena”. Só não voltamos morar em Barcarena, porque a mãe dela mora com a gente, né? Ela já está idosa e eu disse: “Não, vamos ficar aqui pro Belém, que tem mais recursos pra ela, né? O plano dela é Unimed, Unimed não atende Barcarena. Não tem a mesma complexidade”. Atende, mas não tem a mesma eficiência de Belém, os hospitais. Por isso que ela não veio, mas ela gosta de Barcarena também. De vez em quando ela vem aqui, comigo.
(01:40:42) P1 - Às vezes é um futuro, né?
R1 - Sim, quem sabe?
(01:40:48) P1 - E a aposentadoria, está longe?
R1 - Olha, em termos de trabalho, eu já tenho... eu trabalho já há 36 anos, de carteira assinada. Desses 36, 35 são aqui. Tenho orgulho de trabalhar 35 anos aqui. Mas ainda não tenho idade, tenho 58 anos. Eu estou naquela do ágio. Eu acho que com sessenta, 62 eu conseguiria me aposentar, mas eu não pretendo me aposentar, como eu te falei, né? Eu acho que eu não sei se eu conseguiria ficar longe da Hydro, assim. Eu tiro 15 dias de férias e eu já fico agoniado. Nos últimos dias: “Não vai sair aí não”, né? Porque não pode ligar, né? (risos) Nos últimos dias de férias, eu já fico olhando no celular, leio os e-mails, quem mandou mensagem, quem não mandou, se aconteceu algum problema. Por trás eu ligo pra um ‘cara’ que é de confiança minha: “E aí, ‘cara’, está resolvida aquela situação? Está tudo certo? Tem algum problema?” “Não” “O que está sendo feito? Ah, legal, então está bom”. Ele não me liga, mas eu que ligo pra ele. A gente fica com aquela curiosidade, quer saber o está acontecendo, né? Antes eu tirava trinta dias de férias, depois hoje eu só tiro vinte, não consigo tirar mais trinta.
(01:42:09) P1 - Não acredito.
R1 - É sério. Aí já dá aquela vontade de voltar, aquele negócio. O pessoal diz: “Você não cansa, não?” “Não canso, não”.
(01:42:17) P1 - Qual que é a parte do dia mais legal?
R1 - É quando eu chego na empresa pra trabalhar e vejo que está tudo funcionando normalmente. Não só na minha área, mas como em toda a empresa, que está tudo tranquilo, não tem nenhum problema. Então, isso eu fico muito feliz de chegar e está tudo normal. E a gente consegue tirar, trabalhar o dia tranquilamente, sem deixar as pessoas estressadas, sem estar pressionando. Isso é ótimo.
(01:42:46) P1 - Você tem um sonho ainda?
R1 - Meu sonho é só viajar mesmo no Brasil. Eu não tenho sonho de viajar fora do Brasil, incrível que pareça. Mas o Brasil eu quero desbravá-lo todo, numa motocicleta.
(01:43:01) P1 - Qual que o próximo destino?
R1 - A minha esposa quer ir em Gramado. A gente está vendo aí se vamos conseguir já, nesse próximo ano.
(01:43:13) P1 - Você já tem neto?
R1 - Tenho um neto, Miguel.
(01:43:16) P1 - Quantos anos?
R1 - Tem dez anos. É filho da minha filha mais velha.
(01:43:20) P1 - E aí?
R1 - Ele mora hoje numa cidade chamada Viseu, que pertence aqui o Pará. Está vindo agora mês de julho passar as férias comigo. A minha filha trabalha lá, é professora lá e aí ele foi embora morar com ela e o marido dela, que o marido dela e a família dele é de lá. Mas só tenho esse netinho, por enquanto.
(01:43:43) P1 - É bom ser vô?
R1 - Ah, é bom demais. Agora eu tô sendo o avô de um cachorrinho. Adotei um pinscherzinho deste tamanhinho, que a mulher me liga, chamada de vídeo, pra mostrar o que ele está fazendo, rasgando nosso sapato. Comprei uma caminha pra ele, aí a cama é cor de rosa, né? Ela disse: “Mas por que tu comprou cor de rosa?” “É diversidade”. Mas não foi não, é porque era mais barato. (risos) Mas ele já pegou a caminha, que é aquela coisa maciozinha, já roeu tudo, né?
(01:44:14) P1 - Como é que chama o cachorro?
R1 – Zenzo.
(01:44:17) P1 - Zenzo? É teu?
R1 - Não, é do... na verdade, eu digo que sou avô, é do menino, eu sou avô dele.
(01:44:25) P1 - Mas é quem cuida.
R1 – É. E ele gosta de mim. Quando eu chego, ele está lá atrás, ele me vê, ele vem correndo, ele chora, chora, se eu não conseguir pegá-lo logo, aí eu o pego, o abraço, aí ninguém encosta em mim, mais. Qualquer pessoa que encostar, ele quer morder. Então, esse é o meu neto, agora.
(01:44:45) P1 - E é bom, né?
R1 - É bom demais. Eu gosto de animal, né? Eu tenho três cachorros, com ele agora quatro. Tem uma (01:44:52) desse tamanho, tem um vira-lata, tem outro pinscher, maiorzinho. E esse é um pouco menor.
(01:44:58) P1 - Mas ele é o xodó.
R1 - É porque ele é bebezinho, ele está com dois meses. O outro já tem 14 anos, o mais velho, já está velhinho.
(01:45:07) P1 - E aí, quando dá, você vai lá visitar sua mãe?
R1 - Sempre que eu tenho uma oportunidade eu vou lá. Final de semana, assim. Eu só não tô indo esses dias agora, porque a estrada lá está um pouco ruim, mas quando a estrada melhorar eu sigo pra lá. Um feriado, um final de semana, eu vou lá rapidinho, visitá-la. Ela gosta. Minha mãe tem 81 anos, vai fazer 81 agora, em agosto. Até dar um girinho lá, no aniversário dela, de novo. Em função da... porque ela pode se lembrar do que aconteceu com meu irmão, que a gente esteve lá no aniversário, no ano passado. Mas ela tem 81 anos, vai fazer 81 anos e você não dá essa idade para ela. Cria galinha, ela gosta muito de galinha. Ela não come galinha dessas que a gente compra, criada em granja. Ela quer criar galinha dela, para ela comer. Ela tem a horta dela, que ela planta lá o cheiro verde, a alface e assim sucessivamente. Ela se alimenta daquilo. Ela não come carne bovina, mas ela não come porque ela não gosta, mesmo. É só frango, peixe e açaí. Se eu for daqui pra lá e não levar açaí... a minha moto tem três baús grandes. Um, o maior, é só a roupa da minha esposa. Um outro menorzinho é minha roupa, que sobra, eu ainda ‘boto’ o sapato dela junto. E o outro é só o açaí da minha mãe. (risos) Chega lá, se não levar esse açaí dela, ela fica muito brava.
(01:46:30) P1 - Não apanha mais, mas fica brava.
R1 – É. Aí, quando gente vai pra lá, eu digo: “Eu vou tomar uma cerveja. A minha esposa diz: “Dona Neusa, olha, o seu filho está dizendo que vai tomar cerveja”. Ela diz: “Vem pra cá, moleque, com negócio de cerveja pra ti ver se não vai apanhar”. (risos) Aí, pra tomar, tem que ser escondido, não dá. Ela não deixa, mesmo.
(01:46:52) P1 - E ela fala dessa sua vida pro lado de cá, o que que ela acha disso?
R1 - A mamãe gosta muito da... porque eu conto pra ela. A minha filha, que hoje mora lá, foi criada aqui comigo, estudou aqui, conhece, então também fala. Então, ela gosta muito. Ela disse: “Poxa, essa empresa de vocês lá é muito boa, né?” Eu digo: “É, minha mãe, uma das melhores empresas do Brasil pra se trabalhar, do mundo”. Aí ela: “Legal”. Eu digo: “A senhora não quer vir morar pra lá, comigo?” Ela diz: “Não, daqui eu não saio”. Porque está lá no interior, se criou ali, né? Então, não dá pra tirá-la de lá, também, né?”
(01:47:28) P1 – Xavier, um menino que cresceu lá em... como é que chama?
R1 - Cururupu. Nasci no interior do Maranhão, em Cururupu e vim, estou hoje em Barcarena.
(01:47:41) P1 - Com essa carreira, com essa vida construída.
R1 - Muito feliz, por sinal.
(01:47:46) P1 - Que bom! Tem alguma história que você queria contar, que a gente não contou?
R1 - Tem uma história que... um profissional, né? É uma pessoa que me incentivou muito aqui, chama-se Glaucio Mendonça. (choro) Não consigo falar.
(01:48:10) P1 - Ele está vivo? Não?
R1 – Deixa pra uma próxima história, essa.
(01:48:19) P1 - Respira. É bom ter quem acredita na gente, não é? Isso vai ficar registrado na história de trinta anos. Fale do seu Glaucio.
R1 - É difícil. Quando ele veio pra Barcarena, ele trabalha na Vale. Ele veio pra Hydro, na verdade. Aí acredito que foi em 2016 ou 2017 que ele veio pra Hydro. E ele veio em Barcarena, queria me conhecer. Ele era do HSE, mas de Belém. Aí ele disse: “’Cara’, uma pessoa mandou te procurar aqui, porque gosta muito de ti. E ele me deu boa referência tua. É um ‘cara’ que foi diretor da Vale, o vi uma vez só, pessoalmente, mas essa pessoa, num evento que teve aqui, a gente resolveu esse evento e através disso essa pessoa conseguiu, na época, transformar esse evento numa situação positiva para a empresa e a empresa montou o Departamento de Segurança através das informações que ele levou, de prejuízo que foi evitado etc”. E aí o Glaucio veio e falou pra mim e dizia. Aqui muita gente me chama de Xavier, outros de comandante. Eu chamo todo mundo de comandante também, é o jeito de tratamento. Independente de ser operador, ou vice-presidente, todo mundo eu chamo de comandante e o pessoal acaba também me chamando de comandante. Aí ele disse: “Comandante, ele mandou te dar um abraço aqui”. Aí tirou uma foto minha junto com ele e mandou pra essa pessoa e ele começou a conversar comigo, já particular, a gente ia pra Belém, coisas pessoais. Ele disse: “Por que tu não faz o inglês? Por que tu não...” “Não, Glaucio, eu já tô acomodado” “Não. Tu vai ler um livro, eu vou te dar um livro” “Eu gosto de ler livro, eu leio muito livro” “Não, mas eu vou te dar um livro”. Aí ele dava um livro pra eu ler e dizia que eu dissesse depois o que é eu tinha entendido do livro. É o jeito dele, assim, de ser. Eu passei a admirar muito aquela pessoa, o Glaucio. Aí eu digo: através dele eu fiz uma pós-graduação. Aí ele disse: “’Cara’, tu não pretende, assim, porque tua área é muito ampla, sabe? Não é só patrimonial, tua área também tem a parte empresarial, faz uma Gestão Empresarial, alguma coisa assim, sabe? Então, eu me tornei a ser uma espécie... ele se tornou um conselheiro meu, particular. Infelizmente, ano passado ele se foi, repentinamente. Nós... ele tinha um problema de saúde, estava fazendo tratamento e nós tivemos uma reunião, ele era muito metódico com as coisas, tinha que ser. Ele via, assim, uma letra que estivesse em um formato diferente de uma outra, ele diz: “Olha, essa não é a mesma fonte não, essa fonte está errada”. Então, ele via esses detalhes, mas eu gostava muito disso dele, né? E aí nós tivemos uma reunião numa sexta-feira, no final do expediente, que era um relatório que ia ser apresentado para a diretoria numa segunda-feira, mas não seria nem ele que ia apresentar, porque ele ia se afastar, para fazer a cirurgia. Aí ele disse: “Não se preocupa, não. ‘Bora’ olhar aqui” “O ônibus vai sair” “Não, agora não”. Eu e mais outros colegas (01:52:39) o relatório. E aí, quando foi na segunda-feira, nós tivemos a triste notícia que ele fez a cirurgia, mas não conseguiu e morreu. Muito triste. Nós ficamos muito abalados, porque ele era muito querido. Só tinha um defeito que eu dizia, que ele era flamenguista. Ele chegava lá: “E teu vasquinho, teu vasquinho?” Porque eu sou vascaíno e ele era flamenguista. O Vasco, ultimamente, não é time mesmo, é muito ruim. Mas aí ele deixou um legado, não só para mim, mas para a área em que eu faço parte, HSE. E pra Alunorte, mesmo. Detalhes que ele, tipo assim: “Pra eu fazer desenvolver essa tarefa, eu preciso de quê?” E ele ia ver aquele detalhezinho que tu tinha que fazer, para ti não se acidentar, não machucar as pessoas, entendeu? Pesquisava, ele pesquisava muito. Lá nos Estados Unidos aconteceu um acidente, porque o ‘cara’ estava fazendo assim. “Não, temos que mudar, vamos ver outra forma. Em tal país os ‘caras’ fazem diferente”. Então, ele tinha esses detalhezinhos, então ele deixou esse legado, né? E uma admiração muito grande. É isso.
(01:54:04) P1 - É um pai, na empresa.
R1 - Glaucio Mendonça.
(01:54:10) P1 - Fica homenagem, então, pra ele. E o seu legado, hein?
R1 - O meu legado eu acho que é incentivar as pessoas a ser honesto. A primeira coisa de tudo é ser honesto. Nós precisamos, o Brasil precisa, o mundo, as pessoas confiarem uma mais na outra. Eu acho que eu tento sempre mostrar pra pessoa honestidade em primeiro lugar. Você tem que fazer tudo sem ofender, sem se apropriar. É o que é seu. Não pega o que é dos outros. Não ofenda a pessoa. Eu acho que esse é o legado que eu espero deixar na empresa.
(01:55:03) P1 - Para você, o que significa participar desse... você foi escolhido, homem - no meio de tanta gente, tem tantas pessoas - para estar nesse projeto. Como é que é contar a sua história?
R1 - Muita felicidade. Quando teve o evento dos trinta anos, aí o meu gerente disse: “Tu recebeu o e-mail para participar do evento de trinta anos?” Eu digo: “Não recebi, não, mas eu vou participar, que gente que organiza a segurança lá e tal” “Mas tu não recebeu nenhum e-mail?” “Não, não recebi, não” “Porque algumas pessoas iam ser convidadas” e eu: “Não, mas eu não tenho trinta anos na Alunorte. Eu só tenho... iniciei em 2008, então não tenho idade. Eu tenho mais de trinta, né, que eu iniciei na profissão, mas eu era prestador de serviço”. Aí, quando eu recebi aquele e-mail da Silvia, poxa, pra mim é demais. É demais. (choro) Sou muito emotivo, né?
(01:56:4) P1 – (risos) Foi escolhido, sim! (risos)
R1 - É uma emoção muito grande. Eu acho que é por isso que eu amo essa empresa, porque ela faz tudo para deixar a gente confortável, né? A pessoa ter liberdade. Aqui a gente pode dizer: “Você tem liberdade de expressão, você pode opinar, você pode dizer o que você acha, sem ser punido lá na frente”. Eu já trabalhei em outras lideranças, antes de ser da Hydro, que existiam muito temores. E hoje não. Na Hydro eu posso discordar se o vice-presidente da empresa falar uma coisa ou sugerir uma coisa que não esteja de acordo, eu posso opinar, chegar pra ele: “Olha, não é assim não, é dessa forma. A regra, norma, esse é o certo”. Então, hoje a gente tem essa liberdade. E é acatado, quando você fala. Você pode chamar a atenção das pessoas. Não chamar a atenção, assim, mas se a pessoa estiver cometendo algum deslize. Às vezes as pessoas, todos nós somos seres humanos, cometemos algum deslize, em algum momento. Você pode chegar e dizer: “Não pode fazer isso, porque...” e explicar o porquê que não pode, né? Independente de função. Um dia desses eu estava num DDS, lá na minha área, então era a semana da queda do mesmo nível. E aí eu dei um exemplo: agora voltou a ter o jornal impresso na Alunorte, o Se Liga, né? Aí eu peguei o Se Liga lá na portaria e vim andando, olhando aqui, aí eu me ‘toquei’: “Poxa, está errado, porque a gente diz que não pode andar falando no celular, mas você pode andar olhando o jornal? Você vai se distrair e vai bater”. Então, durante o DDS falei para minha turma lá: “Pessoal, a gente fala tanto em segurança, mas a gente comete deslize, eu cometi. Eu vinha com o jornal na mão, aí eu achei um tema importante, eu fiquei olhando, esqueci que eu estava caminhando. Eu poderia, nesse momento, ter tropeçado, caído e me machucado. Então, a gente tem que ter muito cuidado”. É dar exemplo, para as pessoas entenderem também e ser exemplo, nós temos que ser exemplo. Independente de função, a gente tem que ser exemplo para a empresa e para as pessoas, né? Porque, na verdade, a gente tem que ser exemplo para as pessoas, porque as pessoas que fazem a empresa. Se eu for exemplo pra uma pessoa, ela vai ser exemplo para outra e assim nós vamos multiplicando e se torna um país mais justo, mais honesto, mais respeitoso.
(01:59:28) P1 - E hoje, como que foi abrir o seu baú de memórias aqui, para a gente?
R1 - Foi difícil, viu? Muito difícil, porque a gente... na verdade, eu achava assim que vocês iam me dar um roteiro, eu ia ler aquele roteiro e ia responder. Mas vocês fizeram, em algumas vezes, eu lagrimar. É bom, muito bom.
(01:59:49) P1 - É um difícil bom.
R1 - Um difícil bom, gostoso, assim, te relembrar, até mesmo buscar a memória, muito bom.
(01:59:57) P1 - Reconhecer a própria história.
R1 – É verdade.
(02:00:00) P1 – Ter orgulho da própria história.
R1 - E a nossa história acaba se misturando com a da empresa. Eu lembro que fui num evento, no Samaúma, era um evento de liderança, mas eu estava só como segurança, na época. E tinha um rapaz, era empregado nosso. Passei duas ‘saias justas’ desse tipo. Ele é da comunidade, aí ele foi contar a história dele lá e, no meio de contar história ele disse assim: “Meu avô tinha um sítio que ficava aqui atrás da Alunorte, inclusive o Xavier me ‘botava’ pra correr lá, porque eu ia pegar as frutas, entrava dentro da Alunorte e ele me ‘botava’ pra correr, eu ainda era criança”. Aí eu fiquei assim. Outra vez tinha um evento de comunidade lá no CDT. Uma comunidade foi chamada pra visitar a Alunorte e lá um dos líderes comunitários, um dos comunitários foi lá pra frente, falar e falando sobre a Alunorte, e ele disse: “Eu trabalhei aqui, é uma empresa muito boa e tal, só tive uma vez que o Xavier me chamou lá na sala fria”. Aí eu fiquei assim. “Mas eu não fiz nada de errado, tanto é que eu tô aqui, né, Xavier?” Aí eu: “Tá”. Não sei por que eu chamei, o que foi que aconteceu, mas sala fria é quando você vai conversar com uma pessoa, porque alguma coisa está errada. Eu que fiquei errado no meio daquela multidão de comunitários, ele disse que eu o chamei na sala fria, mas é engraçado, até.
(02:01:32) P1 - É o que você disse: a sua história se confunde com a história da...
R1 - É uma mistura, assim, porque você está... e de repente ele disse que eu o chamei na sala fria. Fiquei pensando. É isso.
(02:01:43) P1 - Obrigada, Xavier.
R1 - Eu que agradeço, viu?
(02:01:47) P1 - Muito bom te ouvir.
R1 – Essa aí foi... final de semana...
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