Projeto 30 anos Alunorte
Entrevista de Patrícia Thompson Lima da Conceição Sardinha
Entrevistada por Lígia Scalise
Barcarena, 6 de julho de 2025
Transcrita por Selma Paiva
(00:20) P1 - Patrícia, eu vou pedir para você começar se apresentando, o seu nome inteiro; o dia, mês e ano e cidade que você nasceu. Fala sempre olhando para mim.
R1 - Bom, meu nome é Patrícia Thompson Lima da Conceição Sardinha. Eu nasci no dia 10 de novembro de 1975, em Belém, na Maternidade do Povo.
(00:43) P1 - Quando você nasceu, como que foi o parto? Alguém te contou como foi o dia do seu nascimento?
R1 - O dia do meu nascimento foi bem complicado. Minha mãe sempre fala, né? Que com sete meses ela caiu do tronco de uma árvore e bateu a barriga. Então, quando eu nasci, ela teve as dores de parto, mas o médico dizia que ela não estava grávida, que ela estava com uma gravidez falsa, que não conseguia escutar a criança e sentir a criança. E ela disse que não, que ela tinha certeza de que ela estava grávida. E aí eles resolveram botar no oxigênio. E aí, quando eles oxigenaram, meu coração começou a bater mais forte. E aí eles fizeram o parto. Ela teve o parto cesariano. E ela lembra que, quando eles tiraram de mim, aí eles apertaram, não sei como foi que faz a criança chorar, né? E aí ela disse que ela só via os braços, como se fosse aranha. (risos) Bem fininha, bem pequenininha. Eu nasci tipo raquítica, né? E com a cabeça de um lado deformada, devido ao baque. Ela entende que foi por isso.
(01:56) P1 - Você nasceu de quantos meses?
R1 - Eu estava com sete meses.
(01:59) P1 - Prematura?
R1 - Era, sete meses. Não, eu nasci com nove. Ela caiu com sete. E aí ela conseguiu finalizar a gestação, mas sempre com muitas dores, sempre passando mal e indo para o hospital. E uma dessas vezes ela teve a dor do parto. Ela acha que eu nasci antes do tempo, porque era para eu nascer depois. Eu nasci nesse dia, 10 de novembro. E aí ela disse que...
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Entrevista de Patrícia Thompson Lima da Conceição Sardinha
Entrevistada por Lígia Scalise
Barcarena, 6 de julho de 2025
Transcrita por Selma Paiva
(00:20) P1 - Patrícia, eu vou pedir para você começar se apresentando, o seu nome inteiro; o dia, mês e ano e cidade que você nasceu. Fala sempre olhando para mim.
R1 - Bom, meu nome é Patrícia Thompson Lima da Conceição Sardinha. Eu nasci no dia 10 de novembro de 1975, em Belém, na Maternidade do Povo.
(00:43) P1 - Quando você nasceu, como que foi o parto? Alguém te contou como foi o dia do seu nascimento?
R1 - O dia do meu nascimento foi bem complicado. Minha mãe sempre fala, né? Que com sete meses ela caiu do tronco de uma árvore e bateu a barriga. Então, quando eu nasci, ela teve as dores de parto, mas o médico dizia que ela não estava grávida, que ela estava com uma gravidez falsa, que não conseguia escutar a criança e sentir a criança. E ela disse que não, que ela tinha certeza de que ela estava grávida. E aí eles resolveram botar no oxigênio. E aí, quando eles oxigenaram, meu coração começou a bater mais forte. E aí eles fizeram o parto. Ela teve o parto cesariano. E ela lembra que, quando eles tiraram de mim, aí eles apertaram, não sei como foi que faz a criança chorar, né? E aí ela disse que ela só via os braços, como se fosse aranha. (risos) Bem fininha, bem pequenininha. Eu nasci tipo raquítica, né? E com a cabeça de um lado deformada, devido ao baque. Ela entende que foi por isso.
(01:56) P1 - Você nasceu de quantos meses?
R1 - Eu estava com sete meses.
(01:59) P1 - Prematura?
R1 - Era, sete meses. Não, eu nasci com nove. Ela caiu com sete. E aí ela conseguiu finalizar a gestação, mas sempre com muitas dores, sempre passando mal e indo para o hospital. E uma dessas vezes ela teve a dor do parto. Ela acha que eu nasci antes do tempo, porque era para eu nascer depois. Eu nasci nesse dia, 10 de novembro. E aí ela disse que parece uma aranha, com as pernas e os braços. (risos) Sabe, parece que procurando sobrevida gritando. Ela disse que era um gritinho bem fininho, depois ficou bem forte. E depois, com o tempo, a minha tia era aquele tipo antigo, que fala que dia de sexta-feira tem que fazer aquelas coisas para baixar a cabeça, para ficar redonda. Quando é menino, tem que ‘botar’ com o calcanhar, (risos) para diminuir o saquinho. (risos) E aí ela fazia essas coisas, né? Para desentortar a perna, tem que ‘botar’, (risos) amarrar com guardanapo. E desentorta, tá? Que até hoje a gente faz. Desentortei a perna do meu filho, tanto que agora ele está ‘junteira’. (risos)
(03:14) P1 - Quando você nasceu, como que era a família? Sua mãe, seu pai, tinha irmãos?
R1 - Eu já tinha um irmão, eu sou a segunda, né? Então, eu já tinha o meu irmão mais velho, o Fabrício. Aí era a minha mãe, meu avô... era a minha avó, minha mãe, meu avô, meu pai. Na época trabalhava, ele era soldado, corporação, policial. E minha tia, sempre foi parceira.
(03:43) P1 - Eles moravam juntos?
R1 - Tudo próximos. A minha tia morava... a mamãe liberou um pedaço do terreno dela para construir a casa da titia.
(03:52) P1 - E seus pais, você sabe como eles se conheceram, de onde eles são, como que eles chamam?
R1 - Meu pai é Edmilson Luiz da Conceição, né? A minha mãe é Leda Maria Muniz de Lima. E eles se conheceram na escola. Ela estudava no Salesiano... aliás, ela estudava no Centro Círio e ele no Salesiano. Então, imagina, né? Colégio de padre e de freira, (risos) a juventude não é brincadeira, né? E aí eles formaram uma banda. Aí o meu pai cantava e a minha mãe tocava na bateria. (risos)
(04:27) P1 - Ou seja, o contrário, geralmente a mulher canta.
R1 - É, não, mas é o contrário. Meu pai até hoje, ‘cara’, ele era vocalista de samba, de Macapá, mas agora ele canta para a igreja.
(04:40) P1 - Os seus pais são de onde?
R1 - Meu pai, na verdade, é de Mosqueiro e a minha mãe é adotiva, ela é de Manaus. É de lá.
(04:51) P1 - E aí foi para Belém?
R1 - Foi para Belém, se criou em Belém.
(04:55) P1 - Quando você nasceu, Patrícia, como que era, você sabe, a condição de vida dele, sua mãe trabalhava? Seu pai era soldado.
R1 - Não, meu pai era da polícia. Na verdade, meu pai estava estudando para a escola de polícia, porque antes fazia tipo um curso, era tipo um cursado da polícia e aí ele estava entrando na escola militar da polícia. Então, quem ajudava na renda familiar era a titia. A titia já tinha uma vida mais estabilizada, então ela que ajudava. É tanto que o meu pai, depois que ele começou a trabalhar, ele fazia questão de dividir o alimentar dele, o cartão de alimentação dele, que era grande, bem robusto na época, ele fazia compras boas e sempre ele dividia com a titia. Mesmo, às vezes, ela dizendo que não precisava, mas ele fazia questão, porque ele dizia que gratidão é uma coisa que não pode ser esquecida.
(05:47) P1 - E a sua mãe? Conta um pouquinho dessa parte de ser adotiva.
R1 - É, a minha mãe tem um pouco de frustração com isso, porque ela descobriu com 12 anos que ela era adotada. Então, ela ficou um pouco frustrada com algumas questões, até hoje ela é. Ela sempre diz que, se ela pudesse saber alguma coisa da mãe dela, ela saberia. Ela viajou um tempo para Manaus, mas ela não conseguiu nenhuma informação. Ela sabe pouca coisa.
(06:15) P1 - E quando ela te teve, ela tinha quantos anos? Ela trabalhava?
R1 - Não, ela não trabalhava. Ela estava com 21 para 22 anos. Ela teve eu e meu irmão com intercalado de meses para um ano. (risos) Ela engravidava no resguardo. (risos) Então, é muito legal. Eu posso dizer assim: eu acho que hoje os dias são mais difíceis que antes, sabe? Porque eu lembro que, com toda a humildade que éramos em casa, que tínhamos em casa, mas nunca, eu não lembro de ter faltado nada em casa. Não lembro. Meus avós... meu avô era aposentado da Petrobras e não recebeu a indenização correta porque, naquela época, quem eles poderiam enganar, eles enganavam, já naquela época. E meu pai era marítimo, era marinheiro do Piauí. Meu pai, que eu digo, é meu avô, do Piauí. Então, ele que era o fomento mais forte da casa. Então, o meu avô não deixava faltar nada para a gente. Todo mês, quando ele ia receber, ele fazia questão de dizer, perguntar o que a gente queria. Cada um. Ele comprava o que cada um queria, diferenciado. Eu gostava de Danoninho. (risos) E meus irmãos gostavam de Danone qualquer. Aí a minha irmã dizia: “Eu quero banana e laranja”. Ele trazia o que a gente queria. Não faltava, nunca faltou nada para a gente. E uma coisa que eu digo, sabe? A minha avó era uma mulher que eu digo - eu sempre falo para o meu esposo, para os meus filhos, eu sempre conto sobre ela - que ela não era evangélica. Minha avó era aquela católica praticante. Ela é beata, na verdade. Ela dizia que para a gente ser evangélico é só depois que ela morresse. Então, ela fazia eu fazer flores para o andar da santa. Quando chega no período do Círio, cada rua faz a sua procissão. Então, ela que conduzia o Círio da rua. E eu que tinha que fazer o andor para as flores. E assim eu aprendi a fazer flores de papel crepom, flores de qualquer tipo, para decorar o andor da santa. E ela dizia assim, é isso que eu acho mais interessante, que a minha avó não é evangélica e a gente costuma entender que a prática do bem é de quem é evangélico, porque é conhecedor extremo da palavra. Mas a minha avó sempre foi muito... sempre amou muito o próximo, sabe? E eu tenho histórias dela maravilhosas. Uma pessoa que chegou em casa uma vez, uma pedinte mesmo, de rua, com três crianças e grávida de outro. Duas puxando, uma no braço e grávida de outro. Eu lembro que ela ‘botou’ essa mulher para dentro de casa, direto para o banheiro. Enquanto ela estava no banheiro, ela chamou a minha tia e chamou a dona, que era vizinha do lado. E aí pediu roupa. A dona tinha filha menina e a titia tinha o Danilo, que era menino. E tínhamos nós também, né? Então, ela separou roupas para as crianças, roupas que tinha, de mulher e, incrível, quando aquela mulher saiu, era outra mulher. Ela era linda. Ela tinha olhos verdes, loura, sabe? Engraçado que quando ela estava suja, a gente não conseguia enxergar isso, ‘cara’. Como que pode, né? E aí ela saiu. Eu lembro, a minha mãe nessa época, trabalhava, ela era lavadeira da Di Gregório, uma empresa de transporte marítimo, né?
(10:13) P1 - Lavadeira de roupa?
R1 - É, lavadeira de roupa. Ela lavava os lençóis da tripulação. Eram muitos lençóis. E aí ela saiu. Ela disse: “Ana, cuida dela aí enquanto eu vou sair”. Aí cuidou, alimentou. Ela ficou em casa, assim, tipo: uma pessoa que chegou em casa, tomou banho, se arrumou, ficou, a titia serviu, ficaram conversando lá com as crianças, alimentou. E ela muito, assim, sabe, com vergonha, mas ao mesmo tempo se sentindo à vontade, sabe? E aí, quando a mamãe voltou e eu só ouvi basicamente a conversa que criança, naquela época, não podia estar ouvindo conversa, né? Mas eu prestei atenção que ela disse pra ela assim: “Vou te levar pra você conhecer uma pessoa, que essa pessoa vai te dar um emprego”. Aí sabe o que ela fez? Ela foi lá, com o chefe de lá do departamento da Di Gregório, pediu pra ele pra empregá-la porque, na verdade, a mamãe fazia uma faxina na casa dele, nos fins de semana, tinha uns dias que ia. E aí ela disse que era pra ela, ela não precisava mais daquilo, que dava pra essa moça fazer. E aí eu sei que ela foi embora. Eu só sei que ela foi embora, né? Eu sei que ela falou isso e foi embora. Depois de meses chegou uma mulher em casa e esse momento eu nunca esqueço, sabe? Chegou uma mulher em casa vestida com uma saia verde, uma blusa verde, parece um conjuntinho. Muito bonita! Aquela moça chegou em casa e eu que recebi. Eu ficava muito em casa, eu vou dizer pra vocês por quê. Então, eu que a recebi, né? E aí eu falei: “A mamãe não está, no momento”. Aí ela disse: “Eu queria muito falar com ela”. Aí, eu esperei. Eu disse: “Você espera, então”. Eu recebi, pra ela esperar a mamãe chegar, né? E quando ela viu a mamãe, era ela.
(12:24) P1 - Lembra o nome dela?
R1 - Eu não lembro o nome dela, ‘cara’. Eu era muito criança, eu acho que eu tinha uns oito anos, sete anos, oito, sete anos. Então, essa história ficou marcada na minha vida. Então, eu não lembro detalhe, sabe, de conversa, não lembro. Eu só sei que era ela, aquela mulher linda. Agora já não tinha mais os filhos. Eu só sei que ela disse pra mamãe - a mamãe chorava quando a viu - que ela estava muito bem cuidada, as crianças ficavam na creche. Ele liberou uma casa que tinha atrás da casa dele, a casa do caseiro, pra ela morar com os filhos. E ela estava trabalhando bem e ela disse que ele já tinha a incentivado a voltar a estudar. Era muito linda, ‘cara’. E eu não sei, só sei que depois ela foi embora. E eu não sei mais, sabe? Mas ficou gravado na minha memória essa história, que a mamãe ajudou essa pessoa. E hoje são poucas pessoas que fazem isso, sabe? Uma pessoa que bate na tua porta e você abre a porta pra ajudar, simplesmente, sabe? E eu digo assim: a minha mãe não era evangélica, mas eu acredito que, se ela fosse evangélica, ela faria muito mais do que ela já fez. E ela deixou muitos exemplos pra mim. Tudo que eu sou eu devo a ela, à criação, porque nós fomos criados com ela. Nós fomos criados com vó, né? (risos) A minha mãe viajava, saía de casa, trabalhava e a gente ficava com a mamãe.
(13:58) P1 - Você chama mamãe e papai de vó e vô?
R1 - É, vó e vô. Meu pai é Ed e a minha mãe é Leda. E minha mãe é a minha vó e meu pai é meu vô. Meu nome a ele. Meu vô é Manoel Pompeu de Lima, conhecido Lima e a minha vó era Raimunda Muniz de Lima, a velha Diquita. (risos) A Diquitinha.
(14:26) P1 - E eles que criaram vocês?
R1 - Sim. Naquela foto aparece ela, te mostrei, né?
(14:31) P1 - E os seus pais estavam onde, enquanto vocês estavam sendo criados pelos avós?
R1 - O meu pai, quando eu estava com três anos, separou da minha mãe e eu só vim saber notícia do meu pai depois, quando eu estava com 13 anos e mais depois, com 16. A partir de então eu não tinha nenhum convívio, não sei muita coisa.
(14:55) P1 - E ele foi pra onde?
R1 - Ele foi pra Macapá. Na verdade, ele deserdou, né? A guarnição deles era muito difícil. E aí ele resolveu deserdar e teve que fugir, (risos) pra não ser preso. E não sei muito da história dele, eu só sei que ele deserdou e foi embora pra Macapá. Pra lá ele ficou um tempo num mato, escondido e aí ele pegou malária, quase ele morre. E aí ele foi pro hospital, numa cidade próxima a Macapá. E a minha madrasta, que é a Socorro, ele conheceu lá. Aí, então, ela era enfermeira do hospital e aí ela gostou dele, acabaram ficando juntos e estão juntos até hoje. Já casaram hoje, têm filhos, tenho irmãos. Tenho o Tiago e a Tainá. O Tiago é formado, a Tainá também, né? Formada em Direito. Meu irmão, se eu não me engano é formado em Administração, também.
(15:53) P1 - Você tem contato com seu pai?
R1 - Tenho. Tenho, sim. Inclusive, eu tô esperando. Ele está vindo. Meu pai é ‘fera’, ‘cara’. Meu pai é muito inteligente. Eu sou fãzaça do meu pai, ‘cara’, ‘tu é doida’. (risos) Eu digo assim, sabe? Ele mesmo diz que, se ele tivesse a mentalidade que ele tem hoje, ele jamais deixaria a família dele, sabe?
(16:13) P1 - E sua mãe, como é que foi?
R1 - É, foi bem difícil. Minha mãe foi bem complicada. Muitas coisas. Passou por muitas situações.
(16:23) P1 - Ela foi pra onde?
R1 - Ela foi trabalhar em casa de família, viajou um tempo. Ela foi pra... deixa eu me lembrar a cidade que ela viajou. ‘Cara’, eu esqueci agora, mas eu vou lembrar. Então, ela viajou um tempo, tudo trabalhando em casa de família. Ela não tinha estudo. Ela parou tipo no sexto ano. Ela não finalizou. Quando ela conheceu o meu padrasto, o Valdir, que era professor de português, aí ele a incentivou a terminar. Ela chegou a fazer Desu. Na época era Desu, em Belém. Aí ela concluiu os estudos assim. Mas é assim: ela trabalhou no... ela estudou no IEPAM. Aí depois ela começou a trabalhar de cabeleireira. Ela é cabeleireira nata. Não precisou fazer curso pra saber a profissão. E todos nós temos a mesma tenacidade. Inclusive, meu filho tem uma barbearia. (risos) É barbeiro. Eu já tive meu salão próprio, quando eu morava em Belém. Ela também já teve o dela. E ela precisou vender tudo, pra ir embora pra Macapá. E eu me desfiz pra vir pra cá.
(17:39) P1 - Patrícia, então enquanto criança, você e seu irmão foram criados pelos avós. Tinha mais irmãos?
R1 - Eu, meu irmão e minha irmã.
(17:46) P1 - Três crianças e seus avós?
R1 - Sim.
(17:49) P1 - Como que era a casa?
R1 - Era uma casa de madeira. Outro dia eu estava falando pro meu marido, né? Era uma casa de madeira, que meu avô... primeiro era uma casa pequena. Aí depois meu avô construiu uma casa imensa. Só a sala tinha cinco por seis. Só a sala. Era bem grandona. E ele dizia que a sala era grande pra fazer a festa de 15 anos das netas dele, (risos) que era eu e a Letícia. E era muito legal. Nessa casa tinha uma castanhola. Agora eu vou entrar na história, né? (risos) O meu pai plantava muito. Gostava muito de plantar. E eu sempre os ajudava, né? Então, eu falei que eu ficava muito em casa, né? Eu era doente. Eu tinha uma enfermidade no ouvido. Eu acho que essa enfermidade... não se sabe a raiz, de fato, mas pode ter sido também pela pancada quando eu nasci, com a cabeça torta. Foi descoberto com dois anos de vida que eu tinha uma inflamação grave no ouvido. Mastoidite crônica. Então, desde criança eu sofri com essa doença. Então, quando me dava as crises eu ficava em casa, porque a crise que me dava eram dores profundas. Então, eu ficava quase que louca, né? Então, eu ficava muito em casa. Então, quando eu ajudava meu avô com as plantações dele, que ele gostava, aí no quintal tinha um jambeiro e tinha uma goiabeira, que eu me pendurava no galho da goiabeira. Eu era muito magra. ‘Cara’, eu era ‘seca’. Tu vai ver na foto do casamento quanto que eu era seca. Eu pesava 28, 27, trinta. (risos) Durante tipo: eu tinha 15, 16 anos, eu estava com vinte, 25 quilos. Era muito ‘seca’. Parecia uma vara ambulante. (risos) Meu apelido era Olivia Palito, era vara de virar tripa. Todos os meninos me apelidavam. Palito de Fósforo. (risos) E aí, então, o meu vô plantou essa castanhola, né? E ela ficou grande, tinha uns braços, o galho dos braços dela, que eram muito interessantes. ‘Cara’, naquela época, a gente era criança. Engraçado, eu era doente, Lígia, mas no tempo que eu ficava boa eu não parava, eu não deixava de viver. Os médicos diziam: “Ela não pode fazer isso, não pode fazer aquilo”, mas eu queria fazer tudo. Eu dizia: “Mãe, se eu morrer amanhã, eu já vivi”. Eu tinha isso, eu tinha uma mente, sei lá, eu acho que a enfermidade, quando a gente é doente, a gente tem muita consciência, sabe? A gente se torna uma pessoa muito consciente, também a gente é muito observador das coisas. Então, quando a gente saía pra brincar, brincava mesmo, brinquei de tudo. Aí, a gente subia nessa castanhola e a gente fazia dela nossa nave espacial. (risos) Eram uns oito colegas, oito da rua, né? Eram oito. E a gente subia e o topo, lá no ‘olho’, era eu que ficava. É porque eu ficava depois da copa. A copa dela, frondosa e eu ficava acima da copa, porque eu que era o radar, que eu ficava dizendo se estava a bom tempo, pra poder (risos) a nave voar. Então, naquela observação, eu olhava a rua. Só tinha três árvores na nossa rua: a nossa, a da Dona Délia e a da outra casa lá, que eu esqueci o nome da senhora.
(21:42) P1 - Como você fazia pra subir?
R1 – Subindo, no galho. Subia. Simplesmente subia. (risos) Não tinha dificuldade. A gente subia. Até hoje eu subo. Só não subo mais porque está machucado o joelho. Mas eu digo: “Vai subir numa árvore”. Criança tem que subir em árvores, sabe? A gente tem que resgatar essas coisas. Brincar na rua, sabe?
(22:02) P1 - Essa é a sua memória preferida da infância, quando você subia?
R1 – Era, porque eu achava mágico. É uma coisa que eu nunca esqueço. Nós paramos de brincar nela sabe quando, Lígia? Quando meu amigo, com 14 anos, engravidou a namoradinha dele. Aí os pais dele... porque ele que era o nosso capitão, entendeu? A gente perdeu o nosso capitão. Então, quando o Nei chegou chorando, a gente esperou o Nei, nada do Nei chegar, né? Aí, cadê o Nei? Cadê o Nei? Cadê o Nei? Nada. Aí, quando ele veio, veio chorando, que ele não podia mais brincar com a gente, porque ele ia ter que agora trabalhar, porque ele tinha engravidado a Bena. E aí foi trabalhar. E ele não podia mais. Ele tinha 14 anos, só. E a gente ficava brincando na rua. A gente brincava de tudo. Aí...
(22:54) P1 - Você lembra quais são as brincadeiras?
R1 - Todas! Pira maromba, pira alta. ‘Cara’, a gente brincava de pira alta nas construções da casa. Naquela época era casa de madeira assim, toda armada. A gente corria em cima do telhado, das vigas, sem telha. Só as pernas mancas da gente corriam em cima.
(23:15) P1 - O que é pira alta? Não sei.
R1 – (risos) Pira alta é você correr e subir numa coisa. Quando você sobe, a mãe que está correndo atrás de você não pode te pegar, porque tu está no alto, entendeu? Se ela está no baixo, você está no alto, ela não pode. Agora, se ela subir e ela estiver no mesmo nível que você, ela te pega. Então, tu tinha que subir o máximo que podia. Mesmo subindo, tu tinha que correr, porque ela ia subir. Se ela estivesse no mesmo nível que tu, tu não estava no alto, entendeu? Era pira alta. Era por isso que a gente endoidava. A gente corria em cima de tudo. Incrível! ‘Cara’, a gente corria em cima de tudo. Meus filhos nunca fizeram isso, ‘cara’. Se eles fizessem hoje em dia isso, eu morria. Mas a gente corria em cima de tudo. Era pira alta, era pira maromba. Pira maromba é a bola. Tu joga a bola, acertou na pessoa, já foi. Bandeirinha, garrafão. ‘Cara’, o que era? Vôlei, corda, pula corda. Corria, brincava muito disso. Todas as piras que tu imagina. Fura-fura, soltar pipa, peteca. Brincava de tudo. Não tinha essa. A gente era criança. Não tinha brincadeira de menino, brincadeira de menina. A gente brincava de tudo.
(24:39) P1 - Tudo isso em Belém?
R1 - Era em Belém.
(24:41) P1 - Como que era o bairro?
R1 - Ah, o bairro era lá na Sacramenta. Próximo da Pororoca, ali perto do Canal São Joaquim. Era legal. Nosso bairro sempre foi muito legal. Era perto de muita coisa. Eu conheço meu bairro todo até hoje.
(24:56) P1 - Mas era um bairro simples? Era um bairro perigoso? Era um bairro cheio de árvores?
R1 – ‘Cara’, não tinha muitas árvores. Estou te falando que na nossa rua eram poucas árvores. Era a nossa, a das outras duas vizinhas próximas e as outras casas eram tudo de alvenaria. As nossas casas eram de madeira, que era mais próxima do canal. Então, nossas casas eram mais de madeira. Tinha algumas casas de madeira, mas a maioria era alvenaria. A gente, na época, ainda não podia fazer alvenaria. E era um bairro comum, periférico, perigoso não era. A gente brincava na rua até meia-noite. O único perigo que a gente via era a visagem. Quando a gente via, passava uma visagem. Era uma cachorra. Aquela cachorra passava e logo a gente não percebia. Era uma cachorra grande, parecia que estava amamentando. Todo tempo aquela cachorra aparecia, em noite de lua cheia, com jeito de amamentar. Então, quando ela passava, logo as primeiras vezes, a gente não ligava. A gente ficava até meia-noite. Por quê? A vizinha gostava... em frente de casa tinha a casa do ‘seu’ Fausto, porque ele tinha um sitiozinho lá. Então, ele gostava de assar churrasco, assar charque, fazia pirão de farinha, naquela época. Ficava assando as coisas e às vezes a gente sentava, ele gostava de chamar a gente, para contar histórias de assombração, tudo quanto é coisa que ele inventava. Se era verdade, eu não sei. Eu só sei te dizer que era isso. Então, a gente rompia um pouco da noite. Geralmente eles contavam para a gente, que era para amedrontar a gente, para a gente ir dormir, porque a gente não parava. Então, quando era noite de lua cheia a gente via essa cachorra passar. Ela passava, ela ia até no canal e sumia. Quando a gente começou a prestar atenção, porque um dia, quando ela passou, a gente percebeu que toda lua cheia essa cachorra estava grávida. É estranho. Aí a gente começou a prestar atenção nela, que ela vinha lá da Pedro Álvares Cabral. A nossa rua era como se fosse uns cinco quarteirões desses aqui. Cinco quarteirões. Era longe da Pedro Álvares Cabral e do canal. Então, ela vinha de lá da Pedro Álvares Cabral e vinha até o canal. Quando a gente percebia que ela chegava na ponte do canal, ela sumia. Foi. ‘Cara’, no dia que a gente viu isso, tu é doida! (risos) Quando a gente via a cachorra vindo a gente saía da rua, porque a gente começou a ficar com medo, né? Porque aquela cachorra não era normal, não era um ser normal.
(27:45) P1 - Ela tinha dono?
R1 - Não. Estou te falando, Ligia. Ela aparecia, simplesmente desaparecia. E toda vez que ela aparecia, era noite de lua cheia e ela estava grávida, todo o tempo. Era uma cachorrona marrom. Ela passava com a cabeça baixa. Ela nunca levantava a cabeça. Ela passava com a cabeça baixa e andando com a cabeça baixa. Era assim que ela passava.
(28:11) P1 - E seus avós, mandavam vocês entrarem em casa? Eles eram bravos? Eles eram calmos?
R1 - Não. A minha avó era brava, mas ela nunca impediu a gente de brincar. Não. Ela só dizia assim: “Olha, na hora da comida, se não tiver em casa, quem passar do horário, não come mais”. Então, era sagrado. O horário da refeição era sagrado. Aí ela preparava tudo o que a gente gostava. Geralmente, a gente estava brincando. Ligia, se estivesse chovendo, se a gente estivesse na lama - porque naquela época a gente brincava na lama mesmo - a gente chegava, se lavava e comia. Voltava para a lama. Mas era assim, naquela hora, eram quatro horas da tarde, tinha que vir. Era meio-dia, era meio-dia. Ela era muito radical. Sete horas, no máximo oito, janta. A gente vinha, jantava. Podia brincar, podia sair, ela nunca impediu. Agora também era uma outra coisa: não tira nota vermelha na escola, colega, porque de manhã é escola. De manhã, para ir para a aula era mingau de aveia ou era um café reforçado. E sulfato ferroso, tudo quanto era coisa para ajudar a abrir o apetite, as coisas, tudo ela fazia. Nunca ela deixou a gente ficar assim, sabe? A gente era magra, eu era magra. Todo mundo dizia: “Ela é magra de ruim, (risos) não porque ela não come”. (risos) Mas era porque eu era doente.
(29:43) P1 - Desde que você nasceu, você tinha essa questão no ouvido e ela te acompanhou por muito tempo?
R1 - Sim, foi, até os trinta anos.
(29:50) P1 - Você tinha crises?
R1 - Muitas. Eu casei ainda com crises. Até os 33 anos, para ser mais precisa. Três anos do meu casamento foi o maior inferno da minha vida. Casada, com essas crises. Foi bem difícil pro Nonato. Chegamos à beira da separação por esses motivos, muitas vezes.
(30:10) P1 – O que você sentia?
R1 – Uma dor de cabeça. Quando doía, doía tudo: a cabeça, os dentes, toda a arcada dentária e o ouvido, os dois ouvidos e a cabeça, doía tudo. Era como se a cabeça fosse explodir. Era uma dor insuportável. Quando eu tinha 21 anos eu fui fazer um tratamento médico e o médico disse que tinha que jogar álcool setenta dentro do ouvido. Aí a minha mãe comprou, no caso era a Leda, já. Ela que estava, nessa época, aí ela que colocava. A primeira vez que eles colocaram eu estava na casa da titia. A casa da titia era de alvenaria, de corredor, longa. Quarto, cozinha, sala e aquele corredor só de um lado. E eu estava no quarto, quando ela pingou. Ela tinha que pingar duas gotas de cada ouvido. No ouvido que era menos inflamado ela pingou, eu senti, mas fiquei bem. Mas quando ela pingou no que era mais inflamado, ‘cara’, ela diz que eu saí, me batendo na parede, até chegar na cozinha e eles me segurarem. Da outra vez eu senti a dor, ‘cara’, quando tinha que colocar aquele remédio, era de três em três dias, era um suplício, porque eu sentia primeiro o impacto da dor. Depois era como se eu entrasse em estado inconsciente, entendeu? Da outra vez que aconteceu eu estava na casa da Leda, que era próxima do canal, umas cinco casas pro canal. Nesse dia ela colocou lá e disse assim: - estava o Carlos, o Gugu, que eram os amigos, em casa – “Fica na porta, a segura, porque ela vai se debater” “Meu Deus, mas será?” ‘Cara’, eles não... sei lá, eu passei pela porta, correndo. Eu saí correndo na rua, em direção ao canal. Eu ia cair dentro do canal. Aí, o pessoal que morava perto do canal tinha um bilhar, que eram uns cearenses. Aí ela gritou para eles: “Segura ela, segura ela”. Aí eles que estavam lá que me seguraram. Eu ia parar, eu não ia nem na ponte. Eu estava totalmente desvairada. E aí ela... depois o pessoal disse: “Não, Leda, não faz isso, não coloca mais isso. Não é possível que isso seja normal”. O médico disse... depois eu fui para o médico da Marinha, meu tio chegou do Rio de Janeiro e aí eu estava nesse processo de tratamento. Aí ele disse: “Não, eu vou levá-la lá no Hospital da Marinha, como uma cortesia”. Aí o médico disse: “Nossa, vocês iam enlouquecer essa menina, se continuasse”. Aí pararam de ‘botar’ o remédio em mim.
(33:11) P1 - Quando você era pequena, você tinha crise de quanto tempo, para entender?
R1 - Todo período de inverno. Até hoje o período de inverno é o período de crise. Ou seja, sempre final do ano. Período de setembro, agosto, até o final do ano. E aí eu repetia de ano, tinha que parar de estudar. Tive que ficar dois anos sem estudar na escola. Então, isso tudo retardou meus estudos. Tudo.
(33:39) P1 - Você, quando pequena, foi para a escola com a idade normal e aí foi atrasando?
R1 - Foi. Todo ano eu estudava. Mesmo que eu parava, mas eu estudava. Eu nunca deixava de ir para a escola. Eu dizia que eu não ia abrir mão, porque uma hora eu ia conseguir.
(33:55) P1 - Você gostava?
R1 - Nossa, até hoje. Eu terminei meus estudos aqui no Senai. Na primeira turma-piloto do Senai, do EJA. O EJA Pro. ‘Cara’, eu sou EJA Pro do Senai. Então, eu consegui terminar meus estudos aí. E eu disse: “Eu não vou parar. Eu vou para a faculdade”. Fiz o Enem. Eu fui aprovada, fui contemplada para fazer o FIES, só que para Belém. E aí eu fui aprovada pela UNAMA e pela UFRA. Pela UFRA eu ia fazer Agronomia. E pela UNAMA eu ia fazer Engenharia de Produção. E aí eu fiquei: “Como é que eu vou fazer para ir?” Ainda não tinha o programa da prefeitura que bancava o transporte dos estudantes. Ainda não estava com esse programa. Foi no final de 2021 para 2022. Então, eu desisti de fazer lá. Aí a minha amiga disse: “Pat, ‘bora’ lá para Cruzeiro. Lá tu usa tua nota do Enem e tudo. ‘Bora’ lá”. Aí eu fui lá e fiz Administração. Aí disse: “Quais os cursos que tem?” “Tem vaga na turma da Administração” “Então, vou fazer essa aí” “Tu vai fazer? “Vou fazer”. Aí eu tinha terminado o Pro. Eu sou formada em Controle de Qualidade. Ou seja, inspetora de qualidade, que é Administração. Aí eu disse: “Eu já estou nessa área e vou fazê-la mesmo”. E, ‘cara’, que legal descobrir o quanto que é importante a Administração! Administração é importante para tudo na vida. É o que move o mundo a Administração. Eu digo: “Nós, administradores, temos que ser valorizados, porque a Administração é um pouco de cada profissão. A gente é contador, é médico, é enfermeiro. A gente é tudo, ‘cara’. A gente é advogado. (risos) Tem um pouco de tudo. Então, eu acho que... depois eu fui entender que ela é o que eu sou, eu sou administradora nata.
(35:59) P1 – Mas antes da gente chegar nessa fase adulta, quando você era criança, você sonhava em fazer o quê? Você tinha um sonho?
R1 - Secretária executiva. (risos)
(36:10) P1 - Por quê?
R1 - Tinha uma moça na rua de casa, ela fez o curso de secretariado e recepção. Então, ela vestia as roupas que ela passava, com aqueles blazers, aquelas saias, ou então umas calças lindas. Ela era alta. Rosa. E eu ficava encantada de vê-la com aquelas roupas, sabe? Aí eu dizia: “Eu quero ser igual a Rosa. O que a Rosa faz?” “A Rosa é secretária” “Eu quero ser secretária”. (risos) Eu me inspirei nela. Depois ela abriu um salão de beleza e eu fui trabalhar com ela, no salão de beleza.
(36:49) P1 – Então, esse foi o seu primeiro trabalho?
R1 - Não, eu já trabalhava com a minha mãe.
(36:54) P1 – Então, me começa a contar como foi o seu primeiro trabalho.
R1 - Meu primeiro trabalho... meu primeiro trabalho mesmo? Meu primeiro trabalho foi com 14 anos, aprendi a fazer unha com a Angélica, manicure. Ela me ensinou para ajudá-la com as clientes dela. A gente saía muito nas casas. Eu trabalhei um tempo com ela, de manicure. Aliás, trabalhei muito tempo com manicure, mas com ela pouco, acho que uns quatro, cinco anos. Aí depois eu aprendi, eu conheci a Marluce. Aí a Marluce era costureira, me ensinou a costurar. A gente fazia de tudo, de boneco a tamanco. Tudo costura. Aí comecei a costurar. E também ela trabalhava com decoração de aniversário, de festa. Aí: “Pat, ‘bora’ fazer uma decoração” “Me ensina” “’Bora, eu preciso fazer uns bonecos. Vem me ajudar”. Nisso eu aprendi a fazer boneco de isopor. Fazia decorações belíssimas. Fiz casamento, fiz 15 anos. Festa de crianças, muitas festas de crianças. Fiz muito. Trabalhei muito tempo com isso. Aí depois chegou naquela fase que eu fiquei grávida, né? (risos)
(38:09) P1 - E o que você fazia com esses primeiros dinheirinhos que você ganhava, nesse começo?
R1 - Eu ajudava em casa. Não comprava muita coisa não. Era só para casa, mesmo. Comprar comida, comprar frutas. Era isso. Porque nessa época, sabe, eu já não tinha mais meu pai, né? Eu perdi meu avô quando eu tinha... antes de eu fazer 15 anos. Meu avô, antes da festa dos meus 15 anos, me chamou e disse pra mim: “Minha filha, o que você quer ganhar de presente?” Eu disse assim: “Eu quero ganhar um anel de topázio”. Então, ele foi e mandou fazer. Na época, era a Lobrás, lá em Belém. A Lobrás tinha um ourives em cima dessa loja. Uma ourivesaria, né? Uma loja de ourives. Aí ele mandou fazer o meu anel. Só que, nesse intervalo, ele descobriu que tinha um câncer. Era um câncer no esôfago. Câncer no esôfago é bem severo, porque ele impede da pessoa se alimentar. Então, foi muito cruel. Com pouco tempo, a gente perdeu o meu avô. Mas ele pagou o anel, porque ele contratou com um ano antes. Então, ele conseguiu pagar o anel antecipado. Demorou muito. Ele disse que já estava demorando a chegar por causa da pedra, que era topázio.
(39:38) P1 - Por que topázio?
R1 - Porque eu ganhei um livro do zodíaco, né? Que fala sobre tudo. Era um livro mágico. Eu tinha esse livro. Quem me deu foi o meu padrasto. Meu padrasto me dava livros. Ele era professor de português, né? Aí ele me dava livros. Quando eu completei 12, 13 anos, ele me deu. Meu primeiro livro foi com 12 anos. O conto do pássaro que foi buscar a chuva. Aí ele trouxe... que era o bem-te-vi, que era o pássaro que consegue voar mais alto. Conseguiu furar a nuvem e trazer a chuva no sertão. Foi com 12 anos. Com 13 ele me deu esse, que era de zodíaco. Tinha várias fotos de fadas, era lindo. E aí falava sobre os signos e a pedra do signo de escorpião é topázio. E eu queria uma pedra de topázio. (risos) Eu coloquei na minha cabeça isso e meu avô mandou fazer. No ano de noventa, em janeiro, meu avô faleceu. E os meus 15 anos em novembro. Mas antes de falecer, ele disse pra minha avó que não era pra deixar de fazer a minha festa. Que era pra fazer tudo. Só que apertou um pouquinho, né? Porque depois que ele partiu, não tinha mais os mesmos valores pra manter a casa e tudo mais. Então, quando o meu anel chegou, cinco meses antes do aniversário, ela me chamou. Aí chamou minha tia. A Leda não estava, tinha viajado. Ela tinha ido pra Manaus, com o Valdir, nessa época. Aí chamou e perguntou o que tinha o anel, era valiosíssimo, né? Ouro com topázio. E tinha zircônia. Não era brilhante, mas era aquela pedra zircônia, né? Então, aí eu disse: “Não, a senhora pode vender, mãe, o anel”. Ela me mostrou. E era lindo o anel. Era lindo. Mas eu disse pra ela que ela podia vender. Com a venda do anel, ela mandou ajeitar, fazer o banheiro de alvenaria da casa, que não tinha. Mandou fazer uma cozinha extra, que não tinha. De piso. Não era mais de madeira. Pagou as despesas do aniversário. E a gente ainda se alimentou muito tempo desse dinheiro. Acredito que ela vendeu bem. Bem vendido, esse anel. E pra quem ela deve ter vendido, deve ter pagado um dinheiro bom, valorizado o que ela estava vendendo. Mas a minha festa foi linda. Toda a rua participou dos meus 15 anos. Todo mundo. Todos os vizinhos. E foi muito lindo. Foi muito triste, mas lindo, porque eu não tinha meu pai, porque meu pai tinha sumido no mundo. 15 anos. Ninguém sabia notícia do meu pai. E o meu avô tinha partido. E foi muito bonito na hora da valsa, tudo. A minha mãe, a Leda, que fez o meu vestido de 15 anos. Ela fez o meu vestido, fez o meu bolo. Foi muito legal.
(42:56) P1 - Como era o vestido?
R1 - O vestido tem uma foto, né? Era um ‘tomara que caia’, na altura do joelho de organza, de filó e um tule. Esqueci o outro tecido. E branco, com umas pedrinhas bordadas rosas. E aí tinha um filó, pingo d'água, que amarrava daqui do ombro, transpassava pra costa e tinha um arranjo aqui no ombro e o mesmo arranjo do ombro era o arranjo do cabelo. E foi muito lindo.
(43:37) P1 - E foi na sala que seu avô...
R1 - Foi na sala que meu avô programou. ‘Cara’, minha avó endoidou. Ela tinha dinheiro. Na casa da frente tinha um garoto que era o Rafael. Ele fazia aniversário dia seis e eu dia dez. Aí, como era no sábado, resolveram fazer a festa dele no mesmo dia do meu aniversário. Só que ele era criança, ele estava fazendo seis anos. Então, quando ela viu, ela disse: “Dona Célia contratou uma aparelhagem pra tocar no aniversário do Rafael”. Aí a mamãe disse: “O quê? Aparelhagem?” “Foi” “Está bom”. Ela contratou uma aparelhagem gigantesca pra tocar no meu. O Manoel estava namorando a Angélica, que é tia do Rafael. Aí: “Olha, o Manoel trabalha na tabaqueira. Ele vai trazer champanhe pro aniversário do Rafael” “Champanhe? Não, vou comprar”. Ela comprou uma caixa de champanhe. (risos) 24 champanhes. E o Valdir tinha comprado uma, foram 25 champanhes. ‘Mano’, tomamos banho de champanhe. Ficaram porre de champanhe. A minha avó paterna era muito rígida. Pra ela sorrir, hum. Aí, ‘mano’, ela ficou porre de champanhe. Dançou, dançou. Foi a coisa mais linda que aconteceu, sabe, meus 15 anos, eu tenho recordação. Foi filmado. Só que filmagem, com o tempo, se perde. Aqueles cassetes, naquela época, deu um mofo, se perdeu.
(45:09) P1 - Com quem você dançou a valsa?
R1 - Com todo mundo. (risos) Dancei valsa com todo mundo. Até com o Rafael eu dancei. Dancei com todo mundo. Todo mundo dançou valsa comigo. Todo mundo. A última pessoa com quem eu dancei foi com a minha avó.
(45:23) P1 - Foi especial, né?
R1 - Foi. Sempre é.
(45:32) P1 - Virou a noite?
R1 – (risos) Foi até seis horas da manhã. Minha irmã foi se agarrar com - minha irmã com 14 anos, mulher - o garoto lá, não quebrou o muro do vizinho? (risos) Quebrou o muro do ‘seu’ João. O ‘seu’ João ficou puto, no outro dia. Quem quebrou o muro dele? (risos) Tinha sido (45:57). “Não, eu não estava me agarrando, era o (45:58)”. Era um amigo nosso. Eram dois molecões. Eu acho que eles não estavam se agarrando, eles foram aprontar alguma coisa. Porque, ‘mana’, criança, a gente nunca fica quieta. Queriam estar correndo. Os meninos queriam brincar. ‘Cara’, no dia dos meus 15 anos, eu vestida, os meninos queriam brincar de pular corda. Tu imagina? A gente não parava nunca de brincar. Eu brinquei até meus 17 anos de boneca, de casinha, até... meu namorado, eu comecei a namorar com 16 para 17 anos, eu conheci o Jair. Eu ia fazer 17.
Ele chegava em casa, eu estava onde? Na rua, brincando. (risos) Ele chegava em casa cinco horas da tarde, eu estava na rua, brincando. Eu dizia pra ele: “Depois eu vou aí”. Eu ficava brincando, ele ficava com a minha mãe, conversando. Virou filho da minha mãe, o Jair. Aí, às vezes, ele já chegava em casa, já dormia, descansava do trabalho, e eu aonde? Na rua. Eu saía de uma brincadeira e já ia pra outra. Ele dizia a minha mãe: “’Tia’, não dá certo meu namoro com a Pat, porque a Pat ainda é criança”. Ela disse: “Espera lá, que eu vou ter uma conversa”. Eles tiveram essa conversa comigo, que eu tinha que parar de brincar. Quando eles chegavam, eu digo: “Mas por que eu vou parar de brincar?” Ele disse: “Não, é simples, porque a gente está em uma fase, tu é adolescente, já não é mais criança, mas tu brinca como criança”. Eu digo: “Se é pra isso, eu vou continuar brincando”. E parei de namorar. (risos)
(47:29) P1 - Ele foi seu primeiro beijo?
R1 - Não. (risos) Meu primeiro beijo foi com o meu colega, o Janes. Nós tínhamos 12 anos.
(47:41) P1 - Como é que foi?
R1 – ‘Cara’, não foi legal, porque era... tinha uma brincadeira de Cai no Poço. Aí Cai no Poço tinha várias atividades: tu falava e aí, dependendo do que era, um beijo no rosto, era beijo selinho. Meu primeiro beijo foi com ele, mas era assim, beijo à toa. Só de a gente segurar na mão, já ficava se tremendo todo. Era assim, não foi nada tão especial. Mas meu primeiro beijo valendo foi com o meu namorado Marcos, que foi o meu fotógrafo do dia de minha festa dos meus 15 anos. (risos) Ele foi o meu primeiro namorado, literalmente.
(48:32) P1 - E foi na festa, ou não?
R1 - Ele estava, ele era o fotógrafo.
(48:35) P1 - Não, mas o beijo não.
R1 – Foi depois. Ele veio entregar as minhas fotos depois de quase um mês. Aí ele pediu, nesse dia ele pediu pra mamãe que ele queria namorar comigo. Ele ficou encantado comigo, na festa. E aí eu não sei, a mamãe disse: “Olha, ele quer namorar contigo” “A senhora deixou? Deixado”. Era assim, ainda tinha essa mentalidade.
(49:00) P1 - Você se apaixonou, ou não?
R1 - Não. (risos) Eu me apaixonei mesmo pelo pai do meu filho, o Idalmi. Ele foi uma pessoa... eu namorei com ele seis anos, mas foi bem difícil. Ele me atraía demais. Ele era cearense, o ‘cabra era da peste’, mas eu era louca por causa dele, sabe? E aí chegou ao ponto até que eu engravidei e aí, quando eu engravidei, a gente se separou, porque a gente passou por um processo e eu tinha uma amiga que ela tinha 15 anos e aí eu já ia completar 25. E aí ela era prima dele, eu soube que eles estavam se relacionando. Doeu mais a traição dela do que a dele, né? E aí eu deixei passar. Eles casaram hoje, eles têm uma família construída. Mas é interessante, que quando eu comecei a namorar com o Idalmi eu ficava imaginando assim, como seria nossa vida, né? A gente se imaginava que a gente ia casar, que a gente ia ter filhos, a gente conversava sobre essas coisas. Mas chegou um dia que eu senti que não, que isso não aconteceria. E aí eu disse pra ele: “Idalmi, a gente se gosta muito, eu sei disso, mas eu não sou tua, eu sei que eu não sou tua. Então, o dia que tu encontrar alguém que tu sinta que é uma pessoa especial de fato, não se preocupa comigo”. Eu falei pra ele. Eu tinha essa consciência disso. Então, eu sonhei, tive um sonho, que eu estava numa casa de madeira, era tipo uma palhoça, um sapé, eu acho e ela era de dois andares. E o corrimão dessa escada, a gente ia pra uma festa, estava se arrumando pra ir pra uma festa. E aí, quando eu vinha descendo a escada, ele dizia assim: “’Bora’, já está na hora”. E eu dizia: “Já vou”. E vinha descendo a escada e ele estava no pé da escada, segurando. Sabe o filme do Jack esperando a Rose, no pé da escada? É incrível que é parecido com isso. Aí, quando eu vi essa cena do Jack, eu sempre me lembro desse sonho. Aí ele estava no pé da escada, esperando. Conforme eu ia descendo o degrau, ele ia sumindo, ele ia ficando transparente. Quando eu cheguei no último, ele não estava mais. E na separação do ambiente que tinha a escada pra cozinha, tinha uma cortina como se fosse uma cortina de pedra, de pedraria, sabe? E aí eu dizia: “Idalmi, onde você está?” Ele dizia: “Tô aqui”. Eu ouvia uma voz dizendo ‘tô aqui’. ‘Cara’, quando eu abri a cortina, era um homem negro e eu não namorava com um homem negro. O único homem negro que eu namorei é o Nonato, é meu esposo. É isso.
(52:06) P1 - Na sua infância e adolescência, que você não sabia onde estava seu pai e a Leda ia e voltava, como é que você se sentia?
R1 - A gente se sentia muito ausente da minha mãe. Eu sentia essa ausência dela. Eu sempre digo pra ela, ela sempre diz assim: “Ah, eu trabalhava muito, trabalhava pra ajudar a sustentar vocês”. Mas a ausência era grande. Hoje em dia... não tinha esse amadurecimento que hoje tem mães, eu digo pela minha nora: a minha nora é muito esforçada. Ela trabalha, ela procura trabalhar. Mas ela chega, ela leva o meu neto pra passear, ela traz aqui. Ela é muito esforçada, nesse sentido. E eu vejo muitas mães com esse mesmo sentido. Então, eu não via a Leda nisso. Eu via a minha avó. A minha avó trabalhava, mas não deixava de dar atenção pra gente. Já a Leda, não. Ela não era muito de dar essa atenção. Não sei o que de fato se passava na cabeça dela, mas era assim.
(53:08) P1 - Mas você não sentia... quando ela vinha pra casa, você a recebia bem?
R1 - Sim, sim, recebia. A gente recebia, mas era assim: uma ausência que doía. Não tinha aquele contato. E quando tinha, ela dizia: “Tu está querendo alguma coisa”. Era assim. Então, hoje em dia, a gente... eu tô construindo uma certa, um certo sentimento materno, mas eu cheguei a um ponto de descobrir que eu não tinha sentimento materno pela minha mãe. Eu fui fazer uma redação na escola, depois que minha avó faleceu e aí era pra falar sobre mãe e eu não sabia o que falar. E aí me deu uma crise de choro dentro da sala de aula, porque eu simplesmente não sabia o que falar de mãe. Não conseguia. Eu só conseguia sentir a dor de que eu não tinha mais a minha mãe. Mas depois que eu aceitei Jesus, a gente tem trabalhado muito essa mentalidade de esquecer coisas difíceis e aí eu já consigo. Hoje eu já sinto o sentimento materno pela minha mãe, né? Mas ela é cabeçuda. Ela está com 72 anos. ‘Mana’, ela dá um trabalho! Só pra tu entender, ela não está em casa, aqui, porque ela está aprontando. Ela tem um namorado, ‘cara’, ela arranjou um namorado da idade dela. ‘Cara’, ela apronta, dois velhinhos aprontando, sabe? Parece uma comédia. (risos)
(54:45) P1 – Dá um exemplo? Quero saber.
R1 – ‘Cara’, é assim: a minha mãe não sabe mexer com o celular. Ela não é dessa de tecnologia. Então, ela diz que não sabe mexer, que o celular não presta. Ou então, se ela manda uma mensagem, ela diz que não foi ela que mandou, foi tu. ‘Cara’, e isso é uma confusão que não tem ideia. Aí ela diz pro Joseph: “Tu está me traindo, porque tu mandou mensagem” e é ela mesmo que mandou. ‘Cara’, é uma loucura. Imagina! Aí não se entendem, aí se estressam pra lá e quer trazer problema. Imagina uma pessoa de idade namorar, eu digo: “Tu vai trazer dor de cabeça pra mim, eu não quero dor de cabeça. Pelo amor de Deus, tudo, menos dor de cabeça”. Ela se apaixonou por um ‘irmão’ da igreja que tinha trinta anos! Imagina! Se apaixonou por ele, meu Deus do céu, foi uma coisa! “Leda, o ‘irmão’ não é pra namorar com você”. Aí ela: “Ah, porque eu gosto dele”. ‘Mano’, ela chorava. ‘Cara’, foi um trabalho comigo! Aí ela me culpou, que eu não a deixei namorar, mas lógico, como é que eu vou deixar? Não tenho condições. Eu sou mais mãe dela do que ela é minha mãe, é tipo assim.
(56:00) P1 - E na adolescência, como era a relação com seus irmãos, vocês eram unidos?
R1 - Era, a gente não era desunido, não, a gente era unido. Meu irmão era molecão, era muito bacana, não tinha muita coisa pra falar. A gente brincava todo tempo junto, né? A minha irmã, que era um pouquinho depois, era ‘burra empacada’, sabe? Então, ela tinha um gênio muito forte. Quando ela empacava, meu amigo! Na escola, em todo lugar, ela não conseguiu estudar, porque ela não queria. Ela foi já estudar depois de adulta, que ela compreendeu que tinha necessidade, ela estudou, mas depois de adulta a gente não tem um elo de amizade muito forte, sabe? Algumas coisas aconteceram, que acabaram nos distanciando.
(56:50) P1 - Da sua irmã? Ou dos dois?
R1 - Da minha irmã e do meu irmão. O meu irmão não fala comigo, eu já procurei falar com ele, mas ele não quer, então eu deixo passar. Por conta de conversa da minha mãe, sabe? Minha mãe inventa umas conversas, que ‘só Jesus na causa’! Ao invés dela agregar, ela separa. E aí eu escolhi dar tempo ao tempo, porque não adianta tu passar. Aí, agora, eles souberam que eu me acidentei, recentemente. Quando eles souberam, as pessoas que apareceram no hospital... a minha irmã apareceu lá, sabe? Ela quer brigar comigo, mas quando acontece alguma coisa, a gente está sempre junto, né? E é isso. A gente não pode dizer assim: “Ah, eu não tenho nenhuma interação com a minha irmã”. Não. Se tiver uma festa de família, a gente está junto, mas eu não tenho aquela amizade que eu gostaria de ter, sabe? Aquele companheirismo. Eu sinto falta disso. Ela é praticamente a minha única irmã materna, né? Na verdade, a única irmã materna. E eu sinto falta desse companheirismo. Muita, mesmo.
(57:57) P1 - Ô, Pat, você morou na casa com seus avós, seu avô morreu antes dos seus 15. A sua avó ficou viva até quando e você ficou nessa casa até quando?
R1 - A minha avó ficou viva até os 24 anos, quando eu tinha 24 anos. E eu morei nessa casa até essa data. Logo depois que a minha avó faleceu, a minha mãe vendeu a casa.
(58:23) P1 - E ela faleceu do quê?
R1 - Câncer de pulmão.
(58:28) P1 - Câncer também?
R1 - Foi.
(58:30) P1 - Você cuidou dela?
R1 - Tudo. A minha avó... eu morava no hospital, com a minha avó. É uma epopeia a história da minha avó doente, né? (risos) A minha avó, quando começou a entrar em crise, eu estava com 15, 16. Logo depois que o meu avô faleceu, eu acho que de alguma maneira afetou a minha avó, né? Então... porque ele morreu, eu estava com 14 para 15. E aí completou os 15, ela fez aquela festa, foi linda. Mas a minha avó trabalhava muito. E ela fumava muito. E também ela fazia almanaque. Sabe aquele caça-palavras? Ela fazia almanaque, que era aquele mais grosso. Então, ela fazia na luz de vela. Então, ela forçava muito a vista. Ela ficou cega. Ela teve um glaucoma fortíssimo. Então, ela ficou cega, no final. Mas, assim, antes, quando ela foi diagnosticada com câncer, ela tinha... eu não sei exatamente quantos anos, mas eu sei que eu tinha 16 anos, já. Ia fazer 16 anos quando ela ficou doente a primeira vez. E aí tinha que ficar com ela no hospital, eu que fui ficar. Naquela época era o Hospital Ophir Loyola, que é o hospital referência do câncer, lá em Belém. Aí eu lembro que nós ficamos um mês. Fiquei um mês. E eram poucas pessoas para ficar com ela. Alternava com alguns amigos, algumas vizinhas que queriam ficar, mas era tipo uma noite e outra. E eu morei, eu me mudei com a mamãe, para o hospital. Eu que ficava, literalmente, com ela. E com isso eu aprendi a mexer com scalp, soro e chamava, ajudava os outros que estavam com acompanhante, ou sozinho, resolvia. Teve uma que morreu, eu que chamei para dar ajuda, liguei para resolver aquele negócio de necrotério para liberar, porque a filha não conseguia fazer nada. Então, assim, mas eu fiquei muito tempo com a minha avó, né? Imagina, dos 16 até os 24, quando a mamãe morreu. Eu fiquei com ela todo tempo que ela ficou no hospital, eu ficava. A gente ficava hospedado no Ophir Loyola, no hotel. A minha tia... uma das sobrinhas da minha mãe trabalhava na cozinha do Ophir Loyola. ‘Mano’, a gente comia bem pra caramba! Ela preparava as melhores marmitas para a gente. (risos) Eu conhecia todo mundo, do porteiro ao faxineiro no hospital. O Ophir Loyola virou a minha casa durante alguns anos, enquanto a mamãe ficou doente, que todas as vezes ela tinha que internar. E todas as vezes que ela internava, ela passava um, dois meses. Depois, conforme ela foi ficando mais avançada, ela ficou três meses no hospital. Então, já no fim mesmo, ela não foi pro Ophir Loyola, porque eles já tinham dado a alta, aquela alta, tipo assim, já não tem mais jeito, né? Mas, mesmo assim, a gente a levou para o hospital, a levamos para o pronto-socorro da 14. Ela morreu lá, no pronto-socorro. Eu fiquei com ela lá esses dias, os dias que ela ficou lá. Ela ficou 15 dias lá, eu fiquei com ela, mas nos últimos dias dela, ela não quis que eu ficasse. No terceiro dia antes, quem ficou com ela foi a titia. No segundo dia antes, quem ficou com ela foi a minha irmã. E no último dia, quem ficou foi a... não, minto. No segundo dia foi a Leda, minha mãe. E no último dia foi a minha irmã. Então, quem a viu partir foi a minha irmã, não foi eu. Eu fiquei chocada. Por quê, né? Porque era só eu que cuidava dela. Mas ela mandou recado para mim. Ela disse que não era para me preocupar, porque eu já tinha feito tudo o que eu podia ter feito por ela, que agora era a vez delas. Foi isso que ela mandou dizer para mim.
(01:02:45) P1 - Você ficou com a memória dela quando ela estava um pouquinho melhor ainda, né?
R1 - Sim, sim. Eu não acompanhei as crises, as últimas crises que levaram a minha mãe não vi. Porque a primeira crise que ela teve, ela estava com a titia. A segunda, ela chegou a ter a segunda, ela estava com a Leda. E a última ela estava com a Letícia. Ela falou algumas coisas para elas que eu não sei. Elas nunca compartilharam. Mas para mim ela mandou esse recado. Que tudo que eu tinha feito, que eu já tinha feito tudo por ela, que naquela hora era a hora delas.
(01:03:25) P1 - Qual foi o aprendizado que você teve com a sua avó?
R1 - Ai, todos. Eu já te falei, né? A minha avó é minha inspiração, até hoje. Então, é muito reconhecimento, sabe, às vezes a gente não consegue entender. As pessoas tomam atitudes e às vezes a gente não consegue entender. Naquele momento, eu me senti tipo assim: “Poxa, por que eu”, né? Mas se ela tivesse morrido comigo, eu ia sofrer muito. Então, depois que ela morreu eu não consegui chorar, né? Então, depois de cinco dias, eu saí com a Angélica, para fazer uma unha. E quando a gente estava no ônibus, voltando para casa, começou a tocar uma música da Roberta Miranda, né? E essa música a mamãe cantava, ela cantarolava, ela tinha uma voz linda.
(01:04:20) P1 - Que música que era?
R1 – ‘Cara’, é uma música que eu me recordo pouco dela agora. Pouco dela. Era uma música que dizia assim... eu vou lembrar depois, eu te falo. Porque depois que eu fui para a vida evangélica, certas músicas eu esqueci, mas ela cantarolava essa música. E quando tocou na rádio, foi naquele dia que o ‘gatilho’ despertou e eu vi que eu não estava mais com a minha mãe e eu chorei. Chorei, chorei, chorei, chorei, chorei que o motorista parou o ônibus, para ver o que estava acontecendo comigo. E a Angélica (risos) agoniada: “Não, porque ela perdeu a vó dela recentemente”. Eu entrei numa crise de choro, foi uma crise. Aí eu chorei tudo nesse dia e depois não chorei mais. Eu choro de lembranças, de momentos, mas aquele choro doído, eu chorei nesse dia.
(01:05:14) P1 - E aí você ficou na casa e a sua mãe, a Leda, vendeu a casa?
R1 - Foi. Aí, quando a gente ficou em casa, meses depois eu fiquei grávida. Mamãe morreu em março e eu fiquei grávida em outubro, do André. E aí eu estava no início da gravidez, ela vendeu a casa.
(01:05:36) P1 - E o André você estava namorando-o?
R1 - Não, o André é meu filho.
(01:05:39) P1 - Ah tá, não.
R1 – Acontece. (risos)
(01:05:50) P1 - Desculpa, o André é o filho. E aí você já ficou grávida e foi morar com quem?
R1 - Eu morava com a minha tia. Porque a mamãe, quem cuidava da mamãe e ficava em casa, ela ficou com a titia, ela preferiu ficar com a titia. A casa era colada do lado, né? Então, ela disse que não queria ficar só eu e ela na casa. Então, a gente ficava com a titia. Então, eu passei a morar com a titia, junto com a mamãe. E fiquei, a gente ficou morando. Mesmo depois que a mamãe morreu, eu continuei morando com a titia. Fiquei com a minha tia.
(01:06:25) P1 - E como é que foi saber que estava grávida pela primeira vez?
R1 – ‘Cara’, foi um ‘saco’. (risos) Eu não tinha... foi uma gravidez que eu não me preparei, né? Eu não... fui acidental, mesmo, porque eu tomava remédio e tudo mais. Eu perdi a minha virgindade, eu estava com 18 para 19 anos. Então, a partir daí eu comecei a me cuidar, evitar, essas coisas. E aí, quando eu engravidei, eu pensava que eu estava com um problema, que eu estava com o início de um NIC. Eu tive um NIC.
(01:07:00) P1 - O que que é isso?
R1 - Um câncer, princípio. Então...
(01:07:05) P1 - Em qual lugar?
R1 – Útero, colo do útero. Então, eu sabia que eu estava com esse tratamento. E eu engravidei quando descobri que estava com o NIC. Então, eu não estava preparada para essa gravidez. Então, eu achava que eu estava muito séria, porque o que aconteceu é que saiu de dentro de mim um líquido fedorento, né? Aí eu digo: “Meu Deus, eu devo estar morrendo já”, né? Fui para o médico. Aí o médico disse: “Olha, a gente vai tratar o seu câncer, mas a gente vai tratar outra coisa.” Aí eu disse: “Que coisa?” Ele disse: “A gravidez”. Eu disse: “O senhor está louco! Eu, grávida? Como que eu posso estar com um NIC e como que eu posso estar grávida?” Aí ele disse: “Está bom”. E eu fiz bater no médico. Aí voltei para casa, muito invocada: “O médico disse que eu estou grávida. Eu cheguei lá doente, eu estou com câncer e ele está dizendo que eu estou grávida”. Aí a Leda disse: “Mas como assim, Pat?” E era grávida. Mas ele passou a medicação que conseguiu. Estava no início o NIC, então não interferiu a gravidez, né? Mas depois de seis meses que eu tive o André, ele ficou bem severo. Perdi cabelo. Aí fui para o tratamento, aí fui fazer um exame, um tratamento que é a colposcopia, acho que é isso e aí que tira. E para honra e glória do meu Senhor, saiu toda a doença nessa bolsa, na bolsa que era formada. Saiu tudo, não tinha nada. Ainda fiquei três anos fazendo tratamento lá, de retorno, fazendo acompanhamento se voltava, nunca voltou.
(01:08:52) P1 - E aí você levou essa gravidez adiante sozinha ou você ficou com...
R1 - Não, a gente tinha brigado, tinha se separado. Quando eu fiquei grávida, na verdade, a gente estava brigado. Eu engravidei num lance, entendeu? Então, não foi... por isso que não foi uma coisa assim que eu esperava, porque foi num lance que eu fiquei grávida.
(01:09:09) P1 - Aí você contou pra ele e vocês não voltaram?
R1 - Eu disse que era filho do outro, nem disse que era dele. Aí eu não queria aceitar que era dele, na verdade. E aí, quando o menino nasceu, a cara dele, né? Ele é ‘cuspido’ o pai dele. E é isso, mas aí ele ficava: “É meu filho, é meu filho” “Não é teu filho, é filho do outro, não é teu filho”. (risos) Ele já estava com a Neia, né? Então, o que eu ia fazer? Nada. A Neia ficou grávida. Ou ela engravidava, ou ela o perdia. Ela ficou grávida antes de mim. O filho dela mais velho é meses mais velho que o meu. Então, por isso, mais do que eu odiei que eu fiquei grávida, justamente por causa disso. Aconteceu que ela rufiava o meu namorado. Imagina, o cara era meu namorado há seis anos, ela o roubou e ela o rufiava comigo. Tipo: “Ele me escolheu”. Eu disse assim pra ela: “Olha, ele pode ter te escolhido, mas o dia que ele voltar atrás de mim, pode ser muito que eu diga não ou sim”. E eu resolvi dizer sim, entendeu? Só de pirraça, né? E aí: “Olha, tu quer voltar, tu vai namorar comigo. Vai lá pra casa da Neia às cinco horas da tarde, mas sete horas tu vem pra minha casa e a gente vai namorar de porta” “Está bom”. Aí ele foi, a gente ficou namorando, ele namorava com ela e namorava comigo, porque ele era forçado pela família a ficar com ela, porque ele a engravidou. Aí o avô dela era o ‘seu’ Pepê, aí ele dizia: “Minha filha, eu sei que o Damião ama você, mas ele tem que assumir a responsabilidade com a minha neta”. Eu digo: “Problema dele”. Mas ele ficou comigo durante muito tempo. Depois que o André nasceu, ele queria alugar uma casa pra ele me assumir, assumir as duas famílias. Eu digo: “’Mano’, não calço meia nem pra ir pra escola, vou calçar meia contigo, mais nunca”. (risos) Não aceitei nunca. Aí eu fiquei com o André muito tempo, aí quando o André estava com cinco anos, ele foi pra uma festa, convivia todo mundo junto, os primos, né? Aí morava todo mundo perto, aí ele foi pra esse aniversário lá, da família deles. E ele, quando viu o filho dele brincando com o André, ele pegou o Emanuel e disse que não era pra Emanuel se misturar com qualquer criança. Aí meus sobrinhos viram aquilo e até a tia dele, que é a mãe do Bruno, que era aniversariante, veio e me contou: “Pat, aconteceu assim, assim, assim” “Foi mesmo? Ah, tá”. Só mandei um recado pra ele: “Olha, ‘mano’, pode esperar que agora eu vou te botar na Justiça”. Foi. Aí eu o processei. “Eu vou te processar, pra que tu nunca mais abra a boca e diga que meu filho é um qualquer. Meu filho não é troféu. Sabe por que eu nunca cheguei: ‘Ah, o André é teu filho?’ Porque meu filho não é troféu. Ele é meu filho, ele não é troféu. Então, respeita. Agora tu vai reconhecer a tua paternidade com ele, só por causa do teu abuso”. Aí eu fui e o processei. Foi justo, porque meu filho merecia, né? E hoje a gente tem relação com ele. Graças a Deus a gente se relaciona.
(01:12:31) P1 - Aí ele começou a pagar pensão?
R1 - Pagou pensão até os 18 e depois ele parou, mas eles sempre chamam o André lá. O André tem convívio. Levou o Henri pra ele conhecer. O Henri é a cara do avô, meu Deus. (risos) Aí eles se dão bem. Mas, assim, eu disse pra ele: “Tu vai reconhecer o teu filho, ok, beleza, mas na minha porta nunca tu bate”. Porque eu já estava com o Nonato, quando ele... eu já estava casada quando eu o ‘botei’ na Justiça.
(01:13:04) P1 - Ah, tá. Então, vamos entender as coisas. Você teve o André, aí você começou a criá-lo nessas condições. Você estava trabalhando do que e como que você conheceu o Nonato?
R1 - Eu estava trabalhando de cabeleireira.
(01:13:13) P1 - Mas você já tinha o seu salão?
R1 - Não, eu não estava com o meu salão ainda. Eu estava trabalhando no salão da Rosa. Trabalhava com a Rosa. Aí eu ia pra igreja, estava na igreja. Quando o André nasceu, o André teve uma doença muito severa. Ele teve desnutrição e desidratação, porque eu troquei a massa do mingau dele. Ele só mamou 15 dias e eu tive, devido o problema do ouvido, medicação, o meu leite não era bom. Então, eu tive que parar de amamentá-lo. E aí ele só mamou 15 dias e foi pra massa. Aí, quando ele estava completando dois meses, ele teve uma desnutrição grave. Ele foi pra desnutrição e desidratação. Então, ele ficou dos dois aos seis, que foi o dia dos seis meses dele, doente. No dia dos seis meses dele, o André morreu, literalmente. A gente foi pra igreja e ele já defecava, a boca vazava e defecava sem parar, contínuo. Ele estava com o olho roxo, a boca roxa, as mãozinhas roxas. Então, aquele dia era o último dia dele. Aí eu o levei pra igreja, na esperança de alguma coisa acontecer, né? E não aconteceu. Então, eu cheguei em casa, eu disse pra ele... nesse dia ele já não levantava mais a cabeça, ele já não tinha mais movimentos.
(01:14:43) P1 - E não estava no hospital?
R1 - Não, o hospital já o tinha liberado, porque já tinham feito de tudo. Não tinha conseguido mais resolver.
(01:14:52) P1 - E aí?
R1 - E aí ficou em casa. O único jeito que eu ainda tinha esperança era levar pra igreja. Eu levei pra igreja, mas não resolveu. Aí eu trouxe pra casa, o arrumei, o deixei todo de branco, porque eu sabia que ia amanhecer e a gente ia ter que fazer o velório do meu filho, né? Ele estava praticamente morto, ele estava morto. E aí a minha mãe, com o meu padrasto e os vizinhos ficaram fazendo... naquela época, naquele tempo ficava jogando dominó na frente da casa, né? Então, ficaram jogando dominó lá e eu o ‘botei’ na cama. Então, enquanto eu estava arrumando-o, mexendo nele, ele já estava mole, ele já não tinha nenhum movimento, já. Já não... estava só dando aquelas fungadas, já. E aí eu chorei muito, nesse dia. Eu vi que não tinha mais o que eu fazer. E aí eu chorei, chorei, chorei, chorei, chorei e eu disse pra Deus: - eu não era evangélica então, mas eu disse pra Deus – “Deus, eu aceito que tu o leve. Eu entendi. Tu vai levá-lo, eu aceito. Mas eu só te peço uma coisa: sara o meu coração”. Falei. E aí eu chorei, chorei, chorei e eu desmaiei, chorando. A Leda disse que, quando ela entrou no quarto, eu o tinha ‘botado’ arrumadinho, todo vestido de branco e o ‘empacotei’ do lado. E eu estava caída assim, do lado, assim. E ali eu amanheci. Quando eu senti um toque assim, no meu rosto. Senti aquele toque, senti aquele toque. E aí eu fui despertando, fui despertando assim, longe, aquilo longe, sentindo longe. E do nada eu vi aquilo: “Mama”. Aí eu fui, fui, fui, fui, fui, fui. A janela do quarto dava bem cima da minha cama. E aí, a janela... na verdade não tinha janela, era só um pano. Não tinha janela. E aí, o raio solar estava dando, foi dando. Quando o raio solar bate, parece que dá uma coisa, tu está dormindo, teu olho começa a se incomodar. Aí eu fui me incomodando aquilo, aquilo de novo. Aí novamente: “Mama”. Aí, quando eu ouvi o segundo ‘mama’, eu abri. Quando eu fui abrindo, eu fui vendo o raio solar em cima dele, parecia que estava uma áurea sobre ele. Ele estava simplesmente sentado, me olhando. E quando eu abri o olho, que eu olhei assim, eu gritei, eu dei um berro. Todo mundo correu. (risos) A vizinha do lado, todo mundo correu. Ela acordou: “O André está morto”, né? Ninguém o tinha visto ainda. E quando nós vimos, ele estava sentado, sorrindo. O rostinho chega estava rosado. Nunca mais o meu filho adoeceu do estômago.
(01:18:04) P1 - Ele sarou?
R1 - Curou. O Senhor fez o milagre. Em algum momento, ali naquela oração, que eu disse que eu entregava a Ele, talvez ele tenha dito assim: “Era só isso que eu queria: se você estava disposta, de fato, a abrir mão dele”. E eu me vi, depois disso eu aceitei Jesus...
(01:18:26) P1 - Foi aí que você...
R1 - Não foi exatamente aí, mas aconteceram algumas coisinhas que... o Senhor vai te cercando, que tu não tem como escapar. E aí eu fui pra Cristo. Mas, acima de tudo, por causa dele. Eu abri uma palavra, voluntariamente e aí falava sobre ele. Que Deus tinha um propósito na vida dele que, pra esse propósito se cumprir, eu precisava ir pra Cristo, pra criá-lo no Evangelho. Mas que ele passaria por as experiências dele. Então, quando meu filho completou 16 anos, 17 anos, ele começou a não querer mais ir pra igreja. E hoje ele não tá na igreja, mas ele é conhecedor da Palavra. De vez em quando ele visita, a esposa dele também é conhecedora da Palavra. E eu digo pra eles: “O tempo de Deus na vida de vocês vai chegar”. Eu não forço ninguém, porque não é porque a gente é evangélica, porque a gente é liderança, que a gente tem que forçar os nossos filhos. Cada um tem que ter a sua experiência. E eu respeito isso, porque eu não quero que meu filho esteja na igreja, pra dizer: “Eu tô por causa da minha mãe”. Eu quero que ele ame Cristo, ele tenha essa experiência e conheça. Ele sabe a história dele. Ele conhece exatamente a história dele, ele sabe o que Deus fez com ele. Ele tem essa consciência. Então, é ele e Deus, o tempo de Deus. Eu bati nele, sabe? Quando ele saiu da igreja, eu bati nele.
Por causa dessa surra que eu dei nele, o Senhor me repreendeu e eu fiquei com uma dor no braço três dias. Aí eu nunca mais, depois disso, bati nele.
(01:20:02) P1 - E aí, depois que ele ficou bem, como é que foi acontecendo a sua vida?
R1 - Quando ele ficou bom, era 25 de janeiro. Seis meses exatos. Ele renasceu nesse dia. Ele nasceu dia 25 de julho e foi curado dia 25 de janeiro. Seis meses de vida. A gente fez aniversário dele de seis meses, nesse dia. O levamos para o balancinho, eu tinha foto dele. Incrível, todo mundo ficou maravilhado de ver. Ele ficou rosado, brincou no escorrega a bunda. Como é que uma criança que não tinha movimento simplesmente amanheceu completamente sã, entendeu? E aí, viveu aí. Peralta, joga uma bola do caramba. É isso, é meu filho.
(01:20:45) P1 - Mas e aí você, a sua vida? Você estava trabalhando, conheceu o Nonato. Como é que foi?
R1 - Nesse intervalo, no período da doença do André eu não trabalhava, não fazia nada, porque eu trabalhava com a minha mãe. Eu era manicure, no salão dela. Mas eu não fazia nada, era só doença. É tanto que a passagem do ano eu não lembro, eu não sei o que aconteceu. Eu não consigo ter essa memória da passagem do ano de 2000 para 2001. Simplesmente apagou da minha memória essa passagem. Eu não sei como foi que se deu. Então, eu fui para a igreja, dia 9 o senhor me resgatou, dia 9 de maio. O André estava com 2 anos. E aí eu comecei ir para a igreja, o Nonato já era de lá, só que a gente não se conhecia. E aí eu fui trabalhar, a Leda teve problema com o salão dela. Aí, eu fui trabalhar com a Rosa. A Rosa precisava de um cabeleireiro lá e conversou comigo. Eu resolvi ir para lá, fui trabalhar com ela. Aí, foi quando teve um culto na igreja, que o pastor chamou as famílias. Eu fazia parte do coral das mulheres, porque eu já tinha filho. E ele fazia parte do coral dos homens, porque já era adulto, não era jovem. Aí, solteiro e solteira. Então, eu era muito magrela, parecia uma menina, mãe de um filho. Aí, o Nonato faz aniversário dia 25... dia 27 de junho. E aí, no dia do aniversário dele, ele chorou que ele queria a noiva dele, a mulher dele. Então, ele falou para Deus que tudo o que ele queria de presente era a mulher dele. Aí, os irmãos se envolveram no negócio de achar a noiva para o Irmão Nonato. Aí, fizeram uma pesquisa: qual o perfil da sua noiva? Aí, o perfil da noiva era uma mulher, podia ter filho, de 25 até, no máximo, trinta anos e não tinha problema se tivesse filho. Mas tinha que ser esse percentual e ele não fazia muita preferência de biotipo. Ele só queria assim e que fosse uma serva de Deus. Aí, os ‘irmãos’ começaram uma campanha, A Noiva do Irmão Nonato. Irmã Bena era líder das mulheres: “Quem são as mulheres solteiras da igreja, lá do coral?” Aí tinha umas cinco, eu era a sexta. Tinha cinco mulheres. Só que aí eles foram descartando: “Não, a Patrícia não dá porque ela é nova. Ela é jovem, muito jovem. Ele quer de 25 a trinta anos. Então, ela é jovem. Não dá para ser ela. Então, ‘bora’ ver as outras”.
(01:23:51) P1 – Mas você estava com quantos anos?
R1 - Espera lá. Aí, vou chegar nesse trecho. Aí, eles começaram a pesquisar as ‘irmãs’ e apresentar para Deus, para Deus confirmar quem era e Deus não confirmava. Deus não confirmava, Deus não confirmava. Eles queriam apresentar, para poder dizer para ele: “Olha, a gente tem uma pessoa no perfil e vamos apresentar vocês”. Foi isso que eles planejaram. Aí, nada. As mulheres, nada. Mas aí Deus revelava para as ‘irmãs’: “Não, a esposa do Nonato está na igreja”. Eles tinham essa consciência, Deus revelou para eles isso. “Está na igreja, mas como assim? Então, não é do coral. Está no meio dos Jovens”. Mas as meninas do Jovem, a maioria tinha 22, no máximo. Não tem 23 anos. Aí, chegou o dia do aniversário do André. Olha, o aniversário dele foi 27 de junho. E o do André, 25 de julho. No dia do aniversário do André, eu nunca deixei passar. Sempre fazia bolo, sempre fazia alguma coisa. Faltou energia. Aí, já estava tudo preparado para a festa, digo: “Vamos fazer a festa à luz de vela”. Aí, fiz à vela e convidei a Irmã Bena. Aí, quando foi na hora de deixar a Irmã Bena, a gente foi conversando. Então, havia um caso de uma mãe que deixou os dois jovenzinhos namorarem, de 12 e 13 anos. Aí, estava uma polêmica, porque ela liberou esse namoro. Aí, a gente vinha conversando na rua sobre isso. A gente foi deixar a Irmã Bena na casa dela. A casa da Irmã Bena ficava tipo três quarteirões de casa. Aí, na rua, conversando, chegou energia. Enquanto a gente estava na rua, conversando, chegou energia. Aí, fomos lá deixá-la. Aí, a Leda vai e diz assim: “É, por isso que as minhas, quando arranjaram filho, já estavam todas adultas. A Pat já tinha 25 anos, quando ficou grávida”. Aí, Irmã Bena virou para ela e disse assim: “O que, menina? Quantos anos a Pat tem?” “A Pat vai fazer trinta anos”. Aí, ela: “Mentira” “É verdade” “Como assim? O André tem quantos anos, hoje?” “Cinco. Aí, ela ficou grávida com 24, o teve com 25. Ele tem cinco anos” “Pat, tu vai fazer trinta anos?” “Vou”. Nisso, a gente estava virando a esquina da casa dela. Na casa dela estavam o marido dela, que era o Irmão Joca e estavam os ‘irmãos’ que eram líderes dos homens, do coral dos homens. Ela gritou, no meio da rua: “Joca! Achei a noiva do Nonato! É a Patrícia!” (risos) Eu: “O quê? Como assim? Eu o quê? Noiva de quem? (risos) Aí, ficou todo mundo estatelado, assim. Aí, fomos andando: “Como assim?” “Ela vai fazer trinta anos! Trinta anos!” “Mas, com essa cara, tu não tem vinte e dois?” “Não”. (risos) E aí eles resolveram marcar, começaram a programar. ‘Mana’, foi um negócio. Eles marcaram um jeito de fazer e chamaram o Nonato. Foram orar para confirmar e Deus confirmou, que era eu. Era eu. Sentaram para o Nonato, marcaram um dia. Aí, a Irmã Bena teve que viajar. Eu só sei te dizer que eu fiquei esperando a Irmã Bena chegar de viagem, que era para eu ser apresentada para o Nonato.
(01:27:22) P1 - E você queria?
R1 – ‘Mana’, eu não sabia de nada! Eu dizia assim: “Gente, quem é o Nonato?” Eu nem sabia quem ele era. Aí, eu ficava: “Gente, tem um Nonato aqui. Quem é? Quem é?” ‘Mana’, parecia uma coisa. Ele trabalhava na Unimed, nesse período. ‘Mana’, ele começou a virar serviço. E eu não o conhecia. ‘Mana’, eu não gostava de homem negro. Então, se eu o visse, eu dizia: “Eu acho que eu não vou querer”. Aí, resultado: a ‘irmã’ falou para mim: “Olha, Deus confirmou que é tu a noiva do Nonato. É tu, mesma”. E aí, eu digo: “Mas como assim, Deus tem que me confirmar então”, né? Aí, quando foi nesse dia, eu a esperando chegar de viagem. Aí, chegou dia 6 de agosto, a Irmã Bena tinha viajado. Aí, eu digo... nisso, me mostraram ele. Quando eu vi, eu digo: “Ixi, não vai ser, não, porque tem que... você tem certeza?” “É ele” “Não, não deve ser”. Aí, tá.
Quando foi nesse dia, era dia de ceia. Dia 6 de agosto, dia de ceia. Eu cuidava das crianças. Aí, estava lá. Mandaram, nesse dia, arrumaram que a gente tinha aqui com a nossa roupa social do coral, né? Era uma roupa toda azul: blazer, saia azul. Tipo de secretária, sabe? A igreja me favoreceu, que eu usava minha roupa de secretária, que eu imaginava quando eu era na infância. Olha só como as coisas vai acontecendo! E aí, eu estava lá, cuidando do coral, quando o regente do coral dos homens me chamou. Irmão Wilson: “Irmã Patrícia, eu queria conversar com a senhora depois do culto, pode ser?” Eu disse: “Pode. É rápido?” “É” “Porque eu tenho um 15 anos pra ir” “Não, é rápido” “Está bom”. Na igreja, era banco, não era cadeira, era um banco longo. Aí, terminou, ele disse: “Me espere aqui rapidinho, que eu já falo com a senhora”. Aí eu fiquei sentada na ponta do banco, esperando. Aí, eu fiz um sinal pra Leda. Eu disse: “Leda, tu me aguarda um pouquinho, que eu vou conversar com o Irmão Wilson, pra gente ir pro aniversário da filha da Rosa”. A filha dela estava completando 15 anos. Aí: “Está bom”. ‘Mana’, ele saiu de lá, sentou atrás de mim no banco e eu não o senti sentado. Ele sentou, assim, eu senti. O Irmão Wilson veio e ficou: “É, Irmã Patrícia, na verdade, o que eu queria falar com a senhora era que eu queria apresentar à senhora o Irmão Nonato”. Aí, ele fez assim com a mão. Aí, eu virei e ele já estava bem aqui. Aí, eu fiquei, sabe, numa saia justa. (risos) Não tinha pra onde eu correr. Aí, eu: “Está bom, né? Prazer. Como vai o senhor?” Aí, quando eu virei pro Irmão, o Irmão: “Vocês ficam conversando aí, que eu vou sair”, aí eu disse pra ele: “A gente conversar?” Ele disse: “É, porque eles apresentaram vocês, confirmaram, resolveram conseguir uma noiva pra mim e disseram que é você”. Aí eu: “É, estou sabendo dessa história, mas a gente tem que conversar aqui?” Aí ele disse: “É, a gente pode marcar, pra conversar”. Eu digo: “Então, a gente vai marcar, pra conversar, porque eu tenho que ir pra uma festa de 15 anos e eu estou um pouquinho atrasada, pode ser?” Ele: “Pode. Eu posso ir com você?” (risos) Me disseram que ele era extremamente tímido, que pra abrir a boa era um sacrifício, ele quis ir pros 15 anos. Eu olhei assim: “Tá. É lá perto da sua casa, mesmo!” Eu já sabia pra onde ele morava, mais ou menos, era lá pra perto, no mesmo rumo da casa da Rosa. Aí eu disse: “Tá, eu vou pra lá. Qualquer coisa ele já fica pelo caminho, já vai pra casa dele”. Imaginei. Que nada, ‘mana’, ele foi pra festa dos 15 anos comigo. Chegou na festa dos 15 anos a Leda já tinha falado pra Rosa, pra todo mundo. Aí, tu sabe o que aconteceu? Ficamos na festa de 15 anos e eu fiquei na sala com ele e todo mundo foi pro quintal, eu nem participei da festa, porque eu fiquei fazendo ‘sala’ pro Nonato. Aí, ‘mana’, fiquei ‘pelo osso’, sabe? Conversando, ele: “Porque eu quero casar e tudo” “Eu também quero” “Confirmei” “Mas a gente tem que orar, tem que confirmar e tudo”. Aí, nisso terminou a festa e eu disse que tinha que ir pra casa, que tinha que trabalhar no outro dia, ele também tinha, aí ele disse: “Não, então eu vou acompanhar vocês, eu vou até lá, perto da sua casa, acompanhando” “Você está perto da sua”. Aí disse: “Não, eu vou”. Quando foi na hora de despedir ele não queria me beijar? Foi. O ‘irmão’ queria me beijar. Eu disse: “Opa! Não, ‘irmão’, como assim? Você já quer me beijar?” “Porque você já e a minha noiva” “Não sou, não é assim, a gente tem que orar, pra confirmar, você já orou?” “Não” “Eu também não” “Não, então vamos combinar. A gente vai orar” “Está bom”. E o meu pensamento: “Mas que timidez é essa, onde está?” (risos) Aí, uma louca: nós tínhamos por prática de chegar no salão, antes de levantar as portas, a gente orava ali e cada um de nós fazia isso e no dia seguinte era eu que tinha que ler a Palavra. Aí, ‘mana’, eu não ia pegar a Palavra, porque eu tinha que pegar a confirmação e só a Palavra que ia me confirmar, eu não ia ler a Palavra. Eu não queria ler. Foi uma briga, a Rosa: “Não, tu tem que ler” e o João: “Não, tu tem que ler, é seu dia”. Eu digo: “Não vou ler, porque Deus... eu não quero que Deus me fale nada” “Mas e se Deus tiver que confirmar, Pat?” “Se Deus tiver que confirmar, Ele vai confirmar, mas eu não vou procurar, eu não quero a Palavra”. Aí a Rosa pegou, nunca me esqueço, a Bíblia assim: “Me dá, me dá. Olha, Senhor, tu está vendo, né? Era ela pra ler, ela não quer, eu vou ler, Senhor, mas está aqui”. Vrap. Quando ela abriu, ela disse pra mim: “Tu não quer, mas Deus vai falar contigo assim mesmo: cantares de Salomão 2, final do 2 pro início do 3 e aí, quando ela chegou na parte que diz assim: “Não olheis pra eu estar queimada do sol, porque o sol me queimou de cuidar das vinhas que são dadas aos meus irmãos” ‘Cara’, não era pra eu olhar pra pele dele e eu estava rejeitando por causa disso. ‘Cara’, Deus não falha. Quando ela leu isso, Lígia, uma força me jogou pro chão. E quando eu caí no chão eu fui arrebatada. Eu vi um local, um pomar e eu lembro até do perfume desse pomar. Era uma fragrância de várias frutas juntas e a primeira fruta que eu vi foi abacate. Tinha de todas as frutas e era tudo ao alcance da mão. E quando eu olhei assim, eu ia andar pro lado do abacateiro. Quando eu vi: “Que coisa incrível esse abacate, né?” E do meio de uma plantação mais extensa, mais fechada, que era um arbusto, uma figura vestida de branco veio e, conforme ele veio se apresentando, ele vinha com a mão assim, ele trazia nas mãos um cacho de uva negra. E foi automático: quando ele chegou perto de mim, assim, eu automaticamente fiz assim com a mão. Quando eu fiz assim, a mão dele em cima fez assim e o cacho de uva caiu sobre a minha e ele disse: “Eu não te trouxe aqui pra que tu escolhas o fruto que tu queres. Eu estou te dando o melhor da minha vinha”. E quando ele fez isso, que falou isso, um clarão de luz se estendeu e eu voltei, eu estava chorando, no chão, extremamente apaixonada pelo Nonato. Até hoje eu fico ‘mordida’ por que eu não deixo de amá-lo? (risos) “Esse amor não é meu, foi Deus que colocou”, eu digo pra ele. E aí, ‘cara’, apaixonada. A Leda diz – ela não está aqui, mas se ela estivesse, ela ia te dizer, Lígia, que eu dormia sorrindo, ela disse que eu estava dormindo e eu, dois dias depois, o encontrei, que ele chegou do trabalho, que ele estava plantonista, e eu estava ansiosa pra revê-lo. Ele combinou de me levar numa pizzaria. ‘Cara’, a gente foi numa pizzaria lanchar e a nossa conversa era: “Quando é o nosso casamento?” (risos)
(01:36:55) P1 – Aí beijou?
R1 – Nesse dia beijou. “Quando é nosso casamento?” “Não sei, ‘bora’ pensar a data”. “’Bora’. Deus confirmou. Confirmou pra ti? Ele: “Confirmou comigo”. Aí eu disse: “Então, está bom, vou ler, esperar Deus confirmar a data”. E Deus confirmou, provérbios 17 e 22 e aí nosso casamento foi dia 17 de dezembro.
(01:37:23) P1 – De que ano?
R1 – De 2005. E, ‘cara’, deu tudo certo, foi muito lindo. Muito mágico. Meu pai veio pra minha festa de casamento. Não sei se ele conseguir achar. Tem a foto do meu pai na festa do meu casamento. Não sei se ele achou. Mas foi muito mágico. Eu fiquei triste, porque a gente mandou filmar e a moça perdeu a filmagem do nosso casamento, ele não teve responsabilidade.
(01:37:50) P1 – Ele acolheu o André?
R1 – Meu Deus! Um dos sinais. Antes eu tinha falado com Deus que um dos sinais que eu saberia a pessoa certa era que o meu filho ia receber bem, porque o André tinha ciúmes de qualquer pessoa. Lígia, se eu te abraçasse, ele ficava com ciúmes, ele não deixava. Ele tinha cinco anos, então ele não deixava ninguém se aproximar de mim, era extremamente ciumento. Ele só não era ciumento com as pessoas da igreja, porque ele já estava familiarizado, mas qualquer pessoa que se aproximasse de mim, homem ou mulher, ele rejeitava. Então, como que ele ia? Tinha que gostar do meu filho. E nesse dia que o Nonato chegou lá em casa, pra me levar pra gente ir pra pizza, que foi o segundo dia, ele foi lá em casa, me buscar, quando ele saiu ele disse pra minha mãe, ela conta que ele disse: “Vó, é esse que é o meu pai?” Aí ele disse: “É” “Está bom, então”. Aí ele disse: “Mas ele tinha que ser moreno?” Ele falou. Aí ela falou: “Essa é a pessoa que Deus quer pra você” “Está bom”. Todo tempo meu filho chamou o Nonato de pai. Nunca ele chamou de outra coisa que não fosse pai. E um carinho extremo. Rapaz, eles sofreram! Quando eu fiquei grávida do Abdiel eu enjoei dos dois, não queria nenhum dos dois, aí afinaram cada vez mais o sentimento paterno entre eles dois. E é isso.
(01:39:19) P1 – Aí vocês casaram e continuaram morando em Belém?
R1 – Moramos em Belém. Não, moramos os primeiros meses na casa da mãe dele, no quarto que era dele. Aí, de lá, nós saímos pro aluguel. Aí, depois que eu fiquei grávida, a gente resolveu – o aluguel era ‘pesado’ – reformar a casa da Leda, que era minha mãe e separar um lugar pra gente, a gente morou um ano lá, depois a gente saiu de lá, fomos morar no aluguel de novo. A gente estava começando a procurar casa pra morar e não achava e aí foi quando a gente veio pra uma festa da igreja aqui, em Barcarena e, nessa festa, uma ‘’irmã’ estava oferecendo pras outras ‘irmãs’ terreno aqui, na invasão do Caripi.
(01:40:06) P1 – Que ano que era?
R1 – 2007.
(01:40:15) P1 – Já tinha tido o segundo filho?
R1 – Já, já tinha o Abdiel. 2007. Eu fiquei grávida 13 dias depois do casamento.
(01:40:22) P1 – Treze?
R1 – Treze dias depois eu fiquei grávida, durante a lua-de-mel. (risos) E aí foi uma loucura, porque o Nonato trocou de empresa e aí foi descoberto que o sangue dele era A positivo. O meu era 0 negativo. Foi um desespero, porque eu fiz exame, porque eu queria filho e ele também. Então, foi um desespero quando a gente descobriu que a gente era incompatível pra ter filhos. Tinha incompatibilidade congênita. Aí, como a gente ia ter filhos? Não ia gerar filhos. Eu fiquei desesperada. Aí, com 13 dias eu descobri que eu estava grávida. (risos) E está aí o Abdiel.
(01:41:05) P1 – Daí vocês vieram pra Barcarena, numa festa.
R1 – A gente veio pruma festa em Barcarena, da igreja, aí a ‘irmã’ estava falando para as outras, oferecendo terreno e eu cheguei, enxerida, como sempre e disse assim: “ ‘Irmã’, eu posso me intrometer na conversa de vocês?” Aí ela: “Pode”. Aí eu disse: “Eu queria saber sobre esse terreno que a senhora está oferecendo”. Aí ela disse: “São cinco terrenos, lá no Caripi, numa invasão”. Eu disse: “E como a senhora quer?” Ela disse: “Eu não quero pagamento, eu quero comprar, basta comprar na Yamada as coisas: fogão, geladeira, o que dê o valor do terreno”. Na época, era quinhentos reais que ela queria em cada terreno, dava quase dois mil, acho, em cada terreno. Aí o Nonato tinha um cartão Yamada e tinha o limite, o limite dele era alto, aí ele disse: “Que tal, tu quer? ‘Bora’ lá ver. ‘Cara’, a gente veio ver, uma mata. Tu viu, né? Que aqui era uma mata, essa parte aqui, pra lá era mata também. Em 2007 estavam abrindo isso aqui. Invadindo, literalmente. Então, estava mata fechada ainda em algumas áreas. E lá, onde era o meu terreno, onde hoje é a igreja, era mata fechada. Mas sabe quando Deus diz que é aqui, que aquele é seu lugar? Foi isso. A gente sentiu que era aqui, nós fechamos negócio, fomos na Yamada, compramos o que ela queria e no valor da geladeira ela deu dois terrenos... três terrenos pra gente, faltando oitocentos pra um. Aí a minha cunhada disse assim: “Não, eu pago oitocentos depois, pra vocês”. Ela ficou com um e eu resolvi ficar com dois terrenos. O terreno que é a esquina da igreja e hoje é onde a casa da minha mãe, que depois eu peguei esse terreno da minha mãe, passei pra ela e fiquei com onde é a igreja. No final a gente doou pra igreja, ficamos sem terreno nenhum. (risos)
(01:43:15) P1 – E aí?
R1 – Foi, ficamos sem terreno nenhum. Aí tinha iniciado a casa do projeto. A Dona Antônia, que é a presidente do bairro, iniciou o bairro e, em seguida, ela entrou no projeto Minha Casa, Minha Vida, o primeiro módulo Minha Casa, Minha Vida.
(01:43:33) P1 – Qual é o nome do bairro?
R1 – Renascer com Cristo. Aí ela conheceu a gente e do nada ela disse assim: “Vocês não querem ir pro projeto Minha Casa, Minha Vida?” E a gente ficou assim, que a gente morava... a minha cunhada fez logo a casa, a gente veio pra cá, porque estavam invadindo os terrenos. Então, pra não invadir os terrenos e a gente perder, a gente veio se mudar. A gente se mudou pra cá no final de 2010 pra 2011. A gente adquiriu o terreno em 2007 e no final de 2010, 2011 a gente veio pra cá. O SPU também estava mapeando a área, então a gente teve que vir.
(01:44:06) P1 – Veio já de ‘mala e cuia’?
R1 – Tudo. A gente chegou aqui meia-noite, numa chuva, perdemos muita coisa, porque muita coisa molhou, na nossa mudança de Belém pra cá. A gente se mudou pra cá dia 25 de fevereiro de 2011. Aí ficamos aqui.
(01:44:31) P1 – Ele trabalhava com o quê?
R1 – Na Unimed.
(01:44:35) P1 – Fazia o quê?
R1 – Ele é higienizador, na Unimed.
(01:44:39) P1 – E você, nessa época?
R1 – Eu trabalhava com salão e, quando a gente veio pra cá, eu fiquei sem trabalho, porque quando eu precisava, eu ia pra Belém, fazer os meus serviços. Fiquei nisso. A gente ficou viajando. A gente não conseguia se desligar totalmente de Belém, então a gente ia muito pra Belém, viajando, pra trabalhar.
(01:44:58) P1 – As crianças, aqui, iam pra escola?
R1 – Eu coloquei. Um ia comigo e outro ficava na escola. Ou então, se não estavam, iam comigo. Ou ficava com o Nonato, quando ele estava de folga. E aí a gente veio pra cá, ficamos aqui. Quase um ano depois a gente recebeu a missão de iniciar o trabalho da igreja, iniciamos na casa da minha mãe, foi o tempo, também, que eu passei o terreno pra ela, estava construindo a casa dela e nós iniciamos o trabalho da igreja na casa dela. E depois uma ‘irmãzinha’ doou um terreno na rua de trás, numa outra mata fechada. Aí eu disse pra ela assim: “A senhora aceita que eu troque o seu terreno pelo meu, que é da esquina, mas continua sendo doação sua?” Aí ela disse que aceitava. Aí fizemos a troca. ‘Mana’, Lígia, pra construir a igreja... pra construir a minha casa nunca construí. A gente tinha comprado todo o material, estava comprado, mas a gente nunca conseguia construir. Mas quando... foi dia 25 de dezembro que a gente disse que ia construir a igreja, do nada apareceram dez homens e começaram a cavar no outro dia e aí: “Com o que a gente vai construir a igreja?” “Tem um material”. A Dona Antônia me chamou: “Pat, vai sair a sua casa”. Eu disse: “Mas eu estou com o material de casa comprado”. Ela disse: “Mas não adianta tu usar isso, que não pode ter nada no terreno”. Aí a gente: “Vamos fazer o seguinte? Vamos doar o material da casa pra igreja, pra iniciar?” Então, nós construímos a primeira parte da igreja com o material da minha casa. Deus fez isso. Aí, o filho da Irmã Jailda chegou e soube que ela tinha doado o terreno pra igreja. Aí, ixi, foi uma confusão! Aí ela chegou chorando e dizendo que o filho dela tinha brigado com ela, que ela tinha passado o terreno. Eu disse: “Vamos fazer assim: volte pro seu terreno de volta, não tem problema, a gente não vai brigar com isso, nem a senhora brigar com seu filho”. Aí a gente devolveu o terreno. Resultado: ficamos sem terreno.
(01:47:09) P1 – Ficou sem igreja?
R1 – Ficamos sem terreno, porque já estava construindo a igreja, a gente não ia tomar da igreja. Aí, ficamos sem terreno. Nisso o Nonato tinha saído da Unimed, porque era muito cansativo. Ele resolveu sair da Unimed e ficar só aqui, na igreja, cuidando da igreja e fazendo serviço. Tinha muito terreno pra capinar! Ele fazia muito terreno capinando, ganhando dinheiro assim. Era muito terreno pra cuidar, de gente que tinha terreno e queria que alguém cuidasse e a gente começou a cuidar de terreno. Então, eles pagavam bem, até.
(01:47:44) P1 – A cidade estava toda acontecendo, né?
R1 – Isso. Ixi! Ali, São Francisco... agora São Francisco está belíssima, mas era muita mata. A gente viu Barcarena se desenvolver, de 2007 pra cá, a gente acompanhou esse processo. E aí a casa, olha só! Perdemos o terreno, com uma casa do projeto pra construir e não tinha onde a gente construir essa casa. Não tinha. Aí a Antônia: “E agora, Pat?” Era um projeto pra cinquenta famílias, não podia sair ninguém e eu: “E agora? Tem que ver um jeito de comprar um terreno”. Aí não tinha terreno pra comprar. E agora? Aí o Nonato foi chamado pra trabalhar na fábrica.
(01:48:42) P1 – Qual?
R1 – Minto, na prefeitura. Ligaram onze horas da noite, num sábado, pra ele ir trabalhar na prefeitura. Aí, no outro dia, domingo, fizeram uma entrevista, mesmo, com ele, só sei que segunda-feira ele começou a trabalhar. Aí ele trabalhou cinco dias, conheceu ‘seu’ Pedro. O ‘seu’ Pedro disse assim: “Tu é lá do Renascer? Eu tenho um terreno pra vender, lá”. Aí o Nonato disse: “É”. Ele ainda trouxe o Nonato aqui, aí o Nonato disse: “Ixi, aquele terreno é grande”, que era esse terreno. É grande, bonito, só que a gente não tem dinheiro pra comprá-lo. Ele queria três mil. A gente não tinha. Ele disse: “’Seu’ Pedro, eu não tenho, infelizmente”. Está bom. Aí, o Nonato... aconteceu de eu adoecer, aconteceu o acidente do André, que ele perdeu o dedo dele. Brincando na escola, perdeu o dedo na grade da quadra. Aí foi pro hospital e tudo. Nonato ficou com o Abdiel, precisou faltar uns dias de trabalho. Quando ele voltou o ‘seu’ Pedro agoniado pra falar com ele. Aí, quando coincidiu deles estarem no mesmo plantão, ele chamou o Nonato e disse: “Eu tenho um recado pra lhe dar” “Qual é?” “Deus falou comigo no culto da igreja, ele era da Quadrangular, que aquele terreno lá não é mais meu, é seu e é pra você me pagar quando e como puder”. Desse jeito. Nonato: “Mas como?” “O que você puder, como você puder. É seu. Deus disse que não é mais meu, é seu”. Aí ele: “Está bom”. A gente veio aqui e fechamos o negócio. Ele pegou a documentação, deu tudo pro Nonato, a gente veio, fez a documentação na associação. Enfim, já temos a casa pro projeto! Aí está. Depois de uns dias ele foi sorteado, premiado, não sei o que, ele ganhou um dinheiro, que ele comprou um sítio grandão com tudo, plantio e tudo. Parou até de trabalhar. (risos) Foi.
(01:51:00) P1 - Aí vocês vieram pra cá e começaram a construir aqui?
R1 - Aí a gente veio pra cá. Não, não conseguimos, não construímos aqui. Aí ficamos, continuamos morando na casa da minha cunhada, cuidando da igreja. Era fechado, tu lembra? Tu viu a foto? Era um mato fechado. Aí a gente, como que a gente... ‘bora’ conseguir o dinheiro, pra construir a casa? Aí a gente foi comprando a madeira devagar, naquele período. Aí nós construímos uma casinha aqui e ali. Aí construímos uma casinha, esperando o projeto, pra construir a casa. Demorou, esse primeiro projeto demorou, foi muito enrolado. Passou dois anos pra sair o projeto.
(01:51:35) P1 - Esse projeto, de onde que ele sai?
R1 - É do Minha Casa, Minha Vida, do governo federal. Era um projeto rural. Aí, quando anunciou que ia sair, nós nem estávamos aqui, a gente estava pra Ilha Trambioca, que a gente estava cuidando de uma igreja pra lá. Aí a Antônia: “Vem embora, que saiu a casa”. Ou seja, nós moramos nessa casinha - nós moramos na casa da minha cunhada três anos - sete meses e viemos pra casa do projeto. Aí foi o período de construção da casa. A casa levou dois meses, pra construir. Os últimos dias, eu tinha uma amiga que dizia pra mim assim: “Pat, eu vou ‘coisar’ o Caldeirão do Hulk, que é pra ele fazer a reforma e a construção da tua casa”. Quando foi no dia, Lígia, o auditor das casas vinha. Então tinha que estar, uma das melhores casas era a minha, porque ela estava bem centralizada no terreno e era muito bonito o meu terreno. Eu vou te mostrar a foto da casa, eu tenho. Então, era linda, era lindo de ver, ficava bem na imagem. Ela: “Não, tem que auditar a tua casa”. ‘Mana’, chegou trabalhador, uns na calçada, uns no forro, uns na pintura e senta a porta e faz coisa. Era o Caldeirão do Hulk, era mutirão pra terminar a casa. (risos) Eu fiquei assim: “Meu Deus!” E eles fazendo tudo. A gente amanheceu, dormiu, a casa pronta.
(01:53:03) P1 – Uau!
R1 – Foi. Incrível, pintada, tudo. Aí eles vieram, o auditor veio, auditou a casa, ele disse que estava perfeita a casa, não teve nada. E aí, isso foi dia vinte. Ele autorizou a gente se mudar pra casa no dia 22 de dezembro. E foi nosso primeiro Natal aqui na casa, de 2015. Dez anos tem a casa.
(01:53:39) P1 - E aí, como é que você começou a se envolver com os projetos sociais, de lá pra cá?
R1 - A casa. A partir da casa, eu comecei a sentir esse sentimento de gratidão. Então, eu comecei, eu dizia pra Dona Antônia assim: “Dona Antônia, não tenho... como é que eu posso ajudar? A senhora me deu minha casa, como é que eu posso ajudar?” Então, ela estava com outros processos da Minha Casa. Como a auditoria dela foi muito boa, positiva, ela conseguiu outros projetos. Então, a Isa estava cheia de documentação, eu digo: “Eu posso ajudar, eu ajudo no que eu quiser, eu trabalho na igreja como secretária, então, eu posso ajudar”. Aí: “Pode?” “Posso” “Isa, dá trabalho pra ela te ajudar”. E eu conheci a Isa, que era filha dela, assim. A Isa era meio brabona, meio desconfiada com todo mundo, mas eu consegui conquistar a Isa logo de cara e a gente começou a trabalhar junto. Eu comecei ajudando a Isa nos processos da Minha Casa, Minha Vida. Aí, depois disso, ela disse assim: “Pat, dá pra tu ser a secretária da associação”, quando renovou a instituição. Aí: “Tu aceita?” “Aceito”. Aí, eu fiquei como segunda secretária. A Isa é a primeira. Depois, quando mudou...
(01:54:56) P1 - Qual que é o nome da associação?
R1 - Associação de Moradores Renascer com Cristo.
(01:55:00) P1 - Aí, você ficou, então, de segunda secretária?
R1 - Segunda secretária. Aí, envolvida. Aí, ela dizia assim: “’Bora’, vai ter PPA, vai ter plenária, ‘bora’ participar”. E a gente começou a participar. Logo em seguida eu iniciei no último mandato do prefeito que estava, era o João alguma coisa e aí entrou o Vilaça e o Vilaça começou a fazer uma gestão participativa. Então, ele começou a chamar a população pra escutar, fazer PPA de fato, não era aquele PPA mascarado. E aí nós começamos a participar das reuniões, além dos processos da associação. E a gente começou a se envolver, além de ajudar no que fosse necessário na associação. Aí, a ajuda era mais participar. Aí, a Antônia não podia. Às vezes, tinha dois eventos pra estar e ela não podia estar. Então, a gente se desdobrava. Ela ia pra um, eu ia pra outro. Aí, envolvia o Nonato. Quando o Nonato estava de folga: “’Bora, Nonato, com a gente”, aí ele ia. É assim que a gente começou a se envolver. E aí, como ela viu que eu me envolvi bastante, ela resolveu me colocar como vice-presidente. Foi. Ela me convidou pra vice-presidente. Aí, na hora, eu fiquei assim: “Nossa, vice-presidente. Será que...”. Os outros, as outras pessoas participantes da associação estavam desde o início da invasão.
Então: “Tem que conversar com eles, pra ver se eles me aceitam”, né? Aí, mas não, me aceitaram. E aí a gente ficou, primeiro período de gestão, vice-presidente. E aí, ela resolveu se candidatar à vereadora. Aí, eu, no período da campanha, assumi a associação. Eu fiquei como presidente interina. Cuidamos muito bem, sabe? Cuidamos mesmo, reuniões fazíamos muito, participação mesmo. Continuamos com a nossa projeção.
(01:57:10) P1 - E como que era esse trabalho? O que você fazia com os moradores, com a comunidade, com as empresas?
R1 - É, não era ainda tanto com a empresa, mais ainda com os moradores e com a prefeitura. Porque era período de PPA, eleições pra comissão de conselho, começou as comissões de conselho mais efetivamente, participativa. E daí, as associações que estavam mais regulamentadas começaram a participar. Então, a Associação Renascer, devido ao projeto Minha Casa, Minha Vida, estava toda regulamentada. Então, no município, só tinham três associações regulamentadas. Então, essas três passaram a fazer parte das prestações municipais da gestão e a associação era uma dessas. Então, ela começou a ter uma cadeira cativa em conselhos permanentes. Então, a nossa representação começou a se tornar mais forte. E aí, Antônia e eu, ela era titular e eu sempre suplente. Mas aqui suplente sempre trabalha, tanto quanto o titular. Então, era muito envolvido, o Conselho de Saúde... os Conselhos que mais nós trabalhávamos eram de saúde, o Conselho da Cidade e o Conselho do Meio Ambiente. Aí, agora já tem outros Conselhos. A gente está no da mulher, a gente está no da criança, está... no do idoso a gente está pleiteando agora. A gente está no da saúde, o da mulher, o Conselho do IBA, da criança e alguma coisa sobre a coisa alimentar. Esse é mais a Isa, porque a gente tem muita coisa para fazer. Então, essa é a Isa. Eu participo, eu sou titular do Conselho do IBA, do Conselho das Cidades e sou suplente do Conselho da Mulher. Os outros Conselhos são as outras meninas que participam da diretoria. E sou extremamente ativa nas atividades da empresa. A Antônia ficou ativa nas atividades com a gestão pública e eu fiquei na da empresa.
(01:59:19) P1 - Que empresa?
R1 - A Hydro.
(01:59:22) P1 - Como é que começou tudo isso, então?
R1 - Começou com uma escuta. A empresa foi autuada a pagar uma indenização de impacto ambiental. E aí, então, surgiu a ideia de que tinha cem milhões para pagar, de multa. E aí eles chamaram as comunidades, a liderança, para qual a melhor maneira de administrar isso e dividir para a população isso. Aí foi quando começou, entendeu-se que era necessário criar um organismo comunitário das lideranças para, junto, elencar a forma de distribuir esse dinheiro.
(02:00:05) P1 - Isso foi quando?
R1 - 2018. Final de 2017, com as primeiras escutas, mas ele se firmou mesmo em 2018, que foi quando iniciou a IBS, a Iniciativa Barcarena Sustentável. Em 2018, quem estava ativa era a Antônia, não era eu e chamavam só os presidentes. Aí, como a Antônia... começou a sair outros projetos, ela estava mais esperando sair o projeto das casas e precisava que ela estivesse no (02:00:36), ela começou a participar do Conselho das Cidades estadual. Então, era muita reunião para ela participar. Ela disse: “Pat, tu vai ficar nessa área da empresa, fica contigo”. E também era muita briga, muita discussão, ninguém se ouvia. Ninguém se entendia, sabe? Era assim: “Vai ter um dinheiro, oba, eu quero um pedaço para cá, eu quero um pedaço para cá”. Parece que era briga de cachorro grande, era igual urubu em cima de carniça. Aí, quando eu entrei, final de 2019 para 2020, estava no início da pandemia. E, então, ainda estava só em diálogo, só em conversa. Ela achava que era muito blá, blá, blá. Então, ela não tinha paciência. O negócio dela era ir para a prática. Então, como ela estava com um projeto em andamento, ela disse: “Pat, eu não tenho tempo para blá, blá, blá. Então, tu vai, porque isso é tua ‘praia’, tu gosta de debater, tu gosta de conversar, então vai para lá”. E eu gostei, realmente. Aí, fiquei na iniciativa. Na primeira reunião eles fizeram uma reunião online. E aí, eles estavam tirando a comissão do acompanhamento das máscaras, porque eles entenderam que iriam confeccionar máscaras, para ajudar a população com o impacto da Covid. E aí eu fui, me inscrevi para ser da comissão e eu passei como suplente. Aí eram três, três: três titulares e três suplentes. Mas, no final, eu fiquei como titular. (risos) Eu que atuava bastante e até hoje atuo bastante. Me envolvi mesmo, de cabeça. Me envolvi em todo o processo, que é aquele Projeto Travessias. Tem aquela foto.
(02:02:28) R: O Projeto Travessias é o projeto que tinha duas vertentes: o Travessias Agricultura Familiar e Geração de Emprego e Renda, para fomentar auxílio de renda. E aí foi para a vertente da costura. E como a gente tinha que confeccionar máscaras, o desafio era onde conseguir costureiras para confeccionar cento e cinquenta mil máscaras. E não tinha. Aí, ‘mano’, a gente foi fazer formação de costureira. As costureiras profissionais não queriam estar envolvidas no projeto, porque elas iam deixar de atender a demanda delas. Então, a gente teve que produzir costureiras, ou alguém que entendia basicamente de costura. E assim foi. A gente conseguiu, da associação, 24 mulheres e foram distribuídas mais de cem mulheres em toda a Barcarena. Da estrada, da sede, lá da área do Laranjal, aqui do Renascer, parceirão e Vila Nova também parceirão. E assim a gente conseguiu agregar. A gente finalizou com setenta mulheres, algumas foram desistindo pelo caminho, porque tem que fazer formação, né? Formação para costura, aprender a costurar, mas graças a Deus a gente conseguiu. E foi tão bom o projeto que, em vez de cento e cinquenta, fizemos 174 mil máscaras. Aí, depois de construídas, foi para a higienização, para a inspeção de qualidade e a distribuição. E eu participei da comissão que atuava em todo o processo, inclusive na distribuição. A gente foi, como representante da associação, distribuir. A gente foi para as ruas, a gente foi para as casas, a gente levava as bags cheias de máscaras. De acordo com a demanda, a gente entrou em uma parceria com a Saúde, para fazer o mapeamento das áreas com mais riscos, mais demanda de morte, de infecção. Então, naquelas áreas a gente dava uma quantidade de máscaras maiores. Em outras, não. ‘Cara’, a gente passou por várias experiências. A gente teve uma experiência, da comunidade lá das Águas Verdes, que a igreja não deixou distribuir máscara, porque as máscaras estavam contaminadas pela China, que ia matar todo mundo. Foi uma loucura. A gente não acreditou quando a gente ouviu esse tipo de coisa, sabe? A igreja impedir de distribuir máscara no bairro. E isso são coisas, mas também teve coisas maravilhosas: famílias que uma máscara era para duas, três pessoas e a gente levou as máscaras cada um com uma. “A gente não tem que pagar?” Era cinco reais, na época, uma máscara. “A gente não tem que pagar?” “Não, é gratuita”. A gente distribuiu nas feiras, para os feirantes. A gente distribuiu nas vias, nas estradas. E algumas dessas eu fui, porque a gente era uma comissão. Então, tinha lugares que eu ia, tinha lugares que os outros comissionados iam. Mas todos os que eu participei, foram maravilhosos.
(02:05:38) P1 - Esse foi o seu primeiro contato, então, com a empresa, para esses trabalhos?
R1 - Mais especificamente, sim. Foi o primeiro projeto, de fato. Na verdade, o carro-chefe da IBS é o Travessias. Ele que iniciou toda... saiu do campo da ideologia para a prática. Foi a confecção. Ainda aí se viu o potencial das costuras e aí o Projeto Travessias se intensificou para o estilo travessia, porque a diretora da Noruega, eu esqueci o nome dela agora, vinha fazer uma visita aqui. Então, pegou as costureiras, para desenvolver um vestuário com alta tecnologia. Teve capacitação de padrão de roupa, de costura mesmo. E elas fizeram, construíram, elas confeccionaram uma roupa linda para ela. Duas, na verdade, dois vestidos. Um estilo smoking e outro vestido que foi. E ela usou, inclusive, num evento da Hydro, sabe, lá na Noruega. Ela fala com muito orgulho. Foi muito legal, a gente conheceu a Hydro, eu digo assim, adentro. Foi muito legal. A Hydro sempre chama a liderança, agora ela chama também os comunitários, para ir conhecer a Hydro, para desmistificar sobre essa questão do impacto, porque teve o impacto de Mariana. Então, pra desmistificar essa questão do impacto que pode alagar e destruir Barcarena. Então, eles levam as pessoas para dentro da empresa, pra mostrar como que funciona o trabalho. Mas, ainda assim, há aquelas questões que a gente sabe que acontecem, mas eu não posso dizer que a Hydro não nos escuta e não trabalha para ter melhoria nesses processos. Eu não posso falar. Quem quiser falar que não tem, que fale, mas eu não. Não posso falar isso.
(02:07:41) P1 - Por quê?
R1 - Porque eu vejo que eles fazem tudo para desenvolver. Eles fazem aquilo que a gente pede. Eles não fazem aquilo que eles querem. Eles conversam conosco, veem o que é melhor para a gente para desenvolver. Vocês são exemplos, de estarem aqui. Por que será que vocês estão aqui? Uma equipe colhendo informações com pessoas comuns do território, um projeto desenvolvido pela empresa, sabe? Se isso não é escutar a população, é o quê? Entendeu? Vocês são respostas.
(02:08:18) P1 – E eu imagino que é muito importante escutar a população, né?
R1 - Com certeza, sempre. E, a partir daí, a gente pode entender que, mesmo depois que o prefeito Vilaça faleceu e o Renato assumiu, eles entenderam que estar em conformidade com a população sempre é melhor. Mas por que isso aconteceu, amiga? Tem uma coisa. Que a IBS investiu em capacitação, comunicação não violenta. Dizer assim: a gente quer o melhor para a Barcarena. Iniciativa Barcarena Sustentável. Como que a gente vai chegar nesse lugar? É discutindo? É brigando? Não, é conversando. Então, a partir daí, foi se desenvolvendo esse estímulo. A liderança é o fator principal, porque a liderança é que está. Ela é que conversa. Então, ela tem que ter também o entendimento de que, para ela conquistar alguma coisa para dentro dessa comunidade, ela ser porta-voz dessa comunidade, ela tem que ser ouvida. E como que ela vai ser ouvida, se ela só grita, entendeu? E como que a empresa vai ser ouvida, se ela não suporta a gritaria? Como que ela vai falar? Como que ela vai escutar, se ela gritou e não te ouço, entendeu? Então, houve esse diálogo. Então, essa transformação de comportamento e a IBS teve participação fundamental nisso, porque a IBS não deixava ninguém de fora, convidava toda a liderança do município: quantas lideranças eram? Trinta? Trinta lideranças. Você está entendendo? E a gente se encontra em todos os lugares. E aí aconteceu. Mesmo os novos líderes, sempre todos atuantes. Quando alguém não está, a gente vai atrás. E, com isso, abriu-se as portas. O diálogo, a participação. As pessoas começaram a estar mais participativas nos PPAs, nas conferências, nos Conselhos. Se entendeu a necessidade e a importância de que essas reuniões não são chatas, são elas que liberam o mecanismo para que a coisa aconteça, de fato. Lígia, a gente entende que a gente consegue mudar o mundo. “Ah, eu quero mudar o mundo”. Como você vai mudar o mundo? Muda o seu mundo. Quando tu começa a fazer coisas que mudam o seu ambiente de convívio, tu começa a mudar o mundo, entendeu?
(02:10:51) P1 - O que representa para você ser uma das líderes?
R’ – ‘Cara’, é muito orgulho, sabe? É muito orgulho. Tudo que eu tenho, Lígia, eu consegui aqui, em Barcarena. Essa cidade me abriu oportunidades. E a associação me resgatou, porque eu vim para cá como missionária, atrás de moradia e como missionária da igreja, mas na igreja eu passei por momentos que me levaram ao ‘fundo do poço’. E o que me resgatou foi o envolvimento na associação. Porque eu fui, durante muitos anos, 100% evangélica e só olhava para isso. Cabulada. Mas quando eu comecei a me envolver com o social e comecei a entender a riqueza e a grandiosidade que é isso, eu comecei a entender que só olhar para a religiosidade não comprometia. E Cristo era muito mais do que isso. O maior sociólogo que existe no mundo foi Cristo. E por que nós temos que ser religiosos? Então, às vezes eu não me caibo muito bem, sabe, dentro dessa diretriz religiosa. Mas eu tenho muito orgulho do trabalhar de Deus na minha vida. E não é porque eu não sou mais a liderança religiosa, que eu deixei de fazer a obra. Eu continuo fazendo, onde eu estou.
(02:12:31) P1 - Como é que está a sua vida, hoje?
R1 - A minha vida hoje... (risos) tem o hoje antes e o hoje depois do acidente. (risos) O hoje antes do acidente era muito frenética, mas eu passei por um processo, cheguei no processo... como eu tive NIC, eu tive menopausa precoce. Isso é complicado, ‘cara’.
Menopausa todas nós, mulheres, passamos. Mas as dores da menopausa, quem passa é muito difícil. E eu passei as dores. Então, é horrível, ‘cara’. Tem momentos que tu não acha nem que tu é gente. Tu é bicho, sabe? Literalmente. E é bem difícil. E isso me afastou um pouco de alguns processos. Mas eu sempre me esforcei para não ficar de fora totalmente, porque se eu me afasto de fora totalmente eu entro em depressão e vou morrer. Literalmente. Mas a IBS sempre me deu oportunidade. As meninas nunca me deixaram de fora: “Pat, tu está melhor? A gente vai te buscar” “‘Cara, eu tô com muita dor de cabeça, eu tô mal” “Pat, a gente vai te buscar. A gente precisa de ti”. (risos) Muitas delas. Muitas dessa equipe. Mas isso é uma empresa que presta serviços para Hydro, para desenvolver os projetos da IBS, que é a Sinergia. Mas essa equipe que está na Sinergia é a equipe que te olha, que te enxerga. É humanizado. Se um processo não é humanizado, você só olha o esquema, você não consegue olhar o fundamento.
(02:14:30) P1 - Você falou do acidente. O que é o acidente, Pat? Quando e o que aconteceu?
R1 - O acidente aconteceu dia 26 de dezembro do ano passado. Eu fui atrás de uma vaga na escola do meu filho, para o meu filho. Lá no Dutra, em Itupanema. E na vinda de lá eu resolvi pegar uma mototáxi. E quando nós estávamos vindo perto do cruzamento lá um cachorro saiu. Três cachorros saíram em cima da gente e a gente não teve como se defender. E aí a gente foi pro chão. E o primeiro contato eu estava abraçada com um rapaz. Ele era magrinho, franzino, um rapaz. Então, o primeiro contato eu caí por cima dele, mas o impulso do corpo, do acidente, ele me impulsionou e aí eu virei, eu bati a primeira vez a cabeça. Quando eu bati o capacete cuspiu e quando eu bati a segunda eu já bati a cabeça raspando e o meu corpo revirou e caiu. Eu parei bem no meio da pista. A de esquerda e a de direita e eu caí no meio. Mas o interessante é que o primeiro impacto natural foi quando nós batemos no cachorro, mas daí por diante foi tudo em câmera lenta. Conforme o meu corpo foi voando, foi girando, eu fui vendo. A moto bateu na minha perna e rodou, ela pum e rodou pra um lado. O Vinícius, eu bati por cima dele, só que o impulsionamento do corpo dele foi tirando-o debaixo de mim e ele foi revirando, ele deu três carambelas pro outro lado e eu fui revirando pra cá, pra esse outro lado. Na frente vinha carro, só que os carros pararam. Atrás vinha a van. Como era o cruzamento a van parou e três cachorros, nós caímos por cima dos cachorros, assim, foi revirando. A gente foi parar a quatro metros de distância e eu não perdi a consciência nenhum momento, eu vi todo o acidente e o meu olho ficou aberto e aí, quando eu parei, eu só sentia a dor muito forte na perna e no braço, muito forte e na cabeça, a cabeça não sentia nada e aí o resgate demorou, eu falava, eles conversaram comigo, me deixaram consciente todo o tempo e, quando me socorreram, quando eu cheguei no hospital, que eles fizeram a lavagem pra limpar o sangue todo, eu tinha escoriações só, na cabeça. Não tinha quebrado nada no joelho, só muita dor. Não tinha quebrado nada, só as dores, mas após o acidente o meu rosto, no outro dia o meu rosto ficou muito inchado, inchou muito, eles me mandaram pra casa, me deram medicação e me mandaram pra casa. Na UPA eu só fiz o raio X da perna, não fiz da cabeça, não fizeram nada na cabeça. “Está doendo?” “Não, está dormente o meu rosto, a cabeça estava dormente, eu não sentia absolutamente nada. E aí, dois meses após o meu ouvido começou a vazar sangue e começou a vazar e eu comecei a sentir as dores de cabeça e comecei a perceber a minha perda de visão desse lado, desse olho. Então eu fui pro médico esperar, depender do município, esperar sair as minhas consultas, ainda não saiu o neuro, ainda não saiu o otorrino e já saiu a consulta com o ortopedista e comecei a fazer fisioterapia, comecei a movimentar, fui pra muleta e comecei a recuperar, porque eles disseram que não quebrou, mas mexeu com os ligamentos e deu água no meu joelho. E do braço fiquei algum tempo com o braço sem movimento e aqui surgiu um granuloma, devido a um corpo estranho, entrou no meu dedo e aí pegou a veia, então esse granuloma está ligado na veia. Então, por isso que eu preciso operar, pra retirá-lo. Está marcado já, essa semana eu devo... amanhã, às sete, eu vou fazer a ultrassom, já vou pegar o exame, eu acredito que pra semana eu já devo estar operando.
(02:19:31) P1 - E o Vinícius ficou bem?
R1 – O Vinícius ficou um tempão doente também, mas agora ele já está bem. A gente se comunicava. O tio dele veio aqui. ‘Cara’, os mototáxis deram toda assistência pra mim, eu não tenho o que falar. Muito legal. Fui muito acolhida por eles, muito cuidado. O Nonato disse - quando ele chegou lá no hospital, avisaram pra ele, em vez de levá-lo pro acidente, o levaram pro hospital, que a ambulância já ia me buscar - que quando chegou a ambulância, vinha uma quantidade de mototáxis junto com a ambulância. (risos) Ficaram lá com ele, vieram aqui em casa. Muito legal. Não tenho o que me queixar de nada. Aconteceu, aconteceu.
(02:20:20) P1 - Você está se recuperando agora?
R1 - Tô me recuperando, é. Eu tentei, logo de início, caminhar, mas eu tinha muita dificuldade, não conseguia. Ficou muito inchado o meu joelho. Agora não, agora já tô bem, já consigo flexionar. Eu já vou contando os dias pra andar normal. (risos)
(02:20:42) P1 - E aí agora você está ativa nos seus projetos?
R1 - Já, já tô ativa por aí. A gente não para nunca, amiga. Eles dizendo: “Está doendo?” “Não” “Então ‘bora’. A gente vem te buscar”. É assim. Não para nunca. Aí a gente já está com atividade no projeto, está saindo o projeto Minha Casa, Minha Vida de novo. A nossa associação... só três associações conseguiram essa nova demanda de projeto Minha Casa, Minha Vida retomada, né? Depois desse projeto, de todo esse tempo que não saía nada do governo federal, né? E aí saiu os novos projetos, a gente conseguiu 47 casas. Eram cinquenta, mas infelizmente três tiveram que ser reprovadas, aí ficou 47. Vai sair 47 casas, não é aqui no bairro, é no bairro Castanhalzinho, na área rural de Barcarena. Então, a nossa associação é estruturada pra demandar dentro de Barcarena projeto de casas. Então, casa rural. E aí vai demandar pra lá. E a gente está se revirando, desdobrando, porque a gente foi finalmente contemplada pelo projeto da IBS, que é o Conexões, nosso primeiro. E a gente já tentou, todo ano a gente tentava e nunca conseguia. Esse ano a gente conseguiu ser aprovada no projeto, né?
(02:22:05) P1 - O que é esse projeto?
R1 - O projeto de gestão de fortalecimento das organizações do Terceiro Setor. E a gente vai fomentar a gestão pra nossa associação e pras adjacentes. E também pra comunidade, preparar as pessoas pra cuidar de uma organização.
(02:22:23) P1 - Legal, né?
R1 - É. Pra nós, imagina! Uma organização do Terceiro Setor está puxando um projeto de empoderar a organização. ‘Cara’, isso é muito pra gente, isso já é um marco. E nosso projeto passou em primeiro lugar, tá? (risos) Eu tô muito feliz. Eu sou a coordenadora desse projeto, a gente vai começar a trabalhar muito. E tem outro, a gente está com o projeto do ECA da criança, também. Esse eu não tô como coordenadora, mas a gente vai trabalhar tudo junto em parceria, porque a gente tem que trabalhar, né? Não adianta.
(02:22:59) P1 - E o que é?
R1 - O de lá é esporte, cultura e lazer. Atividades esportivas e culturais, pra crianças e adolescentes.
(02:23:07) P1 - E esse projeto é com quem?
R1 - É a associação com o Conselho da Criança e Adolescentes.
(02:23:15) P1 - Algum outro projeto seu?
R1 - Ah, sim. (risos) Eu tô com um projeto, eu tô cursando, eu vou começar a cursar o sétimo semestre da faculdade de Administração. Isso é uma história, né? Porque eu comecei a estudar, pra terminar o meu ensino médio, através do projeto social do Sesi Senai. E a inscrição veio pras comunidades. Aí, quando eu vi a inscrição: “Nossa, eu vou fazer a minha inscrição também”. E tive o privilégio de participar da primeira turma-piloto, né? E nos formamos, foi muito legal. E aí, os professores nos envolveram muito, pra gente fazer Enem e não parar. E eu me formei, é o EJA Pro, em Controle de Qualidade, né? Então, eu sou inspetora de qualidade, formada no profissionalizante. E usei a nota do Enem pra fazer a inscrição da faculdade, da Cruzeiro do Sul. E aí eu consegui 78% de desconto, então eu pago um percentual bem baixo da faculdade. E tô indo, né? Já vou pro sétimo semestre. Semestre passado, acompanhamento de carreira foi projeto ambiental, voltado pra atividade ambiental.
(02:24:45) P1 - E aí?
R1 - E aí eu já tinha um hobby. Eu, o Nonato e a Malena. Malena é uma amiga minha, que morou um tempo em Paragominas. E aí ela trazia muda de lá, de jacarandá, semente. Ela colhia e trazia. Aí nós colhemos semente também de cassis. E aí a gente começou a fazer uma incubadora de sementes aqui em casa. Aqui onde é essa casinha aqui era a incubadora. Naquele pedaço ali é que era a leira de incubação. E nós começamos a fazer. E a gente produzia o adubo orgânico, pra fomentar as mudas. E aí, com três dias, a gente começava a explodir as sementes do ipê. O meu garanhão, meu ipê amarelo. Esse ipê amarelo meu é nativo. Ele é árvore nativa. Aquela árvore ali é uma árvore nativa. Não sei o nome dela exatamente, mas ela é usada pra fazer compensado, a matéria-prima do compensado. Então, ela é nativa. Esse meu ipê aqui é dessa semente. Ele é filho. O meu ipê lá, o garanhão, era nativo daqui. E as outras árvores que eu tenho lá atrás também são árvores nativas, que já estavam aqui, a gente não derrubou, da mata, nativa dessa mata aqui, dessa área de mata. Então, quando a gente... ele não floria. Aí o meu amigo disse que era por falta de adubo, fertilização da terra. Aí o Nonato começou a fazer fertilização orgânica pra jogar nele e ali ele começou a florir. ‘Cara’, a primeira florada dele foi a coisa mais linda. E a gente não sabia que cor ele era, né? Que cor é? Então, na cidade tem muito ipê roxo, né? Então, deve ser um ipê roxo, né? A gente não sabia se ele era nativo. Então, a gente não tinha entendimento. ‘Cara’, e quando ele saiu, era ipê amarelo. Nossa! ‘Cara’, e foi muito triste, porque nesse mesmo ano que ele floriu, foi no ano que teve uma queimada forte, que queimou muito o pântano e queimou... apareceu o William Bonner mostrando, no Jornal Nacional, o ipê amarelo queimando, no meio da floresta. ‘Cara’, quando eu vi isso, eu chorei, chorei, chorei, chorei. Eu digo: “Eu não acredito”. Ele disse que a espécie do ipê amarelo poderia entrar em extinção, mas que quem tivesse, que produzisse. Então, eu comecei a reproduzir o ipê a partir daí. Então, eu disse: “Não, a gente vai reproduzir as espécies”. Aí a Malena disse: “Eu vou trazer outras”. Aí foi que ela trouxe os jacarandás. A gente doou muita, muita, muita, muitas mudas.
(02:27:40) P1 - Eram quantas?
R1 - Nossa! A gente não tem nem noção. Eu doei para a empresa, para um projeto da Hidrovias, 101 mudas. Eu doei para a creche onde a Malena trabalhava em Belém, sessenta. Para a Escola Pingo de Ouro, eu doei tanto mudas, árvores ornamentais, quanto frutíferas, sessenta. E saí doando o ipê para todo mundo que queria aqui, eu saía doando, até hoje chega alguém aqui, eu doo. Eu separo muitas, muitas plantas. Eu já doei muitas. Eu já não tenho nem contas quantas eu já doei. Mas eu fiz esses processos, fiz esses projetos. O que eu achei mais relevante eu fiz foto. E outras eu não fiz fotos, mas eu tenho consciência daquilo que foi feito. E qual o ideal nosso? O ideal é o que eu disse: “Não, a gente vai fazer nosso bairro, o bairro Renascer com Cristo, o bairro dos ipês, em cada rua a gente plantar ipê. Aí, depois eu fui e disse: “Mas qual a necessidade disso? Tem que ter um objetivo”. Qual o objetivo que a gente tem hoje? Que as ruas, devido que poucas casas querem ter árvores e, com o asfaltamento, há o aquecimento. Então, a gente plantar as árvores para resfriamento das vias. Então, se tornou um processo maior. E aí eu disse: “Não, tem que mexer, melhorar esse adubo aí. Não é mais um montinho aqui, a gente tem que fazer um negócio mais robusto, composto, organizado, para a gente conseguir chegar e fazer. A atividade final é plantar os ipês. E aí, o que eu queria? Eu pensei num projeto ambiental de uma composteira, a incubação de uma composteira. Aí fiz a busca, a gente ia demandar, só que era dia trinta agora, né? Dois projetos para a gente demandar. Só que aí, como a gente estava muito acirrado com esses outros, a gente precisou esperar um pouquinho nesse. Mas ele está pronto. E aí eu resolvi fazer o quê? Apresentá-lo na faculdade. (risos) Aí eu apresentei. Como eu estava ainda doente, não poderia estar fazendo as atividades andando, de campo, eu mandei para a faculdade a justificativa que eu estava acidentada, mas que eu ia mandar a atividade e mandei. ‘Cara’, quando veio a resposta agora, no final do semestre, o professor me deu dez, eu ganhei nota dez, ok. Mas ainda não tinha vindo o parecer, né? E quando veio o parecer ele simplesmente disse: “Parabéns pelo seu projeto!” ‘Cara’, eu fiquei muito besta, que eu fiquei assim: “Nossa!” É tu pegar aquilo que tu faz e transformar em algo que poderá ser palpável, né? E está pronto para demandar. Eu composto a comunidade reciclando vidas e resíduos dentro de uma empresa, que eu tenho uma MEI Conduzindo Vidas. Então, que é, para mim, quando pegar uma árvore e colocar ali, estou conduzindo uma vida a esse ambiente. É isso que representa para mim.
(02:31:13) P1 - Imagino que isso seja fruto de tudo que você aprendeu, né?
R1 – ‘Cara’, eu cresci em cima de uma árvore, entende isso? Então, é muito lindo, sabe? Eu olhava para aquela minha rua e eu via que só tinha três árvores na minha rua e hoje eu posso mudar a realidade da minha comunidade, entendeu? Como? Educando, mostrando para as pessoas que aquilo que é lixo pode ser reciclado, porque é casca de banana - é coisa simples - casca de ovo e borra do café. Poderá ser também outro tipo de resíduos de alimentos, outras cascas, todas servem, mas a básica, que as pessoas mais consomem, são essas. Então, a composteira pode ser a partir de um balde. Você coloca os resíduos ali e como que você composta? Um composto seco com folha seca, para fazer a primeira forragem, aí põe o resíduo orgânico e põe o úmido, que são as folhas verdes. Esses cortes que a gente faz, esse é o verde ali. Começa a chorar, formar um chorume, aí tu vai revirando e aí vai compostando. Depois de dois, três meses está pronto, ele vira uma terra, um composto literalmente, para você adubar as suas plantas e germina muito bem. É muito bom.
(02:32:37) P1 - Qual que é o seu sonho?
R1 - Tornar isso realidade. Hoje o meu sonho é tornar o meu projeto realidade. Comprar as máquinas que a gente precisa, para poder ter uma produção. Porque a gente tem uma produção, digamos assim, caseira, no momento, mas a gente quer produzir de fato adubo e replantar a nossa comunidade, doar, vender, porque a minha empresa é para isso, é para planta. Ela é de planta, (risos) planta natural. Vender adubo e todo derivado de planta. É isso.
(02:33:16) P1 - Pat, você falou que tudo que você tem foi Barcarena que te deu e eu, te escutando, entendo que tudo que você está devolvendo é para a Barcarena, né?
R1 - Sim. Meu tempo, minha energia, minha vida, meus maiores risos, as minhas maiores experiências. ‘Cara’, quando eu vejo uma instituição como a da Abilene, que ela pegou a plantação de cacau dela, no quintal da casa dela e transformou num projeto de chocolate, de fabricação de chocolate, o Chocobel, chocolates da vovó Bel. ‘Cara’, isso é muito maravilhoso, entendeu? Através do projeto do Tipiti, sabe? O Tipiti veio e trouxe muitas bênçãos, para muitos agricultores. Fez a agricultura familiar se tornar um empreendimento, entendeu? É esse lugar. A IBS tem atuado muito fortemente nisso. Conseguir, ‘cara’, fazer uma minuta de projeto de emprego e renda, entregar para o prefeito e ele tornar isso um projeto e agora já está pensando em fazer um Conselho do Emprego e Renda, isso também é muito bom. E a gente participou disso, sabe? Você participar de projetos como esse que a gente está agora, o Museu da Pessoa. A gente começar a entender que a cultura... cadê a cultura de Barcarena? A gente começou, nos nossos diálogos, a entender: “’Cara’, cadê a cultura de Barcarena? Ah, tem a lei Brandi, a lei de incentivo à cultura e tem muita verba para demandar. E cadê os projetos? Cadê? Não tem. Então, ‘bora criar’. Então, a empresa é muito parceira nisso porque, quando a gente pensa em algo, ela vê que dá certo, ela vai e embarca. E esse é um, a memória da pessoa, sabe? Resgatar a essência da pessoa que forma esse município barcarenense, que muitos de nós somos oriundos. A gente veio de outro lugar, somos migrantes na terra de Barcarena, mas é uma terra que nos abraça, que nos acolhe. E assim como fez comigo, fez com tantos outros, deu qualidade de vida, sabe? Deu uma dignidade. E tudo o que eu tenho, tudo o que você vê, foi aqui que eu construí. E ainda vou mais além. Meus filhos não querem estar em outro lugar que não seja aqui. A gente: “Vamos embora para Belém, ‘bora’ vender tudo aqui, comprar uma casa para Belém”. Jamais a gente volta para Belém. (risos)
(02:35:59) P1 - É aqui que você quer ficar?
R1 - É, é aqui.
(02:36:03) P1 - Que legado que você quer construir, além de tudo que você já faz?
R1 - Eu quero que meus filhos e netos possam ter oportunidades dentro do município, uma cidade polo industrial, que não precise ir para Curitiba, para São Paulo. Eu quero me formar, quero ter oportunidade dentro do município, que eu não precise ir para Brasília, para Manaus, sabe? Seja lá para onde for. Nós podemos construir empregos de qualidade dentro do nosso território. A gente só tem que entender que... eu falei para o prefeito no dia que a gente entregou a minuta, eu disse para ele: “Prefeito, eu vou citar um exemplo: a gente tem uma pizza. São oito pedaços essa pizza. Por que só o vereador e uma classe conseguem comer toda essa pizza? Ele nem dá conta. Sabe por quê? Porque são, no mínimo, três fatias para cada um. Às vezes ele come duas. Sempre vai sobrar uma. Sempre vai sobrar metade de uma. Então, vamos redistribuir essas fatias. E o vereador indica daqui, o fulano indica dali. E o Poder Público distribuir emprego de forma mais igualitária dentro do município, porque o nosso município pode. Não é que aquele ali não vai mais comer a pizza. Ele está comendo três. Não, ele vai continuar comendo duas, se ele puder, mas ele vai deixar um pedaço. Esse um pedaço que vai sobrar, vai entrar... sabe quem entra aqui, nesse pedaço, nessa fatia que os vereadores deixam? Entra a sociedade organizada, a iniciativa privada. E assim por diante.
(02:37:58) P1 - É uma engrenagem, né? Todo mundo faz parte.
R1 - Ele amou eu ter falado isso e ele disse que era exatamente isso que ele queria e estava buscando. E é o que ele tem feito. É o que a gente tem observado que ele tem feito. Ele tem procurado usar todos os organismos que compõem a gestão pública, para a gente conseguir gerar emprego, empregabilidade dentro do município. A empresa também. Poxa, por que um jovem consegue emprego lá em Santa Catarina, no polo industrial e não consegue aqui? Qual é o processo? Aí o de lá de Santa Catarina veio trabalhar aqui. Onde está a lógica dos processos? Então, a gente começou com esses questionamentos. E aí a gente resolveu fazer um encontro de RH. E o RH vai ter que dizer quais são as demandas que ele precisa e a comunidade vai se enquadrar. Legal. E é assim que a gente tem feito.
(02:38:57) P1 - Está acontecendo isso?
R1 - Está. Está acontecendo. Já aconteceu e continua acontecendo.
(02:39:03) P1 - Hoje seus filhos estão com quantos anos?
R1 - O meu filho, o caçula, está com 18 e o meu filho mais velho vai fazer 24. O meu filho mais velho conseguiu um emprego na Sambazon. E com o dinheiro, quando ele saiu de lá, ele comprou o material dele, para abrir a barbearia dele. E hoje ele é barbeiro e tem a barbearia dele. Só o ponto não é dele, porque ele paga aluguel, mas tudo é dele.
(02:39:31) P1 - E o caçula?
R1 - O caçula está terminando o estudo, o terceiro ano e ele está estudando, porque eu disse para ele: “Tu quer trabalhar?” Quer. A gente tem tentado vaga de Jovem Aprendiz, mas eu disse para ele: “Abdiel, você precisa de qualificação. Vai fazer os cursos”. Às vezes é cabeçudo, não quer. Eu digo: “Meu Deus! Eu fico doente, que a gente viabiliza a vaga de emprego, a gente luta por vaga de emprego para tantas pessoas e vocês aqui estão jogando fora a oportunidade”. Não é indicação, sabe, Lígia? Porque, se for por indicação, como é que eu vou lutar para que a distribuição seja igualitária e eu vou dizer assim: “Consegue uma vaga para o meu filho?” Negativo, meu amigo, você vai lutar como todo mundo, concorrer como todo mundo e por seus princípios, por seu próprio esforço, você vai conseguir a sua vaga. Mas a oportunidade está criada. Inclusive, a gente disse: “Gente, ensino médio completo”. Não dá para flexibilizar e estar pelo menos terminando o ensino médio? Dá, entendeu? Então, tudo isso a gente vai discutindo, debatendo e vai acontecendo.
(02:40:41) P1 - Quais são as coisas mais importantes hoje?
R1 - Hoje, o mais importante, sabe, Ligia, é Deus me dar saúde para eu continuar a minha jornada, para eu continuar na atividade, porque não é por aqui, não vai acabar. A gente só está começando, sabe? Eu vejo assim que ainda tem muita coisa para acontecer. E tudo o que eu quero é isso, é ver meus filhos encaminhados. Eu fico feliz de ver o André, quero ver o Abdiel. E não só eles. Eu quero poder ver, sabe, esses meninos estudando, trabalhando. Eu indico todo mundo: “Vai trabalhar, gente, por favor. O que precisa? Gente, se envolva com o social”. A empresa olha muito para o jovem que é envolvido no social e dá oportunidade, porque a empresa hoje está preocupada com o comportamento. Ela não está mais preocupada com processos, quem trabalha bem, não, é quem está bem para trabalhar. É isso.
(02:41:40) P1 - E aí tem o netinho.
R1 - É, tem o Henri. O meu Henri, ai meu Deus, foi a coisa mais maravilhosa que aconteceu na minha vida. Foi o privilégio de ser vó e a oportunidade de ver meu filho renascer no meu neto. Tudo igualzinho o André. Meu Deus, a mãe dele chorava: “Por que ele não aparece comigo, meu Deus?” Tudo igual, sabe? Ele é tudo para mim, meu neto.
(02:42:11) P1 - Está com quantos anos?
R1 - Ele está com um ano... novembro, dezembro, janeiro, fevereiro, março. Um ano e seis meses, né? Sete meses. Está com um ano e sete meses. Vai fazer aniversário em novembro. Ele nasceu dia 4 de novembro. Aí o aniversário dele de um ano, a mãe dele fez no dia do meu aniversário, olha, (risos) que privilégio, porque foi cair no sábado e ela fez no dia do meu aniversário. E para mim foi o maior privilégio o aniversário de um ano do meu neto, no dia do meu aniversário. A gente apagou a vela juntos, sabe? E eu só vou ter a oportunidade de fazer isso daqui a seis, sete anos, se Deus permitir.
(02:42:50) P1 - Pat, você teve uma avó muito importante. Eu acho que ser vó...
R1 – (risos) É tudo. Quando ele chega aqui eu digo que ele é o dono da casa. (risos) Ele é o dono da casa, sabe? Ele ainda é muito criança, mas ele é muito inteligente. Pensa num menino... eu vou te mostrar uma foto dele. A mãe dele veio, o deixou aqui comigo, aí mandou o recado, que ela já estava vindo buscar. Aí ele estava só de shortinho, eu tinha tirado a camisa dele. Quando eu peguei: “’Bora’, meu amor, vestir a camisa”. Eu só falei isso e aí ele veio vestir a camisa dele. ‘Mana’, quando ele vestiu a camisa, ele já sabia que ia ir embora. O pai dele trouxe a bola dele num saco. Aí ele pegou a bola e correu, pegou o saco e ‘botou’ a bola dentro. Ligia, parece brincadeira. Era para eu ter filmado isso, ‘cara’. Aí ‘botou’ a bola dentro, depois pegou a mochila e veio. Ficou aqui no portão, olhando. Aí a mãe dele demorou um pouquinho, aí ele cansou. Ele veio, se sentou comigo na rede e ficou se embalando comigo. E aí, quando ela chegou, ela disse: “Cheguei”. Ele fez assim para ela. Ela: “Ai, o que é isso? Eu demorei, não sei o quê”. Aí ela entrou: “Meu filho, meu filho”. Ele nem! Aí depois ela: “Vem, vem, vem, vem”. Aí ele foi. Estava chateado com ela, porque ele a esperou chegar. (risos) ‘Mano’, ele não esquece nada. Eu tirei foto e mandei para o pai dele. “Olha, o pequeno aqui, tu está pensando que ele vai esquecer alguma coisa e não esqueceu nada. Ele está seguro aqui, com a sacola e a mochila”. (risos) Incrível! Como que pode? Um ano e sete meses. Com um ano e sete meses sabe o que eu estava fazendo? Eu estava ainda dormindo, nem abria o olho direito. (risos)
(02:44:39) P1 - Tem mais alguma história, Pat, que você quer contar?
R1 – ‘Cara’, eu não sei, sabe, o que vocês querem ouvir.
(02:44:46) P1 - Como é que você se sentiu, contando tantas memórias?
R1 - Nossa, é um resgate, né? Porque tem coisas que, tipo, já estavam, assim, passadas, né? Coisas que passaram. Tipo: o momento do meu namoro, com o meu filho. Coisas, assim, que já não têm mais importância para mim, não tem mais significância, né? São experiências apenas, mas são insignificantes. O momento do meu filho, eu não esperava que eu fosse reviver esse momento, o momento dele. Eu não esperava que eu fosse reviver esse momento. E, sei lá, o momento dos meus 15 anos, né? Eu esperava reviver o momento da minha árvore, mas dos meus 15 anos, não. (risos) Então, foi uma grata surpresa reviver, revisitar a minha gaveta de guardados.
(02:45:47) P1 – Que bom! Para mim, foi um presente.
R1 - Obrigada.
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